Autor de ‘A Terra Dá, a Terra Quer’ afirma não ver diferenças entre Lula e Bolsonaro quando o assunto é mineração em terras de quilombos
Marina Lourenço
28 de maio de 2023
Antonio Bispo dos Santos. Foto: Alexia Melo
Colonizar um povo é como adestrar um boi. Ambas ações consistem na remoção da identidade, mudança de território e condenação do modo de vida alheio. Essa é a associação que Antônio Bispo dos Santos, também conhecido como Nêgo Bispo, faz em “A Terra Dá, a Terra Quer”.
Lançado nesta segunda (29), o livro desmancha conceitos como ecologia, desenvolvimento e decolonialidade —a contraposição ao pensamento de perspectiva colonialista e eurocêntrica.
O autor propõe o que chama de contracolonialismo, que seria a recusa de um povo à colonização, o que, segundo ele, é praticado há séculos por africanos, indígenas e quilombolas.
Nascido na comunidade Saco do Curtume, no Piauí, Bispo ganhou notoriedade em movimentos sociais, na década de 1990, quando chegou a se filiar a partidos políticos, que abandonou anos depois. Desde então, se voltou para a defesa dos povos quilombolas.
Em “A Terra Dá, a Terra Quer”, o sr. critica o colonialismo e se opõe à chamada decolonialidade, termo cada vez mais usado em contraposição ao pensamento colonial. Em vez disso, fala em contracolonialismo. Por quê? Só pode ser decolonizado quem foi colonizado. Qualquer pessoa que se sinta colonizada pode lutar para ser um decolonial.
Mas decolonialidade é uma teoria, não trajetória. Nunca existiu um movimento decolonial que tenha atuado de forma resolutiva em prol de um povo. O contracolonialismo é diferente. Os quilombos não foram colonizados.
O povo da academia que se diz progressista e só lê autores europeus, sim, precisa se decolonizar.
O sr. também diz preferir usar ‘colonialismo’ a ‘racismo’. É bom discutir racismo, mas ele é apenas um dos elementos colonialistas. Quando se fala em racismo, habitualmente as pessoas pensam na sociedade eurocristã. O colonialismo vai além disso. É para todas as vidas existentes.
Como combater o colonialismo? Não queremos matar os colonialistas. Por isso, falo ‘contracolonialismo’. É uma fronteira que estamos estabelecendo entre nós e a sociedade eurocristã monoteísta.
[O extinto quilombo dos] Palmares poderia ter destruído o Recife, mas não devemos destruir nada. Nossa proposta é dizer: ‘Vivam do jeito de vocês e viveremos do nosso, mas, se porventura, perceberem que o nosso é bom, nos deixem ensinar’.
Além do contracolonialismo, o sr. destrincha o conceito de cosmofobia, que seria uma desconexão entre a humanidade e a natureza. Se opondo a essa lógica, diz, então, que não é humano, mas sim, quilombola. Em termos práticos, o que quer dizer? O povo eurocristão monoteísta tem medo do próprio Deus, da natureza, do cosmo. É tanto medo que tem dificuldade de se relacionar com rios, terra, vento —daí a palavra ‘cosmofobia’.
Em Gênesis, quando Adão e Eva estavam no caminho do Éden, interagiam com tudo, não precisavam trabalhar, se submeter a uma ordem externa. Mas Deus humaniza eles, cria o terror e diz que a terra será maldita porque comeram o fruto proibido. É a Bíblia que cria os seres humanos —e quem está fora dela é selvagem.
Nós, quilombolas, convivemos em harmonia com as demais vidas. Os quilombos são lugares de relacionamentos. As cidades, de civilizações. Precisamos animalizar a humanidade e desumanizar a animalidade.
Como assim? Só os humanos usam a linguagem escrita. Nós, outros seres, nos comunicamos de outras formas, inclusive sonora. Passamos a vida ouvindo esse povo das escrituras dizer que não sabemos ler. Ora, os humanos não sabem falar.
Ainda nessa linha de escrita versus oralidade, o sr. diz que em comunidades quilombolas as histórias são passadas de boca em boca, sem nenhuma monetização. Por que decidiu se tornar escritor? Não sou escritor. Sou uma pessoa que escreve para estabelecer uma fronteira entre os saberes. Sou um lavrador que também lavra palavras.
Quando a escola escrita chegou à nossa comunidade, no fim dos anos 1960, nosso povo se recusou a participar, mas ao ver que perderia tudo se continuasse assim, colocou as crianças para estudar a linguagem das escrituras. Entrei na escola para isso.
Me tornei um tradutor da comunidade. Não vou negar que sei falar e escrever muito bem. Mas decidi escrever somente três livros [dois foram lançados] porque sou mesmo da oralidade.
Ao traçar uma relação entre favelas e quilombos, o sr. critica programas como o Minha Casa, Minha Vida e o antigo Fome Zero, os classificando como colonialistas. Não há nada neles para elogiar? Nada é apenas bom ou apenas ruim. O problema desses programas é que tiram das pessoas o direito de arquitetar, compor e plantar o que querem. Claro, melhor ter Fome Zero do que deixar morrer de fome. É melhor ter o Minha Casa, Minha Vida do que ficar na rua. Mas não são coisas para festejar. São para escapar.
O Minha Casa, Minha Vida tirou a laje das favelas. As casas são pequenas, não têm quintal. As pessoas ficaram confinadas, sem festa.
No Piauí, o Fome Zero foi lançado em Guaribas [município que, na época, era considerado um dos mais pobres do país]. Nunca houve debate com as pessoas de lá. Falavam que ali era pobre porque não tinha nem restaurante nem hotel, mas gente rica não precisa disso.
O sr. também critica alguns discursos ambientalistas. O que o levou a isso? Tem muito ambientalista que vive nas cidades mas quer consertar a floresta. É engraçado. As cidades estão alagadas, cheias de lixo, mas querem mexer onde não sabem viver.
O livro traz a ideia de que, na prática, não há diferença entre gestão de esquerda e de direita. Nos últimos anos, o Brasil entrou numa crescente polarização política. Como analisa isso? A direita e a esquerda são maquinistas que dirigem o mesmo trem colonialista. Escolher o vagão permite decidir os passageiros com quem você vai viajar. Mas a viagem é a mesma, vai para o mesmo caminho.
É preciso uma mudança estrutural. Cabe a nós, quilombolas e indígenas, extrair tudo o que pudermos deste Estado para criar nossas próprias estruturas.
Lula não fez reforma agrária favorável aos agricultores familiares porque não teve coragem. Fez reforma agrária para o agronegócio. Ele diz que acabou com a fome do povo e fará isso de novo. Ora, o que acabou, acabou. Se voltou é porque não acabou.
E quanto à gestão Bolsonaro? Não tive a oportunidade de extrair tanto dele, mas pude conhecer melhor o Estado e certas pessoas. Foi um governo sem máscaras, literalmente —nem contra Covid nem política.
Também serviu para quebrar alguns intermediários. Tinham setores da esquerda que nunca protagonizavam a própria vida mas queriam mexer na nossa.
Para nós, quilombolas, foi o momento de preparar nossas defesas e refletir. Agora, ninguém trata Lula igual das outras vezes.
Há semelhanças entre Lula e Bolsonaro? Qual a diferença entre Bolsonaro e um governo que autoriza a mineração em território quilombola sem cumprir os protocolos da Convenção 169? Do ponto de vista da mineração, não há diferença. Quem manda são as mineradoras.
O que quero dizer é que, sim, Bolsonaro e Lula são diferentes, mas essas diferenças não são tão favoráveis.
O que Lula fez para o povo quilombola? Criou o quê? Qual é o nosso espaço de poder dentro deste governo? Pergunto porque é dos amigos que a gente deve cobrar o melhor acolhimento.
Apesar de hoje dizer que direita e esquerda caminham juntas para o mesmo destino, o sr. já foi filiado ao PSB e ao PT, considerados de esquerda. O que fez se desvincular desse meio? Atuei em movimento sindical, partido e movimentos sociais por um bom tempo. Ao contrário da minha criação, me deparei com um conhecimento todo escriturado. Tentaram me convencer de que a sociedade era composta por duas classes, a trabalhadora e a patronal. Eu nasci e me criei na roça, numa comunidade quilombola. Como lavrador, nunca fui ou tive patrão.
Também diziam que os quilombos são formados por povos que fugiram da escravidão. Isso é muito pouco. [Na época da escravidão] Você podia fugir e aceitar trabalhar na condição dos colonos, mas não foi o que aconteceu com os quilombolas. Os quilombos continuam resistindo ao sistema como um todo.
Desde então, qual sua relação com a política? A última vez que votei foi em 1996, e em 1998, me desvinculei do movimento sindical. Hoje participo de uma mobilização para estruturamos a nossa comunidade. Essa é a nossa grande luta de defesa.
RAIO-X | ANTÔNIO BISPO DOS SANTOS, 63 É membro da comunidade Saco do Curtume, no Piauí, onde atua em defesa dos povos quilombolas. Seus livros lançados são “Colonização, Quilombos, Modos e Significações” e “A Terra Dá, a Terra Quer”.
The report by Dr. Vivek Murthy cited a “profound risk of harm” to adolescent mental health and urged families to set limits and governments to set tougher standards for use.
Dr. Murthy testifying before the Senate Finance Committee on Capitol Hill on youth mental health in 2022. Credit: Susan Walsh/Associated Press
The nation’s top health official issued an extraordinary public warning on Tuesday about the risks of social media to young people, urging a push to fully understand the possible “harm to the mental health and well-being of children and adolescents.”
In a 19-page advisory, the United States surgeon general, Dr. Vivek Murthy, noted that the effects of social media on adolescent mental health were not fully understood, and that social media can be beneficial to some users. Nonetheless, he wrote, “There are ample indicators that social media can also have a profound risk of harm to the mental health and well-being of children and adolescents.”
The report included practical recommendations to help families guide children’s social media use. It recommended that families keep mealtimes and in-person gatherings free of devices to help build social bonds and promote conversation. It suggested creating a “family media plan” to set expectations for social media use, including boundaries around content and keeping personal information private.
Dr. Murthy also called on tech companies to enforce minimum age limits and to create default settings for children with high safety and privacy standards. And he urged the government to create age-appropriate health and safety standards for technology platforms.
Adolescents “are not just smaller adults,” Dr. Murthy said in an interview on Monday. “They’re in a different phase of development, and they’re in a critical phase of brain development.”
The report, effectively elevating long-simmering concerns around social media in the national conversation, came as state and federal lawmakers, many of them raised in an era when social media barely existed or didn’t exist at all, have been struggling with how to set limits on its use.
Montana’s governor recently signed a bill banning TikTok from operating in the state, prompting the Chinese-owned app to file a lawsuit and young TikTok users to lament what one called a “kick in the face.” In March, Utah became the first state to prohibit social media services from allowing users under 18 to have accounts without the explicit consent of a parent or guardian. That law could dramatically curtail young people’s access to apps like Instagram and Facebook.
Survey results from Pew Research have found that up to 95 percent of teens reported using at least one social media platform, while more than one-third said they used social media “almost constantly.” As social media use has risen, so have self-reports and clinical diagnoses among adolescents of anxiety and depression, along with emergency room visits for self-harm and suicidal ideation.
The report could help encourage further research to understand whether these two trends are related. It joins a growing number of calls for action around adolescents and social media. Earlier this month, the American Psychological Association issued its first-ever social media guidance, recommending that parents closely monitor teens’ usage and that tech companies reconsider features like endless scrolling and the “like” button.
A large body of research has emerged in recent years on the potential connection between social media use and soaring rates of distress among adolescents. But the results have been consistent only in their nuance and complexity.
An analysis published last year, examining research from 2019 to 2021 on social media use and mental health, found that “most reviews interpreted the associations between social media use and mental health as ‘weak’ or ‘inconsistent,’ whereas a few qualified the same associations as ‘substantial’ and ‘deleterious.’”
At their clearest, the data indicate that social media can have both a positive and negative impact on the well-being of young people, and that heavy use of social media — and screen time generally — appears to displace activities like sleep and exercise that are considered vital to developing brains.
On the positive side, social media can help many young people by giving them a forum to connect with others, find community and express themselves.
At the same time, the surgeon general’s advisory noted, social media platforms brim with “extreme, inappropriate and harmful content,” including content that “can normalize” self-harm, eating disorders and other self-destructive behavior. Cyberbullying is rampant.
Moreover, social media spaces can be fraught for young people especially, the advisory added: “In early adolescence, when identities and sense of self-worth are forming, brain development is especially susceptible to social pressures, peer opinions and peer comparison.”
The advisory noted that technology companies have a vested interest in keeping users online, and that they use tactics that entice people to engage in addictive-like behaviors. “Our children have become unknowing participants in a decades-long experiment,” the advisory states.
A spokesperson for Meta, the owner of Instagram and Facebook, said that the advisory included recommendations that “are reasonable and, in large part, Meta has already implemented.” Those measures include automatically making the accounts of people under 16 private when they join Instagram and limiting the types of content teens can see on the app.
TikTok did not immediately respond to requests for comment on Tuesday afternoon.
The advisory did not provide guidance on what a healthy use of social media might look like, nor did it condemn social-media use for all young people. Rather, it concluded, “We do not yet have enough evidence to determine if social media is sufficiently safe for children and adolescents.”
The surgeon general’s position lacks any real power beyond its potential as a bully pulpit, and Dr. Murthy’s advisory does not carry the force of law or policy. It was intended, the report said, to call Americans’ attention to “an urgent public health issue” and to make recommendations for how it should be addressed.
In the interview on Monday, Dr. Murthy acknowledged that the lack of clarity around social media was a heavy burden for users and families to bear.
“That’s a lot to ask of parents, to take a new technology that’s rapidly evolving and that fundamentally changes how kids perceive themselves,” Dr. Murthy said. “So we’ve got to do what we do in other areas where we have product safety issues, which is to set in place safety standards that parents can rely on, that are actually enforced.”
Remy Tumin contributed reporting.
Matt Richtel is a best-selling author and Pulitzer Prize-winning reporter based in San Francisco. He joined The Times in 2000, and his work has focused on science, technology, business and narrative-driven storytelling around these issues. @mrichtel
Catherine Pearson is a reporter for the Well section of The Times, covering families and relationships.
Michael Levenson joined The Times in December 2019. He was previously a reporter at The Boston Globe, where he covered local, state and national politics and news.
A version of this article appears in print on May 24, 2023, Section A, Page 1 of the New York edition with the headline: Advisory Says Teens Face Risk On Social Sites.
Quanto mais específicos e precisos forem os dados atmosféricos coletados na área observada, mais precisa será a probabilidade.
Rafael Abuchaibe
29 de abril de 2023
Se você é daqueles que não sai de casa sem antes conferir a previsão do tempo, certamente já se perguntou por que a porcentagem de chuva oferecida pela maioria dos serviços de meteorologia nem sempre corresponde ao que você vê pela janela.
“Porque representa as chances de chover na sua cidade“, alguém já deve ter respondido, quase surpreso com o quão básica parecia ser a resposta à sua pergunta:
“E as estatísticas nunca são 100% precisas.”
Outros, tendo indagado um pouco mais sobre o assunto, podem ter dito que o que o percentual representa é a área do território em que vai chover durante um determinado período de tempo (por exemplo, “das 9h às 12h”).
E para colocar mais lenha na fogueira, você deve ter visto alguns vídeos do TikTok explicando que o que a porcentagem reflete é a certeza dos meteorologistas de que vai chover em uma determinada área, com base em medições de fatores como temperatura, pressão atmosférica e velocidade do vento.
Diante de explicações tão variadas e distintas para algo que parece ser tão simples, a BBC News Mundo, serviço de notícias em espanhol da BBC, resolveu buscar uma explicação mais exata para o que aquele número representa —e percebeu que, de certa forma, todo mundo tem razão.
Probabilidade de precipitação
Para poder estabelecer o que essa porcentagem realmente significa, vamos começar revisando a definição dada pelo Serviço Meteorológico dos EUA:
“A probabilidade de precipitação representa simplesmente a probabilidade estatística de que haja 0,01 polegadas [0,25 mm] ou mais de precipitação [seja chuva, neve ou granizo] em uma determinada área dentro do período de tempo especificado.”
A porcentagem leva em consideração diferentes fatores para expressar em um valor estatístico a probabilidade de ocorrer precipitação em um determinado ponto.
“Vejamos um exemplo do que essa probabilidade significa”, diz o serviço meteorológico em sua definição.
“Se a previsão para um determinado distrito diz que há 40% de probabilidade de chuva para esta tarde, isso significa que há 40% de chance de chover em algum lugar do distrito entre meio-dia e 18h”, acrescenta.
Com base nessa definição, quanto mais específicos e precisos forem os dados atmosféricos coletados na área observada, mais preciso será o percentual de probabilidade.
Isso explica por que os dados fornecidos por diferentes serviços meteorológicos variam (embora não muito).
Duas medições, mesmo resultado
Para poder fazer uma previsão, um analista meteorológico multiplica dois fatores: a certeza que tem de que um sistema de precipitação vai se formar ou se aproximar, calculado por meio de medições atmosféricas, pela extensão —área física— que se espera que tal precipitação tenha no território analisado.
A esse resultado, basta mover duas casas decimais, e a probabilidade de precipitação é obtida.
Isso indica que é possível chegar à mesma porcentagem de precipitação tendo valores diferentes para cada fator.
Para ver essa ideia na prática, vamos voltar ao nosso exemplo do distrito com 40% de probabilidade de precipitação: se um analista tivesse 80% de certeza de que vai chover naquele distrito (medindo a velocidade do vento, a temperatura do ar, a umidade etc.), mas só espera que o sistema de precipitação cubra 50% da área, ele dirá que há uma “probabilidade de 40% de chuva” durante esse período de tempo.
Por outro lado, se outro analista estimasse que a precipitação iria cobrir 100% da área analisada, mas só tivesse 40% de certeza de que essa precipitação iria atingir o distrito, ele obteria o mesmo resultado: “40% de probabilidade de chuva em qualquer ponto do distrito durante esse período de tempo.”
Pequenas variações entre os sistemas
Cada meteorologista terá seus próprios modelos de medição e coleta de dados para calcular a probabilidade de precipitação nos locais que analisa —e alguns serão mais precisos que outros.
O importante é identificar o quão precisos são os métodos de coleta de dados atmosféricos que cada serviço possui na área específica em que você se encontra, algo que pode ser feito comparando-os e analisando qual deles se adequa melhor à realidade que você observa pela janela.
E, claro, não se pode esquecer que, por se basear em modelos probabilísticos, a meteorologia está longe de ser infalível.
Se você confiar apenas na previsão do tempo, é inevitável que um dia, por melhor que seja o sistema que usa, você saia de casa sem guarda-chuva com base na previsão do aplicativo —e seja pego na rua por um temporal.
Pesquisadores afirmam, porém, que as pessoas não precisam ter medo de sair na chuva
29 de abril de 2023
Para uma equipe de pesquisadores canadenses e franceses, as nuvens escuras no horizonte são potencialmente ameaçadoras, e não porque sinalizam a chegada de uma tempestade. Um estudo revela que elas transportam por longas distâncias bactérias resistentes a medicamentos.
“Essas bactérias costumam viver na superfície da vegetação, como em folhas, ou no solo”, explicou Florent Rossi, principal autor do estudo, em entrevista à AFP na sexta-feira (28). “Descobrimos que elas são transportadas pelo vento para a atmosfera e podem viajar por longas distâncias ao redor do mundo, em grandes altitudes, nas nuvens.”
A descoberta foi publicada na edição do mês passado da revista Science of The Total Environment. Pesquisadores da universidade canadense Laval e da universidade francesa Clermont Auvergne buscaram genes resistentes a antibióticos em bactérias encontradas em amostras de nuvens coletadas em uma estação de pesquisa atmosférica localizada 1.465 m acima do nível do mar, no topo do vulcão inativo francês Puy-de-Dôme, entre setembro de 2019 e outubro de 2021.
Uma análise da névoa recuperada revelou que a mesma continha entre 330 e mais de 30 mil bactérias por mililitro de água de nuvem, com uma média de cerca de 8.000 bactérias por mililitro.
Também foram identificados 29 subtipos de genes resistentes a antibióticos nas bactérias. A resistência ocorre quando a bactéria é exposta a antibióticos e desenvolve imunidade aos mesmos ao longo de gerações.
Autoridades sanitárias já alertaram que estas adaptações estão se tornando o que o estudo descreveu como “grande preocupação sanitária em nível mundial”, o que dificulta e, por vezes, impossibilita o tratamento de algumas infecções bacterianas, uma vez que o uso de antibióticos segue aumentando na saúde e agricultura.
O estudo não tira conclusões sobre os possíveis efeitos à saúde da disseminação de bactérias resistentes a antibióticos, pois estima que apenas 50% destes organismos poderiam estar vivos e potencialmente ativos.
Rossi sugeriu que os riscos devem ser baixos. “A atmosfera é muito estressante para as bactérias, e a maioria das que encontramos eram bactérias ambientais”, que têm menos chances de serem nocivas ao homem, explicou. “As pessoas não precisam ter medo de sair na chuva. Não está claro se esses genes seriam passados para outras bactérias.”
O monitoramento atmosférico, no entanto, poderia ajudar a localizar as fontes das bactérias resistentes aos fármacos, de forma semelhante aos testes de águas residuais para a Covid-19 e outros patógenos, “a fim de limitar a sua propagação”, ressaltou Rossi.
MIDLAND, TEXAS – A petroleum pipeline running along the ground in the Permian Basin oil field on March 13, 2022 in Midland, Texas. (Photo by Joe Raedle/Getty Images)
Does slow climate progress justify violence against fossil fuel infrastructure? This subject was thrust into the limelight by a recent movie, How to Blow Up a Pipeline, which is based on the book by Andreas Malm. In the film, eight activists seek to blow up a fossil fuel pipeline in Texas’ Permian Basin. Their argument is that given the severity of the climate crisis and the role of fossil fuel companies in enabling it, they have the moral authority to damage fossil fuel infrastructure.
In recent years, some climate groups have resorted to disruptive action to focus public attention on climate policy lethargy. Activists have thrown tomato soups on paintings in prominent museums, blocked trains and major highways, picketed oil terminals, and glued themselves to the floor of BMW showrooms. So, why not escalate disruption by attacking fossil fuel infrastructure?
Yet, when it comes to the climate question, some surveys suggest that the public does not support disruptive action. Indeed, Extinction Rebellion (XR), a prominent UK-based climate group, recently announced that that it will temporarily suspend mass disruptive action. This motivated a group of scholars to write an open letter in support of nonviolent direct action. They underlined the idea that radical action does not equal violence.
Why is violence problematic? Apart from the moral and legal issues, violent activism undermines the climate cause and diminishes positive sentiments about climate advocacy in policy conversations. Moreover, the theory of change motivating violent action is weak. Most in the world recognize the climate challenge. Climate inaction does not reflect media neglecting climate change which can be corrected by newsworthy action. It reveals deeper distributional conflicts rooted in pushback from the fossil fuel industry and unions, fossil-fuel-dependent communities, rural residents opposing renewable energy projects, and the working class opposing higher energy prices. Thus, slow climate progress is not a simple story of the ruling capitalist class impeding policy change over the objections of the majority.
This means that the movement should resolve these complex issues through political mechanisms. Moreover, violence-based activism allows climate opponents to brand climate movement as eco-terrorism. At least 17 U.S. states have enacted “critical infrastructure” laws criminalizing protests against fossil fuel pipelines. Violent actions to damage fossil fuel infrastructure will justify their actions and even motivate a wider crackdown.
Moral and Legal Implications of Property Violence
In How to Blow Up a Pipeline, eight activists view property violence as an advocacy tactic because they feel this is the only way forward and their lived experiences have convinced them about the moral justification for their actions. The problem with this position is that individuals prioritize different issues. Many also feel disenfranchised. Should these aggrieved individuals resort to violence? Who decides which issues are worthy of violent advocacy and which are not?
