Arquivo mensal: novembro 2012

O agronegócio e a manipulação midiática: o caso dos conflitos fundiários em Mato Grosso do Sul e o papel da Antropologia (ABA)

Fabio Mura (antropólogo, membro da CAI)

Informativo especial n° 026/2012  |  28/11/2012 (retificado)

Uma decisão judicial revertendo uma reintegração de posse e tendo como beneficiária uma comunidade indígena, e, ademais, determinando que o Estado brasileiro (através do órgão indigenista oficial) promova a conclusão dos estudos para identificação e delimitação de uma terra indígena é seguida de uma chuva de artigos em jornais, revistas e blogs, que estão com ela diretamente relacionados. Em seu cerne, estes artigos focam-se num ataque aos antropólogos que são os profissionais responsáveis por tais tipos de estudos. Tal coincidência de fatos merece uma devida contextualização e uma análise, que passaremos a delinear.

“No que toca aos indígenas em especial a Veja tem exercitado com inteira impunidade o direito de desinformar a opinião pública, realimentar velhos estigmas e preconceitos, e inculcar argumentos de encomenda que não resistem a qualquer exame ou discussão”.

As matérias mentirosas, caluniosas e carregadas de preconceito “não devem ser vistas como episódios isolados, mas como manifestações de um poder abusivo que pretende inviabilizar o cumprimento de direitos constitucionais, abafando as vozes das coletividades subalternizadas e cerceando o livre debate e a reflexão dos cidadãos”

João Pacheco de Oliveira, Coordenador da CAI, maio de 2010

O artigo  expressa o ponto de vista da Associação Brasileira de Antropologia-ABA.

O contexto que dá origem à solidariedade da sociedade civil para com os indígenas e à reação midiática em defesa do agronegócio 

Vem cada vez mais ganhando a atenção da sociedade civil a situação em que se encontram os indígenas Guarani-Kaiowa e Guarani-Ñandéva de Mato Grosso do Sul. Os episódios de violência de que estes indígenas têm sido alvo em diversos enfrentamentos fundiários chamam a atenção por sua natureza: pessoas espancadas, feridas por arma de fogo, mortas, indícios de sequestro de corpos de vítimas para confundir investigações policiais, assim como um clima de tensão, gerado em cercos aos acampamentos organizados por esses indígenas nos espaços que consideram como de sua ocupação tradicional, e demonstrações de opulência paramilitar nas estradas que conduzem às fazendas da região.

Nos últimos tempos, a luta de uma comunidade kaiowa específica, Pyelito Kue, tem se constituído em algo emblemático pela tenacidade demonstrada por seus integrantes.  Acampada próxima ao rio Hovy, no município de Iguatemi, sul do estado essa comunidade afirmou uma disposição de morrer, antes de deixar o que consideram como suas terras de origem e de onde foram expulsas. Com efeito, não obstante a fragilidade de vida no acampamento – sofrendo de fome, com casos de suicídio entre seus membros –, as famílias de Pyelito reagiram à liminar de despejo emitida pela Justiça Federal de Naviraí (MS) dispondo-se a morrer na terra ancestral.

Todos esses fatores (embasados por outros de caráter especificamente jurídicos) eram de conhecimento do Juiz, através da argumentação interposta pelo MPF.  Na audiência para decidir o pleito, o juiz pode, ademais, contar com os esclarecimentos prestados pela antropóloga responsável pelos estudos de identificação e delimitação da terra indígena correspondente à comunidade de Pyelito, no concernente ao processo de expropriação fundiária que desembocou na expulsão das famílias de Pyelito de seus espaços de ocupação tradicional – ora reivindicados.  Não obstante essas informações, e o fato de os índios ocuparem apenas um hectare do total de 700 da fazenda cujo proprietário impetrou a ação de reintegração de posse, a sentença foi desfavorável aos indígenas – de modo idêntico, aliás, à esmagadora maioria dos casos julgados em primeira instância em Mato Grosso do Sul sobre disputa fundiária envolvendo comunidades Guarani-Kaiowa e Guarani-Ñandéva.

Em seguida, a referida atitude dos indígenas provocou a solidariedade e a indignação de parte significativa da sociedade civil, que percebia na decisão judicial uma atitude que atentava ao direito à vida e à especificidade dessa vida do ponto de vista indígena, assim refutando o que se revela como um genocídio e um etnocídio dos Guarani. Através das redes sociais da internet, iniciou-se uma campanha, de repercussão nacional e internacional, focada principalmente sobre o destino da comunidade de Pyelito e, de modo mais geral, sobre o destino de todo este povo.

Em decorrência de recurso da decisão, em uma instância externa a Mato Grosso do Sul, o Tribunal Regional Federal de São Paulo, não apenas foi acatado o recurso, suspendendo a liminar de despejo, mas, no corpo da sentença, intimou-se o Governo, responsável pelo processo administrativo, a publicar, no prazo de 30 dias, o relatório de identificação e delimitação da terra indígena – no caso, a “Terra Indígena Iguatemipegua I”, que abrange as comunidades de Pyelito Kue e Mbarakay.

É justamente a partir, e contrastando o mérito desta última decisão judicial, que no espaço de apenas duas semanas tem-se uma sequência de artigos publicados pela revista “Veja” e pela “Folha de São Paulo”, apoiados em resultados de uma pesquisa feita pelo Datafolha, sob encomenda de um organismo nada isento de interesse, como é a Confederação Nacional da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA). Mais do que aprofundar-se em entender casos específicos como o de Pyelito, o intento destes artigos é discutir quais seriam as “reais exigências e interesses dos índios contemporâneos” (sic). Vejamos (e analisemos) a seguir os principais dados e argumentos apresentados pelos articulistas, bem como suas conclusões.

Os argumentos de certa mídia sobre os povos indígenas 

Os artigos veiculados pela revista Veja (Visão medieval de antropólogos deixa índios na penúria), de Leonardo Coutinho (http://www.abant.org.br/file?id=864 – Nota de João Pacheco de Oliveira, Coordenador da Comissão de Assuntos Indígenas, em maio de 2010 sobre a matéria intitulada “A farra da antropologia oportunista”,  elaborada pelo mesmo mau jornalista), e os de autoria de Reinaldo Azevedo (As reservas indígenas e o surrealismo brasileiro: celular, televisão, cesta básica, Bolsa Família e 13% do território brasileiro para… nada! E há gente querendo mais!, e O que realmente querem os índios e o que alguns antropólogos querem que eles queiram…), publicados respectivamente nos dias 4, 10 e 11 de novembro de 2012, bem como a matéria Uma antropologia imóvel, da senadora Kátia Abreu, na Folha de São Paulo do sábado, dia 17 de novembro, apresentam estruturas argumentativas e objetivos bastante semelhantes, complementando-se entre si. A finalidade principal é apresentar resultados de pesquisas como aquela realizada recentemente pelo Datafolha, arrogando-se a competência necessária para analisar os dados produzidos, e apresentando situações sociais, culturais e materiais de suma complexidade, como se estas fossem de simples compreensão.

Improvisando-se em especialistas em antropologia e questões indígenas, os autores declaram que as “reais necessidades” dos indígenas contemporâneos, seriam manifestadas a partir de uma lógica de consumo, em tudo semelhante àquela que impulsiona a classe média da sociedade nacional: os índios desejam celulares, televisões, casas de alvenaria, geladeiras, etc. Afirma-se que escola e trabalho seriam, portanto, os caminhos para se conseguir estes bens, que permitiriam “progredir socialmente”, sendo a terra e os recursos naturais nela presentes de importância secundária, se não irrelevante. Declara-se que os indígenas (em geral) seriam, em suas origens, “pescadores, nômades e coletores”, como escreve a senadora Abreu, razão pela qual não teriam, em suas organizações enquanto povos, um vínculo específico com um determinado lugar; eles apenas “vagam” pelo Brasil”, como afirmado por Leonardo Coutinho. Não seriam agricultores, produtores de alimentos e as reivindicações fundiárias não surgiriam, portanto, das necessidades destes povos, mas da cabeça de missionários e antropólogos, que teriam convencido os índios (sempre nas palavras de Coutinho) “de que o nascimento ou o sepultamento de um de seus membros em um pedaço de terra que ocupem enquanto vagam pelo Brasil é o suficiente para considerarem toda a área de sua propriedade”.

Como fica evidente até mesmo nos títulos das matérias, a imagem que se quer transmitir é de uma antropologia que, propositalmente ou romanticamente, buscaria descrever os indígenas com características que seriam apenas de seus antepassados remotos, com o intuito de justificar a demarcação de amplas frações do território nacional para nelas continuar tutelando os povos indígenas. Reinaldo Azevedo chega a afirmar que o processo demarcatório estaria produzindo “uma horda de miseráveis com celular, televisão e DVD”.

Desta forma, acusa-se profissionais com uma longa formação acadêmica de manifestar um “pensamento medieval”, de promover uma “antropologia do miolo mole”, como definido pelo mesmo Azevedo em seu blog, ou ainda uma “antropologia imóvel”, segundo a expressão de Kátia Abreu.  Com exceção feita ao escrito da senadora, cujo tom apresenta uma formal polidez , para veicular esses argumentos as matérias utilizam-se de uma linguagem arrogante e profundamente preconceituosa, quando não ofensiva, principalmente em relação aos indígenas. Os Guarani (Kaiowa e Ñandéva) de Mato Grosso do Sul prontamente responderam aos argumentos de Coutinho, através de nota emitida pelo conselho da Aty Guasu, a assembleia geral destes povos, manifestando indignação e acusando a revista Veja de fomentar o preconceito para com os índios, apresentados que são como incapazes de pensar com suas próprias cabeças e de tomar suas próprias decisões. No tocante ao papel da Antropologia, cabe observar que especificamente a senadora, na abertura de sua matéria, parece reconhecer os profundos conhecimentos que a Antropologia vem acumulando a respeito dos diferentes povos indígenas, mas ao mesmo tempo afirma que seria injustificável que estas informações “sejam usadas como instrumento de dominação e manipulação”. Ainda citando o caso dos povos tupi e guarani, argumenta ela que estes “são estudados há tanto tempo quanto os astecas e os incas, mas a ilusão de que eles, em seus sonhos e seus desejos, estão parados no tempo não resiste a meia hora de conversa com qualquer um dos seus descendentes atuais”.

Pois bem, estas colocações nos levam a questionar: quem de fato está manipulando informações?  Qual seria a Antropologia que não leva em consideração, em suas análises, as formas de viver e de conceituar o mundo por parte dos indígenas contemporâneos? Comecemos enfrentando a segunda questão, para, em seguida, nos dedicarmos à primeira.

Desconstruindo estereótipos e lugares comuns: o saber antropológico e a questão indígena 

Indicaremos aqui, de modo sucinto, a complexidade dos dados e dos estudos voltados a identificar e delimitar uma terra indígena, bem como dos conhecimentos antropológicos, de modo geral. Para tal propósito, focaremos um contexto específico: o das reivindicações fundiárias feitas pelos Guarani Kaiowa e Guarani Ñandéva, em Mato Grosso do Sul. Com isto queremos evitar sermos excessivamente generalistas e, ao mesmo tempo, poder informar sobre o caso que desencadeou a reação de uma certa mídia, representada aqui pelos veículos e autores citados. O objetivo é revelar quão superficiais, mal informados, caricaturais e mal intencionados são os argumentos das matérias jornalísticas aqui tratadas.

Em primeiro lugar, é totalmente falso o fato de que todos os povos indígenas sejam ou tenham, um dia, sido nômades, centrando as suas economias na caça, na pesca e na coleta. E mais importante ainda, quando nômades, estes não “vagam” por um espaço geográfico, mas constroem, através de suas experiências acumuladas ao longo de séculos, verdadeiros territórios de referência, nos quais baseiam suas atividades e desenvolvem suas vidas.

Em segundo lugar, significativa parte dos indígenas centra suas atividades econômicas na agricultura. Os Guarani aqui em tela são milenares agricultores, existindo uma ampla e rica literatura histórica, arqueológica e antropológica que documenta este fato. Esta mesma literatura coloca em destaque também o fato de os Guarani terem, ao longo de milênios, num processo de expansão civilizacional em busca de terras férteis, realizado amplas migrações; isto de modo algum os caracteriza como nômades, como é muitas vezes erroneamente apresentado pela mídia. Com efeito, ao considerarmos os últimos séculos, percebe-se um modo de ocupação sedentário; milhares de sítios arqueológicos justamente revelam para os Guarani uma continuidade ocupacional e o desenvolvimento de rotações de cultivos ao redor de centros de habitações. Estes centros são construídos nas proximidades de fontes de água (nascentes, córregos e rios), formando amplas redes de comunidades locais. A relação entre estas comunidades, que permite a integração social e a cooperação, é determinada por uma elevada mobilidade espacial, para participar de rituais, realizar atividades econômicas (coleta, caça e pesca), socializar, visitar parentes, estabelecer casamentos, formar ou fortalecer alianças e, antigamente, para organizar e empreender ações guerreiras. Como fica claro, esta mobilidade não representa absolutamente um “vagar” pelo Brasil (ou entre Brasil e Paraguai), conforme pretendido por Leonardo Coutinho em sua matéria.

Em terceiro lugar, é importante destacar que os indígenas não são uma realidade abstrata e homogênea, cada povo sendo um sujeito histórico com suas peculiaridades, constituídas ao longo do tempo, em situações sociais, econômicas e territoriais concretas. Neste sentido, os povos indígenas não podem ser vistos como estáticos, relegados a um modo de vida pretérito, nem como seres passivos, suas vidas, desejos e inspirações sendo definidas apenas por fatores externos ao seu próprio agir. Não cabe dúvida de que o impacto da colonização e o contato com outras civilizações têm-lhe proporcionado novos saberes, tornando as experiências individuais e coletivas mais ricas e diversificadas.  Por outro lado, é também verdade que estas novas experiências não são realizadas a partir de um vazio de informação, de parâmetros e de lógicas de entendimento sobre o mundo; os indígenas vêm, ao longo de séculos e milênios, construído tradições de conhecimento, produzindo cosmologias, definindo quadros morais, lógicas de troca, circulação e uso de bens materiais e simbólicos, fatores estes que permitem a definição de parâmetros para dar um sentido específico a suas coletividades.

É a partir da compreensão destes parâmetros, que costumam ser bastante sofisticados, que podemos entender qual espaço um determinado objeto ocupa na escala de valores definida pelos indígenas, qual será o seu destino de uso, suas propriedades simbólicas, como este pode ser transacionado, trocado, distribuído, etc. Para dar um pequeno exemplo, quando se encontram geladeiras nas residências kaiowa, estas são utilizadas de uma forma bem específica: suas prateleiras são quase totalmente ocupadas por garrafas PET cheias de água, que é destinada ao preparo do tererê (infusão fria da erva mate), consumido geralmente de modo coletivo, quando da visita de parentes, algo constante nas residências destes indígenas. Fica, portanto, óbvio que a eficiência técnica da geladeira, como instrumento que subtrai calor, é algo apreciado pelos kaiowa, mas o uso social deste objeto é definido de modo bem particular. Este exemplo representa apenas a ponta de um iceberg, cuja base não poderemos apresentar aqui por falta de espaço, havendo que se levar em conta todos os parâmetros acima descritos, que são absolutamente diferentes daqueles que servem como referência aos membros da nova classe média nacional, e não similar, como pretendido em seu blog por Reinaldo Azevedo.

Há que se considerar, ainda, que a terra não representa para os povos indígenas em geral um mero meio econômico, assim como a agricultura e outras atividades produtivas não apresentam apenas aspectos materiais, sendo intimamente ligadas à ordem cósmica, adquirindo fortes conotações religiosas. Neste sentido, no caso dos kaiowa, pensar-se que a retirada forçada de seus integrantes de significativas porções de seus territórios de ocupação tradicional, com a sucessiva depauperação dos mesmos (por desmatamento para pecuária extensiva e monoculturas exportadoras) leve estes indígenas a renunciarem àqueles espaços territoriais, representa uma visão extremamente superficial do fenômeno em pauta. Com efeito, as famílias indígenas consideram-se pertencentes a esses lugares, cujo uso material e simbólico revela-se para elas fundamental na manutenção da ordem cósmica e no destino de seu povo. As violências (físicas e simbólicas) sofridas por efeitos da colonização têm, ao contrário, conduzido a uma exaltação simbólica das propriedades da terra e dos lugares de origem, num complexo processo de construção cultural do sentido de pertencimento territorial, étnico e cósmico. Esta complexidade emerge através de acuradas pesquisas e não resulta das presumidas fantasias de “antropólogos de miolo mole” (como disse Azevedo), que estariam convencendo os índios de que “o nascimento ou o sepultamento de um de seus membros em um pedaço de terra” lhes outorga o direito de propriedade sobre o mesmo (como afirmado por Leonardo Coutinho, na Veja).

Finalmente, é importante observar que quando se identifica e delimita uma terra indígena busca-se relacionar famílias indígenas concretas e específicas com espaços territoriais também concretos e específicos. Para tal propósito é necessário verificar as modalidades de uso, conceituação e exploração do território por parte do grupo em consideração. Assim, em Mato Grosso do Sul, a tarefa consiste em analisar a relação de comunidades indígenas contemporâneas com os lugares de onde foram expulsas há apenas poucas décadas, delimitando-se apenas os espaços necessários à reprodução física e cultural dessas comunidades específicas, conforme os ditames da Constituição Federal vigente. No caso da comunidade de Pyelito Kue, que tem atraído toda essa atenção midiática, por exemplo, trata-se de um esbulho ocorrido a partir dos anos quarenta e que se acirrou com uma remoção maciça das famílias indígenas dos lugares que consideram de sua origem no final da década de 1970. Não se trata, pois, de definir um elo imemorial com a situação pré-colonial, criando um território indígena abstrato e sem parâmetros no tamanho. Portanto, é totalmente desprovido de fundamento afirmar-se que, uma vez que antes da conquista européia o Brasil era habitado unicamente por indígenas, estes últimos poderiam reivindicar hoje a totalidade da sua superfície, colocando assim em perigo o resto da população do país (e a capacidade produtiva e econômica da nação).

Inúmeras páginas ainda poderiam detalhar os fatores necessários para se desenvolver uma adequada pesquisa que dê embasamento aos Relatórios Circunstanciados de Identificação e Delimitação de uma Terra Indígena (orientada, aliás, por regulamentação específica e criteriosa), feitos pelos antropólogos, mas, por motivos de espaço, isto se torna impossível. O objetivo maior é apontar sua complexidade, ao tempo que revela a desinformação, a banalização e a distorção da realidade que são apresentadas nos artigos aqui elencados. Poder-se-ia talvez afirmar que isto é fruto da ignorância, mas isto não é uma justificativa válida. Há uma vasta e riquíssima literatura sobre povos indígenas, constituída por publicações, dissertações e teses, bem como por relatórios de identificação de terras e laudos periciais antropológicos, que poderia bem ser consultada. Por que será que isto não ocorre? Pensamos que seja não um problema de mera ignorância, mas devido a uma proposital intenção de manipular a informação, cujas razões consideraremos a seguir.

Os interesses do agronegócio e a Antropologia como incômodo

Os estudos e aprofundamentos antropológicos podem se constituir em uma ameaça aos interesses do agronegócio. A imprensa que apoia as suas razões, por sua vez, sabe que em processos administrativos e jurídicos, argumentações bem fundamentadas, fruto das pesquisas de profissionais sérios, com formação consistente e ampla experiência sobre os indígenas podem redundar no reconhecimento de direitos territoriais, colocando assim em risco seus empreendimentos. Seus representantes sabem, igualmente, que atacar diretamente a Antropologia como um todo, uma ciência com mais de um século de formação, seria contraproducente; proceder deste modo os exporia, deixando transparecer de modo evidente e radical a unilateralidade de seus próprios interesses. Não podendo afrontá-la diretamente, enveredam por caminhos indiretos. Em lugar de conduzir o debate a partir de conteúdos antropológicos, lançam mão dos sentimentos nacionalistas, suscitando com isto alarmismos, ao afirmar que os índios atentam à soberania nacional, representam o atraso e estão associados a interesses estrangeiros. Recorrem também a ataques pessoais, buscando contrastar os profissionais antropólogos não tanto em seus argumentos, mas como indivíduos, que seriam suspeitos. Ainda assim, necessitam contornar o fato de que os argumentos antropológicos lhes são inconvenientes. Constroem então o expediente de se referir aos antropólogos que realizam identificações e laudos periciais como sendo representantes de “certa Antropologia”. É bastante evidente o objetivo desta estratégia: deixar imaginar a existência de outras possíveis Antropologias, cujos argumentos refutariam aqueles normalmente apresentados nos relatórios e nas perícias. Afirma-se, por exemplo, que os antropólogos da FUNAI em Mato Grosso do Sul estariam querendo demarcar o maior número de terras indígenas para nelas perpetuar a tutela. Isto é algo falso, na medida em que os Grupos Técnicos que estão realizando os trabalhos naquele estado são coordenados por antropólogos que não são funcionários desta instituição oficial. Ademais, esses antropólogos têm formação acadêmica em nível de doutorado ou mestrado, em sua maioria sendo professores de universidades federais, com experiência sobre os indígenas em pauta, tendo defendido sobre eles dissertações e teses, publicando livros e diversos artigos científicos.

É evidente que estas estratégias discursivas são rapidamente desmascaradas frente a um crivo acadêmico. Porém, há que se evidenciar que o seu principal alvo (além obviamente da opinião pública, contribuindo para reforçar lugares comuns) é o mundo jurídico, mais especificamente a Justiça Federal, buscando influenciar suas decisões, formando verdadeiros dossiês, compostos com matérias de artigos impressos e da internet. Por vezes os juízes não possuem parâmetros para discernir sobre a qualidade de um estudo antropológico, nem sobre correntes, paradigmas teóricos, metodologias, etc. É justamente em virtude desta situação que, por exemplo, em vários contra-laudos (documentos elaborados para contrastar os relatórios de identificação de terras e as perícias antropológicas) são exaltados determinados autores que sequer têm formação antropológica, apresentando-os como eminências na disciplina, buscando criar assim uma Antropologia fictícia, a ser contraposta àquela “Antropologia do miolo mole”. Gera-se, nesses termos, uma imagem de autoridade sobre a matéria, cuja verificação se torna de difícil realização pelos juízes, que confiam na idoneidade de seus elaboradores.