Democracies have a process for policy change. Sometimes, the policy we favor gets enacted, and sometimes it does not. If we feel that policy inaction causes an existential crisis, we are frustrated. But we can voice our frustration in elections, in the media, and through non-violent advocacy. This is how citizens negotiate their differences. A commitment to ballots not bullets is crucial because both liberals and conservatives have grievances. We must ensure that grievances do not spin out of control into violence—especially important in this era of sharp polarization and angry rhetoric.
Some might argue that violence against property is different from violence against people, and property violence against corporations is different from say burning down the home of an individual. We disagree. The modern corporation’s functional logic is to pool resources from shareholders (both individuals and institutional investors such as pension funds) and use them to run a business. Eventually, violence against corporations is an attack on the livelihood and financial security of people whose assets the corporation manages.
This does not mean that activists should avoid subjecting corporations to economic pressure; they should do so through legal means. Shareholders can assess how their wealth might suffer because the firm faces problems on regulatory issues or social legitimacy grounds. The risk-return trade-off is a part of the bargain shareholders strike with corporations. And if shareholders consider corporate actions or inaction to be harmful, they can use economic and legal mechanisms such as shareholders’ vote or even divest.
What if property violence against corporations hurts the livelihood of impoverished communities? There is widespread poverty in many fossil fuel communities. They often view climate change as an elite issue favored by a predominantly urban climate movement. Might these communities view violence against fossil fuel infrastructure as an attack on their livelihood—on their very existence?
Even lesser actions such as transportation disruption can invite a backlash from affected parties. Consider the incident in London in 2019: “as XR began a second two-week mass mobilization in London, one local branch staged an action in Canning Town, a predominantly Black and Asian working-class neighborhood, in which several XR members clambered onto a subway car, preventing the train from leaving. Commuters dragged the protesters down onto the platform and beat them.”
About 24% of U.S. counties have enacted local ordinances to restrict solar and wind facilities. They view such facilities as spoiling rural landscapes. In some cases, environmental groups and native nations have joined protests against new renewable energy sites. There is also a backlash against new mining projects that will provide critical minerals for energy transition. The lesson is that some actors and communities oppose climate policies, not because they question climate science, but because they view climate action as imposing unfair burdens on them. To mitigate the opposition, underlying climate justice issues need to be addressed and violence is clearly the wrong way to accomplish this task.
What is the Way Forward?
Climate efforts are impeded by, among other things, rising energy prices. As the Ukraine crisis has reminded us, energy politics has economic and national security dimensions. Energy inflation provokes domestic backlash. This is why the Biden administration, which has shown a remarkable commitment to climate issues, sold oil from Strategic Petroleum Reserve and allowed the Willow project. Instead of dismantling pipelines, it is permitting new LNG infrastructure for exporting natural gas to Europe. The lesson is that supply disruptions by destroying fossil fuel pipelines will not serve the climate cause. They will probably do the opposite—by raising energy prices, they could motivate new drilling and investments in fossil fuel infrastructure.
Biden has enacted at least two major laws to fund climate transition, the Bipartisan Infrastructure Deal and the Inflation Reduction Act. It is undertaking administrative actions as well, as in vehicular tailpipe emissions. The reality is that in most countries, the climate movement is supported by the political establishment. Moreover, in the U.S., the movement now has the opportunity to take on the fossil fuel industry in the legal arena. Last week, the U.S. Supreme Court allowed local governments to sue the fossil fuel industry in state courts as opposed to federal courts which the industry wanted. It is possible that the industry might seek a settlement instead of risking jury trials, as happened with the tobacco industry, the opioid industry, and more recently Fox News. Thus, the movement should exploit these new legal opportunities to push the fossil fuel industry to take aggressive pro-climate actions.
Nives Dolsak is Stan and Alta Barer Professor in Sustainability Science and Director of the School of Marine & Environmental Affairs. Aseem Prakash is the Walker Family Professor and the Director of the Center for Environmental Politics. Both are at the University of Washington, Seattle.
Technologically speaking, we live in a time of plenty. Today, I can ask a chatbot to render TheCanterbury Tales as if written by Taylor Swift or to help me write a factually inaccurate autobiography. With three swipes, I can summon almost everyone listed in my phone and see their confused faces via an impromptu video chat. My life is a gluttonous smorgasbord of information, and I am on the all-you-can-eat plan. But there is one specific corner where technological advances haven’t kept up: weather apps.
Weather forecasts are always a game of prediction and probabilities, but these apps seem to fail more often than they should. At best, they perform about as well as meteorologists, but some of the most popular ones fare much worse. The cult favorite Dark Sky, for example, which shut down earlier this year and was rolled into the Apple Weather app, accurately predicted the high temperature in my zip code only 39 percent of the time, according to ForecastAdvisor, which evaluates online weather providers. The Weather Channel’s app, by comparison, comes in at 83 percent. The Apple app, although not rated by ForecastAdvisor, has a reputation for off-the-mark forecasts and has been consistently criticized for presenting faulty radar screens, mixing up precipitation totals, or, as it did last week, breaking altogether. Dozens of times, the Apple Weather app has lulled me into a false sense of security, leaving me wet and betrayed after a run, bike ride, or round of golf.
People love to complain about weather forecasts, dating back to when local-news meteorologists were the primary source for those planning their morning commutes. But the apps have produced a new level of frustration, at least judging by hundreds of crankytweets over the past decade. Nearly two decades into the smartphone era—when anyone can theoretically harness the power of government weather data and dissect dozens of complex, real-time charts and models—we are still getting caught in the rain.
Weather apps are not all the same. There are tens of thousands of them, from the simply designed Apple Weather to the expensive, complex, data-rich Windy.App. But all of these forecasts are working off of similar data, which are pulled from places such as the National Oceanic and Atmospheric Administration (NOAA) and the European Centre for Medium-Range Weather Forecasts. Traditional meteorologists interpret these models based on their training as well as their gut instinct and past regional weather patterns, and different weather apps and services tend to use their own secret sauce of algorithms to divine their predictions. On an average day, you’re probably going to see a similar forecast from app to app and on television. But when it comes to how people feel about weather apps, these edge cases—which usually take place during severe weather events—are what stick in a person’s mind. “Eighty percent of the year, a weather app is going to work fine,” Matt Lanza, a forecaster who runs Houston’s Space City Weather, told me. “But it’s that 20 percent where people get burned that’s a problem.”
No people on the planet have a more tortured and conflicted relationship with weather apps than those who interpret forecasting models for a living. “My wife is married to a meteorologist, and she will straight up question me if her favorite weather app says something different than my forecast,” Lanza told me. “That’s how ingrained these services have become in most peoples’ lives.” The basic issue with weather apps, he argues, is that many of them remove a crucial component of a good, reliable forecast: a human interpreter who can relay caveats about models or offer a range of outcomes instead of a definitive forecast.
Lanza explained the human touch of a meteorologist using the example of a so-called high-resolution forecasting model that can predict only 18 hours out. It is generally quite good, he told me, at predicting rain and thunderstorms—“but every so often it runs too hot and over-indexes the chances of a bad storm.” This model, if left to its own devices, will project showers and thunderstorms blanketing the region for hours when, in reality, the storm might only cause 30 minutes of rain in an isolated area of the mapped region. “The problem is when you take the model data and push it directly into the app with no human interpretation,” he said. “Because you’re not going to get nuance from these apps at all. And that can mean a difference between a chance of rain all day and it’s going to rain all day.”
But even this explanation has caveats; all weather apps are different, and their forecasts have varying levels of sophistication. Some pipe model data right in, whereas others are curated using artificial intelligence. Peter Neilley, the Weather Channel’s director of weather forecasting sciences and technologies, said in an email that the company’s app incorporates “billions of weather data points,” adding that “our expert team of meteorologists does oversee and correct the process as needed.”
Weather apps might be less reliable for another reason too. When it comes to predicting severe weather such as snow, small changes in atmospheric moisture—the type of change an experienced forecaster might notice—can cause huge variances in precipitation outcomes. An app with no human curation might choose to average the model’s range of outcomes, producing a forecast that doesn’t reflect the dynamic situation on the ground. Or consider cities with microclimates: “Today, in Chicago, the lakefront will sit in the lower 40s, and the suburbs will be 50-plus degrees,” Greg Dutra, a meteorologist at ABC 7 Chicago, told me. “Often, the difference is even more stark—20-degree swings over just miles.” These sometimes subtle temperature disparities can mean very different forecasts for people living in the same region—something that one-size-fits-all weather apps don’t always pick up.
Naturally, meteorologists think that what they do is superior to forecasting by algorithm alone, but even weather-app creators told me that the challenges are real. “It’s impossible for a weather-data provider to be accurate everywhere in the world,” Brian Mueller, the founder of the app Carrot Weather, told me. His solution to the problem of app-based imprecision is to give users more ability to choose what they see when they open Carrot, letting them customize what specific weather information the app surfaces as well as what data sources the app will draw from. Mueller said that he learned from Dark Sky’s success how important beautiful, detailed radar maps were—both as a source of weather data and for entertainment purposes. In fact, meteorology seems to be only part of the allure when it comes to building a beloved weather app. Carrot has a pleasant design interface, with bright colors and Easter eggs scattered throughout, such as geography challenges based off of its weather maps. He’s also hooked Carrot up to ChatGPT to allow people to chat with the app’s fictional personality.
But what if these detailed models and dizzying maps, in the hands of weather rubes like myself, are the real problem? “The general public has access to more weather information than ever, and I’d posit that that’s a bad thing,” Chris Misenis, a weather-forecasting consultant in North Carolina who goes by the name “Weather Moose,” told me. “You can go to PivotalWeather.com right now and pull up just about any model simulation you want.” He argues that these data are fine to look at if you know how to interpret them, but for people who aren’t trained to analyze them, they are at best worthless and at worst dangerous.
In fact, forecasts are better than ever, Andrew Blum, a journalist and the author of the book The Weather Machine: A Journey Inside the Forecast, told me. “But arguably, we are less prepared to understand,” he said, “and act upon that improvement—and a forecast is only as good as our ability to make decisions with it.” Indeed, even academic research around weather apps suggests that apps fail worst when they give users a false sense of certainty around forecasting. A 2016 paper for the Royal Meteorological Society argued that “the current way of conveying forecasts in the most common apps is guilty of ‘immodesty’ (‘not admitting that sometimes predictions may fail’) and ‘impoverishment’ (‘not addressing the broader context in which forecasts … are made’).”
The conflicted relationship that people have with weather apps may simply be a manifestation of the information overload that dominates all facets of modern life. These products grant anyone with a phone access to an overwhelming amount of information that can be wildly complex. Greg Dutra shared one such public high-resolution model from the NOAA with me that was full of indecipherable links to jargony terms such as “0-2 km max vertical vorticity.” Weather apps seem to respond mostly to this fire hose of data in two ways: By boiling them down to a reductive “partly sunny” icon, or by bombarding the user with information they might not need or understand. At its worst, a modern weather app seems to flatter people, entrusting them to do their own research even if they’re not equipped. I’m not too proud to admit that some of the fun of toying around with Dark Sky’s beautiful radar or Windy.App’s endless array of models is the feeling of role-playing as a meteorologist. But the truth is that I don’t really know what I’m looking at.
What people seem to be looking for in a weather app is something they can justify blindly trusting and letting into their lives—after all, it’s often the first thing you check when you roll over in bed in the morning. According to the 56,400 ratings of Carrot in Apple’s App Store, its die-hard fans find the app entertaining and even endearing. “Love my psychotic, yet surprisingly accurate weather app,” one five-star review reads. Although many people need reliable forecasting, true loyalty comes from a weather app that makes people feel good when they open it.
Our weather-app ambivalence is a strange pull between feeling grateful for instant access to information and simultaneously navigating a sense of guilt and confusion about how the experience is also, somehow, dissatisfying—a bit like staring down Netflix’s endless library and feeling as if there’s nothing to watch. Weather apps aren’t getting worse. In fact they’re only getting more advanced, inputting more and more data and offering them to us to consume. Which, of course, might be why they feel worse.
An advocate of plant intelligence, the Italian author discusses the complex ways in which plants communicate, whether they are conscious, and what his findings mean for vegans
Killian Fox
April 15, 2023
Born in Calabria in 1965, Stefano Mancuso is a pioneer in the plant neurobiology movement, which seeks to understand “how plants perceive their circumstances and respond to environmental input in an integrated fashion”. Michael Pollan in the New Yorker described him as “the poet-philosopher of the movement, determined to win for plants the recognition they deserve”. Mancuso teaches at the University of Florence, his alma mater, where he runs the International Laboratory of Plant Neurobiology. He has written five bestselling books on plants.
What’s at the root of your love of plants? I began to be interested in plants at university. One of my tasks during my doctorate was to understand how a root growing in the soil was able to move around an obstacle. My idea was to film this movement, but I saw something different: the root was changing direction well before touching the obstacle. It was able to sense the obstacle and to find a more convenient direction. That was my first eureka moment, where I started to imagine that plants were intelligent organisms.
You refer to your field as plant neurobiology. Is this a provocation? At the beginning, it was not at all. I started to think that almost all the claims I was hearing about the brain were valid also in plants. The neuron is not a miracle cell, it’s a normal cell that is able to produce an electrical signal. In plants, almost every cell is able to do that. The main difference between animals and plants, in my opinion, is that animals concentrate specific functions inside organs. In the case of plants, they diffuse everything through the whole body, including intelligence. So it was not a provocation at the beginning, but there was a big resistance among my colleagues to use this kind of terminology, and so after it became a provocation.
What were you hoping to achieve with your new book, Tree Stories? What I’d like to popularise is, first, the many abilities of plants that we normally are unable to feel and understand, because they are so different from us. Second, when you tell a story about life on this planet, not talking about plants, which make up 87% of life, is a nonsense.
You argue passionately in favour of filling cities with trees. Why is this so important? We are producing 75% of our CO₂ in cities, and the best way to remove that CO₂ is by using trees. The closer the tree is to the source of carbon emissions, the better they are at absorbing it. According to our studies, we could put around 200bn trees in our urban areas. To do that, we really need to imagine a new kind of city, completely covered by plants, without any border between nature and city.
You have a fascinating chapter about a tree stump being kept alive for decades by its neighbouring trees. What can humans learn from tree communities? Plants are so incredibly cooperative with one another because cooperation is the most efficient way to grant the survival of species. Not understanding the strength of the community is one of [humanity’s] main errors. There was a very clever evolutionary biologist at the beginning of the last century, Peter Kropotkin, who said that when there are fewer resources, and the environment is changing, then cooperation is vastly more efficient [than competition]. This is an important teaching for us today, because we are entering a period of reduction of resources and the environment is changing because of global warming.
To what degree can plants communicate with one another? If you have a spectrum with rocks at one end and humans at the other, where do plants sit? I would say very close to humans. Communication means you are able to emit a message and there is something able to receive it, and in this sense plants are great communicators. If you are unable to move, if you are rooted, it’s of paramount importance for you to communicate a lot. We experienced this during lockdown, when we were stuck at home and there was an incredible increase in traffic on the internet. Plants are obliged to communicate a lot, and they use different systems. The most important is through volatiles, or chemicals that are emitted in the atmosphere and received by other plants. It’s an extremely sophisticated form of communication, a kind of vocabulary. Every single molecule means something, and they mix very different molecules to send a specific message.
The idea that plants are intelligent is controversial enough, but you’ve gone one step further by claiming that plants are to some degree conscious… It’s incredibly difficult to talk about consciousness, first because we actually don’t know what consciousness is, even in our case. But there is an approach to talking about it as a real biological feature: consciousness is something that we all have, except when we are sleeping very deeply or when we are under anaesthesia. My approach to studying consciousness in plants was similar. I started by seeing if they were sensitive to anaesthetics and found that you can anaesthetise all plants by using the same anaesthetics that work in humans. This is extremely fascinating. We were thinking that consciousness was something related to the brain, but I think that both consciousness and intelligence are more embodied, relating to the entire body.
So you can put a plant to sleep? We are working to see if it’s possible to say that. It’s an incredibly difficult task, but we think that, before the end of this year, we will be able to demonstrate it.
As we learn more about the sophistication and sensitivity of plants, should we think twice about eating them? It’s an interesting question. Many vegan people have written to me asking this. First, I think it’s ethical to eat plants because we are animals, and as animals we can only survive by eating other living organisms – this is a law that we cannot break. Second, it’s much more ethical to eat a plant than, for example, beef, because to produce a kilo of beef, you need to kill one tonne of plants, so it’s much better to eat directly a kilo of plants. The third point is that it’s very difficult for us to imagine being a plant, because for us being eaten is an ancestral nightmare, whereas plants evolved to be eaten, it’s part of the cycle. A fruit is an organ that is produced to be eaten by an animal.
So fruit is probably the most ethical thing you can eat, more so than, say, kale? Maybe fruit is the most ethical, but you need to defecate on the ground afterwards, because otherwise you are breaking the cycle.
Menos de 2% das três bilhões de letras do genoma humano são dedicados às proteínas
David Cox
17 de abril de 2023
Em abril de 2003, o sequenciamento completo do “livro da vida” codificado no genoma humano foi declarado “encerrado”, após 13 anos de trabalho. O mundo estava repleto de expectativas.
Esperava-se que o Projeto Genoma Humano, depois de consumir cerca de US$ 3 bilhões (R$ 15 bilhões), trouxesse tratamentos para doenças crônicas e esclarecesse todos os detalhes determinados geneticamente sobre as nossas vidas.
Mas, enquanto as entrevistas coletivas anunciavam o triunfo desta nova era de conhecimento biológico, o manual de instruções para a vida humana já trazia consigo uma surpresa inesperada.
A convicção que prevalecia na época era que a ampla maioria do genoma humano consistiria de instruções para a produção de proteínas — os “tijolos” que constroem todos os organismos vivos e desempenham uma imensa variedade de papéis nas nossas células e entre elas.
E, com mais de 200 tipos diferentes de células no corpo humano, parecia fazer sentido que cada uma delas precisasse dos seus próprios genes para realizar suas funções necessárias.
Acreditava-se que o surgimento de conjuntos exclusivos de proteínas fosse vital na evolução da nossa espécie e dos nossos poderes cognitivos. Afinal, somos a única espécie capaz de sequenciar o nosso próprio genoma.
Mas o que descobrimos é que menos de 2% dos três bilhões de letras do genoma humano são dedicados às proteínas. Apenas cerca de 20 mil genes codificadores de proteínas foram encontrados nas longas linhas de moléculas que compõem nossas sequências de DNA.
Os geneticistas ficaram assombrados ao descobrir que os números de genes produtores de proteínas dos seres humanos são similares a algumas das criaturas mais simples do planeta. As minhocas, por exemplo, têm cerca de 20 mil desses genes, enquanto as moscas-das-frutas têm cerca de 13 mil.
Foi assim que, do dia para a noite, o mundo científico passou a enfrentar uma verdade bastante incômoda: grande parte do nosso entendimento sobre o que nos torna seres humanos talvez estivesse errada.
“Eu me lembro da incrível surpresa”, afirma o biólogo molecular Samir Ounzain, principal executivo da companhia suíça Haya Therapeutics. A empresa procura utilizar nosso conhecimento sobre a genética humana para desenvolver novos tratamentos para doenças cardiovasculares, câncer e outras enfermidades crônicas.
“Aquele foi o momento em que as pessoas começaram a se perguntar ‘será que temos um conceito errado do que é a biologia?'”
Os 98% restantes do nosso DNA ficaram conhecidos como matéria escura, ou o genoma obscuro — uma enorme e misteriosa quantidade de letras sem propósito ou significado óbvio.
Inicialmente, alguns geneticistas sugeriram que o genoma obscuro fosse simplesmente DNA lixo, uma espécie de depósito de resíduos da evolução humana. Seriam os restos de genes partidos que deixaram de ser relevantes há muito tempo.
Mas, para outros, sempre ficou claro que o genoma obscuro seria fundamental para nosso entendimento da humanidade.
“A evolução não tem absolutamente nenhuma tolerância com o lixo”, afirma Kári Stefánsson, o principal executivo da empresa islandesa deCODE Genetics, que sequenciou mais genomas inteiros do que qualquer outra instituição em todo o mundo.
Para ele, “deve haver uma razão evolutiva para manter o tamanho do genoma”.
Duas décadas se passaram e, agora, temos os primeiros indícios da função do genoma obscuro. Aparentemente, sua função primária é regular o processo de decodificação, ou expressão, dos genes produtores de proteínas.
O genoma obscuro ajuda a controlar o comportamento dos nossos genes em resposta às pressões ambientais enfrentadas pelo nosso corpo ao longo da vida, que vão desde a alimentação até o estresse, a poluição, os exercícios e a quantidade de sono. Este campo é conhecido como epigenética.
Ounzain afirma que gosta de pensar nas proteínas como o hardware que compõe a vida. Já o genoma obscuro é o software, que processa e reage às informações externas.
Por isso, quanto mais aprendemos sobre o genoma obscuro, mais compreendemos a complexidade humana e como nos tornamos quem somos hoje.
“Se você pensar em nós enquanto espécie, somos mestres da adaptação ao ambiente em todos os níveis”, afirma Ounzain. “E essa adaptação é o processamento das informações.”
“Quando você retorna à questão sobre o que nos faz ser diferentes de uma mosca ou de uma minhoca, percebemos cada vez mais que as respostas estão no genoma obscuro”, segundo ele.
Os transposons e o nosso passado evolutivo
Quando os cientistas começaram a examinar o livro da vida, em meados dos anos 2000, uma das maiores dificuldades foi o fato de que as regiões não codificadoras de proteínas do genoma humano pareciam estar repletas de sequências de DNA repetidas, conhecidas como transposons.
Essas sequências repetitivas eram tão onipresentes que compreendiam cerca da metade do genoma em todos os mamíferos vivos.
“A própria compilação do primeiro genoma humano foi mais problemática devido à presença dessas sequências repetitivas”, afirma Jef Boeke, diretor do centro médico acadêmico chamado Projeto Matéria Escura da Universidade Langone de Nova York, nos Estados Unidos.
“Analisar simplesmente qualquer tipo de sequência é muito mais fácil quando se trata de uma sequência exclusiva.”
Inicialmente, os transposons foram ignorados pelos geneticistas. A maior parte dos estudos genéticos preferiu concentrar-se puramente no exoma — a pequena região codificadora de proteínas do genoma.
Mas, ao longo da última década, o desenvolvimento de tecnologias mais sofisticadas de sequenciamento de DNA permitiu aos geneticistas estudar o genoma obscuro com mais detalhes.
Em um desses experimentos, os pesquisadores excluíram um fragmento específico de transposon de camundongos, o que fez com que a metade dos filhotes dos animais morresse antes do nascimento. O resultado demonstra que algumas sequências de transposons podem ser fundamentais para a nossa sobrevivência.
Talvez a melhor explicação sobre o motivo da existência dos transposons no nosso genoma possa ser o fato de que eles são extremamente antigos e datam das primeiras formas de vida, segundo Boeke.
Outros cientistas sugeriram que eles provêm de vírus que invadiram o nosso DNA ao longo da história humana, antes de receberem gradualmente novas funções no corpo para que tivessem algum propósito útil.
“Na maioria das vezes, os transposons são patógenos que nos infectam e podem infectar células da linha germinal, [que são] o tipo de células que transmitimos para a geração seguinte”, afirma Dirk Hockemeyer, professor assistente de biologia celular da Universidade da Califórnia em Berkeley, nos Estados Unidos.
“Eles podem então ser herdados e gerar integração estável ao genoma”, segundo ele.
Boeke descreve o genoma obscuro como um registro fóssil vivo de alterações fundamentais no nosso DNA que ocorreram há muito tempo, na história antiga.
Uma das características mais fascinantes dos transposons é que eles podem se mover de uma parte do genoma para outra — um tipo de comportamento que gerou seu nome — criando ou revertendo mutações nos genes, às vezes com consequências extraordinárias.
O movimento de um transposon para um gene diferente pode ter sido responsável, por exemplo, pela perda da cauda na grande família dos primatas, fazendo com que a nossa espécie desenvolvesse a capacidade de andar ereta.
“Aqui você tem esse evento único que teve enorme efeito sobre a evolução, gerando toda uma linhagem de grandes primatas, incluindo a nós”, segundo Boeke.
Mas, da mesma forma que nossa crescente compreensão sobre o genoma obscuro explica cada vez mais sobre a evolução, ela pode também esclarecer o motivo do surgimento das doenças.
Ounzain ressalta que, se olharmos para os estudos de associação genômica ampla (GWAS, na sigla em inglês), que pesquisam as variações genéticas entre grandes quantidades de pessoas para identificar quais delas são relacionadas a doenças, a grande maioria das variações ligadas a doenças crônicas, como a doença de Alzheimer, diabetes e doenças cardíacas, não está nas regiões de codificação de proteínas, mas sim no genoma obscuro.
O genoma obscuro e as doenças
A ilha de Panay, nas Filipinas, é mais conhecida pelas suas cintilantes areias brancas e pelo fluxo regular de turistas. Mas este local idílico esconde um segredo trágico.
Panay abriga o maior número de casos existentes no mundo de um distúrbio dos movimentos incurável, chamado distonia-parkinsonismo ligado ao X (XDP, na sigla em inglês).
Como no mal de Parkinson, as pessoas com XDP desenvolvem uma série de sintomas que afetam sua capacidade de andar e reagir rapidamente a diversas situações.
Desde a descoberta do XDP nos anos 1970, a doença só foi diagnosticada em pessoas de ascendência filipina. Este fato permaneceu um mistério por muito tempo, até que os geneticistas descobriram que todos esses indivíduos possuem a mesma variante exclusiva de um gene chamado TAF1.
O início dos sintomas parece ser causado por um transposon no meio do gene, que é capaz de regular sua função de forma a causar prejuízo ao corpo ao longo do tempo. Acredita-se que esta variante genética tenha surgido pela primeira vez cerca de 2.000 anos atrás, antes de ser transmitida e se estabelecer na população.
“O gene TAF1 é um gene essencial, ou seja, ele é necessário para o crescimento e a multiplicação de todos os tipos de células”, afirma Boeke.
“Quando você ajusta sua expressão, você tem esse defeito muito específico, que se manifesta como uma horrível forma de parkinsonismo.”
Este é um exemplo simples de como algumas sequências de DNA do genoma obscuro podem controlar a função de diversos genes, seja ativando ou reprimindo a transformação de informações genéticas em proteínas, em resposta a indicações recebidas do ambiente.
O genoma escuro também fornece instruções para a formação de diversos tipos de moléculas, conhecidas como RNAs não codificantes. Eles podem desempenhar diversos papéis, desde ajudar a fabricar algumas proteínas, bloquear a produção de outras ou ajudar a regular a atividade genética.
“Os RNAs produzidos pelo genoma obscuro agem como os maestros da orquestra, conduzindo como o seu DNA reage ao ambiente”, explica Ounzain. E estes RNAs não codificantes, agora, são cada vez mais considerados a ligação entre o genoma obscuro e diversas doenças crônicas.
A ideia é que, se fornecermos sistematicamente os sinais errados para o genoma obscuro com o nosso estilo de vida — por exemplo, com o fumo, má alimentação e inatividade —, as moléculas de RNA produzidas por ele podem fazer com que o corpo entre em um estado de doença, alterando a atividade genética, de forma a aumentar as inflamações do corpo ou promover a morte celular.
Acredita-se que certos RNAs não codificantes podem desligar ou aumentar a atividade de um gene chamado p53, que age normalmente para evitar a formação de tumores.
Em doenças complexas, como a esquizofrenia e a depressão, todo um conjunto de RNAs não codificantes pode agir em sincronia para reduzir ou aumentar a expressão de certos genes.
Mas o nosso reconhecimento cada vez maior da importância do genoma obscuro já está trazendo novos métodos de tratamento dessas doenças.
A indústria de desenvolvimento de remédios costuma se concentrar nas proteínas, mas algumas empresas estão percebendo que pode ser mais eficaz tentar interromper os RNAs não codificantes, que controlam os genes encarregados desses processos.
No campo das vacinas contra o câncer, por exemplo, as empresas realizam sequenciamento de DNA em amostras de tumores dos pacientes para tentar identificar um alvo adequado a ser atacado pelo sistema imunológico. E a maioria dos métodos concentra-se apenas nas regiões codificantes de proteínas do genoma.
Mas a empresa alemã de biotecnologia CureVac é pioneira em um método de análise das regiões não codificantes de proteínas, na esperança de encontrar um alvo que possa interromper o câncer na fonte.
Já a empresa de Ounzain, a Haya Therapeutics, atualmente está realizando um programa de desenvolvimento de drogas dirigido a uma série de RNAs não codificantes que dirigem a formação de tecidos de cicatrização, ou fibrose, no coração — um processo que pode causar insuficiência cardíaca.
Uma das esperanças é que este método possa minimizar os efeitos colaterais decorrentes de muitos remédios de uso comum.
“O problema quando medicamos as proteínas é que existem apenas cerca de 20 mil delas no corpo e a maioria é expressa em muitas células e processos diferentes, que não têm relação com a doença”, afirma Ounzain.
“Mas a atividade do genoma obscuro é extraordinariamente específica. Existem RNAs não codificantes que regulam a fibrose apenas no coração, de forma que, ao medicá-los, temos um remédio potencialmente muito seguro”, explica ele.
O desconhecido
Paralelamente, parte desse entusiasmo precisa ser atenuada pelo fato de que, em termos de compreensão do funcionamento do genoma obscuro, apenas acabamos de arranhar a superfície.
Sabemos muito pouco sobre o que os geneticistas descrevem como regras básicas: como essas sequências não codificantes de proteínas comunicam-se para regular a atividade genética? E como exatamente essas teias complexas de interações se manifestam por longos períodos de tempo até se tornarem traços de doenças, como a neurodegeneração observada no mal de Alzheimer?
“Estamos ainda no começo”, afirma Dirk Hockemeyer. “Os próximos 15 a 20 anos ainda serão assim – [iremos] identificar comportamentos específicos em células que podem gerar doenças e, em seguida, tentar identificar as partes do genoma obscuro que podem estar envolvidas na modificação desses comportamentos. Mas, agora, temos ferramentas para nos aprofundar nisso, algo que antes não tínhamos.”
Uma dessas ferramentas é a edição genética.
Jef Boeke e sua equipe estão atualmente tentando aprender mais sobre a forma de desenvolvimento dos sintomas de XDP, reproduzindo a inserção de transposons genéticos TAF1 em camundongos.
No futuro, uma versão mais ambiciosa deste projeto poderá tentar compreender como as sequências de DNA não codificantes de proteínas regulam os genes, construindo blocos de DNA sintético a partir do zero, para transplante em células de camundongos.
“Estamos agora envolvidos em pelo menos dois projetos, usando um enorme pedaço de DNA que não faz nada e tentando instalar nele todos esses elementos”, afirma Boeke.
“Colocamos um gene ali, uma sequência não codificante em frente a ele e outra mais distante, para ver como esse gene se comporta”, explica ele. “Agora, temos todas as ferramentas para realmente construir pedaços do genoma obscuro de baixo para cima e tentar entendê-lo.”
Hockemeyer prevê que, quanto mais aprendermos, mais surpresas inesperadas o livro genético da vida continuará a nos apresentar, da mesma forma que ocorreu quando o primeiro genoma foi sequenciado, 20 anos atrás.
Para ele, “as questões são muitas. O nosso genoma ainda está evoluindo ao longo do tempo? Conseguiremos decodificá-lo totalmente?”
“Ainda estamos nesse espaço escuro em aberto que estamos explorando e existem muitas descobertas realmente fantásticas à nossa espera.”
Human evolution is typically depicted with a progressive whitening of the skin, despite a lack of evidence to support it. Credit: Viktor Mikhailovich Vasnetsov/Wikimedia Commons
Systemic racism and sexism have permeated civilization since the rise of agriculture, when people started living in one place for a long time. Early Western scientists, such as Aristotle in ancient Greece, were indoctrinated with the ethnocentric and misogynistic narratives that permeated their society. More than 2,000 years after Aristotle’s writings, English naturalist Charles Darwin also extrapolated the sexist and racist narratives he heard and read in his youth to the natural world.
Darwin presented his biased views as scientific facts, such as in his 1871 book “The Descent of Man,” where he described his belief that men are evolutionarily superior to women, Europeans superior to non-Europeans and hierarchical civilizations superior to small egalitarian societies. In that book, which continues to be studied in schools and natural history museums, he considered “the hideous ornaments and the equally hideous music admired by most savages” to be “not so highly developed as in certain animals, for instance, in birds,” and compared the appearance of Africans to the New World monkey Pithecia satanas.
“The Descent of Man” was published during a moment of societal turmoil in continental Europe. In France, the working class Paris Commune took to the streets asking for radical social change, including the overturning of societal hierarchies. Darwin’s claims that the subjugation of the poor, non-Europeans and women was the natural result of evolutionary progress were music to the ears of the elites and those in power within academia. Science historian Janet Browne wrote that Darwin’s meteoric rise within Victorian society did not occur despite his racist and sexist writings but in great part because of them.
It is not coincidence that Darwin had a state funeral in Westminster Abbey, an honor emblematic of English power, and was publicly commemorated as a symbol of “English success in conquering nature and civilizing the globe during Victoria’s long reign.”
Science isn’t immune to sexism and racism.
Despite the significant societal changes that have occurred in the last 150 years, sexist and racist narratives are still common in science, medicine and education. As a teacher and researcher at Howard University, I am interested in combining my main fields of study, biology and anthropology, to discuss broader societal issues. In research I recently published with my colleague Fatimah Jackson and three medical students at Howard University, we show how racist and sexist narratives are not a thing of the past: They are still present in scientific papers, textbooks, museums and educational materials.
From museums to scientific papers
One example of how biased narratives are still present in science today is the numerous depictions of human evolution as a linear trend from darker and more “primitive” human beings to more “evolved” ones with a lighter skin tone. Natural history museums, websites and UNESCO heritage sites have all shown this trend.
The fact that such depictions are not scientifically accurate does not discourage their continued circulation. Roughly 11% of people living today are “white,” or European descendants. Images showing a linear progression to whiteness do not accurately represent either human evolution or what living humans look like today, as a whole. Furthermore, there is no scientific evidence supporting a progressive skin whitening. Lighter skin pigmentation chiefly evolved within just a few groups that migrated to non-African regions with high or low latitudes, such as the northern regions of America, Europe and Asia.
Illustrations of human evolution tend to depict progressive skin whitening.
Sexist narratives also still permeate academia. For example, in a 2021 paper on a famous early human fossil found in the Sierra de Atapuerca archaeological site in Spain, researchers examined the canine teeth of the remains and found that it was actually that of a girl between 9 and 11 years old. It was previously believed that the fossil was a boy due to a popular 2002 book by one of the authors of that paper, paleoanthropologist José María Bermúdez de Castro. What is particularly telling is that the study authors recognized that there was no scientific reason for the fossil remains to have been designated as a male in the first place. The decision, they wrote, “arose randomly.”
But these choices are not truly “random.” Depictions of human evolution frequently only show men. In the few cases where women are depicted, they tend to be shown as passive mothers, not as active inventors, cave painters or food gatherers, despite available anthropological data showing that pre-historical women were all those things.
Another example of sexist narratives in science is how researchers continue to discuss the “puzzling” evolution of the female orgasm. Darwin constructed narratives about how women were evolutionarily “coy” and sexually passive, even though he acknowledged that females actively select their sexual partners in most mammalian species. As a Victorian, it was difficult for him to accept that women could play an active part in choosing a partner, so he argued that such roles only applied to women in early human evolution. According to Darwin, men later began to sexually select women.
Sexist narratives about women being more “coy” and “less sexual,” including the idea of the female orgasm as an evolutionary puzzle, are contradicted by a wide range of evidence. For instance, women are the ones who actually more frequently experience multiple orgasms as well as more complex, elaborate and intense orgasms on average, compared to men. Women are not biologically less sexual, but sexist stereotypes were accepted as scientific fact.
Textbooks and educational materials can perpetuate the biases of their creators in science and society.
The vicious cycle of systemic racism and sexism
Educational materials, including textbooks and anatomical atlases used by science and medical students, play a crucial role in perpetuating biased narratives. For example, the 2017 edition of “Netter Atlas of Human Anatomy,” commonly used by medical students and clinical professionals, includes about 180 figures that show skin color. Of those, the vast majority show male individuals with white skin, and only two show individuals with “darker” skin. This perpetuates the depiction of white men as the anatomical prototype of the human species and fails to display the full anatomical diversity of people.
Authors of teaching materials for children also replicate the biases in scientific publications, museums and textbooks. For example, the cover of a 2016 coloring book entitled “The Evolution of Living Things”” shows human evolution as a linear trend from darker “primitive” creatures to a “civilized” Western man. Indoctrination comes full circle when the children using such books become scientists, journalists, museum curators, politicians, authors or illustrators.
One of the key characteristics of systemic racism and sexism is that it is unconsciously perpetuated by people who often don’t realize that the narratives and choices they make are biased. Academics can address long-standing racist, sexist and Western-centric biases by being both more alert and proactive in detecting and correcting these influences in their work. Allowing inaccurate narratives to continue to circulate in science, medicine, education and the media perpetuates not only these narratives in future generations, but also the discrimination, oppression and atrocities that have been justified by them in the past.
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Preocupação com eventos extremos une apoiadores de Lula (PT) e Bolsonaro (PL)
Lucas Lacerda
6 de abril de 2023
Nove entre dez brasileiros acham que vão sofrer impactos das mudanças climáticas na vida pessoal, e dois terços da população enxergam que a vida será muito prejudicada por eventos climáticos extremos nos próximos cinco anos.
Também há consenso sobre a distribuição desse impacto: 95% das pessoas acham que a parcela mais pobre sofrerá com esses efeitos.
Os dados fazem parte de pesquisa do Datafolha que ouviu 2.028 pessoas, de 126 municípios, com mais de 16 anos, nos dias 29 e 30 de março. A margem de erro é de dois pontos percentuais.
Enquanto a maioria acha que as mudanças climáticas vão prejudicar muito a parcela mais pobre da população (82%), uma minoria acha que a população rica vai sofrer da mesma forma (24%).
Quando avaliam a preocupação com os impactos na vida pessoal, 70% das mulheres afirmam que haverá muito prejuízo —índice que cai para 62% entre os homens.
Para Lori Regattieri, senior fellow da Mozilla Foundation, o destaque indica ainda que as mulheres podem estar mais atentas a riscos para a saúde própria e da família, além de reagirem mais rápido.
“Elas despontam em nível de preocupação principalmente quando temos questões que envolvem a saúde delas, da família e dos filhos”, diz a pesquisadora, que estuda comportamento digital e desinformação na agenda climática e socioambiental.
Regattieri destaca que a percepção também precisa considerar aspectos de cor e renda. “Quando falamos de mulheres negras, há maior probabilidade de morarem em áreas de risco. É onde se percebe o racismo ambiental.”
A percepção de muito prejuízo na vida pessoal foi apontada por 69% das pessoas pretas e pardas ouvidas na pesquisa, contra 61% entre pessoas brancas. A margem de erro é de três pontos percentuais para pessoas pardas, e quatro e seis para brancos e negros, respectivamente.
A pesquisa revela ainda uma preocupação com as mudanças climáticas muito similar entre quem declarou voto no presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e quem disse ter votado no ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) no segundo turno das eleições de 2022. Os percentuais também são próximos quando comparam-se os de apoiadores de PT e PL (quando citadas apenas as siglas, sem mencionar os candidatos em questão).
O prejuízo na vida pessoal decorrente de mudanças no clima é apontado por 89% dos eleitores de Lula e 88% dos de Bolsonaro. A pesquisa, assim, pode indicar que o medo de impactos na própria vida supera o posicionamento político —em campanha, Lula disse que priorizaria a agenda climática, enquanto a gestão Bolsonaro promoveu um desmonte das políticas públicas ambientais.
Na visão de Marcio Astrini, secretário-executivo do Observatório do Clima, rede de organizações socioambientais, isso ocorre porque a relação entre o apoio político e mudanças climáticas ainda não é tão direta no Brasil quanto problemas de emprego, fome, pobreza e saúde.
“Para a composição do voto, a questão de clima e ambiente não é tão decisiva [no Brasil] como em países que já venceram esses problemas”, diz.
“O que verificamos é que há uma narrativa criada para esse público: que o Bolsonaro não é uma pessoa ruim para a agenda de meio ambiente, que as acusações são invenção de esquerdistas, que o movimento ambiental do mundo é bancado por comunistas contra o desenvolvimento do país.”
Os danos imediatos que possam ser causados por uma chuva extremamente forte são outra preocupação em destaque na pesquisa. Para mais da metade da população (61%), a precipitação extrema é um risco para a casa onde moram, e 86% apontam risco para a infraestrutura —ruas, pontes e avenidas— da cidade em que vivem.
A percepção ampla sobre mudanças climáticas não é novidade no Brasil, de acordo com pesquisas anteriores do Datafolha. Levantamento realizado em 2010 mostrou que 75% dos brasileiros achavam que as atividades humanas contribuíam muito para o aquecimento global —o que é um consenso científico, amplamente difundido. Em 2019, esse índice caiu para 72%.
O mais recente relatório do painel científico do clima da ONU (IPCC, na sigla em inglês), lançado em 20 de março —poucos dias antes da realização da pesquisa do Datafolha, portanto—, enfatiza que o mundo vive sob pressão climática sem precedentes e que alguns danos já são irreversíveis.
Os cientistas alertam que o prazo para agir e frear o aquecimento do planeta em 1,5°C, meta do Acordo de Paris, é curto e exige ações rápidas dos países.
O projeto Planeta em Transe é apoiado pela Open Society Foundations.
Cientista brasileira Thelma Krug, que pode se tornar a primeira mulher no cargo, destaca necessidade de medidas rápidas
Cristiane Fontes
9 de abril de 2023
O Brasil apresenta nesta segunda (10) a candidatura da cientista Thelma Krug à presidência do IPCC (Painel Intergovernamental sobre Mudança do Clima da ONU), para o ciclo de 2023 a 2028.
Se eleita, Krug, que já é uma das vice-presidentes do órgão, será a primeira mulher e a primeira representante da América Latina no cargo mais alto da instituição. As eleições ocorrerão em sessão plenária em julho.
A matemática, com atuação no IPCC desde 2002, afirma que, além dos aprendizados sobre a evolução da ciência do clima —que hoje aponta como inequívoca a associação da ação humana ao aquecimento global—, foram o comprometimento dos milhares de autores do painel e o estímulo do neto, Luca, de 10 anos, que a levaram se candidatar a essa função.
“Rápidas, profundas e sustentadas reduções de emissões [de gases de efeito estufa] são necessárias para limitar o aquecimento a 1,5°C ou mesmo abaixo de 2°C”, diz Krug, que ressalta que as escolhas que fizermos nesta década terão um impacto direto para um futuro sustentável.
“O custo da ação vai ser bem menor do que o custo da inação, quando o planeta todo estiver sofrendo com esses impactos do clima com um aquecimento maior.”
Com o aumento do volume e da velocidade da produção científica sobre mudanças climáticas, ela defende que o painel produza relatórios menores e mais frequentes. Krug adianta que no próximo ciclo do painel será elaborado um documento especial sobre cidades.
“As cidades contribuem para aproximadamente 90% das emissões se nós considerarmos todo o escopo”, explica ela, que trabalhou por 37 anos no Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais), até 2019.
Krug decidiu se aposentar do instituto na época de acusações do então presidente Jair Bolsonaro (PL) de que os dados de desmatamento contabilizados pelo órgão seriam manipulados.
Como ser portadora de alertas tão sérios do IPCC sem levar o mundo ao cinismo e à inação? Os relatórios do IPCC já há muito tempo indicam a situação sobre a mudança do clima e, mais recentemente, essa inequívoca associação entre a ação humana e o aquecimento na atmosfera se tornou um fato.
A partir de 2018, o IPCC indicou a necessidade de transformações em todos os setores da sociedade, e a gente não viu uma resposta equivalente. Eu não diria que é inação, mas eu diria que a ação não corresponde à urgência que a ciência mostra, se quisermos ter um futuro sustentável.
Passados cinco anos, o que a gente vê é que esse desafio tornou-se ainda maior. Essa maior frequência de eventos extremos mostra que os custos já são grandes e serão muito maiores no futuro.
O custo da ação vai ser bem menor do que o custo da inação, quando o planeta todo estiver sofrendo com esses impactos do clima com um aquecimento maior.
O último relatório do IPCC diz que ainda temos tempo de conter os piores impactos da crise climática, se grandes e rápidas reduções de emissões de gases de efeito estufa forem feitas. Como isso pode ser realizado? O IPCC indica —e eu me fixo um pouco na parte de 1,5°C, porque 1,5°C [de aumento na temperatura] já vai ser insustentável para muitos países insulares— que as emissões têm de ser cortadas pela metade até 2030.
Não é que seja o final do mundo. Mas, se isso não acontecer, as coisas vão se tornando cada vez mais difíceis.
Poderia comentar essas opções de mitigação? Você tem opções para todos os setores. No setor de energia, a gente fala muito da questão de descarbonização. Hoje há essa eletrificação dos automóveis, que é questionável, mas em muitos lugares poderia funcionar bem.
Se olharmos os preços da energia solar, eram muito altos, mas hoje são mais acessíveis para uma implementação mais larga. A expansão indica avanços que não estão acontecendo só no Brasil, mas em outras partes do mundo.
Outros exemplos também estão ocorrendo, principalmente na questão do uso da terra na agricultura, ou seja, principalmente, a redução do desmatamento, que é indicada como uma das formas de grandes reduções de emissões, e o Brasil é um exemplo disso.
Além de toda a parte de planejamento urbano. No próximo ciclo do IPCC, vamos ter um relatório especial sobre a mudança do clima em cidades. As cidades contribuem para aproximadamente 90% das emissões se nós considerarmos todo o escopo das cidades.
Qual deveria ser o papel do IPCC nos próximos anos, considerando o robusto consenso científico existente sobre a crise do clima, a inação política e a revisão do Acordo de Paris em 2025? O IPCC, através de modelos cada vez mais robustos, faz essa avaliação da literatura [científica] em todo o mundo. E a velocidade de publicações científicas na temática de mudança do clima tem sido enorme.
Talvez o painel decida refletir sobre a importância e necessidade de uma frequência maior de relatórios menores, que permitam que a gente esteja sempre atualizado.
Quais foram os seus principais aprendizados na vice-presidência do IPCC e por que lançar agora a sua candidatura à presidência do painel? A submissão do meu nome como candidata à presidência do IPCC é prerrogativa do ponto focal do Brasil, que nesse caso é do Ministério das Relações Exteriores.
O Ministério das Relações Exteriores fez consultas com outros ministérios, e a indicação do meu nome foi bem recebida por todos, junto com a minha contribuição ao IPCC por 22 anos.
Durante esse período, houve um aprendizado enorme: não só de entender a evolução da ciência, mas também de ter um conjunto de autores que, de uma maneira voluntária, se dedicam a produzir essa ciência, porque acreditam que vai gerar ação.
Essa dedicação, essa vontade de fazer a diferença desses cientistas, dedicando tempo a isso de uma maneira muito profunda, me fizeram perguntar: será que eu também posso fazer uma diferença nesse papel [na presidência do IPCC]? Nós temos muito bons candidatos, eu sou uma delas.
Uma análise recente do portal Carbon Brief revelou que a proporção de mulheres e de autores do sul global no IPCC aumentou nas últimas décadas, mas ainda há muito a ser feito pela diversidade. Como o IPCC vem implementando a política de equidade de gênero, estabelecida em 2020, e quais são as suas propostas nesse sentido? Quando a gente fala da questão de gênero, acho que ela é um pouquinho mais complexa. Porque a gente normalmente trabalha com esse binário, feminino e masculino, mas hoje existe uma diversidade bem maior a ser analisada.