Por último mas não menos relevante, ao deslocar a atenção do conteúdo e da qualidade dos relatórios antropológicos de identificação de uma terra indígena para um ataque à FUNAI, essas estratégias discursivas buscam igualmente desestabilizar e deslegitimar a estrutura do Estado, procurando interferir, o máximo possível, nos processos administrativos voltados ao cumprimento de ditames constitucionais.

 

The State of Climate Science (scienceprogress.org)

CLIMATE SCIENCE

A Thorough Review of the Scientific Literature on Global Warming

By Dr. James Powell | Thursday, November 15th, 2012

Polls show that many members of the public believe that scientists substantially disagree about human-caused global warming. The gold standard of science is the peer-reviewed literature. If there is disagreement among scientists, based not on opinion but on hard evidence, it will be found in the peer-reviewed literature.

I searched the Web of Science, an online science publication tool, for peer-reviewed scientific articles published between January first 1991 and November 9th 2012 that have the keyword phrases “global warming” or “global climate change.” The search produced 13,950 articles. See methodology.

I read whatever combination of titles, abstracts, and entire articles was necessary to identify articles that “reject” human-caused global warming. To be classified as rejecting, an article had to clearly and explicitly state that the theory of global warming is false or, as happened in a few cases, that some other process better explains the observed warming. Articles that merely claimed to have found some discrepancy, some minor flaw, some reason for doubt, I did not classify as rejecting global warming.

Articles about methods, paleoclimatology, mitigation, adaptation, and effects at least implicitly accept human-caused global warming and were usually obvious from the title alone. John Cook and Dana Nuccitelli also reviewed and assigned some of these articles; John provided invaluable technical expertise.

This work follows that of Oreskes (Science, 2005) who searched for articles published between 1993 and 2003 with the keyword phrase “global climate change.” She found 928, read the abstracts of each and classified them. None rejected human-caused global warming. Using her criteria and time-span, I get the same result. Deniers attacked Oreskes and her findings, but they have held up.

Some articles on global warming may use other keywords, for example, “climate change” without the “global” prefix. But there is no reason to think that the proportion rejecting global warming would be any higher.

By my definition, 24 of the 13,950 articles, 0.17 percent or 1 in 581, clearly reject global warming or endorse a cause other than CO2 emissions for observed warming. The list of articles that reject global warming is here.

The 24 articles have been cited a total of 113 times over the nearly 21-year period, for an average of close to 5 citations each. That compares to an average of about 19 citations for articles answering to “global warming,” for example. Four of the rejecting articles have never been cited; four have citations in the double-digits. The most-cited has 17.

Of one thing we can be certain: had any of these articles presented the magic bullet that falsifies human-caused global warming, that article would be on its way to becoming one of the most-cited in the history of science.

The articles have a total of 33,690 individual authors. The top ten countries represented, in order, are USA, England, China, Germany, Japan, Canada, Australia, France, Spain, and Netherlands. (The chart shows results through November 9th, 2012.)

Global warming deniers often claim that bias prevents them from publishing in peer-reviewed journals. But 24 articles in 18 different journals, collectively making several different arguments against global warming, expose that claim as false. Articles rejecting global warming can be published, but those that have been have earned little support or notice, even from other deniers.

A few deniers have become well known from newspaper interviews, Congressional hearings, conferences of climate change critics, books, lectures, websites and the like. Their names are conspicuously rare among the authors of the rejecting articles. Like those authors, the prominent deniers must have no evidence that falsifies global warming.

Anyone can repeat this search and post their findings. Another reviewer would likely have slightly different standards than mine and get a different number of rejecting articles. But no one will be able to reach a different conclusion, for only one conclusion is possible: Within science, global warming denial has virtually no influence. Its influence is instead on a misguided media, politicians all-too-willing to deny science for their own gain, and a gullible public.

Scientists do not disagree about human-caused global warming. It is the ruling paradigm of climate science, in the same way that plate tectonics is the ruling paradigm of geology. We know that continents move. We know that the earth is warming and that human emissions of greenhouse gases are the primary cause. These are known facts about which virtually all publishing scientists agree.

James Lawrence Powell is the author of The Inquisition of Climate Science. Powell is also the executive director of the National Physical Science Consortium, a partnership among government agencies and laboratories, industry, and higher education dedicated to increasing the number of American citizens with graduate degrees in the physical sciences and related engineering fields. This article is cross-posted with permission with the Columbia University Press blog.

This article is a cross-post with our partners at DeSmogBlog.

A hora de pagar a conta – Entrevista com Beto Borges sobre pagamento por serviços ambientais (Agência Envolverde)

26/11/2012 – 10h17

por Alice Marcondes, da Envolverde

“A compensação precisa ser imediata”. Nesta entrevista, o diretor da organização internacional Forest Trends fala das iniciativas de Pagamento por Serviços Ambientais (PSA) que estão dando certo e as perspectivas de crescimento destas ações.

Remunerar pessoas, empresas, organizações sociais e órgãos públicos pelos serviços prestados em prol da preservação ambiental. Esta é uma ideia que vem ganhando peso na última década e recebeu o nome de Pagamento por Serviços Ambientais (PSA). Na prática significa pagar ou dar incentivos, como isenção fiscal, às pessoas que mantenham parte de suas propriedades preservadas ou que atuem de outras maneiras para manter as florestas em pé.Nesta entrevista, Beto Borges, diretor da Forest Trends, fala sobre as práticas já existentes e do panorama de crescimento das iniciativas de PSA no Brasil e no mundo. Beto trabalha, há mais de 25 anos, com comunidades indígenas na Amazônia. Na organização internacional Forest Trends, atua na gestão do programa de comunidades.

am31 201x300 A hora de pagar a conta – Entrevista com Beto Borges sobre pagamento por serviços ambientaisVocê pode definir o conceito de Pagamento por Serviços Ambientais?

Eu prefiro o conceito de incentivo à conservação por serviços ambientais. Os incentivos podem ser feitos na forma de pagamento, com recursos financeiros, na forma de subsídios, com redução de impostos, ou na forma de assistência técnica, facilitando, por exemplo, o acesso a mercados diferenciados. A definição mais abrangente de compensação por serviços ambientais é aquela que provê incentivos para a manutenção dos serviços ambientais.

Onde e como surgiu a ideia de remunerar os serviços prestados em prol da conservação?

Esta é uma questão que já vem sendo discutida há muito tempo. Há dez anos, esse assunto já era debatido na área de economia ambiental. Alguns países estão avançados nesse tema. O Brasil já criou ideias interessantes, como são os casos do ICMS ecológico (imposto sobre operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual, intermunicipal e de comunicação) e da lei Chico Mendes, que é uma iniciativa pioneira. Além disso, o sistema de compensação brasileiro determina que 5% dos investimentos em infraestrutura precisam ser destinados para a compensação dos impactos sobre o meio ambiente.

Estas iniciativas utilizam recursos públicos. Existem também empresas trabalhando com esse tipo de incentivo. O que você acredita que é mais efetivo: a utilização de recursos públicos ou privados?

Os dois são importantes. Depende da implementação. Usar o dinheiro público para fomentar a prática de compensação por serviços ambientais facilita o crescimento desse mercado. Assim, não será mais um setor sujeito a oscilações da vontade política. Um exemplo é que o Brasil até hoje não tem um sistema efetivo de REDD (Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação). O governo continua em cima do muro. Está esperando uma decisão internacional, para poder se posicionar, quando seria muito mais inteligente se antecipar à decisão internacional e definir as regras do jogo para o seu próprio país. Por outro lado, se depender apenas de incentivos públicos, o potencial dos sistemas de compensação por serviços ambientais fica limitado. Além disso, você isenta o setor empresarial da sua responsabilidade de levar essa preocupação para dentro da questão econômica da geração de produtos e serviços. Precisa haver um equilíbrio nos recursos públicos e privados.

Sobre o uso do dinheiro público, na sua opinião, o Brasil possui ferramentas de monitoramento para que esses gastos sejam transparentes, para que as verbas não sejam aplicadas indevidamente?

O monitoramento dessas e de qualquer outra política pública é muito importante. Os incentivos de Pagamento por Serviços Ambientais precisam estar apoiados em mecanismos de acompanhamento, mecanismos de transparência, para que seja possível acompanhar o processo. No caso de investimentos públicos, isso interessa para a sociedade civil, porque a fonte é o dinheiro da tributação. Infelizmente, o Brasil tem um histórico de corrupção, portanto é imprescindível que as iniciativas sejam bem monitoradas. Podem existir, inclusive, ferramentas independentes de monitoramento. O Brasil já tem uma experiência desse tipo. O Observatório do REDD é uma iniciativa da sociedade civil, que acompanha o processo de discussão das políticas públicas para o REDD no Brasil. É uma iniciativa de monitoramento de políticas e projetos para o REDD no país. É importante que existam outros mecanismos de monitoramento e apuração desse tipo de incentivo. A Procuradoria Geral da União também deveria acompanhar a aplicação destas verbas.

Qual o melhor caminho para o Brasil evoluir na questão de PSA: fomentar os investimentos públicos ou privados?

O melhor caminho é uma combinação dos dois. O Brasil é um país imenso, com um sistema democrático estável, com agências públicas de várias setores e que, em comparação com outros países, estão bem posicionadas e bem formadas. Tudo isto está associado a um setor privado extremamente robusto. Diante de um quadro como este, por que nos limitarmos a utilizar somente iniciativas públicas, quando é possível também estimular o setor privado? Os dois setores se complementam. O setor privado pode alcançar áreas onde ainda não é possível o setor público chegar e vice-versa. Um sistema público-privado, referenciado de acordo com as necessidades locais, é o ideal. O fato é que essas medidas precisam evoluir com urgência. Não podemos deixar essa conta para as gerações seguintes. Nós já herdamos essa fatura da falta de visão dos dirigentes passados, da falta de compreensão da sociedade passada. A compensação precisa ser imediata. Ela é fundamental para que sejam criadas novas formas de operação, novos paradigmas de desenvolvimento verdadeiramente sustentável, para nós vivermos em uma economia verdadeiramente verde.

Human intelligence ‘peaked thousands of years ago and we’ve been on an intellectual and emotional decline ever since’ (The Independent)

STEVE CONNOR, MONDAY 12 NOVEMBER 2012

Richard Gardner/Rex Features

Is the human species doomed to intellectual decline? Will our intelligence ebb away in centuries to come leaving our descendants incapable of using the technology their ancestors invented? In short: will Homo be left without his sapiens?

This is the controversial hypothesis of a leading geneticist who believes that the immense capacity of the human brain to learn new tricks is under attack from an array of genetic mutations that have accumulated since people started living in cities a few thousand years ago.

Professor Gerald Crabtree, who heads a genetics laboratory at Stanford University in California, has put forward the iconoclastic idea that rather than getting cleverer, human intelligence peaked several thousand years ago and from then on there has been a slow decline in our intellectual and emotional abilities.

Although we are now surrounded by the technological and medical benefits of a scientific revolution, these have masked an underlying decline in brain power which is set to continue into the future leading to the ultimate dumbing-down of the human species, Professor Crabtree said.

His argument is based on the fact that for more than 99 per cent of human evolutionary history, we have lived as hunter-gatherer communities surviving on our wits, leading to big-brained humans. Since the invention of agriculture and cities, however, natural selection on our intellect has effective stopped and mutations have accumulated in the critical “intelligence” genes.

“I would wager that if an average citizen from Athens of 1000BC were to appear suddenly among us, he or she would be among the brightest and most intellectually alive of our colleagues and companions, with a good memory, a broad range of ideas and a clear-sighted view of important issues,” Professor Crabtree says in a provocative paper published in the journal Trends in Genetics.

“Furthermore, I would guess that he or she would be among the most emotionally stable of our friends and colleagues. I would also make this wager for the ancient inhabitants of Africa, Asia, India or the Americas, of perhaps 2,000 to 6,000 years ago,” Professor Crabtree says.

“The basis for my wager comes from new developments in genetics, anthropology, and neurobiology that make a clear prediction that our intellectual and emotional abilities are genetically surprisingly fragile,” he says.

A comparison of the genomes of parents and children has revealed that on average there are between 25 and 65 new mutations occurring in the DNA of each generation. Professor Crabtree says that this analysis predicts about 5,000 new mutations in the past 120 generations, which covers a span of about 3,000 years.

Some of these mutations, he suggests, will occur within the 2,000 to 5,000 genes that are involved in human intellectual ability, for instance by building and mapping the billions of nerve cells of the brain or producing the dozens of chemical neurotransmitters that control the junctions between these brain cells.

Life as a hunter-gatherer was probably more intellectually demanding than widely supposed, he says. “A hunter-gatherer who did not correctly conceive a solution to providing food or shelter probably died, along with his or her progeny, whereas a modern Wall Street executive that made a similar conceptual mistake would receive a substantial bonus and be a more attractive mate,” Professor Crabtree says.

However, other scientists remain sceptical. “At first sight this is a classic case of Arts Faculty science. Never mind the hypothesis, give me the data, and there aren’t any,” said Professor Steve Jones, a geneticist at University College London.

“I could just as well argue that mutations have reduced our aggression, our depression and our penis length but no journal would publish that. Why do they publish this?” Professor Jones said.

“I am an advocate of Gradgrind science – facts, facts and more facts; but we need ideas too, and this is an ideas paper although I have no idea how the idea could be tested,” he said.

THE DESCENT OF MAN

Hunter-gatherer man

The human brain and its immense capacity for knowledge evolved during this long period of prehistory when we battled against the elements

Athenian man

The invention of agriculture less than 10,000 years ago and the subsequent rise of cities such as Athens relaxed the intensive natural selection of our “intelligence genes”.

Couch-potato man

As genetic mutations increase over future generations, are we doomed to watching  soap-opera repeats without knowing how to use the TV remote control?

iPad man

The fruits of science and technology enabled humans to rise above the constraints of nature and cushioned our fragile intellect from genetic mutations.

Saúde mental, outra vítima da mudança climática (IPS)

23/11/2012 – 10h05

por Patricia Grogg, da IPS

clima Saúde mental, outra vítima da mudança climática

As tensões e angústias acompanham toda pessoa que sofre um desastre. Foto: Jorge Luis Baños/IPS

Santiago de Cuba, Cuba, 23/11/2012 – “A cidade parecia bombardeada. Caminho para meu escritório, cruzo com pessoas que levavam em seus rostos o mesmo – diria dramático – espanto que eu. Nos olhávamos e, sem nos conhecermos, nos perguntávamos: como foi com você? Aconteceu alguma coisa com sua casa? Foi uma solidariedade afetiva muito importante para mim”. Este testemunho dado à IPS, por uma jornalista de Santiago de Cuba, coloca na balança um dos lados bons da reação coletiva após um desastre como o sofrido por esta cidade na madrugada do dia 25 de outubro, quando o furacão Sandy, apesar do alerta meteorológico e das advertências oficiais, surpreendeu boa parte de seus habitantes.

O valor econômico dos prejuízos ainda são desconhecidos hoje, quando a parte mais oriental do país cura suas feridas, graves de todos os ângulos. Mas existe também o impacto psicológico, do qual se fala menos e se vê nos olhos das pessoas quando contam: “perdemos nossa casa com móveis, eletrodomésticos, até as lembranças”. “Tive muito medo, me enfiei no armário quando o vento levou o telhado do meu quarto. Meus vizinhos me tiraram de casa e me ajudaram a atravessar a rua até onde haviam se refugiado outras famílias cujas casas estavam em muito mau estado”, contou à IPS Isabel da Cruz, de 70 anos, moradora de Guantânamo, outra área afetada.

Depressão, tristeza, angústia, desespero, incerteza e agressividade, todas estas são manifestações que acompanham as pessoas depois de um desastre em qualquer parte do mundo. “Imagine, nos deitamos com a bela e acordamos com a fera”, comparou um trabalhador do setor turístico cujo hotel onde é empregado foi totalmente destruído. “As pessoas estão deprimidas e desorientadas. Em muitas nota-se o desequilíbrio psíquico pelas perdas sofridas”, disse à IPS o sacerdote católico Eugenio Castellanos, reitor do Santuário da Caridad del Cobre, virgem padroeira de Cuba. O padre estima que 90% das casas do Cobre, localidade vizinha a esta cidade, sofreram o impacto do Sandy.

Juan González Pérez, por sua vez, disse à IPS que dias antes do furacão houve focos de violência em alguns lugares, especialmente na hora de comprar artigos em falta. “Ficamos muitos dias sem energia elétrica e começaram a vender ‘luz brilhante’ (querosene) para cozinhar. Embora houvesse o suficiente para todos, aconteceram discussões e brigas na fila. Quando as pessoas se desesperam, costumam ficar agressivas”, observou Pérez, mais conhecido por Madelaine, líder do espiritismo cruzado “muertero”, uma expressão de religiosidade popular nesse lugar. Segundo contou, aconselha aos seus seguidores “unirem-se, se lavar bem, dar a quem não tem e não se desesperar”.

Em Mar Verde, a praia por onde o Sandy tocou o território cubano a 15 quilômetros de Santiago, a médica Elizabeth Martínez atende mais de cem pessoas, abrigadas em cabanas de veraneio que, por estarem mais afastadas do mar, se salvaram do desastre. “O impacto psicológico é grande, mas não houve mortes e nem temos pessoas doentes”, contou. Pouco mais de uma semana depois da passagem do furacão, os esforços em matéria de saúde se concentravam fundamentalmente em conter focos epidêmicos. “Estamos dando informações sanitárias aos moradores, ensinando como cuidar de doenças transmissíveis, sobre a importância de descontaminar a água antes de beber”, informou a médica.

Segundo meios especializados, estima-se que entre um terço e metade de uma população exposta a desastres sofre algum tipo de problema psicológico, embora na maioria dos casos se deva entender como reações normais diante de eventos extremos, que sob o impacto da mudança climática ameaçam aumentar em intensidade.

“Quando encontrei meus vizinhos no abrigo, estávamos em choque. Mas alguém disse: vamos limpar a entrada que está bloqueada por essas árvores caídas. Então, começamos a trabalhar, embora no começo ninguém falasse”, contou uma mulher do setor turístico. Nos primeiros dias era possível ver muitas pessoas recolhendo escombros e varrendo as ruas de suas vizinhanças.

Diante da frequência e da maior intensidade dos ciclones tropicais, as autoridades de saúde, desde a década de 1990, começaram a se preocupar com o impacto psicológico dos desastres causados por esses e outros fenômenos naturais. Em 2008, quando o país sofreu três furacões, uma indicação ministerial fortaleceu a inclusão do tema nos planos sanitários. Em um artigo sobre o assunto, o médico cubano Alexis Lorenzo Ruiz explica que os aspectos psicossociais dos desastres são considerados tanto na capacitação do pessoal como na organização dos programas que chegam a todo o país e enfatizam a atenção a setores mais vulneráveis, como menores de idade, adolescentes e idosos.

Do ponto de vista da saúde mental, nos desastres toda a população “sofre tensões e angústias em maior ou menor medida, direta ou indiretamente”, afirmaram Katia Villamil e Orlando Fleitas, que recomendaram não se esquecer que o impacto nessas circunstâncias é mais acentuado em populações de escassos recursos. Estes profissionais afirmam que as reações mais frequentes vão desde as consideradas normais, como ansiedade controlável, depressão leve ou quadros “histeriformes”, até estresse “peritraumático”, embotamento, redução do nível de atenção, descompensação de transtornos psiquiátricos pré-existentes, bem como “reação coletiva de agitação”.

O furacão Sandy causou estragos não apenas em Santiago de Cuba, mas também nas províncias de Guantânamo e Holguín, com saldo de 11 mortos. O governo de Raúl Castro ainda não divulgou as perdas econômicas, embora dados preliminares e incompletos dos primeiros dias indicassem uma estimativa de US$ 88 milhões.

A system of disasters (SocialistWorker.org)

November 20, 2012

Mike Davis is an author and veteran activist whose many books include City of Quartz: Excavating the Future in Los AngelesPlanet of SlumsLate Victorian Holocausts: El Niño Famines and the Making of the Third World and In Praise of Barbarians. He talked to Alan Maass about the natural and non-natural factors involved in Hurricane Sandy–and what shape New York and the East Coast will take in the aftermath of the super-storm.

Hurricane Sandy's flood surge inundates the boardwalk and beyond in Atlantic City, N.J.Hurricane Sandy’s flood surge inundates the boardwalk and beyond in Atlantic City, N.J.

LIKE ALL disasters, Hurricane Sandy revealed a lot about economic, social and political priorities–climate change being the question that received the most attention. What do you think are the most important factors to recognize?

THE TRUE story of Sandy is as much about real estate as global warming. Since the 1960s, everyone on the Atlantic seaboard who could afford it has wanted to live in a beach town or own a second home along the shore. This endless building boom, unrestrained by serious regional or national planning, has put several trillion dollars of prime real estate in harm’s way.

It has also grotesquely aggravated the affordable housing shortage by siphoning away state and municipal investment, as well federal fiscal relief, from the reconstruction of older neighborhoods and central cities. Huge public subsidies are hidden in the mansions on barrier islands and the “historic seaport” tourist zones.

At least among scientists and actuaries, there has never been any doubt that nature would collect a huge toll from this beach property bubble. Every generation or so, the Mid-Atlantic or New England gets smacked with a super-storm capable of bringing devastation as far inland as the Great Lakes.

Until Sandy, for example, the hurricane was the 1938 monster that made landfall on Long Island as a Category 3 (much stronger than Sandy) and surged over parts of the Rhode Island shoreline as a 15- to 17-foot wave. More than 800 people died. Less than a generation later, Hurricane Hazel didn’t desist until after it had drowned almost 100 people in Toronto.

Thus, even without the famous “hockey stick” of accelerated global warming, old-fashioned weather, including the occasional super-storm fueled by unusually warm coastal waters, would be producing escalating bills for storm damage. It is important for the left to understand this, since “global warming” can easily be used as an alibi to cover up the role of banks, developers and local governments in creating so much unnatural risk in the form of beach and barrier-island development.

THE STORM seems to have focused the minds of the U.S. elite about climate change, more than other events–witness the Bloomberg BusinessWeekcover headline “It’s global warming, stupid.” But will this lead to anything different?

THE MOST notorious impact of climate change, of course, will be the increased frequency of super-storms. The design strength of coastal protections, urban infrastructure and large shoreline buildings will be drastically depreciated. What the insurance industry and the U.S. Army Corps of Engineers previously considered to be “hundred-year events” will happen every decade; “fifty-year events” will happen every two or three years.