Eu particularmente penso que não é você aumentar o número de mulheres, aumentar a diversidade. Acho que a questão maior é se essas pessoas que estão lá, em maior número, estão sendo respeitadas. Elas estão sendo incluídas como tais, elas têm a percepção de pertencimento?
O painel autorizou que fosse contratada uma empresa que vai fazer uma pesquisa junto a todos que participaram de 2015 a 2023, para buscar entender se se sentiram parte desse conjunto de autores de uma maneira equitativa, se oportunidades foram dadas a todos que estão envolvidos. Acho que os resultados vão ser muito importantes para entender as ações necessárias.
Em uma entrevista recente à Agência Pública, a senhora afirmou que a vulnerabilidade da produção agropecuária no Brasil aos impactos das mudanças climáticas merece atenção especial. O que deveria ser feito nos próximos anos? Essa afirmação foi baseada nas projeções feitas para a região Centro-Oeste, que já está sendo impactada pela mudança do clima. Ou seja, com o aumento atual, essa região já está sendo impactada e, para 1,5°C [de aquecimento], esses riscos de impactos aumentam por conta de maiores secas.
A gente espera que planos de ação antecipem o que o futuro pode ser e, fazendo isso, eles não estão dizendo que não existe mais solução, mas, se chegarmos lá, como estaremos preparados. A própria Embrapa estava desenvolvendo espécies mais resilientes ao calor, à falta de água.
O que deveria ser priorizado pelo país para reconquistar credibilidade na cena climática internacional? E o que deveria ser negociado em termos de cooperação e financiamento, além de recursos para o Fundo Amazônia? O nosso grande gargalo continua sendo a questão do desmatamento, que foi um dos elementos que fizeram com que o Brasil perdesse muito da sua credibilidade.
Acho que o Fundo Amazônia não é suficiente. Ele tem sido importantíssimo, mas financeiramente é insuficiente. Esse fundo ele compensa, vamos assim dizer, as reduções de emissões quando estas são demonstradas, e nós não estamos num estágio onde isso seja sustentável.
Apesar da importância do fundo, a gente precisa de mais investimentos de outros países, que possibilitem com que essa cooperação possa vir sem vínculos iniciais, para dar ao Brasil condição de iniciar esse processo de reversão.
RAIO-X
Thelma Krug, 72
Graduada em matemática pela Roosevelt University (EUA), com doutorado em estatística espacial pela University of Sheffield (Inglaterra), foi pesquisadora no Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais) por 37 anos. Foi ainda secretária nacional adjunta no Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação e diretora de políticas de combate ao desmatamento no Ministério do Meio Ambiente. No IPCC, copresidiu a força-tarefa sobre inventários nacionais de gases de efeito estufa de 2002 a 2015 e ocupa, desde 2015, uma das três vice-presidências do painel.
Decisão é considerada histórica por poder abrir caminho para mais processos contra governos
Camila Hodgson
29 de março de 2023
A Corte Internacional de Justiça (CIJ) avaliará as obrigações legais dos Estados de proteger as gerações atuais e futuras das mudanças climáticas, depois que os países apoiaram uma resolução na ONU.
A opinião consultiva da CIJ, o principal órgão jurídico da ONU, pode aumentar o risco de litígio para os países que não cumprirem as leis e tratados internacionais existentes, ao mesmo tempo em que orienta os governos sobre o que devem fazer para defender os direitos humanos e o meio ambiente dos danos climáticos.
Os países aprovaram a resolução por consenso sem votação, após uma campanha de anos liderada por Vanuatu, nação insular do Pacífico que corre risco devido à elevação do nível do mar. Mais de cem países copatrocinaram a resolução, mas não os Estados Unidos e a China, os dois maiores emissores anuais do mundo.
Delta Merner, cientista chefe do Polo Científico para Litígio Climático da União de Cientistas Preocupados, disse que a decisão de quarta-feira (29) na Assembleia Geral da ONU marcou “um momento histórico para a justiça climática internacional”.
A CIJ, que pode levar um ano ou mais para entregar suas conclusões, “alteraria a forma como pensamos sobre as responsabilidades pelas emissões e a prestação de contas, incluindo a responsabilidade corporativa”, e “reforçaria” as justificativas legais para “milhares de casos de litígio climático atualmente arquivados“, acrescentou ela.
Dirigindo-se à ONU, o secretário-geral António Guterres disse que os pareceres da CIJ têm “uma importância tremenda e poderão ter um impacto duradouro na ordem jurídica internacional”, embora não sejam juridicamente vinculantes.
O apoio ao que começou como uma iniciativa liderada por estudantes de Vanuatu cresceu no ano passado, pois muitos países sofreram eventos climáticos extremos devastadores. Com as emissões permanecendo teimosamente altas, os principais cientistas climáticos do mundo alertaram recentemente que as temperaturas médias provavelmente atingirão em breve 1,5°C acima dos níveis pré-industriais.
Embora ativistas tenham recorrido aos tribunais para forçar governos e empresas a efetuarem cortes mais rápidos nas emissões, autoridades disseram que o parecer da CIJ não foi visto como um caminho para novos processos, mas uma forma de dar aos governos maior clareza sobre suas responsabilidades.
Ralph Regenvanu, ministro da Mudança Climática de Vanuatu, disse que a iniciativa “não foi dirigida a nenhum estado [individual]”, nem teve “a intenção de culpar, envergonhar ou buscar qualquer julgamento”.
No entanto, especialistas disseram que ela poderia afetar os processos climáticos mais diretamente. Lavanya Rajamani, professora de direito ambiental internacional da Universidade de Oxford, que apoiou a iniciativa de Vanuatu, disse que as descobertas poderiam “apoiar litígios climáticos nacionais e regionais” ao identificar “um padrão ou referência para o que se espera dos estados”.
A decisão de quarta-feira ocorre meses depois que uma coalizão de pequenos países insulares, incluindo Vanuatu e Antígua e Barbuda, pediu a outro órgão intergovernamental uma opinião sobre as obrigações legais dos países de proteger os ambientes oceânicos das mudanças climáticas.
As conclusões do Tribunal Internacional do Direito do Mar devem ser entregues em 2024, antes que a CIJ conclua seu trabalho.
Payam Akhavan, advogado que apoia a iniciativa dos oceanos, disse que a opinião do tribunal pode resultar em contestações legais contra os países, mas um resultado “mais importante” seria usá-la para pressionar os grandes poluidores nas cúpulas climáticas da COP e “colocar alguns dentes no Acordo de Paris”.
The Vatican formally repudiated the “Doctrine of Discovery” that legitimized the colonial-era seizure of Native lands. (Gregorio Borgia/AP)
Using 15th-century papal decrees, European colonial powers captured and claimed Indigenous land in the Americas and elsewhere. Now, in a significant move centuries later, the Vatican on Thursday rejected the contentious “Doctrine of Discovery,” addressing a long-standing demand led by Indigenous groups in Canada.
The church acknowledged in a statement that these papal bulls “did not adequately reflectthe equal dignity and rights of indigenous peoples,” and said that the doctrine is not part of the teaching of the Catholic Church.
Indigenous groups have argued that European explorers used the principle of discovery — which was based on the presumed superiority of European Christians — to legally and morally justify the subjugation and exploitation Indigenous communities, and to rule over them.
The Vatican statement also recognized that acts of violence were committed against Indigenous communities by colonial settlers, and asked for forgiveness for “the terrible effects of the assimilation policies and the pain” they experienced. The doctrine of discovery was previously rejected by several faith communities in the United States and Canada.
The Canadian Minister for Justice David Lametti credited the Vatican’s declaration to the hard work of Indigenous communities. “A doctrine that should have never existed. This is another step forward,” he said in a tweet.
The latest move follows the reconciliation that Pope Francis sought in Canada during his visit last year, when he apologized for the role Christians played in the tragic history of its residential school systems, many of which were run by the Catholic Church in the 19th and 20th centuries.
Indigenous children in Canada were forcibly removed from their families to integrate them into a Euro-Christian society, where they had to give up their language and culture; many were sexually abused. Thousands of children died at these schools and their unmarked graves continue to be discovered.
During his trip last year, Francis was confronted by protesters holding banners calling on him to rescind the discovery doctrine.
The announcement this week was greeted by Indigenous advocates. The news was “wonderful,” Phil Fontaine, a former national chief of the Assembly of First Nations in Canada, told the Associated Press.
“The church has done one thing, as it said it would do, for the Holy Father,” said Fontaine, who was part of the First Nations delegation that met with Francis.“Now the ball is in the court of governments, the United States and in Canada, but particularly in the United States where the doctrine is embedded in the law.”
In a landmark 1823 case, U.S. Supreme Court Chief Justice John Marshall invoked the papal discovery doctrine to rule that Indigenous people only had rights of occupancy and not ownership. This jurisprudence on Native American lands has persisted through the years and was referred to as recently as 2005.
A New York court, in the case of City of Sherrill v. Oneida Nation, relied on the earlier acceptance of the discovery doctrine by courts. Those rulings inferred that land titles were vested with European colonists, and later, the U.S. government.
In recent years, the movement to reclaim Native American lands has grown in the United States. In January 2022, 523 acres of redwood forest in Mendocino County, Calif., were transferred to the InterTribal Sinkyone Wilderness Council and, in April, the Rappahannock Tribe reacquired 460 acres of ancestral land in Virginia after 350 years.
Most Native American lands are trust lands, the U.S. government says — lands where the title is held by the federal government but the beneficial interests are with the tribes.
TheUnited Nations said in 2012 that international law demands that governments rectify the wrongs caused by such colonial doctrines, “including the violation of the land rights of indigenous peoples, through law and policy reform.”
[RESUMO] Em novo livro, Muniz Sodré contesta o conceito de racismo estrutural, que a seu ver carece de base científica. Embora não se oponha ao uso da expressão, o sociólogo e colunista da Folha afirma que a discriminação racial no Brasil é difícil de combater por ser institucional e intersubjetiva, tendo como marca a negação do preconceito, e que teria se reconfigurado depois da Abolição com as ideias fascistas europeias. Sodré defende ainda que o pensamento da aproximação, manifestado em algumas situações brasileiras, traz oportunidade de combater o racismo.
Muniz Sodré é um intelectual de luta. Faixa-preta de caratê, continua a praticar o esporte aos 81 anos. A idade só o obrigou a deixar para trás a capoeira, que ele treinou com mestre Bimba, um dos grandes capoeiristas do Brasil.
O sociólogo e colunista da Folha Muniz Sodré em seu apartamento no bairro Cosme Velho, no Rio – Eduardo Anizelli/ Folhapress
Além de livros publicados sobre a mídia, Sodré também publicou obras acerca da cultura brasileira, em especial a cultura negra. Em seu novo lançamento, “O Fascismo da Cor” (Vozes), ele traça uma radiografia da discriminação racial no Brasil, construindo o argumento de que, passadas a Abolição e a Proclamação da República, uma outra forma de racismo se estabeleceu no país.
Para o pesquisador, essa nova configuração tem laços com as ideias fascistas surgidas na Europa e com o eugenismo associado a elas. Um dos divulgadores desse discurso no país, lembra, era o escritor Monteiro Lobato.
Além desse diagnóstico, Sodré dedica parte significativa do livro a contestar o conceito de racismo estrutural, tal como desenvolvido por Silvio Almeida, agora ministro dos Direitos Humanos e da Cidadania. “Se fosse estrutural, já teria sido derrotado. O movimento negro é o movimento mais antigo da sociedade brasileira”, diz o autor, que propõe no lugar o conceito de “forma social escravista”.
Em entrevista à Folha, Sodré analisa o perfil do racismo à brasileira e explica os motivos pelos quais discorda de Silvio Almeida. Ele também defende que as rodas de capoeira e os candomblés podem oferecer uma chave de saída para a discriminação racial.
Na primeira metade do seu livro, o sr. contesta o conceito de racismo estrutural, hoje muito popular. Por que considera essa definição insuficiente para explicar o racismo no Brasil?
O conceito de estrutura é um conceito complexo. Primeiro, tenho que advertir que não tenho nada contra falar em racismo estrutural, porque acho que, do ponto de vista político, é bom, é fácil. Dá um ancoramento para a ideia de racismo aqui no Brasil.
Mas eu digo que ele não é estrutural. Parto de coisas simples, como a frase do ministro Luís Roberto Barroso, do STF, quando ele disse que, no Brasil, as estruturas são feitas para não funcionar. Ele está falando da estrutura jurídica, da estrutura econômica, e é verdade. As estruturas aqui são feitas para não funcionar. Por que a única a funcionar seria o racismo?
Acho que o racismo funciona exatamente porque ele não é estrutural. Minha visão é que o racismo que existia no Brasil estava consolidado e ligado à escravatura. Portanto, a estrutura escravista existia. Há um livro do historiador Jacob Gorender em que ele mostra a estrutura existente na escravidão. Outros ensaístas, como Alberto Torres, mostram que era uma estrutura que funcionava.
O Brasil se sustentou na escravidão, foi ela que fez a acumulação primitiva [de capital] aqui e foi a coisa mais bem-organizada neste país. Mas isso acabou com a Lei Áurea. Ao contrário do que acham alguns amigos meus escritores negros, a Abolição não foi uma farsa. Ela efetivamente acabou com a sociedade escravista e, portanto, acabou com a estrutura escravista, mas não acabou com o racismo. São duas coisas diferentes.
Antes da Abolição, não era necessário um racismo atuante. Quatro quintos da população que trabalhavam como escravos eram torturados no Império de dom Pedro 2º. Mesmo assim, houve naquele momento uma classe média negra, uma intelectualidade negra que emergiu. Grandes figuras da literatura e das artes eram negras.
O primeiro embaixador plenipotenciário do Brasil na Inglaterra, Francisco Jê Acaiaba Montezuma, era um negão baiano muito brilhante. Os artistas negros de Pernambuco formavam uma classe média com quase 2.000 pessoas. Só ouvimos falar deles hoje depois de livros focados nisso porque, como dizia Mário de Andrade, foi uma aurora que não deu dia. Quando veio a Abolição, se esqueceu de tudo isso. A cultura negra passou a ser a cultura popular, reconhecida muito tempo depois.
Desenho de Angelo Agostini publicados na “Revista Ilustrada”, que retrata a brutalidade do cotidiano escravocrata. Acervo Biblioteca Mário de AndradeDesenho de Angelo Agostini publicados na “Revista Ilustrada”, que retrata a brutalidade do cotidiano escravocrata. Acervo Biblioteca Mário de Andrade
Se o racismo brasileiro não é estrutural, qual seria a característica dele?
Ele é institucional. Defino no livro o que é estrutura. É um termo muito preciso na sociologia e na filosofia. O conceito pressupõe uma totalidade fechada de elementos interdependentes. Você pode falar, por exemplo, da estrutura jurídica: a doutrina do direito se reflete nos tribunais, no processo penal, nas leis. Isso é estrutural.
Se dissermos que o racismo é uma estrutura, temos que mostrar qual é a interdependência dos elementos. Aí você diria que, quando se vai selecionar alguém para um emprego, só brancos são selecionados. Mas a estrutura é formal, tem uma forma escrita ou uma forma de costumes que é reconhecida por todos. A discriminação racial no Brasil não é reconhecida por ninguém. Nenhum Estado ou governante se diz racista. Às vezes, os racistas mais atrozes diziam que não eram racistas.
A grande dificuldade do combate ao racismo no Brasil é que, aqui, a negação funciona. O grande mecanismo do racismo é a negação.
Li o livro do Silvio Almeida (“Racismo Estrutural”), e ele não diz o que é uma estrutura. O racismo foi estrutural nos Estados Unidos, na África do Sul…
Então, o sr. defende que, para ser estrutural, o racismo precisa estar explicitamente amparado pela burocracia do Estado.
Silvio Almeida fala de instituições que funcionam como uma correia de transmissão do racismo.
Sou obrigado a me perguntar: correia de transmissão a partir de onde? Quando Lênin diz que os jornais deveriam ser a correia de transmissão do partido para as massas trabalhadoras, você tem de um lado o partido, de outro, as massas, e no meio, o jornalismo.
Sem dúvida, as instituições são uma correia de transmissão, mas não de uma estrutura. Onde é que está essa estrutura? No Estado? Mas o Estado não tem leis racistas, elas acabaram com a Abolição. Estão na economia? Não conheço leis econômicas racistas, conheço discriminações econômicas, mas não leis.
Manifestantes pintam frase #vidaspretasimportam na avenida Paulista. Discriminação racial é o ato de discriminar alguém por conta de sua raça, origem étnica, cor e/ou condição que apresente diferença, com demonstração de suposta superioridade sobre a vítima e com o objetivo de anular ou restringir o reconhecimento, o gozo ou o exercício em igualdade de condições, de direitos e liberdades fundamentais no campo político, econômico, social, cultural ou em qualquer outro campo da vida pública ou privada. Folhapress/Bruno Santos – 21.nov.20Ato pelo Dia Nacional de Denúncia contra o Racismo, na avenida Paulista. RACISMO ou INJÚRIA RACIAL: A principal diferença entre o crime de injúria racial e racismo é a quem é dirigida a ofensa . Folhapress/Jardiel Carvalho – 13.mai.21
Não tem uma implicação estritamente racial, são os pobres que pagam mais impostos. Entre eles, você tem claros e escuros —ainda que, sem dúvida, os salários mais baixos sejam dos negros. Acho importante que se estudem esses aspectos embutidos na economia, nas instituições, na remuneração da força de trabalho. Com esses dados, é possível intervir no debate público, tomar um partido antirracista.
Não sou contra a expressão racismo estrutural, sou contra a cientificidade dela.
O sr. disse que, depois da Abolição e da Proclamação da República, surgiu uma nova forma de racismo. Qual é o seu perfil?
O segundo ponto do livro é mostrar a diferença entre sociedade e forma social. Você não vai encontrar na literatura sociológica brasileira essa distinção, mas ela é feita por mim. A sociedade implica uma estrutura: ela tem uma interconexão de seus elementos, ou seja, o modo de produção está articulado com o sistema jurídico, com a política… Toda a visão marxista sobre a sociedade, para mim, é coerente. Nesse ponto, sou bem marxista.
Mas a forma social é outra coisa. Ela é uma imagem que a sociedade projeta de si mesma, que ela tem ou quer ter de si. Isso nós temos individualmente: você tem uma imagem de si mesmo e quer que os outros reconheçam você como uma imagem válida.
Isso também existe em termos coletivos. A imagem que a sociedade tem de si é gerida pelo Estado e pelas classes dirigentes. Ela pode ser oficial, mas também subterrânea, uma imagem oculta que existe e lhe determina. Isso eu chamei de forma social escravista.
Aluna da Emef Ruben Bento Alves, em Caxias do Sul (RS), Sophya Domingues Marcos, 13, tem na família da mãe a afrodescendência . /Carlos Macedo/Folhapress
O que seria essa forma social escravista?
Ela é aparência, mas isso não quer dizer que seja uma ilusão. As aparências existem e continuam a existir por ter força, e é um erro querer lidar só com o que é material, concreto. Na forma social, falo de uma aparência que a sociedade quer ter sobre si mesma: as classes dirigentes querem se ver como brancas, europeias e cristãs, sem ter nada a ver com negros.
Esse querer ver-se é a forma social. Dentro dessa imagem, se desenvolvem os mecanismos linguísticos, psicossociais, de subjetividade e de comunicação. Portanto, a aparência cria formas.
Ou seja, acabou a escravidão, mas nasceu a forma social escravista. Ela mantém a escravidão como ideia e como discriminação institucional. Essa forma não é captada apenas objetivamente, não está em números. Portanto, não é pega pela sociologia quantitativa. São também as percepções, os afetos. A forma social é um conceito que vem da sociologia alemã e está na sociologia francesa contemporânea.
O sr. dá um papel de destaque ao patrimonialismo nisso que chama de forma social.
A forma escravista está ancorada nesse modo de controle social que é o patrimonialismo, ou seja, no poder exercido por grandes famílias, pelo compadrio, pelo afilhadismo. Esse parentesco dominante no Brasil é branco e reproduz a forma social racista. Quis mostrar como essa forma é tão ampla, tão invasiva, tão maior que a estrutura que ela pode atingir o próprio preto. O preto pode se adequar a ela e ser racista contra pretos também.
Vivemos essa forma no cotidiano. Podemos vê-la em explosões súbitas de fúria e agressões. No Maranhão, o cara estava passando com a mulher, veem um homem tentando abrir o próprio carro e acham que ele está tentando roubar o veículo. Aí os dois descem a porrada no homem. Quando foi jogado no chão, a mulher grita para o marido chutar a cabeça da vítima. O carro era dele. Isso é diário no Brasil.
Kaique do Nascimento Mendes (de camisa da seleção) e seu advogado, Ewerton Carvalho. Folhapress/Marlene Bergamo
O sr. diz que essa nova manifestação do racismo está ligada ao fascismo europeu. Qual é a relação entre os dois fenômenos?
Diferentemente do período da escravidão, o racismo pós-abolicionista é plenamente doutrinário, ou seja, ele incorpora ideias europeias sobre o racismo. Essas ideias vêm principalmente da doutrina do eugenismo.
Isso não coincide, em termos de data, só com o período pós-Abolição, mas, nesse momento no mundo, o eugenismo faz parte de uma atmosfera fascista. O que faz com que o fascismo se expanda para Portugal, Espanha e outros países é a questão da preservação do cristianismo e da pureza do homem europeu. É o nacionalismo extremado do homem branco.
O racismo ocidental vem da Igreja Católica e é primeiro antissemita. O modelo do racismo [contra os negros] é o antissemitismo: as primeiras vítimas são os judeus, e os primeiros carrascos são os padres. Depois, isso se transfere para o negro. Os escritos do fascismo incorporam a ideia de eugenia e isso chega aqui muito tempo depois da Abolição, através de igrejas, mas principalmente por meio de intelectuais —Monteiro Lobato é o grande modelo.
O fascismo é o espírito da época do racismo brasileiro. É dele que conflui, para as classes dirigentes brasileiras, a discriminação do negro, que já não era mais jurídica nem política.
No livro, o sr. aponta Nilo Peçanha, que virou presidente em 1909 e era negro, como um caso a ser estudado. O que a história dele diz sobre o racismo à brasileira?
Examinaram pouco essa história.Nilo Peçanha veio de uma família pobre em Campos dos Goytacazes (RJ), a mãe era meio clarinha e o pai era preto, eram agricultores. Ele se tornou um político brilhante e abolicionista, mas não queria ser reconhecido como negro. Ele se maquiava para clarear a pele antes de ser fotografado, e as fotos eram retocadas.
É o primeiro e único presidente negro do Brasil. É uma figura importante por mostrar esse mascaramento, ou seja, a tentativa de não parecer negro, que foi típico do mulato aqui no Brasil. A imprensa o ridicularizava. Faço uma análise linguístico-filosófica do discurso racial, mostrando como ele é atravessado pela ambiguidade. Quis mostrar como há jogos de linguagem no discurso racista, para mostrar como a forma social escravista opera.
O medo é um elemento importante nas relações hierárquicas. Torturavam-se escravospara infligir medo. Uma tortura podia começar porque a sinhá achava que o negro olhou atravessado para ela.
Mas o medo é uma faca de dois fios. O torturador tem medo também. Temer os negros foi algo que se intensificou com a Revolta dos Malês, em 1835, mas já vinha do Haiti e de Cuba e se disseminou entre as classes brasileiras.
Mas como esse medo de revoltas negras nas Américas se transforma no medo de manifestações culturais?
O racismo cultural é o racismo do sentido que o outro produz. Junto com ter medo físico do negro vem, principalmente depois da Abolição, ter medo da cultura afro, do feitiço, que era um ponto de repulsa e atração, porque a classe média branca sempre se consultou nos cultos afros.
Como você sabe, eu sou de candomblé, da hierarquia do Ilê Axé Opô Afonjá. Conheci ao longo da vida professores razoáveis, ateus, que têm medo do pertencimento ao candomblé. A pessoa não acredita em nada, mas tem medo. Isso é o preconceito.
Ao mesmo tempo que há esse preconceito, as artes brasileiras promoveram uma celebração da cultura afro-brasileira, como na obra de tropicalistas ou de Jorge Amado. Como o racismo brasileiro comporta essa contradição?
Porque ele não é estrutural [risos] e essa celebração não foi insurrecional.
Conheci bem o Jorge Amado. Ele dizia que não acreditava em nada, mas era do Axé Opô Afonjá como eu. Não viajava de avião sem que uma mãe de santo fizesse um jogo para ele, porque morria de medo. Quando me confirmei como obá de Xangô, Caymmi entrou comigo. Quando eu estava na Bahia, Caetano Veloso, Gilberto Gil, esse pessoal não era de candomblé. Hoje, Gil também é obá de Xangô.
Quando digo que essas celebrações na cultura brasileira não representam uma insurreição, quero dizer que não são algo contra o Estado, é mais uma posição existencial. Mas celebrar o candomblé é celebrar aquilo que a cultura afro traz de mais precioso, o apego à vida.
Se o catolicismo é a religião do amor universal irradiado de Cristo, o candomblé é a alegria, uma alegria litúrgica. Quem é baiano é atravessado por essa liturgia. Jorge Amado foi o grande romancista disso. Ele inventa uma Bahia, a língua da Bahia para fora é o jorge-amadês. Todas aquelas histórias são e não são inventadas.
Filhas de santo com trajes rituais e colares de conta nas cores de seus orixás, no terreiro Ilê Axé Oyó Ibessi, de pai Gegeo, no bairro Faceira, em Cachoeira, Recôncavo Baiano . Raul Spinassé/Folhapress/Filha de santo na subida que dá acesso ao terreiro Ilê Axé Oyó Ibessi em Cachoeira, no Recôncavo Baiano; ao fundo, o Rio Paraguaçu e, na outra margem, a cidade de São Félix . Raul Spinassé/Folhapress
Jorge Amado é o ideólogo do povo nacional, e esse povo nacional era um povo mestiço, os baianos. Ele vai encontrar o modelo dessa mestiçagem no candomblé, em que essa mestiçagem não é só ideológica, é cultural também.
No Axé Opô Afonjá, eu já vi padre bater cabeça, já vi judeu bater cabeça. É isso que sempre atraiu Jorge Amado. Quando Jean-Paul Sartre esteve na Bahia, passou o dia inteiro no Axé Opô Afonjá, sentado com mãe Senhora.
Os negros americanos são diferentes. Acho que nossas condições de luta e opressão são bastante diferentes e o que é igual é a cultura negra. O samba nasceu na Praça 11 nas mesmas circunstâncias que o jazz nasceu na praça Congo, em Nova Orleans. Nasceu do candomblé, com os baianos que civilizaram o Rio de Janeiro.
Falo da cultura como a vitalidade do povo. O que é forte nos Estados Unidos vem dos negros, nada é mais forte que a música, que o jazz. Isso cria uma ponte, é como se o ritmo viajasse pelos Estados Unidos, pelo Caribe, por Cuba, e essa ponte não está sob a égide do Estado, é também uma forma social.
Em um mundo com trocas possibilitadas pelas tecnologias da informação, seria necessário pensar o racismo com um recorte global em vez de apenas nacional?
O pensamento nacional, se for forte, vai ser global. O pensamento global não atinge o núcleo do racismo, que está em conformações nacionais. O combate aqui no país tem que ser pensado em termos brasileiros para ser suficientemente forte e se irradiar transnacionalmente. É algo que o Brasil pode oferecer ao mundo, uma chave de saída do racismo.
Como?
O principal modo de combater o racismo não é pensar intelectualmente a diferença. Não dou muita atenção a toda essa coisa de proteger linguisticamente a diferença, por exemplo. A filosofia da diferença é a grande filosofia moderna, que fala da necessidade de aceitar o diferente. É um pensamento avançado e global.
Mas, para mim, o principal modo de combater o racismo é o pensamento da aproximação, que é mais completo. É o morar junto, a vizinhança na escola, no trabalho, nas relações amorosas. A aproximação está em qualquer unidade que se possa construir, e o racismo se exacerba quando os diferentes estão próximos.
O Brasil já é um país que tem as oportunidades de aproximação pela própria heterogeneidade da população. Temos que pensar as diferentes formas de existir no Brasil e aprender com elas. Onde você não encontra racismo aqui? No Axé Opô Afonjá, no candomblé de Menininha do Gantois, no terreiro da Casa Branca, nas rodas de capoeira. Será que não pode vir daí uma lição?
Não é que as pessoas sejam perfeitas, mas há modos de vida ali que são antirracistas. São casos pequenos, mas é do pequeno que você começa a pensar o grande. Foi assim que Davi matou Golias.
O FASCISMO DA COR: UMA RADIOGRAFIA DO RACISMO NACIONAL
Cerimônia que contou com presenças de lideranças indígenas e de entidades acadêmicas destacou necessária união e encontro de saberes para a difusão do conhecimento e garantia da dignidade humana
Por Denis Dana Fotos: Alex Reipert
Mesa de abertura da cerimônia de outorga do título de doutor honoris causa a Davi Kopenawa
Em cerimônia realizada na última quarta, 15 de março, que contou com presenças de lideranças indígenas e acadêmicas, além de representante do governo federal, por meio do Ministério dos Povos Indígenas, o Yanomami Davi Kopenawa, pensador, líder político e xamã de seu povo recebeu o título de doutor honoris causa da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). Inédita na universidade, a concessão do grau teve processo iniciado em 2021, após iniciativa da Cátedra Kaapora de Conhecimentos Tradicionais e Não Hegemônicos, da Cátedra Sustentabilidade e Visões de Futuro e do Projeto Xingu, com centenas de assinaturas de apoio de docentes, técnicos(as) e estudantes em reconhecimento ao trabalho e luta de Kopenawa pela defesa dos povos originários, do meio ambiente, da diversidade cultural e dos direitos humanos.
Odair Aguiar Junior, diretor acadêmico do Campus Baixada Santista e presidente da comissão de Títulos Honoríficos da universidade
A mesa de honra da sessão solene foi composta por Raiane Assumpção, reitora pro tempore e presidenta do Conselho Universitário (Consu), Juma Xipaia, secretária de Articulações e Promoção dos Direitos Indígenas do Ministério dos Povos Indígenas, Odair Aguiar Junior, diretor acadêmico do Campus Baixada Santista, membro do Consu e presidente da comissão de Títulos Honoríficos da universidade, Renzo Taddei, docente do Instituto do Mar (IMar/Unifesp) – Campus Baixada Santista e membro da Cátedra Sustentabilidade e Visões de Futuro, e Ilana Seltzer Goldstein, docente da Escola de Letras e Ciências Humanas (EFLCH/Unifesp) – Campus Guarulhos e membro da Cátedra Kaapora de Conhecimentos Tradicionais e Não Hegemônicos.
Ao abrir os discursos, Odair Aguiar celebrou a ocasião, que marcou o encerramento de todo o rito realizado na universidade, no processo de proposição do título honorífico para Davi Kopenawa, o primeiro da Unifesp. “Este é um momento histórico e de muita celebração para nós, não só como instituição, mas também como país, ao outorgar como doutor honoris causa essa grande liderança nacional que é Kopenawa”.
Ilana Seltzer Goldstein, docente da Escola de Letras e Ciências Humanas (EFLCH/Unifesp) – Campus Guarulhos e membro da Cátedra Kaapora de Conhecimentos Tradicionais e Não Hegemônicos
Responsável por apresentar o currículo de Davi Kopenawa ao público que acompanhava a sessão solene presencial e virtualmente, Ilana Goldstein teve como desafio resumir toda a trajetória de vida do agraciado. Ao construir uma linha do tempo, Ilana trouxe os principais passos de Kopenawa, desde seu nascimento, passando pelas dificuldades na infância e sua adolescência na cidade, onde aprendeu e desenvolveu o português, tão importante para lhe permitir a tradução entre mundos. A apresentação do currículo também destacou a construção de sua família, o desenvolvimento de atividades xamânicas e sua inserção nas mobilizações e lutas em defesa dos povos originários, bem como no universo da literatura e de outras manifestações artísticas, sempre com o objetivo de conscientização e educação para um planeta mais tolerante e mais saudável.
Na primeira imagem, Marcos Antonio Pellegrini, docente da Universidade Federal de Roraima (UFRR) proferindo seu discurso. Já segunda imagem, o cineasta Edmar Tokorino Yanomami (de vermelho) fala sobre o filme Uma Mulher Pensando, exibido durante a cerimônia
Ao término da apresentação, a docente fez um agradecimento especial ao mais novo doutor da Unifesp: “neste encerramento do processo de titulação, diplomamos aqui um homem único e singular, celebrando sua vida e obra, de forma que possamos continuar aprendendo contigo outros modos de pensar a relação entre os seres humanos e os não humanos e de questionar os valores que nos movem. Muito obrigado Davi Kopenawa”.
Reconhecimento mais que necessário
Renzo Taddei docente do Instituto do Mar (IMar/Unifesp) – Campus Baixada Santista e membro da Cátedra Sustentabilidade e Visões de Futuro, utiliza o púlpito para destacar o trabalho de Kopenawa
Na sequência da cerimônia, ao ser convidado para um breve discurso, Marcos Antonio Pellegrini, docente da Universidade Federal de Roraima (UFRR), médico formado pela Escola Paulista de Medicina (EPM/Unifesp) – Campus São Paulo e integrante do Projeto Xingu, destacou o necessário reconhecimento do agraciado. “Esse título é um reconhecimento à sua coragem, sua luta e todo o seu conhecimento relacionado aos povos indígenas que você representa. É uma grande alegria ver o reconhecimento autêntico e necessário do conhecimento indígena e seu modo diferente de ver o mundo. Parabenizo também a Unifesp por esse reconhecimento”
O reconhecimento foi novamente ressaltado durante o discurso panegírico, proferido por Renzo Taddei. Logo em suas primeiras palavras, Taddei referenciou que “a Unifesp está localizada justamente em território ancestral dos povos indígenas Guarani Mbya, Tupi-Guarani, Kaingang, Krenak e Terena, a quem possuímos dívidas históricas não saldadas de honra, gratidão e reparação”.
Davi Kopenawa recebendo o título de doutor honoris causa pela Unifesp
“Este é um momento ímpar na história da Unifesp. É de beleza sublime o fato de que o primeiro título honorífico da universidade seja concedido a Davi Kopenawa. Contudo, façamos dessa celebração, um momento de reflexão e apoio à luta do agraciado, que vem em um contexto de violência hedionda sofrida pelo povo Yanomami”, disse Taddei.
Além de celebrar a trajetória e feitos de Davi Kopenawa, o docente da Unifesp destacou em seu discurso panegírico as implicações mais importantes de sua grande obra literária, A Queda do Céu, e de seu pensamento para o fazer da ciência e para o mundo universitário.
Na primeira imagem, o discente Willian Jorge Pires da Silva lê um trecho do livro A Queda do Céu, de Davi Kopenawa. Na segunda imagem, a secretária do Consu/Unifesp, Maristela Feldman, faz a leitura do termo concessivo
Após destacar a inclusão da sabedoria indígena em debates de coletividades de cientistas de alto nível mais diretamente ligadas ao combate à crise ambiental causada pela modernidade ocidental, como o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) e a Plataforma Intergovernamental de Políticas Científicas sobre Biodiversidade e Serviços Ecossistêmicos (IPBES), ambos diretamente ligados à ONU e suas agências, Taddei finalizou sua fala novamente com destaque à importância do reconhecimento do trabalho de Kopenawa: “a concessão desse título honorífico é mais do que simplesmente uma declaração de apreciação de sua atuação e de suas ideias, é também uma declaração de que somos seus aliados”.
Ritual contou com discursos impactantes
Davi Kopenawa e os membros da mesa de abertura da cerimônia acompanhando os discursos
Davi Kopenawa passou por todo o ritual de concessão de título, incluindo a leitura e assinatura do ato concessivo do título de doutor honoris causa, a vestimenta doutoral, marcado pela colocação da beca com o auxílio de sua filha, Tuíra Kopenawa, o pronunciamento da concessão de grau, feito por Raiane Assumpção, e a entrega do diploma. Foram momentos de bastante atenção do público, bem como dos discursos que se seguiram, de maneira impactante.
Ao representar o Ministério dos Povos Indígenas do Brasil e sua ministra Sonia Guajajara, Juma Xipaia afirmou “estar honrada em fazer parte desse momento tão importante de respeito da ciência e dos saberes indígenas. Não há uma única ciência, há inúmeros povos com suas ciências. Esse título da Unifesp apresenta ao mundo o reconhecimento de toda a ancestralidade e de todo o saber dos povos indígenas do Brasil representada por essa grande liderança que é Davi Kopenawa”.
Renzo Taddei docente do Instituto do Mar (IMar/Unifesp) – Campus Baixada Santista e membro da Cátedra Sustentabilidade e Visões de Futuro
Em seu discurso, Juma fez um alerta para que a humanidade desperte para o que tem acontecido com o mundo. “Nossa luta nunca foi somente pelo povo indígena, algo isolado, é algo muito maior. Sempre foi por todos, pelo planeta e pela existência de todos nós. Temos que garantir para as nossas e para as próximas gerações o direito não somente de resistir, mas, principalmente, de existir”.
“É preciso que esse exemplo de valorização e reconhecimento que a Unifesp dá seja multiplicado, não só com os povos indígenas, bem como com todos aqueles detentores de saberes que habitam nessa diversidade ainda existente no Brasil,o que faz nosso país tão lindo e com tanta riqueza”, destacou.
Juma Xipaia, secretária de Articulações e Promoção dos Direitos Indígenas do Ministério dos Povos Indígenas, discursando no evento
Seu discurso foi seguido pelo do então mais novo doutor da Unifesp, Davi Kopenawa, que logo em suas primeiras palavras agradeceu o título concedido pela universidade. “Estou muito contente com esse reconhecimento da universidade em ver a minha luta pela defesa dos Yanomami e de todos os povos indígenas do Brasil. Para mim, esse título representa mais uma flecha para seguir nessa luta”.
Sem deixar de citar o horror vivido pela comunidade Yanomami nos últimos anos em decorrência do avanço do garimpo ilegal, Kopenawa também aproveitou o momento para alertar os povos não indígenas sobre o necessário cuidado com o planeta. “Hoje, com vocês da universidade, vejo que nós não estamos sozinhos. Nossa defesa é por todos. Somos um planeta só”. (Veja aqui a íntegra do discurso de Davi Kopenawa).
Raiane Assumpção, presidenta do Consu/Unifesp, durante seu discurso
O discurso final ficou por conta da reitora pro tempore da Unifesp, Raiane Assumpção. Honrada por ter Davi Kopenawa como o primeiro doutor honoris causa da universidade, Raiane ressaltou o significado da sessão pelo ineditismo e também pela figura do agraciado, mas também por toda a responsabilidade de reafirmação do compromisso compartilhado com Kopenawa e suas causas no que diz respeito à defesa do planeta e da sociedade.
“Há décadas a nossa instituição vem construindo vínculo com os povos indígenas, possibilitando assistência e produzindo conhecimento em conjunto, reiterando o compromisso da Unifesp com a formação na graduação, pela extensão e pela pesquisa e que não é no fazer por, mas no fazer com, numa produção de conhecimento que é feito com as pessoas”.
A presidenta do Consu/Unifesp assinando o termo de outorga do título de doutor honoris causa
“Ao longo dos anos fomos construindo uma forma de encontro de saberes. Saberes científicos, tradicionais, populares, que são necessários para que a nossa sociedade caminhe mais e melhor. Que possamos seguir nesse rumo, construindo uma melhor forma de existência e de formação e uma contribuição para que nosso estado brasileiro tenha um desenvolvimento para a dignidade humana”, concluiu Raiane.
Um pouco da arte de Kopenawa
Davi Kopenawa asssinando o termo de outorga do título de doutor honoris causa
Durante a cerimônia de entrega do título honoris causa à Davi Kopenawa, o público pode acessar um pouco da obra do agraciado, com a leitura de trecho do livro A Queda do Céu, feita pelo discente Willian Jorge Pires da Silva, e com a exibição de um trecho do filme Uma Mulher Pensando, do cineasta Edmar Tokorino Yanomami, que, em suas palavras, “foi feito com o objetivo de incomodar e de servir como sinal de alerta e apoio para a luta em defesa da vida”.
Autoridades presentes na sessão solene: Dácio Roberto Matheus, reitor da Universidade Federal do ABC (UFABC); Soraya Smaili, reitora da Unifesp gestão 2013 a 2021; Andrea Rabinovici, vice-reitora da Unifesp gestão 2020 e 2021; Rafael Alves Scarazzati, pró-reitor de Extensão do Instituto Federal de São Paulo (IFSP), representando o reitor da instituição; Dan Levy, chefe de gabinete da Unifesp; Maria Beatriz de Souza Henriques, coordenadora da Unidade de Preservação do Patrimônio Museológico da Secretaria de Cultura e Economia Criativa do Estado de São Paulo; Carlos Papá, cineasta e líder espiritual do povo Guarani; Cristine Takuá, diretora do Instituto Maracá e educadora das Escolas Vivas; Zysman Neiman, coordenador da Cátedra Sustentabilidade e Visões de Futuro da Unifesp, Valéria Macedo, da coordenação colegiada da Cátedra Kaapora de Conhecimentos Tradicionais e Não Hegemônicos; Sofia Mendonça, coordenadora do Projeto Xingu; Douglas Rodrigues, médico coordenador do Ambulatório de Saúde dos Povos Indígenas do Hospital São Paulo; Artionka Capiberibe, diretora do Centro de Pesquisa em Etnologia Indígena, Áurea Gil, coordenadora do Centro de Memória da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC); Fernando Stickel, diretor-presidente da Fundação Stickel; Kelly Adriano de Oliveira, gerente adjunta de Ação Cultural do SESC São Paulo; Rubens Belfort Jr, professor emérito e membro titular da Academia Brasileira de Medicina; Marlon Alberto Weichert, Procurador Regional da República no Ministério Público Federal; Daniel Munduruku, diretor presidente do Instituto Uk´A; Tata Katuvanjesi, autoridade tradicional de matriz centro africana; Renato Sztutman, diretor do Centro Ameríndios da USP; Martin Grossman, diretor da Cátedra Olavo Setubal da USP; Ana Maria Gomes, docente da UFMG e coordenadora do Observatório Educacional Intercultural Indígena, Fernanda Pitta, curadora do Museu de Arte Contemporânea da USP; Luísa Valentini, supervisora do Centro de Pesquisa e Referência do Museu das Culturas Indígenas, além de representante da liderança indígena Xokleng.
Ingestão de plástico por humanos e animais modifica células, dizem cientistas
Clive Cookson
9 de março de 2023
Novas evidências alarmantes estão surgindo sobre os danos potenciais causados pela poluição generalizada por plástico, com níveis significativos de partículas microscópicas da substância descobertas em muitos órgãos humanos e uma nova doença identificada em aves marinhas.
As pessoas consomem hoje, em média, cerca de cinco gramas de microplásticos por semana, ingeridos em alimentos e bebidas e inalados ao respirar ar poluído, disse o professor Philip Demokritou, da Universidade Rutgers, na reunião anual da Associação Americana para o Progresso da Ciência, em Washington.
“O que é realmente alarmante é que os microplásticos entram nas células e interferem nos núcleos, o que levanta preocupações sobre possíveis danos ao DNA”, disse ele. “Outro exemplo alarmante é que eles podem interferir na digestão e absorção de nutrientes importantes.”
Separadamente, no último dia 3, cientistas do Museu de História Natural de Londres anunciaram a descoberta de uma nova doença em aves marinhas causada exclusivamente pela ingestão de plástico. Eles chamaram a condição de plasticose —uma doença fibrótica causada por pequenos pedaços de plástico que inflamam o trato digestivo. A inflamação persistente danifica os tecidos, que ficam marcados por cicatrizes e deformados.
Estudando cagarras na ilha de Lord Howe, na Austrália, eles descobriram que o proventrículo —a primeira parte do estômago das aves— tinha cicatrizes generalizadas. As aves que ingeriram mais plástico tinham mais cicatrizes.
“Embora esses pássaros possam parecer saudáveis por fora, eles não estão bem por dentro”, disse Alex Bond, curador do museu encarregado dos pássaros. “Este estudo é a primeira vez que o tecido do estômago é investigado dessa maneira e mostra que o consumo de plástico pode causar sérios danos ao sistema digestivo dessas aves.”
As aves afetadas tornam-se mais vulneráveis a infecções e parasitas, enquanto perdem parte da capacidade de digerir alimentos e absorver vitaminas.
Outro estudo identificou partículas de plástico “não apenas no tecido placentário, mas também no mecônio, as primeiras fezes do bebê, o que significa que as partículas podem atravessar a placenta e chegar ao feto”, disse Campagnolo.
“Um grande número de diferentes tipos de partículas de plástico foi identificado”, acrescentou. “O mais abundante é o PVC, mas basicamente todos os outros tipos de plástico que fazem parte dos produtos de consumo diário estavam presentes.”
Craig Bennett, executivo-chefe do grupo de conservação The Wildlife Trusts, do Reino Unido, disse que a pesquisa “ressalta meu medo de que estejamos testemunhando apenas o começo do problema do plástico. Nossos mares, rios e campos já estão inundados de poluição plástica. A pesquisa mostra como os humanos e a vida natural consomem microplásticos comendo, bebendo e respirando.”
For the last four years Brazil’s rainforests bled. “They bled like never before,” said Felipe Finger as he prepared to venture into the jungle with his assault rifle to staunch the environmental carnage inflicted on the Amazon under the former far-right president Jair Bolsonaro.
Moments later Finger, a mettlesome special forces commander for Brazil’s environmental protection agency, Ibama, was airborne in a single-engine helicopter, hurtling over the forest canopy towards the frontline of a ferocious war on nature and the Indigenous peoples who lived here long before Portuguese explorers arrived more than 500 years ago.
Felipe Finger, a special forces commander for Brazil’s environmental protection agency, Ibama, leads his troops on a mission to destroy illegal mines into the Yanomami Indigenous territory. Photograph: The Guardian
Felipe Finger torches a motor used by illegal goldminers. Photograph: Tom Phillips/The Guardian
The group’s objective was Xitei, one of the most isolated corners of the Yanomami Indigenous territory on Brazil’s northern border with Venezuela. Tens of thousands of illegal miners devastated the region during Bolsonaro’s environmentally calamitous 2019-2023 presidency, hijacking Indigenous villages, banishing health workers, poisoning rivers with mercury, and prompting what his leftist successor, Luiz Inácio Lula da Silva, has called a premeditated genocide.
As Finger’s aircraft swooped down into a muddy clearing beside a Yanomami village, a handful of those miners scurried into the forest in their wellies in an attempt to avoid capture.
The motors fuelling their clandestine cassiterite mining operation were still growling as members of his six-strong unit leapt from their helicopters and fanned out across an apocalyptic landscape of sodden craters and fallen trees.
“Illegal mining on Yanomami land is finished,” declared Finger, a camouflage-clad forest engineer turned rainforest warrior whose team has been spearheading efforts to evict the prospectors since early February.
Environmental special forces burn down a mining camp in the Yanomami Indigenous territory. Photograph: Tom Phillips/The Guardian
The raid in Xitei was part of what has been hailed by the government as a historic drive to expel miners from Yanomami lands and rescue the Amazon after four years of chaos, criminality and bloodshed such as that which saw the British journalist Dom Phillips and the Indigenous specialist Bruno Pereira murdered last June.
The Guardian was one of the first media organisations granted access to those efforts, traveling deep into Yanomami territory to accompany Finger’s elite squad, the Special Inspection Group (GEF).
The group’s agents gathered early last Friday at a camp on the Uraricoera River – one of the main arteries miners use to invade the territory, which is the size of Portugal and where about 30,000 Yanomami live in more than 300 villages.
Twenty-four hours earlier a gang of illegal miners – who the government has ordered to leave the territory by 6 April – had exchanged fire with troops who blockaded the waterway in order to cut off their supplies. One miner was shot in the face.