More invisibly, rising sea levels–which some scientists believe is happening faster on the U.S. East Coast than elsewhere–will infiltrate coastal aquifers, raising water levels and thereby abetting flooding, as well as making water unpotable. Salt water is an insidious enemy of steel and concrete, and increased corrosion will shorten the lifespan of already elderly tunnels, bridges and electrical infrastructure.

Here, class politics kicks in again. Faced with the choice of becoming more like Holland or ending up like Atlantis, cities like New York will triage storm-damage repair and investment in new infrastructure. Saving lower Manhattan, for instance, may involve the construction of enormous floodgates in New York Harbor that will deflect storm surges and higher tides toward poorer parts of Brooklyn and Queens.

But even a triage strategy of preferential public investment for the wealthy parts of the metropolis may be beyond the means of New York and Albany as well as the global insurance industry. This was the obvious message sent by Michael Bloomberg’s endorsement of Barack Obama: New York and the Atlantic seaboard need federal investment on the scale of President Eisenhower’s interstate highway program.

SANDY FORCED the issue of climate change into the presidential campaign at the last moment, to the obvious advantage of Obama. But the record of Obama and the Democrats shows that no one should place much hope in them to deal aggressively with the threat.

THEORETICALLY, A 20-year federal program for rebuilding coastal infrastructure and protecting harbors might make eminent Keynesian sense. But it’s unlikely that Obama can disguise Stimulus Part Two as hurricane repair. I think the only question on the table at the present moment is how much austerity in lifeline programs the president will concede to make fiscal compromise possible.

Nor is it clear that the rediscovery of global warming as a clear and present danger will lead to new attempts to mitigate carbon emissions. Indeed, Sandy may have the opposite effect. A focus on repair and adaptation may further marginalize the case for carbon taxes. In any event, the shale energy revolution puts carbon in the driver’s seat for another generation or two.

Natural gas will continue to reduce the dependence of utilities on coal, but the coal will be produced anyway and exported to China. No wonder that Pricewaterhouse Coopers recently warned about the cataclysmic disruption of global supply chains as 6 degrees Centigrade warming appears the most likely future in 2100.

The politics of climate adaptation will be torturous since federal spending will involve large net tax transfers from one region or sub-region to another. Why should Tea Party activists in the Great Plains care about saving New York City? What Democrat would actually support something so unpopular as federal regulation of coastal development (even though a model exists in the Mississippi’s flood plain)?

And as Katrina showed, the poor inhabitants of the Gulf Coast, whose natural storm barriers have been sacrificed to the development of the oil and sulfur industries, have no advocates whatsoever. If large numbers of people are relocated from coastal target areas, they will not be the wealthy inhabitants of Hilton Head and its replicas.

Years ago, I enraged many people with an article entitled “The Case for Letting Malibu Burn.” There’s an equally strong case for letting elite beach resorts and second-home communities drown.

THOUGH LESS spectacularly than in New Orleans, the aftermath of the storm has exposed another failure of the federal response to disasters. In fact, it’s widely acknowledged that the volunteer grassroots efforts of Occupy Sandy have been more effective. What does this say about where we go next?

THE ROLE of Occupy Sandy confirms Rebecca Solnit’s thesis that disaster response usually comes from the bottom up, through the self-organization of the victims, and it often generates temporary “utopias” of cooperation and democracy.

But to build upon both the anger and hope in such situations requires programmatic initiatives. Until Mayor Ed Koch, who held the office in the 1980s, when ethnic backlash overwhelmed borough politics, the left in New York City–ranging from Socialists to Communists to Labor Party supporters to Black liberationists–had repeatedly contested the agendas of the Rockefellers on one hand and Tammany Hall on the other. The left offered astute analysis and put forward alternative municipal platforms, winning some historic victories–rent control, public housing and so on.

Taking New Orleans as the paradigm of disaster turned to elite advantage, it’s vitally important that Occupy and the “broad left” in New York anticipate, analyze and contest Bloomberg’s obvious attempt to build a new corporate consensus about the city’s future. And there is no better guide to how ruling class rules in Big Apple than Bob Fitch’s The Assassination of New York, published by Verso.

If Nelson Rockeller could deindustrialize Manhattan and drive away hundreds of thousands of manufacturing jobs for sake of rising land values, what will the new game bring?

UCSB anthropologist studies reciprocity among chimpanzees and bonobos (UC Santa Barbara)

20-Nov-2012
By Andrea Estrada

Primate behavior may reveal clues to evolution of favor exchange in humans

Adrian Jaeggi, a postdoctoral researcher in anthropology at UC Santa Barbara, and a junior research fellow at the campus’s SAGE Center for the Study of the Mind, is studying this question of reciprocity, using chimpanzees and bonobos as his test subjects. His findings appear in the current online issue of the journal Evolution & Human Behavior.(Santa Barbara, Calif.) –– When your neighbor asks to borrow a cup of sugar and you readily comply, is your positive response a function of the give and take that characterize your longstanding relationship? Or does it represent payment –– or prepayment –– for the cup of sugar you borrowed last week, or may need to borrow a month from now?

“The article focuses on the question of whether individuals do favors because they expect them to be reciprocated at some other time, and, more specifically, whether such exchanges have to happen immediately, or can take place over longer time spans,” Jaeggi explained. “We studied the question in chimpanzees and bonobos –– our two closest living relatives –– and looked at the exchanges of grooming and food sharing, which are two common types of favors among these apes.”

Two female chimpanzees take food from a male (center).

According to Jaeggi, while results of his research provide some evidence for immediate exchanges, they more strongly support the notion that favors are exchanged over long periods of time. Calculated exchanges, in which individuals keep a detailed score of past interactions, are much less common than the more loosely balanced exchanges that take place in stable relationships.

“In the chimp group we studied, we knew there was a lot of this long-term exchange,” said Jaeggi. “We didn’t find any evidence for a short-term effect.” Chimpanzees live in stable social groups, he continued, and have a relatively long life span. They recognize others in the group, form long-term relationships, and associate with individuals who have helped them in the past.

“In the wild, for example, chimps hunt for smaller monkeys, and they commonly share the meat. It’s similar to what hunters and gatherers do,” Jaeggi said. “Our experiment is meant to mimic the situation in which you have a large monopolized food item.” Using grooming as the favor, the researchers studied whether or not a chimp that had just been groomed was more likely to share food with the pal who had groomed him. “That would provide evidence for keeping track of who has done a favor,” Jaeggi said. However, grooming releases endorphins, he added, and that general sense of wellbeing on the part of the food owner might lead to more indiscriminate food sharing.

One female bonobo rests her hand on another’s shoulder.

Bonobos, on the other hand, presented a different result. While chimpanzees have a formalized dominance hierarchy, food is available to most individuals, no matter what their group status. That is not the case with bonobos. Bonobos don’t establish formal hierarchies, so they don’t know on an individual basis where they fit within the group. Also, they don’t form coalitions as much as chimpanzees do. “The food sharing situation sort of freaked them out,” said Jaeggi. “All of a sudden there’s all this food that’s owned by one individual, and they don’t really know what to do about it. They want to get it, but they don’t dare, because they don’t know what the consequence will be.””We found that sharing was predicted by who the chimps’ long-term friends and partners were,” he said. “Grooming just before didn’t play a role. Food owners didn’t share specifically with their groomers. Nor did the groomers act in return. They didn’t pay for the food, and they didn’t reward the food owner’s generosity afterward.”

Jaeggi added that bonobos did a lot more grooming, most likely because they sought the calming effects of the endorphins. “And there we did see an effect of grooming on sharing,” he said. “Chimps would go and take food pretty confidently, but Bonobos were more reticent. They’d reach out and then groom. It seemed to be that they’d groom to release tension, and then there would be these short-term reciprocal exchanges.”

But even those exchanges seem to be more a byproduct of the need to reduce tension, he noted, rather than short-term contingencies used to establish reciprocity.

So, what do these findings tell us about ourselves? Jaeggi suggests we should take seriously this evidence of long-term reciprocity in animals. “It’s really not qualitatively different from what people do,” he said. “They establish these lasting relationships, and within them, services are exchanged without the participants keeping close track of who’s doing what for whom.”

However, humans also have the capacity for more contingent reciprocity, which raises questions about its purpose, and how it developed. “Maybe that’s something that’s more culturally learned,” said Jaeggi.

16 perguntas sobre o PCC (OESP)

O que é o PCC e qual o seu tamanho? Qual o seu papel dentro e fora das prisões? O que aconteceu depois que Marcola assumiu a liderança da facção? Por que os ataques aconteceram?

23.janeiro.2010

Para responder essas e outras perguntas, o blog Crimes no Brasil promoveu um debate com quatro pesquisadores que fazem pesquisas de campo em prisões e nas periferias de São Paulo tentando entender o significado do PCC nos dias de hoje. O texto com as respostas de cada um deles é imenso  e já cansei de ouvir que posts desse tamanho são impublicáveis. Não concordo, já que espaço ilimitado eu tenho na internet e não no jornal.

Além disso, o debate é riquíssimo e o assunto, pouco conhecido. Como verão aqueles que chegarem até o fim, as opiniões estão longe de serem consensuais e ainda existem muitas dúvidas sobre esse fenômeno social que não cansa de surpreender e de assustar aqueles que vivem em São Paulo.

Segue uma pequena apresentação dos entrevistados e depois as perguntas e respostas na íntrega. Parte delas foi publicada no Estadão de domingo (24/01), no Caderno Metrópole.

***

Professor do Departamento de Sociologia da Universidade Federal de São Carlos, Gabriel Feltran, de 34 anos, começou a estudar as periferias de São Paulo interessado nas mudanças sociais. Durante as pesquisas, que viraram tese de doutorado premiada ano passado pela Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Ciências Sociais, foi impossível deixar de falar sobre o Primeiro Comando da Capital, sempre presente nas conversas.

A antropóloga Karina Biondi, de 32 anos, atualmente faz doutorado na UFSCar. Começou a estudar o PCC depois que o marido foi preso, em 2003. Durante as visitas, fez pesquisas de campo cujo material deu origem à dissertação Junto e Misturado: uma etnografia do PCC, que em março será publicada em livro pela Editora Terceiro Nome. O marido dela, depois de cinco anos preso à espera de julgamento, foi inocentado.

A dissertação da socióloga Camila Nunes,  A igreja como refúgio e a Bíblia como esconderijo: religião e violência na prisão, concluída na USP, também virou livro (Editora Humanitas). Agora, ela finaliza doutorado com base em pesquisas em presídios paulistas.

O antropólogo Adalton Marques, de 27 anos, defende sua dissertação em Antropologia na USP em fevereiro, chamada Crime, proceder, convívio-seguro – um experimento antropológico a partir de relações entre ladrões.

Na semana passada, eles travaram com o Estado o debate abaixo:

1) É possível dimensionar o tamanho e a influência do PCC? Quantos integrantes existem? Eles têm influências sobre quantas prisões?

Karina – De acordo com minha pesquisa, o PCC está presente na grande maioria das instituições prisionais paulistas, mesmo em prisões que, eventualmente, não conta com a presença de “irmãos” (seus membros batizados). Narrei um desses casos em minha dissertação, um Centro de Detenção Provisória recém-inaugurado que foi conquistado para o PCC por presos que não eram seus membros. O número de “irmãos” é desconhecido até por eles próprios. Surpreenderia-me saber que algum deles tem esse controle, já que um “irmão” sequer conhece todos os seus outros “irmãos”. O PCC, como procuro descrever em minha dissertação, não se restringe à soma de “irmãos”; é um fenômeno muito mais amplo, complexo e, sobretudo, múltiplo.

Camila – É muito difícil dimensionar o tamanho do PCC, mas de acordo com minha pesquisa, realizada em unidades prisionais, com entrevistas com diretores, funcionários e presos, o PCC tem influência em cerca de 90% das 147 prisões paulistas. Essa influência é um tanto quanto diversificada em cada uma das unidades, a depender das relações que se estabelece com a administração do local, na qual se estabelecem seus limites. No Estado inteiro há cerca de 6 ou 7 unidades aproximadamente, que são controladas por outros grupos ou que são chamadas “neutras” designando, assim, a inexistência das chamadas “facções”. Essas unidades, contudo, não permitem a entrada de presos que pertencem às facções e para elas são transferidos os presos que anteriormente ficavam no “seguro”. Ou seja, se um preso que se encontra numa penitenciária controlada pelo PCC sente-se ameaçado e pede “seguro”, ele provavelmente será transferido para uma dessas unidades “neutras” que são, de fato, unidades de “seguro”, tal como a definem diretores e os presos que nelas se encontram. Enfim, excetuando-se essas unidades e umas poucas controladas por outras facções, as demais se encontram sob a influência – maior ou menor – do PCC.

Gabriel – do lado de fora das prisões a lógica é exatamente a mesma. Ouço relatos de que “agora é tudo PCC”, referindo-se ao “mundo do crime” nas periferias há alguns anos. Mas quando vamos olhar os detalhes, aparecem situações curiosas. Por vezes, como diz a Karina, o PCC está mesmo onde não há um “irmão”. Por exemplo, um ponto de venda de maconha e cocaína, numa das favelas em que estudo, não é gerenciado por nenhum “irmão” (os outros pontos são). No entanto, quem gerencia esse ponto, uma pessoa respeitada na favela, lida bem com a presença do PCC e diz também concordar com “a lei” dos “irmãos”. Não saberia dizer o quanto casos como esse são freqüentes, e também me surpreenderia se alguém soubesse fazê-lo, mesmo entre os integrantes da facção.

Adalton – Considero um equívoco pensar o PCC a partir de quantificação dos “batizados”, bem como de mensuração da extensão dos efeitos provocados por suas ações. Definitivamente, o PCC não é isso! O PCC não é somente um aglomerado de membros e de ações. Antes, se trata de um conjunto singular de enunciados, forte (o que não quer dizer necessariamente violento) o bastante para afirmar a “paz dos ladrões” – “ladrões” são aqueles “considerados” como tais, é claro – e a “disposição pra bater de frente com os polícia” e “pra quebrar cadeia, pra fugir”. Imprescindível dizer que a efetuação dessas coisas não depende da presença de um “batizado”. Portanto, as ações dos membros do PCC não são condições necessárias para a atualização do PCC.

Em minha dissertação arrisco os mesmos 90% afirmados por Camila – Karina também teve essa impressão em seu campo. Contudo, entendo que, mais decisivo que a mensuração de extensões, é perceber que isso que se chama PCC se efetua nos quatros cantos da cidade, onde se fala e se escuta, por exemplo, as já clássicas expressões “veja bem, fulano”, “[en]tendeu?” e “sumemo” (isso mesmo). Esse modo específico de travar conversas é uma marca registrada do PCC, que substitui os “palavrões” e as ofensas banais por um novo jargão “do crime”, especialmente preocupado com as “palavras”, exatamente por saber da veracidade do dito popular “peixe morre pela boca”.

Um último ponto. Esse modo de travar conversas é efetuado também por crianças de 7, 8, 9 anos, que já sabem que não devem mandar seus colegas “tomar no cu”. Já preferem dizer: “Veja bem, fulano, essa fita não tá certa. Vamo debater essa fita”.

2) Qual o papel do PCC nos dias de hoje?

Karina – Minha pesquisa de campo dentro de algumas prisões revelou que o PCC tem dois grandes papéis ali: ao mesmo tempo em que regula a relação entre os prisioneiros, é uma instância representativa da população carcerária frente ao corpo de funcionários das prisões.

Gabriel – Minha pesquisa tem mostrado que, fora das prisões, e muito especificamente em algumas regiões das periferias urbanas, o PCC tem um papel de regulação das normas de conduta internas ao “mundo do crime”, que em algumas favelas também operam como regra geral de conduta. Nesses espaços, os “irmãos” são percebidos como uma instância regradora – que pode gerar medo, porque tem acesso à violência letal – mas à qual se pode recorrer no caso de injustiças sofridas. A depender da situação de injustiça experimentada, se pode recorrer ao Estado, a uma igreja, à imprensa, ou aos “irmãos”.

Camila – dentro das prisões entendo que o PCC exerce um papel muito similar ao apontado pelo Gabriel, para o caso da periferia. Constitui-se como instância reguladora, não só na relação presos/administração prisional, mas, sobretudo, na relação entre a população carcerária, intervindo diretamente na resolução de conflitos e exercendo o papel de árbitro e juiz, inclusive impondo punições, quando se considera que seja o caso.

Adalton – Entendo que o papel do PCC, nos dias de hoje, está intimamente ligado à manutenção do que compreendem por “Paz”, “Justiça”, “Liberdade” e “Igualdade”. As forças despendidas para assegurar esses valores passam pela efetuação de suas duas políticas centrais. A primeira consiste em esforços para estabelecer a “paz entre os ladrões”, a “união do crime”, acabar com a matança que tinha lugar no “mundo do crime”, fazer com que os “ladrões” sejam “de igual”. A segunda se divide em duas frentes: 1ª) “bater de frente com os polícia” – categoria que abarca policiais, agentes prisionais, diretores e outros operadores do Estado – a fim de protestar contra a situação imposta aos presos, considerada “injusta” por eles; 2ª) “quebrar cadeia”, manter ativa a “disposição” (“apetite”) para fugir, enfim, cultivar a vontade de “liberdade”.

3) Quais as principais mudanças que aconteceram na facção ao longo dos anos?

Karina – O sistema prisional do Estado de São Paulo sofreu um crescimento vertiginoso durante as décadas de 1990 e de 2000. O número de presos, bem como o número de unidades prisionais triplicou nos últimos 20 anos. Mas o impacto visual dessa política de encarceramento em massa foi amenizado por um processo de pulverização dessa população, com a construção de prisões em regiões mais afastadas dos centros urbanos. Acompanhando essa política estatal, vimos também mudanças na política operada pelos prisioneiros. As pessoas costumam utilizar o termo “política” se referindo à política partidária, mas utilizo-o aqui de forma mais ampla, para me referir ao modo como os prisioneiros conduzem suas existências e suas lutas. Minha pesquisa aponta para duas mudanças fundamentais nessa política operada pelos prisioneiros: uma relacionada ao nascimento e expansão do PCC e outra a uma revolução interna, a introdução do “ideal de igualdade” em seu lema e suas práticas.

Camila- Entendo que está perguntando as mudanças no PCC ao longo dos anos. Do meu ponto de vista o PCC mudou bastante. Para responder de forma mais sintética, eu diria que houve uma racionalização do seu modo de operar. Nos primeiros anos de sua existência, quando havia ainda a necessidade de expansão e “conquista” de territórios, além do discurso de necessidade de união da população carcerária para lutar contra a opressão do Estado, era necessária a imposição de seu domínio a partir da demonstração da violência explícita contra aqueles que rejeitavam ou eram recalcitrantes em aceitar esse domínio. Por isso, na década de 1990 – até o início dos anos 2000 – assistia-se cenas grotescas de violência no sistema carcerário, muitas delas protagonizadas pelo PCC que fazia questão de explicitar a sua capacidade de imposição da violência física, especialmente durante as muitas rebeliões ocorridas no período. Essa explicitação da violência era importante para demonstrar o seu poder para os presos e também para o Estado.  A partir de 2003, 2004, o PCC alcança uma relativa hegemonia no sistema prisional – e, talvez, em algumas atividades fora dele – o que torna o exercício expressivo da violência física, como forma de punição aos “traidores”, desnecessária. Ou seja, não era mais preciso demonstrar publicamente sua capacidade de imposição da violência física, uma vez que o PCC já tinha seu domínio consolidado na ampla maioria das prisões paulistas, e não havia mais “rivais” a serem combatidos. Era possível, portanto, “gerenciar” a população carcerária – que já havia “aderido” às novas regras vigentes no sistema prisional – a partir de formas menos violentas, inclusive com o estabelecimento de instâncias de diálogo, debate e participação nas decisões que envolviam não apenas a cúpula, mas os diversos segmentos que compõem o PCC, além de alguns presos que não fazem parte do grupo.

Adalton – Houve uma mudança decisiva entre o final do ano de 2002 e o início de 2003. Geléião e Césinha, os dois últimos “fundadores” vivos, foram “escorraçados” – essa é a palavra utilizada – pelos “presos” e mandados para o “seguro”. Segundo se diz, os “presos” perceberam que estavam sendo “extorquidos” e “lagarteados” – tornar-se “lagarto” de alguém é o mesmo que permanecer sob seu jugo, convertendo-se em mero instrumento de sua vontade – pelos dois e reagiram ao estado de coisas então vigente. Diz-se, também, que Marcola teve um papel decisivo, tanto para mostrar aos “presos” a situação a que se submetiam, quanto na “guerra” travada contra os dois “fundadores”. É comum ouvir de meus interlocutores que Marcola “bateu de frente” com os “fundadores” e recebeu “apoio total da população carcerária”.

Esse acontecimento, segundo meus interlocutores, foi decisivo para “o PCC aprender com os erros do passado”. Desde então, conforme compreendem, foi extirpada a posição política “fundador”, bem como a figura de “general” – última variação de mando no seio desse coletivo –, pondo fim à diferença imensurável (infinita, portanto) que os separavam dos “irmãos” (para não falar dos “primos”). Desde então, está dito que não mais pode haver diferenças absolutas entre os relacionados ao PCC – antiga prerrogativas dos “fundadores” –, mas somente diferenças de “caminhadas” – entre “pilotos”, “irmãos” e “primos”. Esse é o movimento político guardado na adição da quarta orientação basilar do programa do PCC: “Igualdade”. Trata-se de uma renovação profunda do antigo lema, que trazia três princípios fundamentais: “Paz, Justiça e Liberdade”. Enfim, de acordo com essa nova diretriz, as diferenças de “caminhada” não podem mais ser confundidas com quaisquer relações de mando. Todos os  preso de “cadeias do PCC”, sem exceções, devem ser efetuações do signo “de igual”.

Esse acontecimento, sem dúvidas, se trata de uma re-fundação do PCC.

4) Marcola, apontado como liderança do PCC, exerce realmente essa função? O que mudou no PCC com a saída de Geléião (antigo líder) e chegada do Marcola?

Karina – Não só Marcola não exerce, como não existe no PCC uma forma de liderança que pressuponha uma hierarquia piramidal, uma estrutura rígida ou formas de mando e obediência. Isso justamente porque, com a saída do Geleião, Marcola promoveu a inserção da “igualdade” ao lema e às práticas do PCC que, com isso, sofreu profundas transformações, dentre elas a extinção de lideranças que exerceriam poder sobre os demais integrantes. Essas transformações – que não param de se transformar – são como antídotos a quaisquer manifestações de mando ou de qualquer relação que venha a ferir o princípio de “igualdade”.