Shortly before 11am the agents took to the skies in two Squirrel helicopters and powered south-west towards Xitei where they had spotted a series of mines during a surveillance flight the previous day.
“This region has been absolutely devastated … there are villages that are now completely surrounded by the mines,” said Finger, 43.
Aerial view of mines in the Yanomami territory. Photograph: Tom Phillips/The Guardian
Thirty minutes later his first target came into view. The helicopters corkscrewed down from a cloud-filled sky into a tawny gash in the forest where miners had been pillaging gold from protected Yanomami lands.
The miners had fled, abandoning their equipment in a muddy pit where a small brook once flowed. “They left in a hurry – just a few days ago,” Finger said as his crew trudged through their deserted encampment.
Clothes, empty packets of cigarettes and painkillers and spent 12-gauge shotgun cartridges littered the ground near a wooden sluice used to separate gold from gravel and dirt.
Finger’s troops raid an illegal goldmine in the Yanomami Indigenous territory. Photograph: Tom Phillips/The Guardian
After setting fire to the sluice and the motors that powered hoses used to blast away soil, Finger’s group reboarded their helicopters and raced towards their second target: a larger cluster of mines near the Venezuelan border.
When the Guardian last visited the Xitei region in 2007, it was a sea of largely pristine rainforest dotted with traditional communal huts and deactivated clandestine airstrips that were dynamited during the last major operation to evict miners, in the early 1990s.
Fifteen years later the jungle around Xitei has been shattered. Immense sand-coloured lacerations have replaced dark green woodlands. Ramshackle mining campsites stand where tapirs and deers once roamed. Unknown quantities of mercury have polluted rivers, poisoning the fish on which the Yanomami rely.
Yanomami villagers carry away the supplies from an illegal mining camp raided by environmental troops near the village of Xitei. Photograph: Tom Phillips/The Guardian
Dário Kopenawa, a prominent Yanomami leader, compared the environmental desecration to leishmaniasis, a disease carried by sand flies that causes horrific skin lesions and ulcers.
“Our land is so sick. Our rivers are sick. The forest’s sick … the air we breathe is sick,” he said, using a Yanomami word to describe the catastrophe that unfolded under Bolsonaro, whose anti-environmental rhetoric and crippling of protection agencies such as Ibama caused deforestation to soar.
“I would call it onokãe,” Kopenawa said. “It means a genocide which kills people, spills blood and ends lives.”
As the Ibama team landed in the cassiterite quarry, its operators scattered. Dozens of Yanomami villagers emerged from the jungle, curious about the arrival of Finger’s flying squad.
The women wore traditional red loincloths and had yellow and white beads draped over their bare chests. The men wore jaguar teeth necklaces and clutched arrows adorned with the black feathers of pheasant-like curassow birds. The children sported flip-flops and football shirts, given as gifts by the miners.
Yanomami villagers watch Finger’s troops arrive. Photograph: The Guardian
The men shook their heads when asked to name Brazil’s current and former presidents. But the consequences of Bolsonaro’s incitement of environmental crime were visible all around: the wrecked forest, the bulging sacks of illegally extracted minerals, and the filthy encampment where beer cans and tins of sardines were strewn on the ground.
Yanomami villagers watch environmental troops land in an illegal mine near their community. Photograph: Tom Phillips/The Guardian
Nearby, Finger’s team chased down one fugitive miner, a former butcher named Edmilson Dias from the mid-western state of Goiás.
Dias, a weather-beaten 39-year-old whose eight years toiling in the mines had given him the appearance of a far older man, voted for Lula in last October’s crunch election. But the miner lambasted the new president’s crackdown and insisted it would fail.
“Mining’s a fever,” the dejected miner said as he sat on a tree trunk flanked by Finger’s heavily armed troops. “If you kick me out of this mine … I’ll just go somewhere else because illegal mining will never end.”
Similar defiance could be heard around the swimming pool of the best hotel in Boa Vista, the city nearest to the Yanomami enclave. On a recent afternoon one portly mining boss sat there, swigging beer and bragging how his team had buried its gear in the jungle to prevent troops destroying it. Miners had doused the earth over the concealed objects with petrol to help them relocate their equipment by stopping the forest from growing back.
Environmental agents frisk suspected miners at a blockade along the Uraricoera River. Photograph: Tom Phillips/The Guardian
The boss predicted Lula’s clampdown would fade after six months, allowing miners to resume their multimillion dollar activities in more than 200 pits. But Lula allies are adamant they have come to the Yanomami territory to stay.
“This is Lula’s pledge and we’re all working … so this pledge becomes reality. We are determined to make this work,” said the environment minister, Marina Silva, vowing to defend other Indigenous territories ravaged by illegal mining such as those of the Munduruku and Kayapó peoples.
A Yanomami man sits beside an illegal cassiterite mining operation deep in the Indigenous territory. Photograph: Tom Phillips/The Guardian
For the Yanomami such pledges are a matter of life and death. At least 570Yanomami children reportedly died of curable diseases during Bolsonaro’s administration, partly because rampant mining gangs had caused an explosion of malaria and made it impossible for health workers to operate.
“This is a crime. There’s no other name for it – an attempted genocide,” said Silva, denouncing the “ethically, politically, morally and spiritually degrading” conditions she believed the Yanomami had been deliberately subjected to under Bolsonaro.
André Siqueira, a malaria expert who visited the Yanomami territory recently to assess the health emergency, described horrifying scenes of malnourishment and neglect. “I saw five-year-old children who weighed less than my two-year-old. Even on trips to Africa I’d never seen such levels of malnutrition. I’d only seen it in books,” he said.
Bruce Albert, an anthropologist who has worked with the Yanomami since the 70s, when miners first stormed their territory, accused Bolsonaro of seeking to “totally annihilate” the Yanomami by sabotaging efforts to shield the lands they are thought to have inhabited for thousands of years.
“Bolsonaro’s plan was a species of genocide by means of intentional negligence,” Albert said of the politician, who he believed was obsessed with military dictatorship-era conspiracy theories that hostile foreign powers wanted to annex the border region by inciting an Indigenous separatist movement. “And if Bolsonaro had had another four years [in power] his plan would have succeeded.”
Brazil’s former president has called such accusations a leftist “farce”. Dias also rejected claims miners were destroying the Yanomami.
“When our machines are all working they eat well and they live well,” he said reeling off the names of three supposed Yanomami collaborators. “Miners aren’t crooks and what they are doing to us is a total disgrace.”
Dias also denied miners were collecting gold with the use of mercury, which can cause birth defects, kidney damage and even death. Moments later, however, Finger emerged from Dias’s shack brandishing a plastic flask filled with the toxic heavy metal. “It’s not just dangerous, it’s lethal – for them [the miners] and for the Indigenous,” he bristled.
Ibama agent Rafael Sant’Ana dismantles a wooden sluice used to separate gold from dirt. Photograph: Tom Phillips/The Guardian
Dias confessed to paying about five grams of gold (£240) for the silvery substance. “It comes from X-ray machines, hospitals, that sort of thing,” he mumbled.
After Dias’s supplies were distributed to Yanomami villagers, his hovel was torched. He was fined and left in the forest to find his way home.
Finger’s troops soared back to base to clean their weapons and prepare for the next day’s mission at the vanguard of Lula’s campaign to write a new chapter for the environment, the Yanomami, and the global fight against climate change.
“We’re fighting a de facto war,” Finger said as Ibama agents frisked down a group of miners fleeing along the river behind him. “It’s a silent war that society doesn’t see – but those of us doing battle know it exists.”
Bruce Albert, o antropólogo francês que trabalha há quase 50 anos com os Yanomami, acredita que levará tempo, esforço e muitas ações para reverter o cenário desolador de desnutrição e falta de assistência de saúde ao povo indígena. “Ainda há muito trabalho pela frente para articular um sistema de assistência em saúde eficiente na Terra Indígena Yanomami que permita reverter o quadro assustador do presente”, diz ele. “A dramática situação de saúde e desnutrição causada pela invasão da mineração ilegal na TI Yanomami, e a destruição da base da subsistência indígena com os rios poluídos, a caça afugentada e as roças devastadas, estão longe de ser resolvidas.”
Albert, um dos maiores antropólogos contemporâneos, acredita que, do mesmo modo que é preciso criar um sistema de saúde duradouro na terra indígena, será necessário criar um sistema de monitoramento com imagens de satélites e drones e intervenção rápida de equipes da Funai e do Ibama, para controlar invasões na área.
“Fora da TI Yanomami também é preciso ter um planejamento de inteligência eficiente para desmantelar a logística das mineradoras ilegais”, diz. “O comércio do ouro deve ser profundamente revisto para que seja implementada, de maneira sistemática, a fiscalização da origem do metal produzido e destinado ao setor financeiro e joalheiro”, defende.
Nascido no Marrocos e doutor em antropologia pela Université Paris X Nanterre, Albert é tido como uma das maiores referências entre estudiosos dos Yanomami. Começou a trabalhar com o povo em 1975, fala bem uma das línguas e foi um dos fundadores da Comissão Pró-Yanomami, a CCPY, que conduziu com o xamã Davi Kopenawa, a célebre fotógrafa Claudia Andujar e o missionário Carlo Zacquini a campanha nacional e internacional de 14 anos pela homologação da Terra Indígena Yanomami, em 1992.
Intérprete do inquérito que ouviu sobreviventes do massacre de Haximu em 1993 – que vitimou 16 crianças, velhos, mulheres e até um bebê- Albert enxerga duas causas básicas para o drama atual que acomete o povo indígena: a abertura “escancarada” da terra indígena “a verdadeiras empresas-piratas de extração de ouro e cassiterita” e “um cínico desmantelamento de todas as estruturas assistenciais -ambientais, sociais e sanitárias-, na TI Yanomami e na Amazônia em geral.” Atribui ambos “à mortífera desgovernança do ex-presidente Jair Bolsonaro’.
Para Albert, criar o que chama de “auxílio garimpeiro” seria um erro que premiaria “a busca de lucro em atividades ilegais nas terras indígenas. E ainda pago pelo erário público, que já se encontra muito lesado pela mobilização necessária para conter e remediar estas ilegalidades, sem contar o prejuízo ecológico enorme ao patrimônio público”. Na visão do antropólogo “quem tem que financiar a saída dos garimpeiros da TI Yanomami são os donos das mineradoras clandestinas”.
Em 1992, a retirada dos garimpeiros da TI Yanomami foi “relativamente rápida, mas os Yanomami de Roraima tinham perdido 13% da sua população”, lembra. Alguns garimpeiros nunca saíram da região, conta, e quando o preço do ouro voltou a subir, retornaram em número muito maior, mecanizados e possivelmente apoiados pelo crime organizado. “As lideranças Yanomami e suas associações alertaram inúmeras vezes o governo e a imprensa sobre a iminência de uma crise humanitária sem precedentes na terra indígena. Sem resultado. Desde 2015 pouco foi feito para resolver a situação e, a partir de 2019, o governo Bolsonaro agravou a crise. Acabou se configurando uma verdadeira tentativa de genocídio.”
Albert acaba de voltar de viagem aos Estados Unidos com o amigo Davi Kopenawa e Claudia Andujar. Participaram da abertura da exposição “The Yanomami Struggle”, em Nova York, com fotos de Claudia Andujar e o trabalho de vários artistas Yanomami – Albert foi o consultor antropológico. Estiveram nas universidade de Princeton e Columbia, onde relataram o que vem ocorrendo com o povo Yanomami e encontraram o secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres.
Albert, que escreveu com Davi Kopenawa “A Queda do Céu”, prepara em março o lançamento de “O Espírito da Floresta”, também em coautoria com o xamã e editado pela Cia. das Letras. O livro reúne reflexões e diálogos que, a partir do conhecimento xamânico Yanomami, evocam imagens e sons da floresta. Ao retornar dos EUA, concedeu esta entrevista ao Valor, por escrito:
Valor: O senhor já dizia, em entrevista em 2021, que a pior catástrofe que viu em 50 anos de convívio com os Yanomami, é a que assistimos nos últimos anos. Por quê?
Bruce Albert: A trágica situação na qual se encontram atualmente os Yanomami do Brasil – que é de fato a pior em 50 anos – tem duas causas imputáveis à mortífera desgovernança do ex-presidente Jair Bolsonaro entre 2019 e 2022. A primeira é a abertura escancarada da Terra Indígena Yanomami a verdadeiras empresas-piratas de extração de ouro e cassiterita, em desprezo total das leis e da Constituição brasileiras.
Valor: E a segunda causa?
Albert: A segunda: paralelamente [à abertura da terra indígena às empresas de mineração de médio porte que atuam clandestinamente na TI Yanomami] ocorreu um cínico desmantelamento de todas as estruturas assistenciais – ambientais, sociais e sanitárias -, na TI Yanomami e na Amazônia em geral. Eu me refiro à Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), à Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai) e ao Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama).
Valor: O senhor foi intérprete do inquérito que ouviu os sobreviventes do massacre de Haximu, em 1993, quando morreram 16 crianças Yanomami, idosos, mulheres e um bebê. O massacre foi caracterizado como genocídio pelo Superior Tribunal de Justiça, a única vez, na história do país. O senhor dizia, em 2021, que tolerar o garimpo em terras indígenas configurava um crime de genocídio por omissão.
Albert: O planejamento e a execução desses dois ataques complementares contra a integridade da TI Yanomami e de seus habitantes indígenas configuram exatamente a situação descrita no artigo 2o item c da Convenção para a Prevenção e Repressão de Crime de Genocídio promulgada por decreto no Brasil [decreto no 30.822/1952, assinado por Getúlio Vargas. O artigo 2o entende por genocídio “atos cometidos com a intenção de destruir, no todo ou em parte, um grupo nacional, étnico, racial ou religioso” e o item c diz “submissão deliberada do grupo a condições de existência que acarretarão a sua destruição física, total ou parcial”]. Nos anos 90, Bolsonaro, então parlamentar, tentou por todos os meios legais impedir a demarcação da TI Yanomami. Em vão. Um decreto presidencial [assinado pelo então presidente Fernando Collor] e as disposições da Constituição de 1988 garantiram a sua homologação em 1992. Não podendo anular legalmente a TI Yanomami, Bolsonaro deixou, na sua Presidência, os Yanomami serem dizimados pelos garimpeiros. Ele deverá responder pelo crime diante da justiça nacional e/ou internacional.
Valor: O senhor pode contar algo do processo de desintrusão dos garimpeiros nos anos 90?
Albert: A desintrusão da invasão garimpeira do fim dos anos 80 começou em janeiro de 1990 com uma ação conjunta e simultânea da Polícia Federal, do Exército, do Ministério da Saúde. Imediatamente após a desintrusão entraram equipes médicas com voluntários do país inteiro mobilizadas pelo Ministério da Saúde e membros de ONG parceiras dos Yanomami, indigenistas e antropólogos, que conheciam a área e a língua yanomami. Eu mesmo trabalhei meses como intérprete nestas equipes. A desintrusão foi relativamente rápida, mas os Yanomami de Roraima tinham perdido 13% da sua população e núcleos de garimpeiros profissionais “radicais” permaneceram durante décadas entricheirados em lugares de difícil acesso na TI Yanomami.
Valor: E o que aconteceu depois?
Albert: Esse garimpo começou a expandir novamente com a subida do preço do ouro nos mercados internacionais no fim de 2015, e explodiu em proporções inéditas durante a presidência Bolsonaro, pelas razões que mencionei. No fim dos anos 80 estimava-se que os garimpeiros na TI Yanomami eram 40 mil. Em 2022 eram provavelmente ainda mais numerosos, em vista da extensão das áreas devastadas que quase quadruplicaram de 2018 a 2022 chegando a praticamente 4.500 hectares de florestas destruídas. Há anos estes garimpeiros estão submetendo mais da metade da população Yanomami a terríveis condições de degradação sanitária e desnutrição, violência, exploração sexual e degradação social. As lideranças Yanomami e suas associações alertaram inúmeras vezes o governo e a imprensa sobre a iminência de uma crise humanitária sem precedentes na terra indígena. Sem resultado. Desde 2015 pouco foi feito para resolver a situação e a partir de 2019, o governo Bolsonaro agravou a crise. Acabou se configurando uma verdadeira tentativa de genocídio.
Valor: Na sua visão, como o processo de desintrusão deveria ser feito agora, com o garimpo ilegal mecanizado e muito mais violento?
Albert: A situação é mais complexa hoje do que em 1990, é óbvio. Em 1990 assistimos a um início de mecanização e capitalização do garimpo. Em 2022 estamos frente a verdadeiras empresas ilegais de extração de ouro e cassiterita, altamente mecanizada e capitalizadas, operando com retroescavadeiras, abrindo estradas privadas na floresta, com frota de aviões e helicópteros. São protegidas por milícias com armamento pesado e provavelmente associadas ao crime organizado do sul do país, para lavagem de dinheiro. Não tem mais nada a ver com o que era, no passado, o garimpo artesanal. Aliás, chamar de “garimpo” a mineração ilegal na Terra Indígena Yanomami é hoje impróprio -pode esconder a verdadeira natureza da situação e sua extrema gravidade. O novo governo parece agir com prudência e determinação para retirar os garimpeiros da TI Yanomami, controlando o espaço aéreo para forçar, em um primeiro momento, a saída espontânea dos garimpeiros; e, em um segundo momento, implementar uma intervenção repressiva direta na área para quem tentar ficar e manter lugares de garimpo. Obviamente este planejamento, por mais bem-intencionado que seja, não é perfeito. Sabemos que os garimpeiros desabastecidos que devem sair por sua própria conta, sem controle, acabam muitas vezes roubando a ajuda humanitária levada aos Yanomami e cometendo mais violência. Muitos cruzam a fronteira da Venezuela para esperar a pressão baixar e poder voltar mais tarde, impunemente, na TI Yanomami do lado brasileiro.
Valor: O senhor acha que pode haver resistência?
Albert: Em 30 anos de garimpo na TI Yanomami, os invasores desenvolveram técnicas sofisticadas para esconder seus equipamentos. Vai ter uma grande resistência para manter a mineração clandestina na área. Os interesses econômicos envolvidos são poderosos e os políticos locais são favoráveis à mineração ilegal. Isto sem contar o envolvimento das facções criminosas no garimpo da TI Yanomami. Circulam também noticias sobre um possível auxílio público aos garimpeiros o que me parece o cúmulo do populismo.
Valor: Por quê?
Albert: “Garimpeiro” não é uma profissão permanente, só para muito poucos. Trata-se, em geral, de uma atividade ilegal temporária nas terras indígenas e pela qual abandonam um emprego. Ou buscam a atividade no desemprego, por ser mais lucrativa que um emprego legal na cidade – e isto sem falar da criminalidade profissional que é muito presente nos garimpos. Portanto, criar um “auxílio garimpeiro” seria premiar a busca de lucro em atividades ilegais nas terras indígenas. E ainda pago pelo erário público, que já se encontra muito lesado pela mobilização necessária para conter e remediar estas ilegalidades. Isso sem contar o prejuízo ecológico enorme ao patrimônio público. Nos caso dos Yanomami seria um verdadeiro “auxílio genocídio”. Quem tem que financiar a saída dos garimpeiros da TI Yanomami são os donos das mineradoras clandestinas cujos bens, mal adquiridos, devem ser confiscados e assim pagar a retirada de seus empregados abandonados na floresta.
Valor: O quadro atual levará tempo para ser revertido?
Albert: A dramática situação de saúde e desnutrição causada pela invasão da mineração ilegal na TI Yanomami, e a destruição da base da subsistência indígena com os rios poluídos, a caça afugentada e as roças devastadas, estão longe de ser resolvidas. Não basta o fluxo emergencial de cestas básicas. Pelo que soube, a ação sanitária de emergência em campo ainda é pouco organizada e sistemática, e não consegue atingir as piores áreas onde o garimpo ainda é ativo. As equipes de saúde trabalham em situações de alto risco com falta de pessoal competente e insumos médicos especializados. As ONGs médicas que conhecem a área começam apenas estes dias a ser autorizadas a colaborar no sistema de assistência emergencial. Enfim, o Distrito Sanitário Yanomami ainda não tem nova direção e não foi reestruturado, enquanto políticos locais, cúmplices do genocídio yanomami, rondam para interferir na nomeação. Ainda há muito trabalho pela frente para articular um sistema de assistência em saúde permanente e eficiente na Terra Indígena Yanomami que permita reverter o quadro assustador do presente.
Valor: Como fazer para que os garimpeiros não retornem?
Albert: Do mesmo modo que a assistência em saúde, será precisar articular um dispositivo de controle permanente na TI Yanomami. Este sistema deveria ser de monitoramento e contar com radares, imagens satélites e drones. E também com intervenção rápida de equipes da Funai, do Ibama e outros, em lugares estratégicos da terra indígena. Fora da TI Yanomami também é preciso ter um planejamento de inteligência eficiente para desmantelar a logística das mineradoras ilegais que compreende voos, combustíveis, circuitos comerciais dos insumos, por exemplo. O comércio do ouro deve ser profundamente revisto para que seja implementada, de maneira sistemática, a fiscalização da origem do metal produzido e destinado ao setor financeiro e joalheiro.
Valor: O governo Lula criou o Ministério dos Povos Indígenas. Como o senhor viu essa decisão?
Albert: Esta criação é obviamente uma vitória e um momento histórico para os povos indígenas do Brasil que reivindicaram esta decisão por muito tempo. É a primeira vez na história do Brasil que os povos indígenas ganham espaço no poder Executivo para administrar seu próprio destino.
Valor: O governador de Roraima Antônio Denarium deu entrevista à “Folha de S.Paulo” dizendo “que os Yanomami têm que se aculturar e não podem mais ficar no meio da mata, parecendo bicho”. O que acha deste pensamento, que é, também de boa parte da população?
Albert: Os ditos do governador de Roraima caracterizam um infame retorno do recalcado cultural e social do Brasil colônia, o que é inacreditável e inaceitável em 2023. Com estereótipos racistas só se pretende encobrir o extermínio dos Yanomami pela mineração selvagem invadindo suas terras. Isto é indigno de um cargo publico no Brasil contemporâneo. Alem disso, tais colocações parecem tão medíocres e anacrônicas quando o mundo inteiro reconhece a profunda sabedoria filosófica e ecológica da tradição do povo Yanomami, através de livros de pensadores como Davi Kopenawa [“A Queda do Céu”, com Bruce Albert], que foi publicado em oito idiomas. E a exposição de arte Yanomami nos museus e galerias de arte contemporâneas de São Paulo, Londres, Paris, Xangai e Nova Iorque com obras de Joseca Mokahesi e outros artistas Yanomami.
Indigenous communities protect more than 80% of the world’s remaining biodiversity.
To achieve the Sustainable Development Goal 2 of the Global Goals, Indigenous voices are crucial to ensuring that a future free of famine is created by 2030. | IFAD
As stewards of the earth, the 476 million Indigenous Peoples living across more than 90 countries have an essential role to play in our world’s future. Generations of traditional knowledge, cultural responsibility, and sustainable land management have proven how critical Indigenous voices are to both protecting our planet and solving the global food crisis.
Yet for decades, Indigenous communities and activists have called for urgent action on climate change and food security — calls that have largely gone ignored. As protectors of more than 80% of the world’s remaining biodiversity, their leadership and consultation hold the key to a resilient and sustainable future.
And two things are clear — Indigenous voices must be heard, and their recommendations must be taken seriously.
That’s why, in 2011, the Indigenous Peoples Forum (IPFI) was launched by the UN agency, the International Fund for Agricultural Development (IFAD), to ensure an in-person, open dialogue existed between communities at the heart of climate change and development agencies on the front lines. The 2023 Indigenous Peoples Forum runs from Feb. 9-13, and is bringing together Indigenous leaders to discuss food security, climate action, traditional knowledge, and more.
Indigenous communities come face to face with climate change every day — one of the reasons why it’s important that they have the opportunity to shape the future of climate action and inform adaptation measures beyond their communities.
Despite contributing the least to climate emissions, Indigenous Peoples are among the communities suffering most from its impacts, which threaten food security, livelihoods, and millennia of culture. Here are five key reasons it’s essential to make sure Indigenous voices are present at every climate discussion.