Camila – Na minha concepção, a ascensão de Marcola coincidiu com o momento em que o PCC conquista a hegemonia e estabilidade nos locais onde exerce seu controle, o que permitiu o processo de racionalização citado na pergunta anterior. Acredito, no entanto, que o Marcola teve uma importante influência nesta mudança no PCC a partir da priorização de formas mais racionais de “controle”, com menos recurso à violência e a difusão de instâncias de participação, a fim de conferir mais legitimidade ao domínio do PCC, buscando a adesão e a manutenção desta adesão dos membros ou “simpatizantes” a partir desta nova forma de ação – supostamente mais democrática – e não mais pelo medo ou ameaça.

Adalton – Se ousarmos ceder, ao menos por um instante, ao ponto de vista dos “ladrões”, perceberemos o quanto lhes é detestável aquele que “quer mandar”, comumente chamado de “bandidão”. Marcola, ao contrário dos “bandidões”, é considerado “de igual” por meus interlocutores. É “respeitado” por todos interlocutores com quem tive contato porque é considerado “humilde” e por que se mostrou “cabuloso” todas as vezes que foi preciso (quando “bateu de frente” com Geléião e Césinha, por exemplo).

Nesse sentido, o posto que lhe é atribuído pela grande mídia – “Líder máximo do PCC” – não encontra sentido nas práticas cotidianas dos presos. Trata-se de um grande equívoco. Se os presosobedecessem a uma Liderança desse tipo (do tipo que manda), segundo seus próprios pontos de vista, converter-se-iam em “lagartos”! Basta saber o que aconteceu com tantos outros presos que quiseram ascender à posição de mando, inclusive alguns “fundadores” do PCC: morreram ou foram “escorraçados”.

5) Como funciona o PCC? Como as ordens chegam das lideranças até os linhas de frente? Como podemos hierarquizar o PCC: torres, disciplinas, etc?

Karina – Como o Gabriel disse, não se trata de ordens, mas de “salves”, que possuem um estatuto mais de orientação e recomendação do que de ordem ou de lei, de decreto. O que o preso quer dizer com “ninguém é mais do que ninguém”, “ninguém é obrigado a nada”, “é de igual”? Não basta ouvir o que eles têm a dizer, é preciso levá-los a sério. Foi isso que procurei fazer em minha dissertação e que permitiu que eu enxergasse no PCC uma formação que, por um lado, não pode ser caracterizada como hierárquica, mas que por outro lado tem a hierarquia como um fantasma que não pára de aparecer em seu interior. Os prisioneiros tecem reflexões riquíssimas a esse respeito, reflexões que são indissociáveis de suas próprias experiências cotidianas. Esta questão é muito complexa e não há espaço aqui para respondê-la, mas trabalhei-a em minha dissertação de mestrado, que será publicada em março pela Editora Terceiro Nome.

Camila: O PCC possui uma hierarquia que não é de tipo “piramidal”. Até onde pude compreender, há uma “cúpula” que figura como instância máxima e que conta com cerca de 18 membros e que são chamados de “finais”. Abaixo deles há as “torres”, que controlam grandes áreas, geralmente divididas a partir do código DDD; abaixo das “torres” essa grande área é dividida e essa divisão será de acordo com o tamanho da área, que será controlada por um disciplina. Mais uma vez o tamanho da área definirá se abaixo desse “disciplina” haverá outras subdivisões. Essa estrutura – da torre para baixo – se duplica uma vez que uma se refere ao sistema carcerário e a outra às regiões fora do sistema. Abaixo dos “disciplinas” (que podem ser responsáveis por uma cidade do interior, um bairro, uma unidade prisional ou um raio da prisão) há os irmãos. Com exceção da cúpula todas as demais “instâncias” são inteiramente intercambiáveis, a depender da necessidade. Ou seja, todos os irmãos devem estar preparados para assumirem o posto de disciplina e/ou torre. Claro que tudo isso é um tanto quanto fluido e essa forma de organização pode mudar – e muda muito – a qualquer momento, a depender da ação das forças repressivas ou das necessidades e interesses da facção. Mas, essa foi a estrutura – aproximada – que consegui apreender na minha pesquisa.

Adalton – Segundo entendo, ordens e hierarquias são consideradas desarranjos de valores aos relacionados ao PCC. Quem “corre com o PCC” está na “caminhada do PCC”, está na mesma “sintonia do PCC”, está “junto e misturado” (para parafrasear o título da dissertação de Karina) “com o PCC”. Esse “correr junto”, esse “estar na mesma caminhada”, esse “estar na sintonia” nada tem a ver com obediência a ordens. Antes, se trata de um modo específico de existir: “ser lado a lado com o PCC”. E não há um Líder Mal ou uma Ideologia por trás disso.

6) Quais as principais mudanças nas prisões ocorridas com o surgimento do PCC? 

Karina – São muitas e conhecidas as mudanças que ocorreram nas prisões após o nascimento do PCC: diminuição no número de homicídios e das agressões entre prisioneiros, fim do consumo de crack e dos abusos sexuais, não se vende mais espaço na cela, não se troca favor com agentes penitenciários em benefício próprio em detrimento de outros, não se fala palavrões. Mas é importante lembrar que essas mudanças não são frutos de leis, decretos ou imposições. Suas propostas nascem de amplos debates e são expandidas e adotadas paulatina e assistematicamente, não sem resistências e diferenciações na condução dessas políticas. É muito comum uma unidade prisional funcionar de forma diferente de outras, principalmente no que diz respeito a mudanças ainda não tão cristalizadas.

Camila – A mudança fundamental foi a criação de uma instância de regulação das relações sociais na prisão. Antes (do PCC) as regras eram impostas – e quebradas – por líderes individualizados que alcançam essa posição a partir da imposição da violência física, do medo e da ameaça, além da formação de pequenos grupos que se utilizavam dessa superioridade física para dominar os mais fracos. Essa forma de domínio era extremamente efêmera e precária, uma vez que recorrentemente surgiam outros presos ou outros grupos que buscavam ocupar este espaço. Com o surgimento do PCC, este se constituiu como essa instância reguladora, de imposição e controle do cumprimento das regras, assim como de punição aos transgressores. Não se tratava mais de um domínio baseado puramente na violência e na ameaça e nem mais era uma dominação individualizada: trata-se agora de um grupo, organização, ou seja, lá como se chame o PCC; o fato é que a regulação das relações sociais passou a ser mais “institucionalizada”, menos dependente de indivíduos e, portanto, muito mais estável. Assim, muitas regras foram criadas, entre elas a proibição do uso do crack (provavelmente no início dos anos 2000), a proibição de matar um companheiro sem prévia autorização do PCC, a proibição do porte de facas e outros instrumentos cortantes, dentre muitas outras (essa última mais recentemente, a partir de 2006).

Adalton – Concordo plenamente com a resposta dada por Karina.

7) As lideranças do PCC tem poder de barganha com as autoridades nas prisões?

Karina – sobre lideranças, ver resposta à pergunta 4. De qualquer forma, os presos não vêem como barganha as negociações feitas com as autoridades das prisões. Trata-se, para eles, de reivindicações do que consideram seus direitos. O sucesso de tê-las atendidas não tem relação com uma suposta posição de um irmão dentro do PCC, mas depende exclusivamente da habilidade dos presos – “irmãos” ou não – em reivindicar e negociar.

Camila – Uma das funções das lideranças do PCC nas prisões – não só deles, mas sobretudo deles – é o estabelecimento de diálogo com a administração prisional, fazendo a ponte entre esta e a população carcerária. Neste sentido, o grupo que constitui a chamada “linha de frente” da unidade prisional  (piloto/disciplina, faxinas) concentra as reivindicações dos presos e estabelece canais de diálogo com administração, que podem ser mais ou menos tensos. Como dito antes, os diretores pode ter uma maior ou menor tolerância com esse papel exercido pelos irmãos. Há unidades, por exemplo, que o diretor não admite que cresça muito o número e “irmãos” e passa a transferi-los quando entende que eles estão em quantidade muito grande ou quando eles “incomodam”, ou seja, explicitam demais o papel que exercem; em outras unidades, a tolerância é maior e o PCC pode ter uma influência maior também.

Adalton – O termo lideranças do PCC não me parece apropriado. De qualquer forma, os “presos de cadeia do PCC” – sejam “pilotos”, “irmãos” ou “primos” – travam relações com a administração prisional, sejam elas belicosas, denominadas de “guerra”, sejam elas não-belicosas, denominadas de “dar uma idéia”. Segundo suas próprias auto-descrições, jamais travam relações amistosas com a administração prisional. Justamente por que esse modo de “proceder” era comum entre “presos das antigas” que se aproximavam das autoridades para encontrar melhores condições durante suas passagens pela prisão, delatando (“caguentando”) seus companheiros como contrapartida aos favores recebidos.

8) Qual o papel do PCC hoje do lado de fora das prisões?

Gabriel – Certa vez o Mano Brown disse: “o Estado defende a favela, dá segurança ao favelado, com a sua polícia? Não. Então a favela tem que se defender de outra forma”. Há que se entender o que ele diz. Se a frase causa estranhamento a quem acredita na universalidade da democracia, ela é perfeitamente inteligível na perspectiva de quem morou numa favela. Pois, nessa perspectiva, existe um repertório amplo de instâncias de justiça, autoridade e uso da força, para além do Estado.

Ora, quando a justiça estatal funciona, não é preciso criar outra: ninguém da favela recorre ao PCC para ganhar horas-extras não pagas. Por quê? Porque a justiça do trabalho tem funcionado bem nesses casos. E em diversas outras áreas – infra-estrutura urbana, moradia, saúde, assistência social – há avanços nas políticas voltadas às periferias. O PCC não cuida de nenhuma dessas áreas. Mas na questão da segurança pública, e do emprego, as coisas pioraram muito para os favelados ao longo dos últimos 30 anos. E não por acaso, especialmente entre os mais pobres o “crime” disputa legitimidade tanto com o trabalho lícito, pois gera renda, quanto com a justiça estatal, pois pode-se obter reparação de danos a partir do recurso a ele.

Se alguém é agredido ou roubado na favela, e sente-se injustiçado, não chama a polícia, chama os “irmãos”. E se não consegue trabalho, ou não tem os requisitos mínimos para obtê-lo, sempre pode ocupar postos nos mercados ilícitos.

A aparição do PCC do lado de fora das prisões, a partir do início dos anos 2000, é um passo a mais no estabelecimento de atores extra-estatais de regulação dessa dinâmica social. Sofistica-se, por especialização de funções, o que o “crime” já vinha fazendo de modo menos estruturado. Trata-se portanto de uma conseqüência  da cristalização de deficiências de garantia de direitos de uma parcela da população, ao longo de décadas. Tentando resolver essa questão com encarceramento massivo, desde os anos 1990, o Estado jogou mais lenha nessa fogueira. O paradoxo político que essa dinâmica expõe, e que exploro na minha tese de doutorado (a ser publicada como livro ainda esse ano), é que isso se dá ao mesmo tempo em que se consolida a democracia institucional no Brasil.

Adalton – O papel do PCC fora das prisões segue a mesma “sintonia” de suas políticas dentro do cárcere, e vice-versa. Suas diretrizes visam a “paz entre os ladrões”, “justiça” nos “debates” realizados, “correria” para trazer à “liberdade” os “irmãos que estão no sofrimento” (“estar no sofrimento” é o mesmo que “estar preso”) e “igualdade pra ser justo”.

9) Como as ordens chegam do lado de fora?

Gabriel – Não se trata de “ordens”, mas de “salves”, diferença sutil mas relevante. Os “salves” representam uma posição a ser considerada, mas é no “debate” que eles podem se transformar em ação prática, ou não. E os “salves” circulam por dentro e fora das prisões, como se sabe muito bem, por meio de telefones celulares.

Adalton – Nada a acrescentar à resposta do Gabriel.

10) Como o PCC faz para exercer influência em diferentes territórios?

Karina – o PCC não é externo aos territórios, ele brota no interior deles.

Gabriel – concordo com a Karina, e acrescento que em cada território da cidade há uma tradição de atividades criminais específicas, e uma dinâmica social também específica que interage com ela. O PCC atua nesses territórios negociando e/ou usando a força, a depender do caso, para estabelecer sua legitimidade. Sem pensar essas relações, caímos no equívoco de pensar que o PCC domina tiranicamente esses territórios, o que é uma bobagem. A análise de um ator complexo como o PCC, numa cidade imensa como São Paulo, é uma empreitada muito desafiadora e ainda estamos engatinhando na compreensão desse fenômeno.

Adalton – Nada a acrescentar às respostas da Karina e do Gabriel.

11) As lideranças realmente exercem poder efetivo sobre a massa de integrantes ou as decisões são tomadas em níveis mais baixos de hierarquia?

Karina – Gilles Deleuze e Féliz Guattari escreveram um texto magnífico chamado “Um só ou vários lobos?”, uma crítica a um famoso caso freudiano, o Homem dos Lobos. Os autores chamam a atenção para as reduções que o psicanalista elabora sobre o relato do paciente. Apesar das constantes referências a matilhas, Freud as despreza, reduzindo sempre a matilha (o múltiplo) ao lobo (a unidade). Essa redução foi fundamental para suas construções teóricas, que cada vez mais se distanciavam dos problemas relatados pelo paciente. Todos os relatos dos pacientes se transformavam em substitutos, regressões ou derivados de Édipo. Não importa o que se relatava; de antemão, Freud sabia que era o pai. O mesmo ocorre com o PCC. Não importa o que seus participantes dizem, alguns analistas só vêem hierarquia, só enxergam lideranças, ordens, leis e decretos. Onde vêem diferenças, as tratam como contradições que anseiam em solucionar. “É o pai!”, diria Freud. “É a Lei! É o Marcola!”, dizem esses analistas, sempre em busca de um soberano, de uma unidade. Matam as diferenças, desprezam as multiplicidades que dão forma ao PCC. E se distanciam cada vez mais do fenômeno múltiplo e complexo que pretendem analisar.

Camila – a maioria das decisões, que envolvem a “administração” cotidiana das unidades prisionais – e, acredito que também da periferia – como resoluções de conflitos simples, negociações com a administração prisional etc. são realizadas pelos irmãos e disciplinas responsáveis pelo próprio local, normalmente a partir do “debate” entre os mesmos que, algumas vezes, inclui outros presos que não são irmãos, mas são muito próximos deles. Quando se trata de algo mais sério ou importante – como agressões entre irmãos, delação, estupros, roubos – e que demandaria uma punição mais rigorosa, como a exclusão do PCC, a agressão ou a morte, então as discussões são levadas até as instâncias superiores e que, depois de ouvir todos envolvidos, tem papel decisivo na “sentença”.

Adalton – Mais uma vez devo dizer que essa noção de liderança, tão dependente de um princípio hierárquico, não funciona no caso em tela. Os “presos de cadeias do PCC” não endossam essa externalidade entre lideranças e massa. Senão, veriam a si mesmos numa relação entre “bandidões” (um avatar para essa liderança imperiosa) e “lagartos” (um avatar para essa massa destituída de força e bastante obediente). O que, por certo, lhes é uma relação odiosa.

12) Qual a importância do tráfico de drogas para o PCC? Quais são as principais formas de financiamento?

Karina – É mais o objetivo de minha pesquisa indagar sobre “qual a influência do PCC no tráfico e no consumo de drogas” do que procurar saber qual a importância do tráfico de drogas para o PCC. Interessa-me mais o que o PCC promove do que o que o financia. Pois a resposta a essa pergunta seria óbvia: se há alguma importância, é monetária. Mas isso não diz muito sobre meu objeto de pesquisa. É muito mais interessante investigar qual a relação da presença do PCC nas periferias de São Paulo e a concentração de consumidores de crack na região central da cidade. Para tanto, é preciso, novamente, levar a sério o que dizem sobre os “nóias”, sobre o porquê deles não serem bem aceitos nas “quebradas”, sobre o porquê de eles migrarem para o centro da cidade, sobre por que o centro é permitido. Essas sim são questões que eu gostaria de aprofundar.

Gabriel – em minha tese de doutorado levanto a hipótese de que, nos lugares em que faço pesquisa, a acumulação de capital pelo tráfico de drogas permitiu nas últimas décadas a diversificação, a especialização e a profissionalização de outras atividades criminais – roubo de carros, cargas, assaltos de grande especialização, etc. O PCC está em todas essas atividades, pelos depoimentos que obtive. Mas não tenho dados suficientes para comprovar essa hipótese, ou dizer que é assim em toda a cidade.

Camila – De acordo com as entrevistas que realizei, o PCC é hoje um dos principais distribuidores de drogas (maconha, cocaína e o material para fabricação do crack) no estado de São Paulo (mas não o único), agindo também em outros Estados mas com uma participação menor. Além desta importante participação o PCC também exerce uma regulação da venda de drogas no varejo, intervindo nas disputas por pontos de venda, nas relações credor/devedor etc. a partir dos disciplinas que estão presentes em vários bairros e cidades do Estado. No comércio de drogas nas prisões o PCC também exerce essa regulação.

Adalton – Essas questões não foram consideradas por mim durante minha pesquisa.

13) Qual o papel do PCC na diminuição da violência no Estado?

Adalton – Entendo que a diminuição da violência no Estado está atrelada a múltiplos fatores. Em minha pesquisa não tomei esse fenômeno como objeto. Portanto, não tenho como traçar uma resposta abalizada aqui. Posso dizer, apenas, que nas periferias que percorro – “quebradas” localizadas nos bairros Cidade Ademar, Pedreira, Capão Redondo, Sacomã, Sapopemba, Jardim Brasil, entre outros, e também em “quebradas” localizadas nas cidades de Diadema, São Bernardo do Campo e Santo André –, comumente escuto vozes que apontam as políticas do PCC como causa principal, às vezes única, para a diminuição das mortes.

Camila – concordo com o Gabriel e Karina, acrescentando que, para mim, a regulação do comércio de drogas no varejo pelo PCC é um dos principais responsáveis pela diminuição dos homicídios no Estado de São Paulo. Todos os entrevistados, sem exceção, mencionaram o fato de “não poderem mais matar” se referindo tanto ao interior das prisões quanto aos bairros controlados pelo PCC. Essa proibição se estende, inclusive, a um fator que sempre se constituiu como um dos principais motivadores de mortes violentas na prisão, a dívida de drogas.

Karina – Muitos prisioneiros e moradores das favelas atribuem ao PCC a responsabilidade pela queda do número de homicídios. O “não pode mais matar” (nas “ruas”) me foi dito pela primeira vez em meados de 2006, por prisioneiros. Logo depois, ouvi de uma moradora de uma favela da cidade de São Paulo que, se antes ela se deparava diariamente com um cadáver na porta de sua casa, hoje, “graças ao PCC, isso não acontece mais”. As informações sobre a influência do PCC na diminuição do número de homicídios no Estado de São Paulo, que antes apareciam para mim apenas em relatos de experiências como essa, foram reforçadas pelas estatísticas oficiais. Se há outros motivos para esta queda, não os encontrei nos relatos daqueles que vivem nas áreas onde ocorrem a maioria dos homicídios.

Gabriel – Tenho trabalhado nisso há algum tempo. O primeiro ponto a considerar é que não há diminuição da “violência” em geral, mas dos homicídios e, muito especialmente, dos homicídios chamados no senso comum de “acertos de conta” entre indivíduos inscritos no “mundo do crime”.  Há muitas evidências empíricas de que o PCC pode ter interferido diretamente na queda dos homicídios, tanto no meu trabalho quanto em outras pesquisas recentes. Durante a pesquisa de campo, quando se comenta porque é que não morrem mais jovens como antes – o que é patente em todos os depoimentos e conversas – as explicações oferecidas são três. A primeira é: “porque já morreu tudo”; a segunda é: “porque prenderam tudo”, e a terceira, mais recorrente, é: “porque não pode mais matar”. Eu levei bastante tempo para compreender essas três afirmações, entender que elas me falavam de uma modificação radical na regulação da violência – e do homicídio – nas periferias de São Paulo, nos últimos anos. E que essa regulação tem a ver com a presença do PCC.

“Morreu tudo” significa dizer duas coisas, na perspectiva dos moradores: a primeira e óbvia é que morreu gente demais ali, e que portanto uma parcela significativa do agregado dos homicídios era de gente das periferias, ou seja, de gente próxima. Aqueles que as estatísticas conhecem de longe – jovens do sexo masculino, de 15 a 25 anos, pretos e pardos, etc. – são parte do grupo de afetos de quem vive ali. A segunda é que aqueles jovens integrantes do “mundo do crime” que se matavam, antigamente, já morreram há tempos; ora, se esse “mundo do crime” persiste ativo, e inclusive se expande, só podemos concluir que seus novos participantes não se matam mais como antigamente. Houve uma mudança, que as duas outras respostas ajudam a entender.

“Prenderam tudo” significa dizer que aqueles que matavam, e não foram mortos, não estão mais na rua. Houve uma política de encarceramento em massa nos últimos quinze anos, em São Paulo. Há um problema pouco comentado, no entanto, entre os defensores dessa política. O que esse encarceramento fez foi retirar uma parcela significativa dos pequenos criminosos das vielas de favela, diminuindo a conflitividade delas e os inserindo em redes bastante mais complexas e especializadas do mundo criminal, que operam nos presídios. O período do encarceramento crescente corresponde, quase exatamente, com o período de aparição e expansão do PCC.

É aí que a terceira afirmação, a mais freqüente de todas, ganha mais sentido. Quando me dizem na favela “porque não pode mais matar”, está sendo dito que um princípio instituído nos territórios em que o PCC está presente é que a morte de alguém só se decide em sentença coletiva, e legitimada por uma espécie de “tribunal” composto por pessoas respeitadas do “Comando”. Esses julgamentos são conhecidos como “debates”, podem ser muito rápidos ou extremamente sofisticados, teleconferências de celular de sete presídios ao mesmo tempo, como escutas da polícia já mostraram. Há uma série de reportagens de imprensa e estudos acadêmicos tratando deles. O que importa é que esses debates produzem um ordenamento interno ao “mundo do crime”, que vale tanto dentro quanto para fora das prisões. Evidente que a hegemonia do PCC nesse mundo facilitou sua implementação. Com esses debates, aquele menino que antes devia matar um colega por uma dívida de R$ 5, para ser respeitado entre seus pares, agora não pode mais matar.