1. Custodians of Knowledge
From unusual weather patterns to land management and sustenance farming, Indigenous Peoples have spent millennia accumulating knowledge about their environment. This place-based knowledge can help us predict and adapt to accelerated climate change on a global scale, because protecting and conserving ecosystems and nature is about preserving the diversity of human cultures.
Just 6% of the global population is Indigenous. Still, they speak more than 4,000 languages, including unique words and concepts to describe how they interact with the natural environment that demonstrate a respectful, symbiotic relationship.
Triệu Thị Tàn, a traditional healer from the Dao-Que Lam community who lives in the village of Phien Phang in Northern Vietnam, used traditional knowledge to help save her daughter’s life during pregnancy using a recipe passed on by her grandmother.
Like generations before her, she collects and cultivates medicinal plants in the complex forest-based ecosystems near her home, using ancestral knowledge to grow medical plants that only survive where their original habitats are intact.
Over 3 days of productive dialogue, representatives of Indigenous Peoples around the world have gathered at IFAD to share their views and recommendations & celebrate indigenous climate leadership.
— International Fund for Agricultural Development (@IFAD) February 13, 2023
2. Life-Saving Food Systems
The climate crisis is driving up rates of hunger worldwide. Today, the realities of globalized networks and years of compounding crises, like war and COVID-19, have uncovered the weaknesses in the global food system. From 2019 to 2022 alone, the number of malnourished people grew by as many as 150 million.
One of the best solutions is to build resilient food systems at the community level, with Indigenous knowledge serving as both beneficiaries and drivers of the answers we need to curb hunger.
The food systems of Indigenous Peoples’ have traditionally provided healthy diets anchored in sustainable livelihood practices. One of the main goals of the International Fund for Agricultural Development (IFAD) has always been to place small-scale farmers and other rural people at the heart of work to transform food systems, fostering action-orientated and sustainable solutions for food systems around the world.
This includes IFAD’s investment in Slow Foods — a program that’s dedicated to enhancing “local value chains for traditional foods” and which operates across 86 countries, helping Indigenous farmers sustain traditional crops and farming practices while protecting biodiversity and species at risk of extinction. Farmers are then encouraged to scale production to sell on the national commercial market, like cities and wholesale producers.
Smallholder farmers, who are already facing drought and extreme weather events, will continue to face the biggest future impacts of climate change. Programs like Slow Foods help preserve generational farming that could inform sustainability agriculture for the future, promote nutrition security worldwide, and generate income at the community level.
3. Protecting Biodiversity
Biological diversity, or biodiversity for short, is the variety of all living things, as well as how these species interact with each other. These interactions can either lead to species extinction or the creation of new ones, a natural process that exists in harmony with the sustainable practices championed by Indigenous communities.
Of the world’s remaining biodiversity, a massive 80% is located in the lands of Indigenous Peoples, who use sustainable farming methods and land management practices that help protect this biodiversity. Preserving biodiversity and reducing the greenhouse gas emissions across the world is crucial to tackling the climate crisis.
Centuries of deforestation, the expansion of agricultural land, the hunting of wildlife, as well as the more recent additions of fossil fuels, and the impacts of climate change have put Indigenous communities and our planet at risk.
That’s why this year’s Indigenous Peoples Forum is convening under the theme “Indigenous Peoples’ climate leadership: community-based solutions to enhance resilience and biodiversity” in support of Indigenous Peoples and their role in protecting diversity, “one harvest at a time.“
In the Peruvian Amazon, employment opportunities in gas exploration have drawn many Indigenous communities to jobs in the field. But when strict COVID-19 laws in 2020 forced mining work sites to close, many Indigenous families returned to farming on their traditional lands as a means of survival, using knowledge and conservation-based agricultural practices that protected their livelihoods and the environment.
— International Fund for Agricultural Development (@IFAD) February 12, 2023
4. Safeguarding Conservation and Wildlife
While the exact amount isn’t known, it’s estimated that 50-65% of the world’s land is held by Indigenous Peoples and other communities, serving up to 2.5 billion Indigenous and non-Indigenous people who depend on that land for their livelihoods and well-being.
Almost two-thirds of that land is considered “essentially natural,” — an internationally recognized legal term to describe how Indigenous communities live in harmony with nature and the essential role they play in its conservation. In 2022, this was recognized at the UN Biodiversity Conference (COP15) in Canada when 190 countries signed onto the “30 x 30′ Agenda” calling for the protection of 30% of the world’s land and sea biodiversity while recognizing the role of Indigenous communities play as “stewards of nature.”
As one example, the Indigenous community of the Manobo people in the Philippines has protected their homeland, Pangasinan Island, through cultivation and land care practices for centuries, writes Vox. Centuries of “intuitive” cultivation have contributed to an island abundant in wildlife, allocating specific hunting seasons and dedicated areas for farming.
Within decades, millions of animals and plants will be at risk of extinction due to a decline in biodiversity worldwide at rates never witnessed in human history. Our climate is changing, and its effects are felt in all aspects of life, including food security, gender equality, political stability, and peace. Indigenous Peoples hold the key to developing future solutions, thanks in part to open forums like the The Indigenous Peoples’ Forum at IFAD, which draw on the wealth of knowledge, wisdom, and leadership their communities provide.
📸: Indigenous leaders from all over the world are at IFAD, sharing inspiring stories of resilience.
Indigenous Peoples have ancestral knowledge and unique approaches that are invaluable in battling the #ClimateCrisis. We should all learn from them. pic.twitter.com/RQjexWNEWq
— International Fund for Agricultural Development (@IFAD) February 10, 2023
Driven by the impacts of the war against Ukraine, the COVID-19 pandemic, and climate change, the world faces the largest food crisis in modern history. Indigenous knowledge will play an important role in preventing future food crises and solving the current one. Through community-based action and national and international advocacy, they’re generating practical adaptation initiatives, and solutions for our future.
OUTRO LADO: Defesa Civil diz que enviou SMS para 34 mil celulares cadastrados na região do litoral norte
Isabela Palhares
22 de fevereiro de 2023
O Cemaden (Centro Nacional de Monitoramento e Alerta para Desastres Naturais) afirma ter alertado o Governo de São Paulo cerca de 48 horas antes sobre o alto risco de desastre no litoral paulista.
Segundo o Cemaden, que é um órgão federal, a Defesa Civil estadual foi alertada sobre a ocorrência de chuvas fortes na região e o alto risco de desastres em uma reunião online na manhã de sexta (17). A vila do Sahy, o ponto em que mais pessoas morreram, foi citada como uma área de alto risco para deslizamento.
Em nota, a Defesa Civil diz que emitiu alertas preventivos à população desde que foi informada da previsão de fortes chuvas.
“Nós alertamos e avisamos a Defesa Civil na sexta, foram quase 48 horas antes de o desastre acontecer. Seguimos o protocolo que é estabelecido, alertando a Defesa Civil estadual para que ela se organizasse com os municípios”, disse Osvaldo Moraes, presidente do Cemaden.
O Cemaden é ligado ao Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação. O centro é responsável por monitorar índices meteorológicos e geológicos e alertar, caso necessário, os órgãos de prevenção.
Moraes diz que, ainda na quinta-feira (16), um boletim meteorológico já indicava as fortes chuvas na região. Esse boletim foi repassado para a Defesa Civil do estado.
Depois desse primeiro alerta, o Cemaden se reuniu com um representante da Defesa Civil estadual na sexta de manhã. “Nós emitimos boletins diários, o de quinta já indicava o risco. Mas o de sexta-feira aumentou o nível de alerta para essa região.”
A Defesa Civil disse que enviou 14 alertas de mensagem de texto (SMS) para mais de 34 mil celulares cadastrados na região do litoral norte. O órgão informou ainda que começou a articular ações as defesas civis municipais na quinta-feira quando recebeu a previsão de fortes chuvas na região.
“Os primeiros avisos divulgados pela Defesa Civil do Estado, que ocorreram ainda de forma preventiva, foram publicados por volta das 15 horas de quinta-feira, nas redes sociais da Defesa Civil e do Governo com informações sobre o volume de chuvas estimado para o período, bem como as medidas de segurança que poderiam ser adotadas pela população em áreas de risco”, diz a nota.
O órgão disse ainda que à 00h52 de sexta, ao acompanhar imagens de radares e satélites, enviou a primeira mensagem de SMS com o alerta.
Nas redes sociais da Defesa Civil, a primeira mensagem de alertas para chuvas fortes no sábado foi feita às 12h22. A mensagem, no entanto, não fala sobre os riscos de desmoronamento.
Durante a noite, outros alertas foram postados pelo órgão e nenhum deles faz menção ao risco de desmoronamento de terra. Foi só às 19h49 uma mensagem recomendou que as pessoas deixassem o local se precisassem.
Para os especialistas, a proporção do desastre e o elevado número de vítimas mostram que apenas a estratégia de envio de SMS aos moradores não é eficiente. Além de não ser possível saber se as pessoas viram os alertas, não havia um plano ou orientação sobre o que fazer na situação.
“Você cria um sistema de aviso, as pessoas podem até receber a mensagem, mas não sabem o que fazer com aquela informação. Não há uma orientação para onde devem ir, quando sair de casa, o que levar”, diz Eduardo Mario Mendiondo, coordenador científico do Ceped (Centro de Estudos e Pesquisas sobre Desastres) da USP.
Para ele, a estratégias devem pensar também criação de rotas de fugas em áreas de risco e na orientação aos moradores. “A população precisa saber qual o risco está correndo e como se proteger. É injusto depois dizer que eles não queriam sair de casa, eles não tinham orientação correta do que fazer.”
Segundo ele, em diversas cidades do país, como Petrópolis e Salvador, o alerta ocorre por uma sirene.
“Você garante que todo mundo vai ouvir a qualquer momento do dia. É o instrumento mais antigo, mas que funciona. Uma sirene dá o recado claro do risco iminente”, diz.
Para Fernando Rocha Nogueira, coordenador do LabGRIS (Laboratório Gestão de Riscos) da UFABC, as autoridade brasileiras assistem de forma inerte aos desastres que ocorrem no país. Segundo ele, o Brasil conta com bons sistemas de monitoramento, mas não desenvolve estratégias para proteger a população.
“Temos um problema grave de comunicação no país. Tinha o mapeamento de que iria chover muito, que havia um alto risco e não se deu a atenção devida. Milhares de pessoas desceram para o litoral, ignorando a previsão. Nós não temos conscientização do risco, nós vivemos um negacionismo das informações climáticas”, diz.
Como foram os avisos
Quinta-feira (16) Boletim do Cemaden alerta para a ocorrência de chuvas fortes e volumosas no litoral paulista durante o Carnaval
Sexta-feira (17) Em reunião virtual, o Cemaden faz alerta sobre a previsão de chuvas fortes e o risco de deslizamentos de terra para integrantes da Defesa Civil do estado. A vila do Sahy estava entre as áreas apontadas como de maior risco
Sábado (18)
12h22: Defesa Civil do Estado avisa nas redes sociais que a chuva estava se espalhando pela região de Ubatuba e Caraguatatuba. “Tem vento e raios. Atinge municípios vizinhos. Tenha cuidado nas próximas horas”, diz a mensagem
18h33: Uma nova mensagem da Defesa Civil é postada alertando para chuva persistente na região.
19h49: Outra mensagem é postada pela Defesa Civil diz que a “chuva está se espalhando” pelo Litoral Norte e pede para que as pessoas “tenham cuidado nas próximas horas”
23h13: A Defesa Civil alerta que a chuva persiste na região e recomenda “não enfrente alagamentos. Fique atento a inclinação de muros e a rachaduras. Se precisar saia do local”
03h15: O órgão volta a alerta sobre a chuva forte e persistente no litoral norte e diz “não enfrente alagamentos. Fique atento a inclinação de muros e a rachaduras. Se precisar saia do local.”
Especialistas apontam falta de investimento e defasagem do modelo; temporal foi agravado por ciclone extratropical, diz meteorologista
Carlos Petrocilo
22 de fevereiro de 2023
A falta de investimento em novas tecnologias, aliada à aceleração das mudanças climáticas, torna a previsão do tempo mais imprecisa no Brasil, segundo especialistas ouvidos pela Folha.
O serviço de meteorologia é essencial para que órgãos públicos, como Defesa Civil, se preparem com antecedência na tentativa de mitigar os efeitos de um temporal.
Como consequência do temporal, 48 pessoas morreram, sendo 47 em São Sebastião e uma em Ubatuba, conforme os dados desta quarta (22).
Segundo o professor Eduardo Mario Mendiondo, coordenador científico do Ceped (Centro de Educação e Pesquisa de Desastres) da USP, os modelos atuais de previsão utilizam parâmetros atmosféricos calibrados por condições históricas e precisam ser atualizados.
“O clima está mudando, com maior magnitude e com maior frequência de ocorrência de extremos. Os modelos precisam ser atualizados de forma constante, em escala global e em regiões específicas, com microclima e dinâmicas peculiares, como é o caso da Serra do Mar e da Baixada Santista”, afirma Mendiondo.
O professor chama atenção para falta de investimentos públicos. Segundo ele, o governo precisa reforçar o quadro de servidores e investir em novas ferramentas para Cemaden (Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais), Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais) e Inmet (Instituto Nacional de Meteorologia).
“Falta aumentar em 20 vezes o potencial de supercomputadores atuais em território nacional, falta contratar até 20 vezes o número servidores de manutenção e operação de supercomputadores e falta contratar até em dez vezes o número atual de técnicos operadores”, afirma o professor da USP.
Para suprir tais necessidades, Mendiondo estima que é necessário investimentos de R$ 25 bilhões por ano. “Isto para converter essas novas evidências científicas, melhorando as previsões, seguindo exemplos como Japão, Europa e Estados Unidos.”
O meteorologista Mamedes Luiz Melo afirma que o volume de chuva foi agravado pela ação do ciclone extratropical associado a uma frente fria que passou pelo Sul do país e por São Paulo. “A tecnologia vinha alertando, mas estamos lidando com algo móvel na atmosfera”, afirma Melo.
A Defesa Civil diz, em nota, que os boletins especiais e de aviso de risco meteorológicos são emitidos com base em simulações numéricas de previsão do tempo. “Tais limiares baseiam-se no histórico da chuva da região em que a chuva acumulada representa risco para transtornos, como deslizamentos, desabamentos, alagamentos, enchentes e ocorrências relacionadas a raios e ventos”, disse a Defesa Civil.
As projeções do Inmet, que emite alertas sobre riscos de deslizamentos para órgãos públicos, previram volumes de chuva menores do que um modelo usado pela empresa de meteorologia MetSul.
O modelo da empresa, chamado WRF, apontou que algumas áreas poderiam ter chuva acima de 600 mm em alguns pontos do terreno, o que acabou se confirmando. As previsões mais graves do instituto federal falavam em chuvas no patamar de 400 mm.
A previsão do Inmet para a chuva no litoral norte utilizou seis modelos numéricos diferentes. O instituto também usa o WRF, mas com uma resolução menor do que a da MetSul. Ou seja, a empresa conseguiu fazer os cálculos a partir de detalhes mais precisos do relevo do que o órgão público.
“O WRF tem se mostrado uma ferramenta muito importante na identificação de eventos extremos de chuva”, diz a meteorologista Estael Sias, da MetSul. “É importante assinalar que o modelo WRF é meramente uma ferramenta de trabalho, um produto, e não a previsão, e que o prognóstico final divulgado ao público e clientes leva em conta outros modelos e também a experiência do meteorologista para eventos extremos.”
Segundo o meteorologista Franco Nadal Villela, da equipe do Inmet em São Paulo, a resolução não é o fator mais decisivo na previsão de chuvas. Ele diz que os modelos usados pelo instituto deram conta de prever que o temporal em São Sebastião seria muito grave, embora não tenham chegado ao valor de 600 mm.
“Há modelos de menor resolução que pontualmente previram menos precipitação”, diz Villela. “As previsões modeladas estavam prevendo bem este evento e as variações na quantificação de precipitação [volume de chuva por hora] são mais uma das varáveis que ponderamos para emitir alertas.”
A Folha enviou perguntas através de email ao Inpe, que coordena o Centro de Previsão de Tempo e Estudos Climáticos (Cptec), mas não obteve resposta até a publicação deste texto.
Para José Marengo, climatologista e coordenador do Cemaden, defende mudanças [sic]. Ele explica que o modelo de previsão do tempo divide a região em áreas de até 200 quilômetros quadrados. Com isso, não é possível prever a quantidade de chuva aproximada em toda a região.
“O Brasil não está preparado tecnologicamente. É como se dividisse o Brasil em caixas grandes de 200 quilômetros quadrados, por isso há distorções dentro da mesma região. Pode ter áreas em que chove menos e outras que superaram os 600 milímetros, a modelagem não é perfeita”, afirma Marengo.
Ele também alerta para a falta de novas tecnologias. “O supercomputador do Inpe, o Tupã, que resolve as equações matemáticas em alta velocidade, é de 2010 e considerado obsoleto”, afirma o climatologista.
O professor Pedro Côrtes, do Instituto de Energia e Ambiente da USP, concorda que é área precise de mais recursos, mas pondera que as previsões dos órgãos do governo foram suficientes para apontar que uma tempestade grave se aproximava.
“A espera pelo investimento não pode postergar a solução do problema, as previsões já funcionam.”
A Folha publicou, no dia 28 de dezembro de 2010, a inauguração do supercomputador. Na ocasião, o Tupã custou R$ 31 milhões e era utilizado em países como Estados Unidos, China, Alemanha e Rússia. Para operá-lo, o Inpe precisou construir uma nova central elétrica, de mil quilowatts —antes tinha só 280 quilowatts disponíveis no instituto.
Até hoje os especialistas apontam o Tupã como o melhor equipamento que o Brasil possui para prever, além de enchentes, ondas de calor e frio e os períodos de seca.
Microplastics found washed up on a beach. About 11 percent of microplastics in the atmosphere over the western U.S. come from the ocean. Visual: Alistair Berg/DigitalVision via Getty Images
Airborne microplastics can absorb or reflect sunlight and seed clouds. How might that change the planet’s trajectory?
Plastic has become an obvious pollutant over recent decades, choking turtles and seabirds, clogging up our landfills and waterways. But in just the past few years, a less obvious problem has emerged. Researchers are starting to get concerned about how tiny bits of plastic in the air, lofted into the skies from seafoam bubbles or spinning tires on the highway, might potentially change our future climate.
“Here’s something that people just didn’t think about — another aspect of plastic pollution,” says environmental analytical chemist Denise Mitrano of ETH Zürich University, in Switzerland, who co-wrote an article last November highlighting what researchers know — and don’t yet know — about how plastics can change clouds, potentially altering temperature and rainfall patterns.
This story was originally published by the Yale Environment 360 and is reproduced here as part of the Climate Desk collaboration.
Clouds form when water or ice condenses on “seeds” in the air: usually tiny particles of dust, salt, sand, soot, or other material thrown up by burning fossil fuels, forest fires, cooking, or volcanoes. There are plenty of these fine particles, or aerosols, in the skies — a lot more since the Industrial Revolution — and they affect everything from the quality of the air we breathe, to the color of sunsets, to the number and type of clouds in our skies.
Until recently, when chemists thought of the gunk in our air, plastics did not leap to mind. Concentrations were low, they thought, and plastic is often designed to be water repellent for applications like bags or clothing, which presumably made them unlikely to seed cloud droplets. But in recent years, studies have confirmed not only that microscopic pieces of plastic can seed clouds — sometimes powerfully — but they also travel thousands of miles from their source. And there are a lot more particles in the air than scientists originally thought. All this has opened researchers’ eyes to their potential contribution to atmospheric murk — and, possibly, to future climate change.
“The people who invented plastics all those decades ago, who were very proud of inventions that transformed society in many ways — I doubt they envisaged that plastics were going to end up floating around in the atmosphere and potentially influencing the global climate system,” says Laura Revell, an atmospheric scientist at the University of Canterbury in New Zealand. “We are still learning what the impacts are for humans, ecosystems, and climate. But certainly, from what we know so far, it doesn’t look good.”
Global annual production of plastics has skyrocketed from 2 million tons in 1950 to more than 450 million tons today. And despite growing concerns about this waste accumulating in the environment, production is ramping up rather than slowing down — some oil companies are building up their plastic production capacity as the demand for fossil fuel declines. To date, more than 9 billion tons of plastic has been produced, and about half of it has gone to landfills or been otherwise discarded. Some project that by 2025, 11 billion tons of plastic will have accumulated in the environment.
Plastic has been found in soils, water, crops, and on the ocean floor. And in recent years, several studies have suggested that microplastics (pieces less than 5 millimeters in length) and nanoplastics (smaller than approximately 1,000 nanometers) were being transported long distances through the air. In 2019, for example, researchers found microplastics in the Pyrenees that had arrived via rain or snowfall. In 2020, Janice Brahney of Utah State University and four co-authors published a high-profile Science paper revealing high amounts of plastic in federally protected areas of the United States. Brahney had found the plastic by accident; she had been looking for phosphorus, but was surprised by all the colorful bits of gunk in her ground-based filters. Her study led to a slew of headlines warning, “It’s raining plastic.”
Brahney’s extensive U.S. dataset also opened the door for modelers to figure out where, exactly, all this plastic was coming from. “It’s a really beautiful data set,” says Cornell University’s Natalie Mahowald, who did the modeling work.
Mahowald took the plastic concentrations Brahney had cataloged and mapped them against atmospheric patterns and known sources of plastics, including roads, agricultural dust, and oceans. On roadways, tires and brakes hurl microplastics into the air. Plastic winds up in agricultural dust, notes Mahowald, in part from plastics used on farm fields and in part because people toss fleece clothing into washing machines: The wastewater flows to treatment plants that separate solids from liquids, and about half the resulting biosolids get sent to farms for use as fertilizer. As for the ocean, Mahowald says, big globs of plastic in places like the Pacific Gyre degrade into microscopic pieces, which then float to the surface and are whipped up into the air by chopping waters and bursting air bubbles.
Mahowald’s model concluded that over the western U.S., 84 percent of microplastics were coming from roads, 5 percent from agricultural dust, and 11 percent from the oceans. Plastic is so lightweight that even chunks tens of micrometers across — the width of a human hair — can be lofted and blown great distances. The model revealed that some of this plastic was found thousands of miles from its presumed source. The smaller the pieces, the longer they can stay aloft.
While individual bits of plastic may stay in the air for only hours, days, or weeks, there’s so much being kicked up so consistently that there’s always some in the air: enough that plastic bits are now also found in human lungs. “We’re definitely breathing them right now,” says Mahowald.
Working out exactly how much plastic is in our skies is extremely difficult. Most of these studies are done by painstakingly teasing bits of plastic out of filters and examining them under a microscope to get an estimate of shape and color, then using spectroscopic techniques to confirm their source material. The smaller the pieces, the harder they are to identify. Studies can also be plagued by contamination: Walking into a lab wearing a fleece sweater, for example, can skew results with shedding plastic microfibers.
Nearly a dozen studies have shown airborne microplastic concentrations ranging from between 0.01 particles per cubic meter over the western Pacific Ocean to several thousand particles per cubic meter in London and Beijing. The cities showing higher levels are probably genuinely more polluted, says Revell, but it’s also true that those studies used a more-sensitive technique that could identify smaller bits of plastic (under 10 micrometers in size). The other studies would have missed such smaller pieces, which made up about half the plastic found in the London and Beijing studies.
Plastic bits are now found in human lungs. “We’re definitely breathing them right now,” says Mahowald.
Concentrations of airborne nanoplastics are understood even less. The numbers floating around today, says atmospheric chemist Zamin Kanji, Mitrano’s colleague at ETH Zürich, are likely to be “significantly underestimated.”
For now, the proportion of plastics to total airborne aerosols is tiny, so plastics aren’t contributing much to aerosol climate impacts, says Mahowald. Even in London and Beijing, plastic may account for only a millionth of the total aerosols. But plastic production, and the accumulation of plastic in the environment, keeps going up. Says Mahowald, “It’s only going to get worse.”