Isso impacta na queda dos homicídios muito mais do que se imagina, porque o irmão daquele menino morto pela dívida se sentiria na obrigação de vingá-lo, e assim sucessivamente, o que gerava uma cadeia de vinganças privadas altamente letal, muito comum ainda em outras capitais brasileiras. Agora, entretanto, nesses tribunais do próprio crime, mesmo que o assassino seja morto, interrompe-se essa cadeia de vingança, porque foi “a lei” (do crime) que o julgou e condenou. E como a lei, nesses “debates”, só delibera pela morte em último caso – há muitas outras punições intermediárias – toda aquela cadeia de vinganças que acumulava corpos de meninos nas vielas de favela, há oito ou dez anos atrás, diminuiu demais.

Nossos dados indicam que o PCC seria a principal causa da queda dos homicídios, mas eles não têm capacidade de comprovação cabal. Uma parcela muito pequena dos homicídios é oficialmente esclarecida, e justamente a parcela menos esclarecida é a composta daqueles jovens pobres, supostamente assassinados em conflitos internos ao “crime” ou com a polícia. Entre esses casos, não há dúvida nenhuma de que a redução expressiva dessa década é resultado dessa regulação interna ao “mundo do crime”, que tem muito a ver com o PCC. Para medir esse impacto com mais exatidão, cruzando com outras possíveis causas aventadas por aí, seria preciso ver o quanto os assassinados nesse tipo de conflito representavam do agregado dos homicídios.

É evidente e relevante dizer, mais uma vez, que não estamos dizendo que essa regulação é boa, evidentemente não é. Só estamos alertando, como cientistas sociais, que esse processo vem ocorrendo em São Paulo, há pelo menos uma década, e que não podemos fechar os olhos para ele.

14) Quais os riscos que o fortalecimento do PCC impõem à sociedade?

Karina – Concordo com o Gabriel. Mas tenho dificuldade para responder a essa pergunta. O que segue é uma explicação do por que prefiro não responder, tá? O problema dela é o termo “sociedade”. Quem é “sociedade”? Os prisioneiros ou os criminosos não são, também, “sociedade”? Ou vc está falando de Estado? Nesse caso, eu diria que o Estado é um dos grandes responsáveis pelo crescimento do PCC.

Gabriel  – aqui eu gostaria de subverter a pergunta e dizer que os riscos não são “do PCC para a sociedade”, porque não há externalidade entre ambos. O PCC também é sociedade, e a dinâmica social como um todo não cansa de gerá-lo. Creio que sem a política de encarceramento dessa década, o PCC não seria tão forte quanto é hoje, por exemplo. Para pensar com mais rigor a questão há que se abandonar, o que é difícil, a polaridade entre o bem e o mal. Seria tudo mais simples, e palatável para os “bons cidadãos”, se houvesse um “submundo” que pudéssemos reprimir até o fim, liberando a “boa sociedade” para viver em paz. Mas infelizmente não é assim que as coisas funcionam.

Camila – concordo com Gabriel. Acho que o fortalecimento do PCC coloca constrangimentos importantes para o Estado, que é incapaz de lidar com o problema fora da chave da repressão. E, desta forma, ocorre o efeito contrário, ou seja, o fortalecimento.

Adalton – Isso que chamamos de PCC são múltiplas posições de embate (por que não existe o PCC, único e homogêneo) no seio do que se chama de sociedade. Assim como são a Universidade, a Polícia Militar, os Comerciantes, a Polícia Civil, os Sindicatos (nenhum desses corpos políticos são homogêneos). Compreender o jogo de riscos nesse solo de posições múltiplas e variantes, em embates móveis, não é tarefa fácil. Só para termos uma idéia dessa complexidade, o avanço do PCC é visto de forma positiva por uma parcela considerável de moradores das periferias paulistas, mal visto por outra e não visto por outra. Ao que tudo indica, as agências de segurança pública e os “comandos” inimigos do PCC consideram alto o risco de seu avanço. E o que pensar de uma micro-empresário, numa situação hipotética (porém bastante comum), que conseguiu recuperar seu carro roubado através de um “irmão” que toma cerveja com seu filho na padaria do bairro?

15) É possível enfraquecer ou acabar com o PCC? Como?

Karina – Não é uma questão que cabe a mim, mas diria que seu fortalecimento está diretamente ligado às formas de opressão que o Estado dirige à população carcerária.

Gabriel – Nem a mim. Gostaria de comentar, entretanto, que como minha análise identifica o desemprego e a fragilidade da garantia do direito à segurança dos mais pobres, nas últimas décadas, como elementos que fortaleceram a identificação, por eles, do “mundo do crime” como instância legítima de geração de renda e obtenção de justiça, radicalizar a repressão e o encarceramento só me parecem colocar mais água nesse moinho.

Camila – Não sei como acabar com o PCC mas, como falei antes, de uma coisa tenho certeza: o aumento da repressão dentro e fora das prisões, a carta branca que parece ter a polícia para matar na periferia e outras formas mais de desrespeito aos direitos da população pobre da periferia e dos presos, são elementos que fortalecem o PCC, conferem mais legitimidade ao seu domínio enquanto enfraquece cada vez mais a confiança nas instituições públicas de segurança.

Adalton – Questão bastante apropriada à intelligentsia policial paulista. Como antropólogo, não tenho como respondê-la.

16) O que representaram os ataques? Como repercutiram no PCC? Podem ocorrer novamente?

Karina – Os ataques de 2006 desencadearam um grande movimento auto-reflexivo no PCC. De acordo com essas reflexões, os ataques foram reações às provocações do Governo do Estado de São Paulo, cuja finalidade seria a de mostrar sua força e, assim, conseguir pontos na corrida eleitoral que estava em andamento à época. Essa é a análise que os próprios protagonistas dos ataques elaboraram, não cabe à mim questioná-la. Nesse mesmo movimento reflexivo, avalia-se que os ataques não foram a melhor maneira para chamar a atenção dos cidadãos para o que ocorria no interior das prisões. De lá para cá, vêm-se buscando, outras formas de articulação e diálogo, com pouco sucesso, entretanto. Afinal, como criminosos podem se articular, mesmo que para reivindicar o cumprimento da Lei de Execuções Penais, sem que constituam uma “organização criminosa”? Se novos ataques ocorrerão ou não, não é possível prever. Isso depende de inúmeros fatores, muitos deles sequer previsíveis.

Gabriel – Representaram uma manifestação de força da facção frente às forças policiais, que estabelece novos parâmetros para a negociação entre elas. Ouvi diversas vezes, em pesquisa de campo, que há negociação entre PCC e funcionários do Estado e das polícias. Evidentemente essa negociação se dá em bases distintas depois de uma demonstração como a de 2006.

Mas os ataques também demonstraram o que significa colocar em xeque a força do Estado – segundo dados colhidos em 23 Institutos Médico-Legais, e divulgados pelo NEV e pelo Estadão, os eventos contabilizaram 493 mortos, em uma semana! Mais ou menos 50 mortes foram atribuídas ao PCC, cento e poucas oficialmente à polícia. Mais de 200 mortes permaneceram sem sequer hipótese investigativa. No distrito de São Mateus, do lado de onde faço pesquisa de campo, seis rapazes que iam trabalhar numa fábrica em Santo André, no sábado seguinte aos ataques, foram executados sumariamente. Segundo os moradores ao autores foram policiais à paisana. Suas mortes foram computadas entre os “suspeitos”. Espanta perceber que as mortes dessas pessoas não foram consideradas um descalabro num Estado democrático. O contrário, matar “suspeitos”, sejam eles quem forem, contribui para fazer crer que as forças da ordem retomavam o controle da situação.

Se outros ataques vão ocorrer seria futurologia, não há como dizer. Estava em campo em maio de 2006 e não consegui prever os eventos. As causas de eventos como esses são complexas e dependem de negociações às quais temos muito pouco acesso, em pesquisa. No entanto, não me surpreenderia se voltassem a ocorrer, já que os atores principais seguem em cena.

Adalton – Nada a acrescentar às respostas de Gabriel e de Karina.

Perguntas sobre o trabalho dos pesquisadores:

1) Por que vocês quiseram estudar o PCC e como o trabalho se tornou viável?

Gabriel – Sinceramente, eu nunca quis estudar violência, crime ou PCC. Sou um pesquisador das periferias urbanas – estudo as transformações desses territórios, as relações com o Estado, os movimentos sociais, associações de bairro, famílias etc. O problema é que a questão da violência e do crime – e mais recentemente do PCC – atravessou as histórias de vida das pessoas com quem eu convivo em pesquisa. Tenho muitos conhecidos que perderam maridos, filhos, irmãos assassinados nos anos 1990. Outros tantos que vivem de atividades ilícitas e, por vezes, violentas. Não foi possível desviar do tema. E todos eles relataram mudança importante nessa dinâmica a partir da aparição do PCC nos territórios. Isso me interessou e, a certa altura, estava metido nessa discussão mesmo sem querer. Sigo sentindo isso, aliás.

Camila – eu já estudava o sistema prisional e já vinha percebendo a crescente influência no PCC no cotidiano das unidades prisionais e, quando ocorreram os chamados “ataques de 2006” achei que era um fenômeno muito importante, jamais visto antes e que era preciso tentar compreendê-lo. Para tornar a pesquisa viável eu precisei pedir autorização para a Secretaria de Administração Prisional – uma vez que meu foco é o sistema carcerário – que o fez e conversar com os diretores das unidades em que a pesquisa foi realizada. Acho que tive sorte neste sentido, pois sei que têm diretores que dificultam a realização desse tipo de trabalho em decorrência das “normas de segurança”. No meu caso, entretanto, diretores e a maioria dos funcionários foram essenciais e colaboraram muito com o trabalho, ao permitir a realização das entrevistas com os presos com absoluta privacidade e com o tempo que fosse necessário para tal, dispensando-me toda atenção que era possível nas minhas permanências na unidade por longos períodos de tempo – eu ficava semanas inteiras, das 7h – as 17 horas nas penitenciárias -, e também me ajudando na identificação dos presos que eram entrevistados, de acordo com o perfil que eu desejava conversar: o piloto, o irmão, o faxina, os excluídos, os mais velhos, os que estavam no seguro etc. Seria impossível eu identificar esses perfis para entrevistar sem a colaboração dos funcionários.  Além disso, obviamente que eu devo à confiança depositada em mim, pelos entrevistados que, sejam membros ou não do PCC, poderiam ter todos os motivos para não falar de assuntos um tanto complexos e delicados com uma estranha. No entanto, a grande maioria colaborou muito e pudemos estabelecer, mais do que “entrevistas” , longos diálogos, onde muitas das experiências, vivências, conhecimentos e também, dos sonhos e esperanças destes sujeitos, me foram passados. Importante também enfatizar a necessidade da honestidade e respeito do pesquisador: por exemplo, sempre deixei muito claro que aquela entrevista não iria ajudá-lo em nada (nos seus processos) e nem atrapalhá-lo, uma vez seu nome ou fatos que o identificassem não seriam mencionados, explicando do que se tratava a pesquisa e quais eram os objetivos da mesma.

Karina – Em 2003, quando meu marido foi preso, eu já era estudante de graduação em Ciências Sociais na USP. Depois de alguns meses, sob o incentivo do Prof. José Guilherme Magnani, decidi transformar a experiência involuntária à que fui submetida em instrumento para uma pesquisa sobre instituições prisionais. À época, ainda não era meu interesse estudar o PCC, mas para onde eu olhava, via-o em funcionamento. O estudo do PCC decorreu de uma impossibilidade de estudar uma instituição prisional sem falar do PCC. Todos os aspectos das vidas dos prisioneiros que por lá passaram estavam permeados, em maior ou menor intensidade, pelo fenômeno-PCC. A pesquisa que realizei durante a graduação foi premiada pela Associação Brasileira de Antropologia e publicada em uma coletânea organizada pela mesma. Naquele texto, a sigla PCC não aparece, embora seja dele que eu estivesse falando. Eu só me senti confortável a mencioná-la após enviar um exemplar daquele trabalho para que os presos pudessem ler e avaliar que minhas intenções não eram as de investigar crimes ou delatar pessoas. Com sua anuência, pude então me debruçar especificamente sobre o PCC em pesquisa de mestrado, que só foi viabilizada graças ao apoio de meu orientador, Prof. Jorge Luiz Mattar Villela.

Adalton – Em 2004, ainda na graduação, iniciei uma pesquisa sobre conversão religiosa na prisão. Logo nas primeiras conversas que tive com ex-presidiários percebi que a noção “proceder” lhes era central para descrever suas experiências prisionais, fossem relacionadas às conversões, às visitas, às trocas materiais, às avaliações de condutas e de posturas, às considerações sobre crimes cometidos ou às definições de punição aos presos que “não tinham proceder”. A propósito, me chamou a atenção o fato de que a palavra “proceder” raramente era utilizada como verbo, indicando ações. Quase sempre era utilizada como atributo (“esse cara tem proceder”, “o proceder desse verme é zero”) ou como substantivo (“o proceder”). Quando me dei conta, já estava muito mais preocupado com essa categoria do que com as conversões religiosas.

O PCC também me apareceu logo nessas primeiras conversas. Era difícil um ex-presidiário não marcar diferenças entre o “proceder do PCC” e o “proceder das antigas” ou o “proceder” de outros “comandos”. A partir de então, procurei perseguir essas diferenças e os desdobramentos que elas provocaram em minha pesquisa inicial.

2) Quais foram as maiores dificuldades?

Gabriel – Me perguntam muito isso, pressupondo que faço um trabalho de campo “perigoso”, quase uma “aventura”. Não é. Em minha opinião não é mais difícil estudar o crime ou a violência do que qualquer outro tema. No nosso tipo de pesquisa, a etnografia, estamos encontrando pessoas e conversando sobre as vidas delas durante períodos de tempo longos; convivemos com as pessoas, assim não nos preocupamos em “arrancar” informações delas, como se não fôssemos encontrá-las nunca mais. É todo o contrário, da convivência cotidiana e do método as informações aparecem. Como em qualquer relação, o fundamental é ter respeito. E como em qualquer pesquisa, é preciso ter rigor e método. Assim se pode pesquisar qualquer tema em ciências sociais. A maior dificuldade, na verdade, é conseguir fazer isso – falar como deve ser, como faço aqui, é sempre mais fácil.

Karina: Geralmente as pessoas me perguntam a respeito das dificuldades, pensando que eu estaria submetida a algum risco ao estudar criminosos. Eu nunca tive esse tipo de problema, também porque sempre contei com a ajuda de meu marido que, sem ser membro do PCC, nunca economizou esforços para tornar minha pesquisa viável. É claro que, como toda pesquisa, me deparei com algumas dificuldades. A maioria delas foi teórico-metodológica. Por exemplo, no que diz respeito a uma pesquisa de campo pouco ortodoxa, que não se fixava em um só lugar. Mas ao contrário de constituir obstáculo, as freqüentes transferências de unidade prisional a que meu marido era submetido potencializavam a pesquisa, pois se por um lado permitia que eu visse o PCC sendo operado em diferentes lugares, pude também enxergar as diferenças que se manifestam no interior do PCC, pois seu funcionamento se dava de maneiras diferentes em cada prisão que eu conhecia. Na dissertação, exponho muitas outras dificuldades que encontrei no meu caminho, mas a principal, sem dúvida, está ligada a uma preferência teórico-metodológica que prioriza as falas, as práticas e reflexões das pessoas que estudo. É muito difícil vencer a tentação de tentar impor alguma ordem exógena ao que eles dizem/fazem/pensam e lutar contra vícios de pensamento que pertencem ao pesquisador e não aos pesquisados. Mas só com a superação desses vícios e tentações é possível acessar a riqueza que o objeto de pesquisa apresenta.

Adalton – Em determinado momento de minha pesquisa, vi-me com dados etnográficos que produzi a partir de escolhas teóricas (que são escolhas políticas). Essa situação me colocou duas grandes dificuldades, exatamente porque eu não queria escrever uma dissertação que trouxesse ao final de cada parágrafo o endosso de um grande autor; geralmente um endosso exógeno às relações de meus interlocutores. A primeira dificuldade, foi intensificar as descrições sobre as relações de meus interlocutores nos instantes em que parecia inevitável a citação mágica (porque exógena) de um grande autor. Elas parecem ajudar na explicação, mas quase sempre interrompem o que há de mais importante nos dados etnográficos: um novo modo de explicar. A segunda dificuldade, foi explicitar essa estratégia metodológica e dizer que poderia ser proficiente não ceder espaços para teorias externas durante a descrição das relações que eu estudava.

3) Por que em São Paulo, ao contrário do Rio, os trabalhos sobre crime organizado são mais escassos?

Karina – Sinceramente, não sei responder a essa pergunta.

Gabriel – Há autores muito importantes nas duas cidades – Michel Misse, Alba Zaluar, Machado da Silva, entre outros no Rio, e Sérgio Adorno, Robert Cabanes e Vera Telles em São Paulo, para citar poucos. O fato é que as dinâmicas da violência e do crime são muito distintas no Rio e em São Paulo, muito mais do que se pensa. E elas também têm também temporalidades distintas. Creio que essa é a principal causa pela qual a produção acadêmica sobre os temas ter perfis também muito distintos nas duas cidades. Mas há outras causas: uma pouco comentada é que em São Paulo os movimentos sociais das periferias urbanas foram muito mais expressivos que no Rio, e sua tematização acadêmica foi enorme desde os anos 1980. Isso de certa forma ocultou o problema do crime e da violência naqueles territórios – julgava-se que a democratização política inseriria os pobres na representação política, por via dos movimentos sociais, e isso geraria distribuição de renda e integração social. A diminuição da violência seria caudatária desse processo, e portanto o tema da violência seria menos importante que o dos movimentos sociais. No Rio isso não ocorreu, e talvez por isso a produção carioca sobre crime e violência tenha saído muito na frente. Atualmente há pesquisadores jovens, nas duas cidades, fazendo trabalhos fantásticos sobre esses temas, e com grande interlocução.

Adalton – Também não sei responder a essa questão.

The Repeated Failures of International Negotiations for Environmental Protection (Review of Environment, Energy and Economics)

In this brief interview with FEEM, Bruno Latour explains why, in his opinion, international negotiations for environmental protection (e.g. Rio+20, UNFCC COPs, etc..) continue to fail. This has to do with an issue of proper representation of different interests, of scale, and because of the substantial separation between science and policy.

Bruno Latour granted this interview when visiting the International Center for Climate Governance on last September 14th to hold his lecture “What does it mean to bring the fate of the Earth into daily politics?“.

Os direitos indígenas nos debates sobre REDD+ (Mercado Ético)

22/11/2012 – 10h53

por Redação do GTA

indigenas2 Os direitos indígenas nos debates sobre REDD+Notícia recente informou que povos indígenas e ambientalistas californianos reunidos em São Francisco teriam se manifestado contra a possibilidade de utilização de créditos de REDD+ no mercado de carbono que vem sendo desenvolvido naquele estado.

Segundo o noticiado, a queixa, com forte viés ideológico, apresentava o temor de que a comercialização desses créditos seria o equivalente a venda dos recursos naturais dos povos da floresta, o que não é verdade.

O GTA compartilha com as preocupações apresentadas sobre o mecanismo de REDD+ e reconhece os desafios e riscos que os mercados de carbono podem trazer e se empenha na luta pela garantia dos direitos dos povos e comunidade da floresta, sobretudo no que se refere ao direito a terra e uso e acessos dos recursos florestais.

Para garantir esses direitos, o GTA participa de vários fóruns nacionais e internacionais, contribuindo com o diálogo entre as partes interessadas e exigindo a inclusão de salvaguardas socioambientais que garantam e protejam os direitos dos povos das florestas.

Em benefício dos povos da floresta

No entanto, o GTA também reconhece que o REDD+ pode trazer novas oportunidades e benefícios para os povos e populações tradicionais, assim como a conservação das florestas, garantindo renda e mantendo a floresta em pé.

Exemplo disso é como o povo Surui, em Rondônia, tem se organizado para se beneficiar de recursos do REDD+ de forma auto determinada, mas transparente, com acompanhamento da Fundação Nacional do Índio (Funai). Com as oportunidades que se abrem, os Surui estão planejando o futuro da comunidade para os próximos anos.

O Projeto REDD+ dos Surui está diretamente ligado ao Plano de 50 anos de gestão integrada e autônoma dos Surui, cujo território se estende por 248 mil hectares na Amazônia brasileira. Para conhecer os detalhes do Projeto Carbono Surui, visite o site do Observatório do REDD, aqui.

No Acre, o exemplo vem do governo do estado, que criou o Sistema Estadual de Incentivo a Serviços Ambientais (SISA), no qual os direitos dos povos indígenas não foram esquecidos. Criado em 2010, o SISA foi debatido abertamente durante nove meses, incluindo consultas específicas com lideranças indígenas e organizações locais.

Posteriormente, a Comissão Estadual de Validação e Acompanhamento do SISA instituiu o Grupo de Trabalho denominado de GT Indígena, tendo como missão estabelecer o diálogo entre este sistema, as comunidades indígenas e a sociedade civil.

Além disso, durante o processo das consultas públicas, foram realizadas oficinas com representantes de 22 terras indígenas do Acre, as quais contaram com participação do GTA, COIAB, FUNAI, Comissão Pró-Índio, entre outras organizações.

Desta forma, o SISA vem buscando garantir os direitos das populações indígenas e comunidades locais, em sintonia com o debate sobre o tema dentro do Brasil e com os acordos internacionais assinados pelo governo federal.

A Rede GTA acredita, antes de tudo, que os questionamentos a respeito do REDD e do mercado de carbono não devam ser uma forma de obstrução ao desenvolvimento social das comunidades tradicionais, mas seja um meio para a construção de políticas sociais mais justas visando ao benefícios dos povos da floresta.

O que é a Rede GTA

Em 1992, quando uma conferência mundial no Rio de Janeiro reconheceu que o futuro do planeta dependeria do meio ambiente, movimentos sociais ecoaram em todos os continentes que esse futuro ambiental também estava ligado com uma outra justiça social e cultural. Nesse contexto foi criado o Grupo de Trabalho Amazônico (GTA), rede que envolve mais de 600 entidades representativas de agricultores, extrativistas, indígenas, quilombolas, quebradeiras de coco babaçu, pescadores, ribeirinhos, entre outras.

* Publicado originalmente no site GTA e retirado do site Mercado Ético.