That’s especially true in less polluted regions — like over the oceans of the Southern Hemisphere, Kanji says. Since plastic can likely travel farther than other, denser aerosols, it could become a dominant airborne pollutant in more pristine areas. Brahney and Mahowald’s paper concludes that plastic currently makes up less than 1 percent of anthropogenic aerosols landing on the ground but they could, “alarmingly,” make up more than 50 percent of the aerosols landing on some parts of the ocean downwind from plastic sources.
Exactly how aerosols affect climate has been a critical sticking point in climate models, and many of the details are still unknown. Different aerosols can change the climate by either reflecting or absorbing sunlight, which can depend, in part, on their color. Black soot, for example, tends to have a warming effect, while salt reflects and cools. Aerosols can land on the ground and change the albedo, or reflectivity, of ice and snow.
Aerosols also affect cloud formation: Different bits and pieces can seed more and smaller droplets of water or ice, making for different types of clouds at different elevations that last for different amounts of time. High-altitude, thin, icy clouds tend to warm the Earth’s surface like a blanket, while low-altitude, bright and fluffy clouds tend to reflect sunlight and cool the Earth.
Though tiny, aerosols have an oversized influence on climate. The murk of anthropogenic aerosols in the sky has, overall, had a dramatic cooling effect since the Industrial Revolution (without them, global warming would be 30 to 50 percent greater than it is today). And they have more sway on extreme weather than greenhouse gases do: A world warmed by removing aerosols would have more floods and droughts, for example, than a world warmed the same amount by CO2.
Revell and her colleagues took a stab at trying to model how microplastics might affect temperature by either reflecting or absorbing sunlight, a calculation of what’s known as “radiative forcing.” For simplicity’s sake, they assumed that plastic is always clear, even though that’s not true (and darker material tends to absorb more sunlight), and that the global concentration is uniformly one particle per cubic meter, which is on the order of 1,000 times lower than concentrations measured in, say, London.
With those assumptions, Revell found that plastic’s direct impact on radiative forcing is “so small as to be insignificant.” But, importantly, if concentrations reach 100 particles per cubic meter (which they already have in many spots), plastics could have about the same magnitude of radiative forcing as some aerosols already included in Intergovernmental Panel on Climate Change assessments. In other words, plastics become noteworthy. But whether they would warm, or cool, the Earth is unknown.
Though tiny, aerosols have an oversized influence on climate.
Aerosols often have a greater impact on the climate through their influence on clouds. Pristine plastic beads, Kanji notes, repel water and so are unlikely to affect clouds. But plastic can “age” in a matter of hours, says Kanji, during its transit to the sky: It can be abraded, or it can accumulate salt from the ocean and other chemicals from the atmosphere, all of which can make the particles more water-loving. Plastic pieces can also contain nooks and crannies, which aid in the formation of ice.
In the lab, Kanji’s student Omar Girlanda has run preliminary tests showing that under such battered conditions, plastic pieces can be potent cloudmakers. “Some of them are as good as mineral dust particles,” says Kanji, “which is the most well-known, effective ice nucleus out there.”
Kanji says skies heavily polluted with plastic will probably make both more high-altitude ice clouds, which tend to warm the Earth’s surface, and more low-altitude water clouds, which tend to cool the Earth. Which effect will dominate is unknown. “It doesn’t make sense to model it at the moment, given the poor estimates we have of [atmospheric] plastic,” says Kanji. Plastic could also affect precipitation patterns: In general, Kanji says, clouds that are more polluted tend to last longer before bursting into rain than do less polluted clouds, and then they rain more heavily.
Revell and her colleagues are now whittling down the assumptions in their paper, working out more detailed calculations for more realistic estimates of plastic concentrations, colors, and sizes. “All we know is that the problem is not going to go away anytime soon,” she says. “These plastics are incredibly long lived. They’re breaking down, and they’re going to be forming new microplastics for centuries. We just don’t know how big the problem is that we’ve committed ourselves to.”
Nicola Jones is a freelance journalist based in Pemberton, British Columbia. Her work can be found in Nature, Scientific American, Globe and Mail, and New Scientist.
It was late fall of 2022 when David Stallknecht heard that bodies were raining from the sky.
Stallknecht, a wildlife biologist at the University of Georgia, was already fearing the worst. For months, wood ducks had been washing up on shorelines; black vultures had been teetering out of tree tops. But now thousands of ghostly white snow-goose carcasses were strewn across agricultural fields in Louisiana, Missouri, and Arkansas. The birds had tried to take flight, only to plunge back to the ground. “People were saying they were literally dropping down dead,” Stallknecht told me. Even before he and his team began testing specimens in the lab, they suspected they knew what they would find: yet another crop of casualties from the deadly strain of avian influenza that had been tearing across North America for roughly a year.
Months later, the bird-flu outbreak continues to rage. An estimated 58.4 million domestic birds have died in the United States alone. Farms with known outbreaks have had to cull their chickens en masse, sending the cost of eggs soaring; zoos have herded their birds indoors to shield them from encounters with infected waterfowl. The virus has been steadily trickling into mammalian populations—foxes, bears, mink, whales, seals—on both land and sea, fueling fears that humans could be next. Scientists maintain that the risk of sustained spread among people is very low, but each additional detection of the virus in something warm-blooded and furry hints that the virus is improving its ability to infiltrate new hosts. “Every time that happens, it’s another chance for that virus to make the changes that it needs,” says Richard Webby, a virologist at St. Jude Children’s Research Hospital. “Right now, this virus is a kid in a candy store.”
A human epidemic, though, remains a gloomy forecast that may not come to pass. In the meantime, the outbreak has already been larger, faster-moving, and more devastating to North America’s wildlife than any other in recorded history, and has not yet shown signs of stopping. “I would use just one word to describe it: unprecedented,” says Shayan Sharif, an avian immunologist at Ontario Veterinary College. “We have never seen anything like this before.” This strain of bird flu is unlikely to be our next pandemic. But a flu pandemic has already begun for countless other creatures—and it could alter North America’s biodiversity for good.
Deadly strains of avian flu have been ferried onto North American shores multiple times before, and rapidly petered out. That was the case in 2014, when a highly virulent version of the virus crossed the Pacific from Asia and invaded U.S. poultry farms, forcing workers to exterminate millions of chickens and turkeys. The brutal interventions worked: “They did all the right things, and nipped it in the bud,” says Nicole Nemeth, a veterinary pathologist at the University of Georgia. Hardly any wild birds were affected; egg prices bumped up briefly, then settled back roughly to baseline. “It just kind of died down,” Nemeth told me. “And everyone breathed a sigh of relief.”
Some birds are likely to make it through the outbreak just fine. For as long as humans have been aware of this particular strain of avian influenza, scientifically classed as H5N1, the virus has been relatively gentle on certain types of waterfowl, especially mallards, pintails, and other so-called dabbling ducks. “Some populations have a prevalence as high as 40 percent, and they’re as normal as normal could be,” Stallknecht said. Those same species have also been some of avian flu’s best chauffeurs in the past, silently spreading the feces-borne infection across countries and continents during their seasonal migrations.
Others haven’t been so lucky. Some of the same respiratory issues that strike humans who have the flu—sneezing, coughing, pneumonia when the disease gets severe—can hit birds, too. But across a variety of susceptible species, necropsies show more extensive damage, with evidence of virus in various organs, including the liver, gut, and brain. The neurologic problems can be among the worst: Swans might swim in listless circles; geese might waddle shakily onto shores, their necks twisted and turned; eagles might flap defeatedly from their perches, unable to launch themselves into the air. Michelle Hawkins, a veterinarian at UC Davis, told me that several of the red-tailed hawks she’s treated in her clinic have arrived with their eyes shaking so vigorously from side to side that the spasms turn the animals’ head; others appear to gaze off into nothingness, unresponsive even when humans approach.
Death can come swiftly—sometimes within a day or two of the infection’s start. Birds simply keel over as if they’ve been shot, their bodies dropping like rocks. On poultry farms, outbreaks can wipe out entire flocks in just two or three days. In wilder settings, locals have spotted bald eagles plummeting out of their nests, leaving shrieking chicks behind. By the time infected birds reach Hawkins in her clinic, “they’re usually almost dead,” she told me. “And we can’t figure out how to help them except to put them out of their misery.” Hawkins estimated that in the past few months alone, her team’s euthanasia rate has gone up by about 50 percent.
Mammals so far haven’t fared much better. Last spring, the corpse of a dolphin infected with the virus was found wedged into a canal in Florida—around the same time that Wisconsin locals happened upon litters of ailing fox kits, drooling, twitching, and struggling to stand in the hours before they seized and died. In the fall, three young, flu-stricken grizzlies in Montana were euthanized after researchers noticed that the disoriented animals had begun to go blind. Wendy Puryear, a molecular virologist at Tufts University, told me that seals sick with the virus will sometimes convulse so badly that they can barely hold their bodies straight. Every seal she’s seen that tested positive has ended up dead within days. This month, researchers in Peru reported that they were picking up the virus in some of the sea lions that have died by the hundreds along the country’s coast; a similar situation may now be playing out among a number of Scotland’s seals.
It’s hard to say why this outbreak is so much worse than the ones that came before. Microbial evolution may be one culprit: Flu viruses are particularly inclined to tweak their RNA code; when two genetically distinct versions of the pathogens wind up in the same cell, they can also swap bits of their genomes. This iteration of H5N1 may be particularly adept at sparking lethal disease—something Justin Brown, a veterinary pathologist at Penn State, thinks is quite likely, given how many animals have died. It may also be more easily exiting birds’ bodies in feces, or more efficiently entering cells in the airway or gut. “This particular virus seems to be better adapted to wild birds. I think that’s the key thing,” Stallknecht told me. As climate change alters migration schedules, and pushes certain avian species into more frequent contact with one another’s contaminated scat, the risks of intermingling are only growing. The greater the number of infections, the more animals will die. “It becomes a numbers game,” Stallknecht said.
Flu viruses have never had much trouble spreading: They can be breathed out or defecated; they can persist on surfaces for hours, and in cool waters for days. But Webby suspects that the ballooning of this epidemic can be at least partly blamed on the severity of disease. “The easiest birds to catch are the ones that are sick,” he told me. Hawks, eagles, owls, and other predatory birds may be stumbling across dying ducks and eating them, unwittingly infecting themselves. Nemeth thinks that certain species, including black vultures, are now cutting out the middlebird and feasting on the carcasses of their own kin as they continue to die in droves. “They see dead tissue, they’re going to eat it,” she told me. It’s a morbid tragedy of abundance, as the virus climbs the food chain to reach species it hasn’t easily accessed before. “The biggest impact is on these atypical hosts,” Webby told me, which lack the prior exposures to the virus that might have helped protect them.
Predation or scavenging of sick or dead birds is probably how certain mammals—grizzlies, foxes, opossums, and the like—are catching the virus too. The seals and dolphins present a bit more of a puzzle, Puryear told me, though it’s possible to guess at what’s at play. At least some types of seals have been documented consuming birds; other marine mammals might simply be gulping feces-infested water. A recent avian-flu outbreak at a mink farm in Spain suggests a more troubling mode of transmission: mammals repeatedly conveying the virus to one another—a possible first for H5N1. “That is really disconcerting,” Sharif told me. “It tells me the virus is adapting to mammals.”
Animals vulnerable to the virus don’t have many good options for protection. Some avian-flu vaccines have been used on certain poultry farms, mostly abroad. But some of the same issues that plague human-flu vaccines are obstacles in the bird world too, Brown told me: The ingredients of the shots aren’t always good matches for the circulating virus, and the immunizations, which may be pretty good at staving off severe disease, don’t do much to block infection or transmission, making outbreaks tough to contain. Wild birds, which can’t be corralled and immunized en masse, are essentially out of luck. Nemeth told me that some of her colleagues in Florida have been trying to clear the ground of carcasses so that they won’t become sources of infection for yet another unlucky mammal or bird. “But they just can’t keep up with the number of deaths,” she said. Essentially all avian species are thought to be susceptible to infection—and there’s simply no way to reach every bird, says Becky Poulson, an avian-flu researcher at the University of Georgia. After hopscotching across the globe for decades, H5N1 now seems very likely to be in North America for good, “part of the new normal here,” Poulson told me.
Experts told me they’re hopeful that the outbreak will abate before long. But even if that happens, some species may not live to see it. North America’s birds already face a medley of threats—chemical pollution, window collisions, habitat destruction, roving colonies of feral cats—and some of them cannot sustain another blow. “This could be the last nail in the coffin for some species,” says Min Huang, who leads the migratory-bird program at Connecticut’s Department of Energy and Environmental Protection.
The current epidemic “may not be directly affecting us, in that almost none of us are getting sick,” says Kishana Taylor, a virologist at Rutgers University. But the extent of its reach into wildlife means that humans will still notice its many impacts. In a world with fewer birds, other animals—such as coyotes, snakes, and even humans—might go hungrier, while the fish, insects, and rats that birds eat could experience population booms. The treetops and shorelines, once alive with song, could go silent; far fewer seeds might be dispersed. The U.S.’s national bird—one of the country’s few conservation success stories—could once again find itself pushed to the brink. Some locals in the Southeast have already told Nemeth that they’re feeling the absence of vultures, as roadside deer carcasses begin to fester in the sun. The bird pandemic will have its survivors. But they are likely to be living in a world that is quieter, lonelier, and harsher than it was before.
Com exposições, livros e itens raros, ‘Estadão’ ouviu especialistas
Conhecimento se adquire degustando, não engolindo inteiro, conta Alcida. Esta foi a lição que ela aprendeu junto ao povo Yanomami em 1968, quando começou sua pesquisa de doutorado com os Sanumá, Yanomamis da região do Rio Auaris, em Roraima. Ainda aprendendo o bê-á-bá da língua sanumá, uma das seis faladas na maior terra indígena do Brasil, Alcida conta que fez uma pergunta a uma mulher e recebeu uma resposta monossilábica. Meses mais tarde, a antropóloga fez a mesma pergunta à mesma mulher e recebeu um longo discurso como resposta. Quando Alcida questionou a resposta resumida de meses antes, a indígena respondeu: “Se eu lhe dissesse tudo naquele momento, você não ia entender nada!”.
A história que nos conta Alcida Rita Ramos, autora de inúmeros artigos de antropologia e livros dedicados a compreender o mundo Yanomami, fala sobre uma trajetória e um tempo que se leva para ter o vislumbre de uma outra cultura, aspecto que a voracidade colonizadora do homem branco materialista não tem condição de compreender, como mostra o líder Davi Kopenawa Yanomami ao escrever que “os brancos não sonham tão longe quanto nós. Dormem muito, mas só sonham com eles mesmos”.
Uma das formas para dar visibilidade a diferentes culturas e refletir sobre sua história é a arte, instrumento que tem sido usado pelo povo Yanomami. “Eu não vim à toa para passear, conhecer a cidade. Eu venho em nome do meu povo para dizer o que está acontecendo, para pedir apoio”, diz Morzaniel Iramari, por telefone, de Nova York para o Estadão. Morzaniel vive na região do Demini, na Terra Indígena Yanomami (TIY) situada entre os Estados de Roraima e do Amazonas, e assina a direção do filme Mãri hi – A Árvore dos Sonhos, curta-metragem de 17 minutos, que estreou no dia 3 de fevereiro na exposição The Yanomami Struggle (A Luta Yanomami), no museu The Shed, em NY.
O filme Thuë pihi kuuwi (Uma Mulher Pensando) também integra a exposição. Filmado e dirigido por mulheres Yanomamis e por Edmar Tokorino, o curta aborda o olhar de uma jovem sobre o trabalho dos xamãs. “Eu preciso muito mostrar a nossa cultura, é muito importante para os não indígenas. Para vocês defenderem o nosso direito também”, diz Edmar, que estava temporariamente em Boa Vista, Roraima.
A fotógrafa Claudia Andujar, pioneira na fotografia dos Yanomami, no IMS Foto: Denise Andrade/Estadão
“A presença de Davi Kopenawa, de Claudia Andujar, de vários artistas Yanomamis e da Associação Hutukara, que representa o povo Yanomami, despertou um interesse imenso em Nova York”, avalia João Fernandes, diretor artístico do Instituto Moreira Salles (IMS), instituição que já abrigou temporadas da exposição em São Paulo e no Rio e é uma das organizadoras.
Com mais de 200 fotografias de Claudia Andujar, fotógrafa dedicada às causas Yanomamis desde a década de 1970, mais de 80 desenhos e pinturas de artistas Yanomamis e filmes da produção recente indígena, a exposição vem ganhando maior presença e autoria do próprio povo. “A exposição passou a ser uma construção muito mais aberta e diversa a partir da obra da Claudia, que continua a ser um fio condutor”, conta João Fernandes, que também estava presente na inauguração em Nova York.
“Eu acho que arco e flecha hoje em dia não dão conta das metralhadoras, dos fuzis, das epidemias”, diz Angela Pappiani, comunicadora que desenvolve projetos com povos originários há mais de 30 anos. “Mas uma câmera de vídeo, um gravador, um celular, o rádio, a comunicação via internet são armas que protegem e que ajudam na sobrevivência.”
Eu acho que arco e flecha hoje em dia não dão conta das metralhadoras, dos fuzis, das epidemias – Angela Pappiani, comunicadora
A necessidade de usar a força da imagem – desde o trabalho de Claudia Andujar até as últimas produções dos cineastas Yanomamis – revela um conflito. “Esse recurso de defesa se faz contra a vontade dos próprios Yanomamis, que detestam ser fotografados e exigem que nunca se mostre a imagem de parentes que já morreram”, lembra Alcida. “Não deixa de ser paradoxal que, sendo uma prática anti-Yanomami, a fotografia tem o poder de ser, também, pró-Yanomami, pois a imagem é um dos recursos mais poderosos para sensibilizar os não indígenas.”
Assim como no cerne das culturas indígenas, a divisão em territórios e fronteiras não obedece à mesma lógica que na cultura do homem branco – tratam-se de culturas que cultivavam a terra muito antes de a cultura colonizadora chegar com suas regras de demarcação. A arte Yanomami também não é marcada pelas mesmas fronteiras da cultura ocidental. Ela se mistura ao cotidiano, ao artefato.
Dança dos índios yanomami (Crédito:Odair Leal/Reuters – 14/10/2012). Foto: STRINGER/BRAZIL/REUTERS
”A estética Yanomami é completamente entranhada na vida, ela faz parte da vida. O desenho Yanomami não existia enquanto tal, como uma atividade artística separada”, conta o sociólogo Laymert Garcia dos Santos que, em 2006, trabalhou na concepção artística da ópera Amazônia – Teatro Música em Três Partes com Yanomamis da aldeia Watoriki, no Amazonas. “O desenho Yanomami existia na pintura corporal, na pintura de cestos, de alguns instrumentos, na cerâmica, ou seja, sempre não associada a uma superfície, mas praticada num volume. Não existia essa noção de desenho tal como a gente entende pela história da arte ocidental, de uma superfície bidimensional na qual você distribui alguns elementos de figuração.”
Laymert explica que o desenho Yanomami parece integrado ao espaço, o papel faz as vezes de uma tela, onde se projeta uma ação. “Os Yanomamis têm uma relação com o movimento e com a ocupação do espaço que é totalmente diversa da maneira como a composição ocidental trabalhou a questão do desenho.”
Os Yanomamis têm uma relação com o movimento e com a ocupação do espaço que é totalmente diversa da maneira como a composição ocidental trabalhou a questão do desenho – Laymert Garcia dos Santos, sociólogo
Curioso é que a arte, instrumento capaz de sensibilizar o não indígena e abrir uma fresta potente para a compreensão de novas cosmologias, também pode servir a interesses menos nobres, como debateram curadores indígenas numa conversa promovida no dia 2 de fevereiro pelo IMS e o Museu da Língua Portuguesa.
“A arte mata, porque no livro da história da arte indígena bom é indígena morto ou ajoelhado na frente de uma cruz”, diz Daiara Tukano, curadora da exposição Nhe’ Porã: Memória e Transformação em exibição no Museu da Língua Portuguesa, São Paulo. “É dentro do campo da poesia, da literatura, daquilo que é chamado de arte pelo branco que se criou essa alegoria do indígena, essa imagem muito artificial, com a qual a gente não se identifica.”
Daiara Tukano na abertura da exposição Amõ Numiã na Galeria Millan Foto: Silvana Garzaro/Estadão
”Uma das figuras que sempre me arrepiaram, de me deixarem triste mesmo, de ter pesadelo era a imagem da Moema”, conta Daiara. A imagem da moça indígena morta na praia, retratada em pinturas e esculturas, personifica o amor de uma indígena pelo colonizador. Também das páginas do cearense José de Alencar emerge uma Iracema que morre de amor pelo português quando ele parte para a guerra, ilustrando quem sabe uma espécie de “síndrome de Estocolmo” – aquela patologia em que a vítima de abuso desenvolve uma relação sentimental pelo aproveitador.
Para confrontar esse tipo de visão, Daiara destaca a relevância de pensadores indígenas exporem sua arte. “Cada povo vai trazendo as suas narrativas e vai se empoderando de todas as linguagens. A música, a literatura, o desenho, a dança, o teatro, o cinema para trazer não apenas um relato de história, mas também uma maneira própria de contar essa história, de mostrar uma imagem que é própria da nossa linguagem, uma narrativa, um ritmo, uma relação de tempo, de mundo que é própria. São nossas cosmovisões, mas cada uma de nossas cosmovisões também carrega algo importante que é nossa cosmopotência. Nós somos culturas vivas, nós continuamos nos autogerando.”
Cada povo vai trazendo as suas narrativas e vai se empoderando de todas as linguagens – Daiara Tukano, artista
Em A Queda do Céu: Palavras de um Xamã Yanomami, livro revelador da cosmologia Yanomami escrito pelo antropólogo Bruce Albert e por Davi Kopenawa, o líder indígena compartilha sua estranheza ao ver objetos de seu povo guardados num museu, como relíquias de um passado longínquo, e questiona: “Depois de ver todas as coisas daquele museu, acabei me perguntando se os brancos já não teriam começado a adquirir também tantas de nossas coisas só porque nós, Yanomamis, já estamos começando também a desaparecer”.
Marcelo Moura Silva, pesquisador da cultura Yanomami no Instituto Socioambiental (ISA), destaca: “Eles não são janelas para o passado, não são resquícios de uma humanidade perdida, são nossos contemporâneos, estão aqui agora, vivendo um tipo de vida que é possível dentro do mesmo mundo em que estamos vivendo”.
O líder Yanomami Davi Kopenawa Foto: Amanda Perobelli/Reuters
Ainda em A Queda do Céu, Kopenawa escreve: “Os brancos nos chamam de ignorantes apenas porque somos gente diferente deles. Na verdade, é o pensamento deles que se mostra curto e obscuro. Não consegue se expandir e se elevar, porque eles querem ignorar a morte”.
Marcelo lembra que uma das mais bonitas festividades Yanomamis é o cerimonial funerário, que reúne grupos e parentes para reforçar laços de amizade numa grande demonstração de generosidade e abundância de alimentos. A festividade ajuda a apagar a memória da pessoa que partiu para que ela tenha paz e os parentes consigam viver fora do luto. Acontece que até o cerimonial funerário tem sido atingido pelo garimpo. “Nos lugares atingidos, não há força física ou produção de alimentos para ofertar”, ressalta o antropólogo.
“Gostaria que os brancos parassem de pensar que nossa floresta é morta e que ela foi posta lá à toa. Quero fazê-los escutar a voz dos xapiri, que ali brincam sem parar, dançando sobre seus espelhos resplandecentes. Quem sabe assim eles queiram defendê-la conosco?”, clama Kopenawa nas folhas que ele chama de pele de papel.
O uso da arte como flecha atinge a percepção de que precisamos nos apressar para poder degustar os conhecimentos milenares dos povos originários. “Assim como cada árvore que tomba na Amazônia é como um arquivo que se queima, cada povo dizimado é uma amputação da humanidade”, acrescenta Alcida Ramos. “O flagelo que se abate sobre os Yanomamis não podia se encaixar melhor na definição de genocídio da ONU”, conclui.
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