O racismo faz mal à saúde (IPS)

Crianças negras e mestiças em Araçuaí, Minas Gerais. Foto: Rodrigo Dai – Cortesia Ser Criança

por Fabiana Frayssinet, da IPS

Rio de Janeiro, Brasil, 16/11/2012 – Entre a emergência de uma parturiente negra e uma branca, o médico brasileiro escolhe a branca porque “as negras são mais resistentes à dor e estão acostumadas a parir”. As convenções culturais e sociais brasileiras “imputam ao negro condições de estereótipo, que fazem com que não tenha as mesmas garantias de tratamento da saúde que um branco”, disse à IPS a psicóloga Crisfanny Souza Soares, da Rede Nacional de Controle Social e Saúde da População Negra. Estes estereótipos refletem um racismo que faz mal à saúde e que uma campanha tenta extirpar do sistema hospitalar brasileiro.

Dos 192 milhões de brasileiros, metade se reconhece como negra. A Mobilização Nacional Pró-Saúde da População Negra, foi lançada este ano por organizações de afro-brasileiros, com apoio do Fundo de População das Nações Unidas (UNFPA). Sob o lema “Vida longa, com saúde e sem racismo”, o objetivo da campanha é a saúde integral em todas as fases da vida, incentivando a sociedade, e em particular o sistema sanitário, a combater a discriminação para reduzir os altos índices de mortalidade da população de origem africana.

“Praticamente, todos os índices de saúde da mulher negra são piores do que os da branca. Em uma consulta sobre câncer de mama, as negras são menos apalpadas do que as brancas; e recebem menos anestesia no parto”, afirma Crisfanny. O Ministério da Saúde, que desde 2006 impulsiona uma política nacional integral para este grupo de população no contexto do Sistema Único de Saúde (SUS), realiza estudos para detectar este tipo de situação.

“A ideia de que a população negra é mais resistente à dor e tem melhores condições de conviver com a doença está presente em todo o sistema de saúde, desde os técnicos de enfermagem até os médicos”, afirmou Deise Queiroz, coordenadora da Articulação de Jovens Negras, da Bahia. Ela conhece bem isso, especialmente porque sua mãe, que sofre de diabete e pressão alta, deve recorrer com frequência ao sistema público de saúde. Segundo a ativista, o SUS, que foi um modelo de democratização do serviço de saúde, hoje não consegue atender tanta demanda, e “as atitudes racistas ficam mais evidentes”.

A Constituição determina que a saúde é um direito universal e o Estado tem o dever de proporcioná-la. O SUS estabelece que “todas as pessoas têm direito ao tratamento de qualidade humanizado e sem nenhuma discriminação”. Entretanto, o racismo se infiltra aberta ou sutilmente. “Ele se incorpora nas condições de vida da população, na organização dos serviços de saúde e na formulação de políticas”, explicou à IPS a representante auxiliar do UNFPA no Brasil, Fernanda Lopes. “Por isto é necessário construir políticas específicas de equidade”, afirmou.

Um estudo epidemiológico do Ministério da Saúde apresenta informação específica para ajudar a preencher esses vazios, ao comparar indicadores como assistência pré-natal por raça, cor e etnia. Também analisa outros aspectos, como o direito e o acesso a planejamento familiar, que é mais precário entre as afrodescendentes. Precisamente este aspecto é o centro do informe mundial do UNFPA, apresentado no dia 14, com o título Sim à Opção, não ao Acaso – Planejamento da Família, Direitos Humanos e Desenvolvimento.

Por exemplo, 19% das crianças nascidas vivas são de mães adolescentes brancas entre 15 e 19 anos. Contudo, a incidência de gravidez em adolescentes é de 29% entre as jovens afro-brasileiras da mesma faixa etária. Além disso, enquanto 62% das mães de crianças brancas informavam ter realizado sete ou mais consultas pré-natais, apenas 37% das mães de recém-nascidos mulatos e negros realizaram essa quantidade de exames antes do parto.

A mortalidade infantil também apresenta disparidades. O risco de uma criança negra ou mulata morrer antes dos cinco anos de idade por doenças infecciosas e parasitárias é 60% maior em relação a uma criança branca. E o de morte por desnutrição é 90% superior. O estudo também constatou que morrem mais grávidas afrodescendentes do que brancas por causas vinculadas à gestação, como hipertensão.

“Dizem que os piores índices sanitários da população negra se deve ao fato de a maioria ser pobre e, por isso, mais vulnerável”, apontou Crisfanny. Porém, não se pode negar outras variáveis estritamente racistas, advertiu. “Se em um hospital vemos dois jovens baleados, é mais fácil o imaginário cultural colocar o branco no papel de vítima, enquanto o negro estaria ali porque se envolveu em um crime”, ressaltou a psicóloga, afirmando que às vezes essa referência “faz com que um profissional estabeleça prioridades no atendimento”.

Outra preocupação se refere às doenças prevalentes na população afrodescendente, como anemia falciforme, diabete mellitus Tipo II e hipertensão, que o sistema sanitário não está preparado para abordar de maneira específica. As mulheres negras têm 50% mais possibilidades de desenvolver esse tipo de diabete, com o agravante de a hipertensão arterial entre elas ser duas vezes maior do que na população em geral.

O mesmo ocorre com a anemia falciforme, que poderia ser detectada nos recém-nascidos. Segundo a Mobilização Nacional Pró-Saúde, cerca de 3.500 crianças brasileiras nascem a cada ano com essa enfermidade, fazendo dela a doença genética de maior incidência no país. “A população negra morre, em geral, mais cedo, e suas mortes por causas evitáveis são mais frequentes”, pontuou Fernanda. Por isso, uma política para combater a discriminação na saúde “chega para minimizar o impacto das desigualdades históricas mediante estratégias de ação afirmativa”, acrescentou.

O UNFPA contribui com o governo e o movimento negro para fortalecer essa política e a formação profissional que deve acompanhá-la. “O desafio é responder por que, em um país onde a população negra representa 50,3% do total, temos um quadro sanitário tão diferenciado” entre negros e brancos, admite o Ministério da Saúde. Envolverde/IPS

Em busca de um novo lugar para o homem e a natureza. Entrevista com Philippe Descola (Instituto Humanitas Unisinos)

Terça, 20 de novembro de 2012

O francês Philippe Descola, de 64 anos, é parte de um grupo de antropólogos contemporâneos – ao lado do também francês Bruno Latour e do brasileiro Eduardo Viveiros de Castro – que propõe embaçar a distinção natureza/cultura, durante muito tempo orientadora do pensamento sobre o humano.

O ponto de partida de sua obra foi uma longa convivência, nos anos 1970, com a tribo achuar, indígenas da Amazônia equatoriana, sobre os quais publicou no Brasil “As Lanças do Crepúsculo” (Cosac Naify). Antes de se formar em antropologia sob a orientação de Claude Lévi-Strauss, estudou filosofia com Michel Foucault e Gilles Deleuze, pensadores que também o influenciaram.

Descola, que esteve no Brasil no mês passado para série de conferências no Rio, em Brasília e no Recife, hoje se interessa pelo que chama de “ontologia das imagens”, mais uma estratégia de questionar o naturalismo e a ideia de que os humanos possuem uma interioridade distinta que os separa dos outros existentes.

A entrevista é de Carla Rodrigues e publicada pelo jornal Valor, 20-11-2012.

Nesta entrevista, ele fala dos desdobramentos desse tipo de pensamento, acusado muitas vezes de relativista, para o ambiente, a defesa dos animais e a forma de fazer antropologia, dentro do que chama de “uma teoria geral sobre a continuidade e a descontinuidade entre humanos e não humanos”.

Eis a entrevista.

Sua obra começa com uma etnologia na Amazônia, nos anos 1970. O senhor acompanha o debate sobre a questão indígena na Amazônia hoje?

É um debate relativamente simples. De um lado, a espoliação territorial das terras indígenas – que é muito grave e diferente nos diversos países que compõem a Amazônia -, a destruição da floresta e do modo de vida de populações que vivem dela, como seringueiros. São problemas muito graves e cada país o encara de maneira diversa. Mesmo assim, a situação do extermínio da população ameríndia já foi pior. Quando comecei a fazer etnologia na Amazônia, os ameríndios não eram representados na cena pública. Os etnólogos ocupavam um papel importante como porta-vozes, para fazer eco a situações que eram dramáticas. A grande mudança atual é que os ameríndios ocupam uma posição de interlocução, o que no Brasil é particularmente notável. Sem intermediários, são capazes de se fazer entender por eles mesmos, o que é muito positivo.

A partir desse trabalho, o senhor começou a pensar as relações entre humanos e não humanos. Quais são as consequências desse tipo de pensamento?

Toda a tradição do pensamento humanista consiste, de forma um tanto paradoxal, em pôr os humanos no centro e, ao mesmo tempo, de tirá-los do centro do mundo. É uma espécie de contradição permanente do pensamento. O que tento fazer – inspirado por Lévi-Strauss – é “desantropocentralizar” a antropologia, uma disciplina que nasceu, no âmbito das ciências sociais, como resultado da vontade de ter uma atitude reflexiva sobre as nossas experiências coletivas, na Europa e no mundo ocidental. Sociedade, natureza, cultura, história e razão são conceitos que nos permitiram nos objetivar a nós mesmos, mas são extremamente inadaptados para a análise e a descrição de realidades diferentes. O que tento fazer é compreender como em outros sistemas culturais, aqui, por exemplo, na Amazônia, existem espécies animais, vegetais, espíritos que formam certa espécie de sociedade. São sociedades coextensivas aos cosmos que nos impedem de distinguir a cultura de um lado, a natureza de outro.

Trata-se de repensar os objetivos da antropologia?

A antropologia nasce na segunda metade do século XIX na Europa para questionar sobre como viviam as sociedades que não estabeleciam a distinção natureza/cultura, justamente no momento em que o pensamento europeu estava se estabelecendo a partir dessa distinção. Era a partir dessa distinção que os departamentos das universidades começaram a se organizar, separando as ciências da natureza das ciências humanas. Nesse mesmo momento havia a descoberta de que havia sociedades que não consideravam essa distinção. De certa forma, a antropologia surge como uma ciência que busca entender esse “escândalo lógico”. Essa distinção que hoje nos parece superada tem uma história, que eu retracei no livro “Par-delà Nature et Culture” (Gallimard), que começa com os gregos, passa pelo cristianismo, mas começou a emergir entre o século XV e o XVII.

Qual é a importância desse tipo de pensamento para a defesa do ambiente?

O fato de distinguir de um lado a vida social, de outro a natureza, favoreceu a percepção de que a natureza é alguma coisa exterior ao homem e pode ser transformada em um recurso passível de ser destruído em nome da vida social. Chamar a atenção sobre outras formas de concepção da relação entre humano e não humano – que se dá não apenas nos ameríndios, mas no budismo e em outras formas de organização -, é mostrar que os humanos são uma prolongação do ambiente e as perturbações que produzem nele não apenas são dramáticas para todos os seres, mas também para nós. Há cada vez mais pessoas convencidas de que a distinção natureza/cultura não tem nenhum sentido, porque fenômenos como aquecimento global e efeito estufa são naturais, mas também culturais. O que se vê é a irrupção do social dentro do natural e do natural dentro do social, o que terá efeitos políticos importantes que, esperamos, não seja tarde demais.

O crescente movimento de defesa dos animais também pode ser considerado um desdobramento desse tipo de pensamento?

Faço distinção entre duas formas de defender os direitos dos não humanos. Há uma versão, individualista, que inclui nomes muito conhecidos, como Peter Singer, que tem por objetivo estender aos não humanos certos direitos que são dos humanos. O que pode ser muito positivo, mas é um tipo de discurso a partir de uma visão muito ocidental da questão. Há outro tipo de defesa dos animais, que chamo de ecocentrada, defensora da biodiversidade. Em tudo, nas espécies, na cultura, vale mais a diversidade do que a monotonia.

O senhor e o brasileiro Viveiros de Castro compartilham muitas ideias a respeito da necessidade de superação da distinção natureza/cultura. O que há de proximidade e de distância no pensamento dos senhores?

Ao longo do tempo desenvolvemos nosso pensamento por meio de um diálogo permanente, que começou há 30 anos e perseverou na França e no Brasil. Somos muito influenciados por Lévi-Strauss, o que já é um ponto de partida importante. Também somos ambos especializados nas sociedades amazônicas e contribuímos para transformar a visão sobre esses grupos ao aportar a percepção de que parte importante da vida dessas sociedades se passa não com os humanos, mas com os não humanos. Para compreender essas sociedades, pensar a relação com a natureza foi muito importante. Nós dois sublinhamos que essa relação com a natureza se traduz numa forma de existência e organização social muito particular, ao incluir os não humanos na vida social. Não podemos compreender essas sociedades se não compreendermos isso.

No entanto, a diferença que se estabelece entre nós ao longo do tempo é que eu desenvolvi um pensamento que visa tomar as sociedades amazônicas e particularmente sua concepção de relação entre humanos e não humanos como um tipo entre outros, dentro de uma teoria geral sobre a continuidade e a descontinuidade entre humanos e não humanos. Já Viveiros de Castro se engajou em um trabalho filosófico sobre o pensamento ameríndio como um tipo de pensamento alternativo ao pensamento ocidental.

Nossas divergências hoje vêm do fato de que eu sempre estive engajado em um projeto geral de antropologia, do qual as sociedades amazônicas fazem parte, entre outras, enquanto Viveiros de Castro, principalmente no seu último livro, publicado na França (“Métaphysiques Cannibales. Lignes d’Anthropologie post-Structurale“, PUF, 2009, sem edição brasileira), expõe um projeto inspirado pela filosofia de Gilles Deleuze, de desenvolver o que poderia ser chamado de uma filosofia indígena, que se propõe a ser um contraponto à filosofia ocidental.

Wallerstein: a crise estrutural do capitalismo vai continuar (Revista Fórum)

13/11/2012 8:05 pm

(http://www.flickr.com/photos/buridan/)

Para sociólogo, o que ele denomina como sistema-mundo tem problemas de tal magnitude que não será possível sua sobrevivência, mas o que virá depois é algo ainda totalmente incerto

Entrevista a por Lee Su-hoon | Tradução de Hugo Albuquerque e Inês Castilho para o Outras Palavras

Em dois sentidos, pelo menos, o sociólogo norte-americano Immanuel Wallerstein parece disposto a contrariar as ideias que ainda predominam sobre a crise iniciada em 2007. Primeiro, no diagnóstico do fenômeno. Para ele, estamos diante de algo muito mais profundo que uma mera turbulência financeira. Foram abaladas as bases do próprio capitalismo. Ou, para usar um conceito caro a Wallerstein, do “sistema-mundo” que se desenhou a partir do século 16, em algumas partes da Europa, e se tornou globalmente hegemônico desde os anos 1800. Tal sistema teria atingido “o limite de suas possibilidades”, sendo incapaz de sobreviver à crise atual. Se ainda temos dificuldade para compreender o alcance das transformações em curso é porque, presos à inércia, demoramos a aceitar que “há alguns dilemas insolúveis”. “Nada dura para sempre – nem o Universo”, lembra Wallerstein, um tanto irônico.

O segundo ponto de vista não-convencional deste sociólogo – também um pesquisador de enorme repercussão internacional nos terrenos da História e da Geopolítica – diz respeito ao que virá, diante do eventual colapso do atual sistema-mundo. Ele diverge dos que pensam, baseados numa interpretação pouco refinada do marxismo, que podemos permanecer tranquilos – já que o declínio do sistema atual dará necessariamente lugar a uma ordem fraterna e socialista.

Não – diz Wallerstein – o futuro está mais aberto que nunca. O declínio do capitalismo pode abrir espaço, inclusive, a um sistema mais desumano – como sugere a forte presença, em todo o mundo, de correntes de pensamento autoritárias e xenófobas.

Estamos, portanto, condenados à ação, sugere este pensador, em cuja obra destaca-se a tetralogia “O Sistema Mundial Moderno”. Se o sentido do século 21 é imprevisível, isso deve-se ao fato de ele estar sendo construído neste exato momento, “em uma infinidade de nano-ações, desempenhadas por uma infinidade de nano-atores, em múltiplos nano-momentos. Em outras palavras, convoca Wallerstein, não se trata de prever o futuro, mas de construí-lo, inclusive em ações e atitudes quotidianas.

Para transformar, contudo, é preciso conhecer. Talvez por isso, embora aos 83 anos e consagrado por vasta obra teórica, Wallerstein dedica-se, em seu site, a análises quinzenais sobre temas contemporâneos muito concretos. Boa parte do material produzindo nos últimos dois anos traduzida e publicada por “Outras Palavras”. Entrevistado há poucas semanas pelo cientista político coreano Lee Su-hoon, ele avança no exame destes temas, muitas vezes expressando pontos de vista pouco usuais.

Indigado sobre a Europa, onde os cortes de direitos sociais e serviços públicos parecem não têm fim, propõe que se busque alternativas olhando, por exemplo, para a Argentina e Malásia. Estes países saíram da crise porque contrariaram, nas décadas de 1990 e 2000. Agora, pensa Wallerstein, o espaço para fazê-lo é ainda maior – mas é preciso ter coragem política.

O mundo irá tornar-se mais seguro se o Irã for impedido de desenvolver energia atômica? A resposta é “não”, garante este professor da Universidade de Yale: o atual Tratado de Não-Proliferação nuclear (TNP) é absolutamente hipócrita e será cada vez mais ineficaz. Contra o que ele preconiza, prevê Wallerstein, diversos países do Sul desenvolverão armas atômicas nos próximos anos – inclusive o Brasil…

China e Estados Unidos tendem a se converter em potências globais inimigas? Nada demonstra esta hipótese, frisa ele. A despeito da retórica, e da necessidade de satisfazer audiências locais, na prática Washington e Beijing mantêm cada vez mais interesses em comum. A entrevista completa, publicada pelo ótimo jornal sul-coreano Hankioreh, vem a seguir. (Antonio Martins)

Lee Su-hoon: Você disse: “Nos próximos 50 anos o mundo vai mergulhar em uma turbulência econômica séria e, mais tarde, o capitalismo vai enfrentar uma crise tremenda, como a da Grande Depressão”. As pessoas dizem que a crise se deve à ganância de Wall Street e à bolha imobiliária etc. Como você analisa essa crise?

Wallerstein: Faz cinco anos que eu não mudo de opinião. Basicamente, a meu ver, estamos em uma crise estrutural da economia capitalista mundial desde os anos 1970, e ela vai continuar. E não vai ser totalmente resolvida até talvez 2040 ou 2050. É difícil prever a data exata, mas vai levar muito tempo. No momento, o sistema mundial está bifurcado. Tem problemas de tal magnitude que não poderá sobreviver, está tão longe do equilíbrio que não há como voltar atrás. Mas para onde ele vai é totalmente incerto, porque, como disse, essa bifurcação significa que, tecnicamente, há duas formas de resolver uma mesma equação, o que não é normal.

Em linguagem leiga, isso significa simplesmente que o futuro sistema mundial, ou sistemas mundiais (porque não sabemos se haverá um só) que vai ou vão surgir no final desse processo podem ter, no mínimo, duas variedades fundamentais. Assim, não se pode prever qual sistema teremos, porque ele vai ser uma consequência de uma infinidade de nano-ações, desempenhadas por uma infinidade de nano-atores, em múltiplos nano-momentos – e ninguém é capaz de elaborar tanta coisa. Mas vai acontecer. Então, aqui estamos nós, no meio de tudo isso. É caótico, como se diz.

E o que significa dizer “É caótico”? Significa que as flutuações são enormes e, portanto, há incertezas inclusive no prazo muito curto. Isso significa que uma pessoa que preveja qual será a relação entre o iene, o dólar, o euro e a libra dentro de um ano será alguém muito corajoso. Não há como saber. Mas os empresários precisam dessa informação. Eles têm de ter o mínimo de estabilidade, do contrário correm o risco de sofrer perdas enormes. Isso os deixa paralisados, com muito receio de se envolver em qualquer tipo de investimento, uma das coisas que está acontecendo no mundo todo. É por isso que o desemprego explodiu. E é também por isso que os governos estão em tal dificuldade financeira, pois sem essa produção adicional não há receitas fiscais, e sem receitas os governos passaram a sofrer um grande aperto. E então o desemprego aumenta, o que coloca mais pressão sobre o governo. É o que acontece hoje em praticamente todos os países do mundo. Os governos têm menos dinheiro e enfrentam demandas para gastar mais. Isso, naturalmente, é impossível: não se pode ter menos e gastar mais. Então, eles vêm com tudo quanto é tipo de solução. Nenhuma parece funcionar. É onde nos encontramos atualmente.

Lee: E muitos países europeus estão enfrentando uma crise fiscal, uma espécie de moratória, o que os leva a tentar obter ajuda da UE (União Europeia) e do BCE (Banco Central Europeu).

Wallerstein: Os europeus têm um problema básico. Possuem pelo menos nove moedas, e 17 países compartilham o euro. Mas não têm um governo federal. É uma situação muito complicada, pois significa que os governos não podem intervir em sua própria moeda. Uma dos instrumentos que os governos utilizam tradicionalmente para lidar com suas dificuldades é aumentar ou diminuir o valor da moeda. Ao diminuir o valor da moeda pode-se vender mais; aumentando o seu valor, pode-se comprar mais. Os países da zona do euro não têm essa opção, porque nenhum país tem moeda própria. E eles estão enfrentando os mesmos problemas de todos os outros. Ou seja, exigências crescentes, porque o aumento do desemprego gera mais demandas sobre o governo. Ao mesmo tempo, a receita do governo diminui, porque não há empregos.

Sua única opção (da Grécia, Espanha, Portugal ou Irlanda) é obter ajuda, algum tipo de solidariedade. Então eles se deparam com a relutância, por parte dos países mais ricos, em “salvar” os mais pobres. Isso não leva em conta o fato de que o único e maior beneficiário da zona do euro é, de fato, a Alemanha. E é justamente o país que está fazendo o maior estardalhaço sobre não querer ajudar outros países, a menos que façam X, Y ou Z – medidas que, na verdade, só pioram a situação. Essa é a questão da zona do euro. É o problema enfrentado por todo o mundo, acrescido do fato de que esses países não podem manipular individualmente suas próprias moedas. Mas o problema básico não é diferente daquele dos EUA, da Rússia, do Egito ou de qualquer outro lugar onde haja aperto.

Lee: Aqui na Coreia, os especialistas e a mídia apresentam dois argumentos diferentes. A Irlanda, a Grécia e outros gastam muito dinheiro em benefícios sociais – essa é uma linha de argumentação. A outra é o efeito de contágio, por causa da facilidade de migração na zona do euro.

Wallerstein: Vamos lidar com os dois argumentos. O primeiro é “a Grécia está em apuros porque exagerou no bem-estar social”. Isso é exatamente o que o Partido Republicano diz sobre os EUA. É um mesmo argumento para todo o mundo, não um argumento especial para a Grécia. A reação das forças mais conservadoras a essa crise é dizer “corte benefícios”, o que significa “reduzir os gastos do governo”. Mas se você cortar benefícios reduz também o poder de compra das pessoas. Cria assim uma demanda menos eficaz. Por exemplo, uma pessoa que fabrica camisetas, ou algo assim, tem menos clientes. De forma que essa não parece ser a solução. Para mim, só piora o problema. De qualquer forma, a questão é que não é um problema específico da Grécia, da Espanha ou de Portugal. É um problema de todos os países.

Agora, o efeito de contágio. O que acontece é que, como os governos estão sem recursos, precisam de dinheiro emprestado. E para obter esse dinheiro, dependem do mercado. As pessoas emprestam dinheiro com mais facilidade quando veem possibilidades de obter reembolso. Então há, sim, um efeito de contágio na Europa: a Grécia começa a ter problemas, Portugal e Irlanda começam a ter problemas, e Espanha e Itália começam a ter problemas. E agora é a França que está se metendo em encrencas, e depois a Holanda e a própria Alemanha. É o efeito de contágio, em parte criado pelas agências de classificação de risco – que não são neutras –, mas também um problema muito real. O efeito de contágio vai da Europa para os EUA, e da Europa para o resto do mundo. Vai deixando as pessoas paralisadas. Isso significa que, quando veem as coisas indo tão mal, dizem “bem, pode dar errado em outros lugares também, portanto, não vamos emprestar o dinheiro”, ou “vamos exigir taxas de juro mais elevadas”.

Mas se tomamos o dinheiro emprestado a taxas de juros mais altas, sobra ainda menos dinheiro para gastar em outras coisas. Esse é exatamente o problema mundial. Então, novamente, não vejo isso como um problema especialmente europeu. A questão na Europa, no momento, é saber se as forças que dizem ”os países europeus estariam em situação melhor se não houvesse euro” conseguirão aboliro euro e voltar para suas moedas nacionais. Há um certo movimento nessa direção, tanto da direita como de alguns setores de esquerda.

A esquerda europeia não gosta do fato de que Bruxelas, com tanta influência, tenha um viés neoliberal tão forte. Diz-se (em alguns países escandinavos e mesmo na França): “estaríamos melhor se estivéssemos livres do controle de Bruxelas”, em oposição ao ponto de vista ainda dominante – o de que o euro fortalece a posição europeia frente ao resto do mundo e, mais especificamente, frente aos Estados Unidos.

Está acontecendo uma luta política, não há dúvida. Tendo a acreditar que, em geral, deve-se separar a retórica política da realidade e das pressões geopolíticas. A retórica política é em geral uma resposta a uma circunstância política imediata de um país. Se a chanceler Angela Merkel diz certas coisas na Alemanha, não é necessariamente porque ela acredita naquilo, mas porque, na próxima eleição, que pode ser muito em breve, ela julga que com isso ganharia votos. A mesma coisa vale para Obama. Vale também, tenho certeza, para o presidente da Coreia. Os políticos têm de se preocupar com a próxima eleição. Isso não significa que: (a) eles querem realmente dizer o que falam, e (b) o que dizem tem importância. Não acho que importe muito.

Ainda que, numa situação muito volátil, a estupidez possa prevalecer. Em geral, o que acontece é decorrente de pressões geopolíticas. Então, penso que a pressão para manter o euro, os benefícios em termos de geopolítica, são muito maiores do que a pressão para voltar às moedas individuais.

A chanceler Merkel está dizendo às pessoas, em toda a Europa, “deixem-me fazer isso, e então terei cacife político para convencer os políticos e eleitores alemães a me acompanhar”. Penso que a Europa vai concordar com um aumento do federalismo, ainda que não chamem isso de federalismo, porque não gostam dessa palavra. Mas um fortalecimento do poder central e, em consequência, um aumento do fluxo de dinheiro. Nos EUA, um estado como o Mississippi só não vai à falência porque o governo federal pode redirecionar dinheiro para lá. É disso que a Europa precisa. É isso o que querem realmente dizer as pessoas que estão clamando por “solidariedade”.

Se você me pedir que faça previsões, penso que a probabilidade de vermos, em três anos, não apenas um euro, mas um euro fortalecido, é muito maior do que o contrário. E algum tipo de mecanismo que permita enfatizar menos a prosperidade e mais a volta de recursos, ter o dinheiro fluindo novamente, é a única solução de curto prazo para os problemas europeus, assim como para os dos EUA.

Lee: Gostaria de acrescentar algo em sua análise da situação da zona do euro. Você mencionou os países escandinavos, que são mais fortes em termos de benefícios sociais. São os que mais gastam com bem-estar social e os que pagam mais impostos. Mas não estão em crise, embora se argumente que o chamado “populismo do bem-estar” social é inteiramente errado.

Wallerstein: Sim, evidente. Isso pode ser demonstrada de várias maneiras. É claro, existem cinco países nórdicos diferentes, cada um com uma situação um pouco diferente, inclusive aqueles que estão e aqueles que não estão na zona do euro, e os que estão e os que não estão na OTAN. Mas, em geral, você tem toda a razão ao dizer que aqueles cinco países nórdicos ainda são estados de bem-estar fortes, com impostos relativamente altos.

Lee: Sim, na verdade o problema fiscal da Europa é um problema mundial. Quando você olha para países específicos, há diferenças. Em alguns países, a corrupção é mais grave do que em outros.

Wallerstein: Vamos nos deter um pouco na corrupção. Penso que a corrupção é mais grave nos EUA, na Grã-Bretanha, na França e na Alemanha, do que em alguns casos de países muito citados em todo o mundo. Eles são fichinha, perto da corrupção real. Temos escândalos o tempo todo nos EUA, França e Grã-Bretanha. Quando você se depara com esses escândalos, de repente descobre que se trata de trilhões de dólares. Já quando ocorre algo do tipo em Myanmar ou no Iraque, por exemplo, estamos lidando com milhões, nem sequer com bilhões de dólares.

Assim, a corrupção é uma arma deveras etnocêntrica. Os países do Norte tendem a dizer que os do Sul são imorais, porque são corruptos. Mas não dizem que somos imorais porque somos corruptos. A corrupção é geral em nosso sistema. É geral porque, se você tem um sistema em que o principal objetivo é a acumulação de capital, a corrupção é simplesmente um aluguel que as pessoas que estão no lugar certo cobram, da acumulação sem fim do capital. Dizer que “eles não deveriam” é uma posição moral correta, mas retórica, porque eles irão até onde der, já que a opinião pública não gosta de enxergar a corrupção. E talvez uma ou duas pessoas sejam presas por um tempo relativamente pequeno, mas, basicamente, nada mais é feito contra a corrupção. Quando foi a última vez que uma pessoa corrupta dessas foi mandada para uma prisão de verdade, por um período realmente longo e teve de devolver todo o dinheiro que levou? Isso simplesmente não acontece.

Lee: Quando ouvi o discurso de feito por Obama ao se candidatar à reeleição, anotei o que ele apresentou como receitas para salvar os EUA dos tempos difíceis: criar mais postos de trabalho na indústria, reconstruir a classe média, enfatizar a educação, cortar tributos sobre a riqueza, uma nova política energética, a redução das importações e benefícios sociais que incluíssem assistência médica – um tema sempre muito controverso nas eleições norte-americanas. Mas eu me surpreendi ao ouvir as mesmas coisas dos candidatos presidenciais aqui na Coreia do Sul. Claro, a Coreia tem uma situação peculiar: a divisão da península, razão pela qual a questão da paz e a questão nuclear são importantes. Fora isso, os programas e políticas socioeconômicas eram mais ou menos idênticos. Isso me levou a pensar se a Coreia do Sul seria como os EUA socioeconomicamente. Cerca de vinte anos atrás a Coreia do Sul foi saudada como modelo para os países de Terceiro Mundo, uma vez que alcançou o crescimento econômico com relativa igualdade. Mas após as crises de 1997 e 2008 a Coreia do Sul revelou-se muito parecida com os EUA, e então as receitas políticas são quase idênticas nos dois países, penso eu.

Wallerstein: Bem, não discordo. Dentre os países mais ricos do mundo, a Coreia do Sul não está no topo, mas não está muito mal. As opiniões sobre o bem-estar social parecem estar divididas entre os conservadores e as pessoas de esquerda. Mas penso que, na verdade, a divisão pode ser mais ampla. Quando se olha para o papel do governo nos países mais pobres do mundo, ainda há a questão de quanto eles têm de benefícios sociais. Uma das coisas que o neoliberalismo, como um movimento atuante desde os anos 1980, tem prescrito para os países do Sul é: “Vejam, ocês têm todos esses problemas econômicos. Querem emprestar dinheiro de nós? Então reduzam os benefícios sociais, porque isso é dinheiro jogado fora”. A teoria age como uma força conservadora contra o governo local, que está atuando mais à esquerda. É o mesmo tipo de debate.

Você se lembra da chamada ”crise da dívida asiática” de 1997? De repente, uma série de países do Leste e do Sudeste da Ásia se viu encrencado economicamente. Ou seja, o dinheiro desapareceu. Os governos viram-se em apuros. Alguns buscaram ajuda, dizendo: “emprestem-nos dinheiro.” E esses governos contaram que a resposta recebida em geral foi: “emprestar dinheiro para vocês? Sim, desde que façam assim e assado”.

O único país que se recusou a tomar dinheiro emprestado nesses termos foi a Malásia — e ela foi o que se recuperou mais rapidamente, por ter recusado. Ao aceitar as exigências, a Indonésia provocou a queda de Suharto. E eu gostaria de citar este episódio. Trata-se de uma famosa atuação de Henry Kissinger, um político reconhecidamente de direita. Após a queda de Suharto, ele escreveu: ”como vocês (FMI e governo dos EUA) podem ser tão estúpidos? Vocês prescrevem para o governo de Suharto medidas que provocam sua queda e colocam, no seu lugar, um governo à esquerda dele. É mais importante manter Suharto no poder do que negar-lhe dinheiro. Vocês não entenderam suas prioridades. A prioridade é geopolítica, e não econômica”. Ele os repreendeu por fazer o que vinham fazendo há dez ou vinte anos em países menos importantes que a Indonesia.

A Coreia ficou no meio, tendo em vista o modo como respondeu. Teve uma atuação melhor do que a dos países que se entregaram completamente ao FMI, mas não tão boa quanto a da Malásia. Uma das coisas que se aprende com isso, e depois do que aconteceu na Argentina, é que esses países têm mais poder geopolítico do que acreditam ter e são mais capazes de reagir contra agências tipo FMI. Naturalmente, o FMI e o Banco Mundial aprenderam a lição. E começaram a falar em programas contra a pobreza. De repente, sua linguagem mudou, como resultado da crise da dívida asiática, porque se deram conta daquilo que Kissinger estava lhes dizendo: precisam ser mais astutos politicamente; não podem ser estritamente econômicos em suas exigências.

Lee: Na convenção do Partido Democrata norte-americano deste ano, Joseph Biden afirmou, repetidamente, que “os EUA não estão em declínio”, e Obama disse que “os EUA são um país do Pacífico”. Isso pode ser interpretado como um retorno dos EUA à zona asiática do Pacífico, inclusive sugerindo a contenção da China.

Wallerstein: Aqui há duas questões. Uma delas é afirmar que os EUA não estão em declínio. A outra é o que eles estão tentando fazer com essa ênfase na Ásia e no Pacífico.

“Os EUA não estão em declínio” é um mantra nos Estados Unidos. Nenhum político pode dizer que os EUA estão em decadência. Na verdade, todos eles se esforçam para negar essa realidade, porque a população dos EUA não está preparada para aceitar o fato de que os EUA não são mais o “Número 1”, um exemplo admirado no mundo inteiro. Eles não vão dizer isso publicamente. É uma pena porque, a meu ver, uma das coisas importantes é tornar a população dos Estados Unidos mais consciente da realidade geopolítica e do fato de que os EUA são um país muito forte – mas não mais, em nenhum sentido, acima dos demais. Há vários países com avaliação melhor que os EUA em determinadas questões. E a capacidade de os EUA para influenciar a situação em várias partes do mundo diminuiu enormemente. Então, penso que é preciso separar a retórica política da realidade política.

E agora, o que os Estados Unidos estavam fazendo na Ásia? A primeira coisa a notar é que os EUA não têm força econômica e militar suficiente para engajar-se por completo, como costumavam, na Europa e na Ásia. Se eles dizem publicamente “vamos estar fazer isso na Ásia”, querem dizer ao mesmo tempo que não vão fazer isso na Europa. Isso não está sendo ignorado pelos europeus. Está sendo ignorado pela opinião pública dos Estados Unidos. Ou seja: isso, em parte, é admitir o declínio.

Agora, a segunda parte é ”conter” a China. Os comunistas chegaram ao poder em 1948. A China não tem sido politicamente popular nos EUA. A Guerra da Coreia, entre o Norte e o Sul da península, foi também uma guerra entre os EUA e a China. Não a denominamos assim, mas essa é a realidade. E a linha de armistício não é tão diferente da linha anterior à guerra. Considero que houve um empate militar entre a China e os EUA. Nenhum dos lados ganhou. No entanto, a retórica era muito forte nos dois lados, China e EUA denunciando um ao outro de todas as maneiras possíveis, até que Nixon foi à China, guiado por seus instintos geopolíticos e os de Henry Kissinger. A combinação era bastante forte. Ambos eram muito cínicos e muito inteligentes. Naquele momento, a China travava uma grande disputa com a União Soviética. Tinham um terreno comum. Uniram-se contra a União Soviética, é simples assim.

Agora, a Guerra Fria acabou, e a União Soviética não existe mais, e há algo chamado Rússia, que é o mesmo país e ao mesmo tempo um país extremamente diferente. A China ficou mais forte do que era antes – militarmente e economicamente. Mas não se deve exagerar. A China está se afirmando geopoliticamente como líder da Ásia. Mas, trinta anos atrás, ninguém na África ou na América Latina pensava na China. A China simplesmente não fazia parte da cena. Agora, mudou. A China ambiciona ser uma potência, e uma potência mundial precisa interessar-se por todas as partes do mundo, da mesma forma que os EUA e a Grã-Bretanha, que são potências mundiais, estão interessados em todas as partes do mundo. Nesse sentido, a União Soviética era uma potência mundial.

A China e os Estados Unidos têm muitas diferenças sobre questões imediatas, e esfregam isso na cara um do outro, de modo errado, de tempos em tempos. E atualmente há um monte de difamadores da China nos EUA. Os políticos gostam de culpá-la por tudo. Isso irrita os chineses, mas é um jogo. Se você olhar para a realidade das políticas dos Estados Unidos e a realidade das políticas chinesas ao longo dos últimos trinta anos, verá que eles nunca fizeram nada que ultrapassasse os limites um do outro. Têm sido muito cuidadosos em manter boas relações geopolíticas.

Então, não considero tão significativa a nova ênfase dos EUA na Ásia e no Pacífico. Primeiro, vejo isso como um show de retórica, em parte para os EUA e em parte para os outros países da Ásia, porque há que se preocupar com a Coreia do Sul, Japão, Vietnã e Filipinas. Estes países são ambivalentes com relação aos EUA. Eles gostam dos EUA, porque Washington os ajuda em certas coisas. Por outro lado, não querem realmente os EUA. Então, têm relações complicadas. E os EUA sentiram que precisavam reassegurar a esses aliados que não os haviam excluído da cena completamente. Não acho que seja mais do que isso. Penso que, quanto a isso, os dois lados não vão cruzar a linha, a não ser a linha retórica, no máximo.

Agora, a península coreana é de fato uma das questões cruciais nas relações EUA-China, porque temos um país chamado Coreia do Norte e outro chamado Coreia do Sul. Ambos são muito coreanos, e o nacionalismo coreano é muito forte. A pressão geopolítica pela reunificação é enorme. E agora os EUA e a China têm de se preocupar com isso. Se as tropas americanas tiverem que sair, isso significa que a Coreia reunificada possuiria armas nucleares? E se eles tiverem armas nucleares, o que os japoneses diriam sobre isso? E Taiwan? Penso que a pressão para nuclearizar, para acabar com a abstenção de armas nucleares na Coreia do Sul, no Japão e em Taiwan é muito forte. Não acho que os EUA estejam felizes com isso. Nem a China. O que leva à aproximação, não ao distanciamento dos EUA e da China. E ambos estão tentando descobrir, “podemos parar este processo?”

Não posso enxergar o que têm em mente, mas suspeito que isso está no topo da sua lista de preocupações. O fato é que eles antecipam, não que a Coreia do Norte vá se desnuclearizar, mas que a Coreia do Sul, o Japão e Taiwan venham a se nuclearizar. Se você me pedir novamente uma previsão, diria que em dez anos, todos eles estarão nuclearizados. E não acho isso desastroso. O fato de os EUA e a União Soviética terem, ambos, armas nucleares, foi um fator importante para garantir que não haveria guerra entre eles. Foi uma coisa positiva, e não negativa.

Agora, é claro, com armas nucleares existe sempre a possibilidade de desastre. As armas nucleares estão em determinado lugar, sob um comandante militar. Ele pode apertar um botão qualquer e dispará-las. Nossa aposta é que ele, como indivíduo, irá obedecer ao comandante-em-chefe do seu país. Em 999 das vezes, é possível contar com isso. Mas há sempre uma chance em mil de haver um oficial descontrolado. Ademais, é bem verdade que, havendo mais armas nucleares no mundo, as pessoas podem roubá-las. Isso vem sendo discutido com relação ao Paquistão. Continua-se a dizer: ”Você sabe, o Paquistão tem de 70 a 80 armas nucleares e bombas” e “Será que os lugares onde estão armazenadas são realmente bem protegidos?”, “Alguém, afiliados à Al Qaeda ou talvez a outro grupo, poderia atacá-los e roubá-los?”

Assim, não excluo o potencial negativo da nuclearização generalizada. Mas não penso que isso significa que o Irã irá bombardear alguém. Na verdade, os governos usam as armas nucleares como um mecanismo de defesa, e não um mecanismo agressivo. Usam como um modo de se safar de ser bombardeados. Os EUA foram para o Iraque não porque ele tinha armas nucleares, mas porque ele não tinha. Os EUA sabiam que, portanto, Bagdá não poderia responder com uma arma nuclear.

Penso que essa é a lição que o Irã e a Coreia do Norte tiraram imediatamente do que aconteceu no Iraque. Na verdade, do ponto de vista da Coreia do Norte, essa é a única proteção real que eles têm militarmente, no momento. Minha previsão é de que, em dez anos, todos os países da Ásia Oriental terão essas armas. E também muitos outros países, como Brasil e Argentina. Suécia, Egito e Arábia Saudita as terão. Sempre pelas mesmas razões: para evitar de ser bombardeado pelos outros.

Lee: E se todo mundo desistisse das armas nucleares, inclusive aqueles que já as possuem?

Wallerstein: Isso seria o ideal, se você considera possível convencer os EUA ou o Paquistão, Índia, Israel, França e Grã-Bretanha. Mas não há política que possa persuadir esses países a reduzir os armamentos nucleares a zero. Você poderá persuadi-los a reduzir o número de bombas que têm, em certas condições. Mas voltar a zero não seria prático. Pela simples razão de que é difícil verificar se os outros estão de fato reduzidos a zero. Há muitas maneiras de esconder essas coisas. É por isso que eles não vão aceitar.

Mas essa é a razão porque o tratado de não-proliferação nuclear é uma farsa, pois basicamente o que ele diz é que ninguém deve possuir armas nucleares, exceto os cinco membros permanentes do Conselho de Segurança da ONU. O resto de vocês, o mundo todo, deve renunciar a qualquer tentativa de ter armas nucleares, e em troca disso nós prometemos duas coisas: (1) vamos reduzir significativamente o nosso estoque, e (2) vamos permitir que você desenvolva a energia nuclear para fins pacíficos.

Desde que o tratado entrou em vigor, não houve uma redução significativa, e agora todo o mundo está falando novamente em renovar e expandir. Os três únicos países que se recusaram a assinar o tratado são a Índia, o Paquistão e Israel. E isso agora está praticamente aceito. Eles desafiam o mundo, desafiam todas as regras, e agora são membros do clube. Os EUA têm boas relações com os três países, e nenhum foi penalizado por ter armas nucleares.

Lee: Então, o que você diz sobre a nossa tentativa de persuadir a Coreia do Norte a desistir das armas nucleares…

Wallerstein: É que é impossível. Se eu estivesse dirigindo a Coreia do Norte, certamente não concordaria.

Lee: Se for esse o caso, acha que o impasse atual entre os EUA e a Coreia do Norte vai continuar? E o que dizer da China?

Wallerstein: Mais uma vez, há a retórica e a realidade. De fato, os diplomatas norte-americanos sabem, todos, que essa proibição é impossível. Mas não sabem o que fazer. Eles certamente não podem dizer, por razões políticas internas, que “não há esperança”. Então imaginam que, colocando pressão sobre a China, estão, por tabela, pressionando a Coreia do Norte. E usam um mecanismo de retardo, não um mecanismo sério. Os militares dos EUA dizem “não vamos enviar tropas ao Irã em hipótese nenhuma”. Por outro lado, os EUA estão comprometidos com Israel e Israel, por sua vez, está dizendo: “Temos que bombardear o Irã”. Então, o que fazem os EUA? Operam com seu mecanismo de retardo. Isso reflete as limitações essenciais do poder dos EUA, o que revela parte de seu declínio. Houve um tempo em que eles não precisavam retardar. Houve um tempo em que podiam tomar decisões fortes sobre outros países. Já não podem. Aqui estamos. Separemos a retórica da realidade geopolítica.

Lee: Isso deixa muitos coreanos progressistas, que são-aliança, pró-negociações, pró-diplomacia, pró-processo de paz, muito pessimistas.

Wallerstein: Por que? Há muitos possíveis acordos entre as Coreias do Norte e do Sul, a começar pelas questões econômicas. Veja, se você está no comando de um regime como o da Coreia do Norte, tem que levar em conta a realidade geopolítica. Por outro lado, quer permanecer no poder. Até agora, eles contaram com um regime de mão pesada, muito repressivo, e o apoio do exército. Podem tentar continuar a reprimir a maioria, os famintos, podem tentar ludibriá-los com a ideologia, tentando fazê-los acreditar que vivem maravilhosamente bem. Mas hoje é cada vez mais difícil fazê-los acreditar nisso. Então é preciso dar-lhes um pouco de bem-estar social – o que significa que deve haver algumas mudanças na política econômica da Coreia do Norte, na linha das que foram feitas pela China e Vietnã. Tanto a China quanto o Vietnã mostraram a eles um modelo, no qual um partido único pode permanecer no poder e ainda assim promover uma abertura econômica. E acho que o novo líder está tentado pela idéia, mas é um caminho difícil. Ele tem as mesmas dificuldades em negociar com o seu público interno que a chanceler Merkel tem, que Obama tem, e certamente todo o mundo precisa se preocupar em manter a retórica satisfatória, internamente. Assim, ele pode ser capaz de ter algo equivalente ao que os chineses fizeram, como as Zonas Econômicas Especiais.

Lee: Se você fosse o presidente da Coreia do Sul, interessado em desenvolver boas relações com a Coreia do Norte, se esforçaria mais para ajudá-la nesse esforço?

Wallerstein: Se eu fosse o presidente da Coreia do Sul é o que eu faria, até onde fosse politicamente possível. Você precisa assegurar um equilíbrio, mantendo o poder político na sua base e as demandas geopolíticas. Mas penso que esse vai ser o caminho a seguir. Sei que a resposta das forças mais conservadoras na Coreia do Sul seria dizer ”bem, nós tentamos uma política de diálogo e não funcionou.” E a resposta é ”sim, não funcionou, em parte porque os tempos eram diferentes, o líder era diferente, com uma atitude diferente. E em segundo lugar porque as coisas foram feitas sem entusiasmo. Talvez a gente tenha que fazer ainda mais.” Esse tipo de debate acontece o tempo todo na política.

Lee: Tocamos em muitas questões hoje. Uma última questão é sobre o capitalismo fundamentalista. Depois da crise de 2008, houve uma volta à abordagem keynesiana do mercado. Pessoalmente, acho que eles não estão certos, mas isso levanta a questão do futuro do capitalismo.

Wallerstein: Algumas reformas vão resolver esse problema. Mas as pessoas estão muito reformistas na sua abordagem dos problemas. É muito difícil para elas aceitar o fato de que há alguns dilemas insolúveis. Quando digo que alguma coisa é insolúvel, elas dizem “oh, nós gostamos do seu argumento até aqui, mas esse ponto nos incomoda.” Os sistemas têm vida. Nenhum sistema dura para sempre. Seja o universo, o maior sistema que possamos conhecer, ou o menor dos nano-sistemas que não podemos ver, nenhum deles vai durar para sempre. Em sua vida, os sistemas se movem gradualmente para mais e mais longe do equilíbrio até atingir um ponto em que já não podem equilibrar-se novamente. E nós somos um sistema. É o chamado sistema mundial moderno. Foi um sistema bem sucedido, mas atingiu o limite das possibilidades. Quando comecei a dizer isso, trinta anos atrás, as pessoas riam. Agora elas não riem, argumentam contra. Já é um progresso. Penso que daqui a vinte anos as pessoas vão estar bem conscientes disso. Pelo menos assim espero, porque é muito difícil empenhar-se em políticas inteligentes para tentar empurrar o mundo para a direção certa, sem que se esteja ciente da realidade.

Ascensão social faz aumentar casos de racismo em shoppings e universidades (Brasil Atual)

Pessoas negras enfrentam discriminação e preconceito em ambientes antes frequentados apenas por brancos

Por Raimundo Oliveira, da Rede Brasil Atual

Publicado em 19/11/2012, 13:54

São Paulo – Nos últimos dez anos, com melhorias consistentes nos indicadores sociais no Brasil, os cidadãos mais pobres passaram a ter acesso a outros níveis de consumo, como em lojas de shopping, aeroportos, cinemas e universidades. No caso de cidadãos negros e pardos, para muitos isso significou também maior exposição à discriminação racial nos ambientes antes frequentados majoritariamente por pessoas brancas.

Na Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (Seppir), já são 15 as denúncias de racismo em universidades, 12 registradas neste ano, quatro vezes mais que as três contabilizadas em 2011 – quando a Ouvidoria da Seppir passou a receber os relatos de discriminação –, afirma Carlos Alberto Silva Júnior, ouvidor da Seppir.

Segundo ele, este aumento não está relacionado a manifestações contra a lei que garante metade das vagas nas universidades federais a negros, pardos e índios, desde que tenham cursado o ensino público, sancionada no final de agosto.

“A lei é recente, e muitas situações ocorreram antes que ela foi sancionada. O que percebemos é que há, além da maior exposição de negros em situações de consumo antes pouco comuns por causa de condições financeiras, também maior percepção por parte destes cidadãos do que é preconceito racial”, diz.

Daniel Teixeira, advogado e coordenador de projetos do Centro de Estudos das Relações de Trabalho e Desigualdade (CEERT), afirma que, neste ano, aumentou em cerca de 30% as denúncias de crimes raciais em situações de consumo registrados na entidade – que lida com casos de natureza racial e de intolerância religiosa, por exemplo.

As denúncias relacionadas aos centros de compras lideram nos 25 casos acompanhados pelo CEERT desde janeiro e evidenciam que o preconceito ocorreu em função da cor da pele e não da classe social. “Em muitos casos, quando a pessoa é pobre, ela não consegue identificar direito se está sofrendo preconceito por ser negra ou por ser pobre e, muitas vezes, acaba relacionando tudo à pobreza”, afirma Teixeira.

“Mas, quando estas pessoas conseguem melhorar sua situação financeira, percebem que não é mais por causa da pobreza que são discriminadas”, afirma. “Tem um caso emblemático de um músico que foi o único da banda a ser barrado em shopping de elite em São Paulo onde eles se apresentariam. Ele chegou de táxi e foi impedido de entrar pelos seguranças, alegando que o motivo era por estar com um instrumento. Mas os outros músicos, todos brancos, também estavam com seus instrumentos e nenhum foi barrado”, relata.

Tanto para o advogado do CEERT como para o ouvidor da Seppir, a queda na desigualdade social registrada nos últimos dez anos no Brasil (que fez o índice Gini, usado pela ONU para medir a desigualdade, cair de 0,594 para 0,527 entre 2001 e 2011) beneficia a população de negros e pardos no país, historicamente relegadas às posições mais baixas da sociedade, e revela mais nitidamente as situações de preconceito.

Para Silva Júnior, há uma discriminação histórica – como na lei de Imigração de 1890, que proibia a entrada de africanos, e na lei que criminaliza e legaliza a prisão por vadiagem logo após o fim da escravidão, quando a maior parte dos negros não tinha emprego formal algum -, mas há também o preconceito difuso.

A secretária Nacional de Combate ao Racismo da CUT, Maria Júlia Reis Nogueira, acostumada a uma rotina de aeroportos por conta do trabalho, e dona de cartões de fidelidade que dão os maiores benefícios na compra de passagens,  conta que já caiu na armadilha do preconceito difuso em situações de consumo.

“Sempre viajo a trabalho, não me visto como uma madame, e percebi que em muitos locais quando entro na fila destinada aos portadores do meu cartão de fidelidade têm pessoas que me perguntam se estou na fila correta. No começo, ao perceber que esta atitude era em função da cor pele, respondia sempre que, se não tivesse o cartão, não estaria naquele lugar. Mas agora, quando me perguntam isto eu questiono a pessoa se está fazendo esta pergunta para todo mundo que está na fila, independente da cor da pele”, afirma.

Hardtalk: Vandana Shiva, environmentalist (BBC)

Duration: 25 minutes / First broadcast: Monday 19 November 2012

Hardtalk speaks to the original tree hugger. The phrase was coined back in the 1970s when she – along with a group of women in India – hugged trees to stop them from being chopped down. In the decades since, Vandana Shiva has become known throughout the world for her environmental campaigns. She says a billion people go hungry in the world because of the way greedy international companies go about their business. So is it a naïve world view or could we really end poverty and improve everyone’s life by returning to old fashioned ways of farming?

http://www.bbc.co.uk/programmes/p010d95m

Call to Modernize Antiquated Climate Negotiations (Science Daily)

ScienceDaily (Nov. 18, 2012) — The structure and processes of United Nations climate negotiations are “antiquated,” unfair and obstruct attempts to reach agreements, according to research published November 18.

The findings come ahead of the 18thUN Climate Change Summit, which starts in Doha on November 26.

The study, led by Dr Heike Schroeder from the University of East Anglia (UEA) and the Tyndall Centre for Climate Change Research, argues that the consensus-based decision making used by the United Nations Framework Convention on Climate Change (UNFCCC) stifles progress and contributes to negotiating deadlocks, which ultimately hurts poor countries more than rich countries.

It shows that delegations from some countries taking part have increased in size over the years, while others have decreased, limiting poor countries’ negotiating power and making their participation less effective.

Writing in the journal Nature Climate Change, Dr Schroeder, Dr Maxwell Boykoff of the University of Colorado and Laura Spiers of Pricewaterhouse Coopers, argue that changes are long overdue if demands for climate mitigation and adaptation agreements are to be met.

They recommend that countries consider capping delegation numbers at a level that allows broad representation across government departments and sectors of society, while maintaining a manageable overall size.

Dr Schroeder, of UEA’s School of International Development, will be attending COP18. She said: “The UN must recognize that these antiquated structures serve to constrain rather than compel co-operation on international climate policy. The time is long overdue for changes to institutions and structures that do not support decision-making and agreements.

“Poor countries cannot afford to send large delegations and their level of expertise usually remains significantly below that of wealthier countries. This limits poor countries’ negotiating power and makes their participation in each session less effective.”

The researchers found that attendance has changed in terms of the number and diversity of representatives. The number of delegates went from 757 representing 170 countries at the first COP in 1995 to 10,591 individuals from 194 countries attending COP15 in 2009 — a 1400 per cent increase. At COP15 there were also 13,500 delegates from 937 non-government Observer organisations.

Small developing countries have down-sized their delegations while G-7 and +5 countries (Brazil, China, India, Mexico, and South Africa) have increased theirs. The exception is the United States, which after withdrawing from the Kyoto Protocol started to send fewer delegates to COPs.

The study also looked at the make-up of the delegations and found an increase in participation by environmental, campaigning, academic and other non-Governmental organisations.

“Our work shows an increasing trend in the size of delegations on one side and a change in the intensity, profile and politicization of the negotiations on the other,” explained Dr Schroeder. “These variations suggest the climate change issue and its associated interests are framed quite differently across countries. NSAs are well represented on national delegations but clearly the government decides who is included and who is not, and what the official negotiating position of the country and its level of negotiating flexibility are.”

Some countries send large representations from business associations (Brazil), local government (Canada) orscience and academia (Russia). For small developing countries such as Bhutan and Gabon the majority of government representatives come from environment, forestry and agriculture. The UK has moved from mainly environment, forestry and agriculture to energy and natural resources. The US has shifted from these more conventional areas to an overwhelming representation from the US Congress at COP15.

Journal Reference:

  1. Heike Schroeder, Maxwell T. Boykoff, Laura Spiers. Equity and state representations in climate negotiations.Nature Climate Change, 2012; DOI: 10.1038/nclimate1742

Overwhelming Public Support for Whistleblowers (Science Daily)

ScienceDaily (Nov. 19, 2012) — New research by the University of Greenwich shows 4 out of 5 Britons think that people should be supported for revealing serious wrongdoing, even if it means revealing inside information. However, under half of the respondents (47%) thought whistleblowing is an acceptable thing to do in our society. Hence, people think society is less supportive of it than it should be.

Three quarters of respondents, who are employees or members of an organisation, also indicated that if they observed wrongdoing, they would feel personally obliged to report it to someone in their organisation. However, a smaller proportion were confident their organisation would stop wrongdoing if they reported it, and less than half thought management in their organisation were serious about protecting people who report wrongdong. Still, almost 9 out of 10 in Britain believe whistleblowers should be able to use the media to draw attention to wrongdoing (either as a first resort, when there become specific reasons to do so or as a last resort).

Dr Wim Vandekerckhove from the Work and Employment Relations Unit (WERU) at the University of Greenwich, who leads the research, believes that at a time where a change in the UK legislation on whistleblower protection is demanded by different actors and in different directions, it is important to take stock of how citizens feel about whistleblowing. Any changes to the legislation should be in line with attempts to close the gaps identified by this research.

Dr Vandekerckhove concludes that this research shows people will raise concern inside their organisation, but adds: ‘If we don’t make it safer for employees to speak up inside their organisations, people will support those who blow the whistle to the media.’ Political, business and community leaders must accept this new reality, and develop and implement legislation and policies that make it safe and effective to speak up about wrongdoing inside the organisation.

This research was funded by the University of Greenwich Business School. ComRes interviewed 2,000 adults online from 26th to 28th October 2012. Data were weighted to be demographically representative of all British adults aged 18+. ComRes is a member of the British Polling Council and abides by its rules. Full data tables are available at ComRes.co.uk.

Dr Wim Vandekerckhove is Senior Lecturer at the University of Greenwich where he researches and teaches on whistleblowing, business ethics, and organisational behaviour. He has published widely in academic journals and books, and is a regular international speaker at conferences and events on whistleblowing and business ethics.

The survey is part of an ongoing international project measuring public attitudes to whistleblowing. Findings in Australia show a similar thrust as these from Britain.

Working paper: http://ssrn.com/abstract=2176193

Women in Congress Outperform Men On Some Measures (Science Daily)

ScienceDaily (Nov. 16, 2012) — One of the most notable outcomes of the Nov. 6 election was the record number of women voted into Congress, including 20 women who will occupy seats in the U.S. Senate.

Christopher Berry, associate professor at the University of Chicago Harris School of Public Policy, recently discussed the effects of the increase in female U.S. senators. Berry co-authored a 2011 study that found congresswomen consistently outperform their male counterparts on several measures of job performance.

What implications will the increase of female representation have for the U.S. Senate?

Potentially of great interest to the constituents of the new female senators is our finding that they consistently bring home more federal projects and federal aid than their male counterparts. When you think about disasters like Hurricane Sandy, the ability to bring home federal aid for rebuilding efforts is really important. It is going to be good for their constituents and the states they represent.

Another of our findings, which may have broader implications for the Senate and the country, is that not only do women sponsor more legislation, but also they collaborate more broadly with their colleagues. We looked at all the bills introduced in the U.S House of Representatives since 1984 and who sponsored them, and we found that women work with a much broader range of co-sponsors than their male counterparts.

This ability to collaborate may be particularly important as we move into some of the really big challenges in the next term. The fiscal cliff is the most obvious one. There are going to have to be a lot of deals done. And it is not impossible that we will revisit some aspects of healthcare reform and start long-term entitlement reform. There are big issues for President Obama’s second term, during which women may play a really interesting role in helping to bridge some of the partisan gaps.

Why do women tend to better perform in public office than men?

There are two main reasons. First, women have to be more effective in order to win elections. There still exists a substantial amount of discrimination among the electorate — something on the order of 20 percent of people express some reservations about voting for a woman, even today. When you have that sizable a portion of the electorate predisposed against you, you have to be better than the person you are running against in order to get the same number of votes. When you see a woman winning, she often comes in with a better set of skills, more appeal, more charisma. Whatever the political talent is, in order to get elected, women have to have more of it. And that is what we think makes the women who win better legislators once in office.

Secondly, women work closely with more of their colleagues then men do. The reasons for this are probably less tangible and harder to measure, but there is some research suggesting it is a matter of style. Men and women politicians have different styles of legislation and leadership. Women tend to be more collaborative, which is why we see them co-sponsoring bills with a wider network of collaborators than men typically have.

What will happen as increasing numbers of women are elected to political office?

While this election was an important gain, there is a long, long way yet to go for increasing the number of women in public office. After almost a century of suffrage, a group of people who represent 50 percent of our population are only 20 percent of the Senate.

The somewhat ironic implications of our theory are that as women become more successful and more widely accepted as politicians, eventually they simply will be equally as effective as their male counterparts and we won’t see a difference in performance. That will be a mark of success rather than failure, although we will see it reflected in a decline in the effectiveness advantage that women in office now have.

Journal Reference:

  1. Sarah F. Anzia, Christopher R. Berry. The Jackie (and Jill) Robinson Effect: Why Do Congresswomen Outperform Congressmen? American Journal of Political Science, 2011; 55 (3): 478 DOI: 10.1111/j.1540-5907.2011.00512.x

Government, Industry Can Better Manage Risks of Very Rare Catastrophic Events, Experts Say (Science Daily)

ScienceDaily (Nov. 15, 2012) — Several potentially preventable disasters have occurred during the past decade, including the recent outbreak of rare fungal meningitis linked to steroid shots given to 13,000 patients to relieve back pain. Before that, the 9/11 terrorist attacks in 2001, the Space Shuttle Columbia explosion in 2003, the financial crisis that started in 2008, the Deepwater Horizon accident in the Gulf of Mexico in 2011, and the Fukushima tsunami and ensuing nuclear accident also in 2011 were among rare and unexpected disasters that were considered extremely unlikely or even unthinkable.

A Stanford University engineer and risk management expert has analyzed the phenomenon of government and industry waiting for rare catastrophes to happen before taking risk management steps. She concluded that a different approach to these events would go far towards anticipating them, preventing them or limiting the losses.

To examine the risk management failures discernible in several major catastrophes, the research draws upon the combination of systems analysis and probability as used, for example, in engineering risk analysis. When relevant statistics are not available, it discusses the powerful alternative of systemic risk analysis to try to anticipate and manage the risks of highly uncertain, rare events. The paper by Stanford University researcher Professor Elisabeth Paté-Cornell recommends “a systematic risk analysis anchored in history and fundamental knowledge” as opposed to both industry and regulators sometimes waiting until after a disaster occurs to take safety measures as was the case, for example, of the Deepwater Horizon accident in 2011. Her paper, “On ‘Black Swans’ and ‘Perfect Storms’: Risk Analysis and Management When Statistics Are Not Enough,” appears in the November 2012 issue of Risk Analysis, published by the Society for Risk Analysis.

Paté-Cornell’s paper draws upon two commonly cited images representing different types of uncertainty — “black swans” and “perfect storms” — that are used both to describe extremely unlikely but high-consequence events and often to justify inaction until after the fact. The uncertainty in “perfect storms” derives mainly from the randomness of rare but known events occurring together. The uncertainty in “black swans” stems from the limits of fundamental understanding of a phenomenon, including in extreme cases, a complete lack of knowledge about its very existence.

Given these two extreme types of uncertainties, Paté-Cornell asks what has been learned about rare events in engineering risk analysis that can be incorporated in other fields such as finance or medicine. She notes that risk management often requires “an in-depth analysis of the system, its functions, and the probabilities of its failure modes.” The discipline confronts uncertainties by systematic identification of failure “scenarios,” including rare ones, using “reasoned imagination,” signals (new intelligence information, medical alerts, near-misses and accident precursors) and a set of analytical tools to assess the chances of events that have not happened yet. A main emphasis of systemic risk analysis is on dependencies (of failures, human errors, etc.) and on the role of external factors, such as earthquakes and tsunamis that become common causes of failure.

The “risk of no risk analysis” is illustrated by the case of the 14 meter Fukushima tsunami resulting from a magnitude 9 earthquake. Historical records showed that large tsunamis had occurred at least twice before in the same area. The first time was the Sanriku earthquake in the year 869, which was estimated at magnitude 8.6 with a tsunami that penetrated 4 kilometers inland. The second was the Sanriku earthquake of 1611, estimated at magnitude 8.1 that caused a tsunami with an estimated maximum wave height of about 20 meters. Yet, those previous events were not factored into the design of the Fukushima Dai-ichi nuclear reactor, which was built for a maximum wave height of 5.7 meters, simply based on the tidal wave caused in that area by the 1960 earthquake in Chile. Similar failures to capture historical data and various “signals” occurred in the cases of the 9/11 attacks, the Columbia Space Shuttle explosion and other examples analyzed in the paper.

The risks of truly unimaginable events that have never been seen before (such as the AIDS epidemics) cannot be assessed a priori, but careful and systematic monitoring, signals observation and a concerted response are keys to limiting the losses. Other rare events that place heavy pressure on human or technical systems are the result of convergences of known events (“perfect storms”) that can and should be anticipated. Their probabilities can be assessed using a set of analytical tools that capture dependencies and dynamics in scenario analysis. Given the results of such models, there should be no excuse for failing to take measures against rare but predictable events that have damaging consequences, and to react to signals, even imperfect ones, that something new may be unfolding.

Journal Reference:

  1. Elisabeth Paté-Cornell. On “Black Swans” and “Perfect Storms”: Risk Analysis and Management When Statistics Are Not EnoughRisk Analysis, 2012; DOI:10.1111/j.1539-6924.2011.01787.x

Homophobia in Sport: Sporting Identity, Authoritarian Aggression, and Social Dominance (Science Daily)

ScienceDaily (Nov. 16, 2012) — Homophobia exists in many areas of life. It also seems to be particularly entrenched in sport, exercise and physical education (PE) settings of all kinds. But why is this the case?

To find out, an international trio of psychologists have become the first to examine the relationship between investment in physical/sporting identity, certain psychological attributes, and homophobia in PE/sport participants.

The authors, Kerry S. O’Brien, Heather Shovelton and Janet D. Latner, whose pioneering work appears in the International Journal of Psychology, had two goals in mind. First, they wanted to address the lack of quantitative work on homophobia in PE and sport settings. Second, they wanted to examine the role played by established sociological constructs in homophobia. Since other forms of bias such as racism are associated with conservative ideologies and personality traits such as authoritarianism and social dominance orientation (SDO — a preference for social hierarchies), the authors wanted to see whether such traits were also associated with homophobia.

Because heterosexual masculinity and physical identity are defined by physical attributes for both men and women (which gay men and lesbians are often seen as threatening), the authors also explored the relationship between ‘sporting identity and athletic self-concept related constructs’ and homophobic attitudes. The authors posited that individuals who identify strongly as members of a physically oriented group (such as PE/sport science students), place a high value on physical attributes, abilities and appearance (such as strength or skill), or have more conservative ideologies, or may hold more negative attitudes towards those whose beliefs and attitudes differ from their own.

The conclusions bore out the researchers’ hypothesis: anti-gay and anti-lesbian prejudice was greater in PE students than non-PE students, and males had greater anti-gay, but not anti-lesbian, prejudice than females. The differences between the two groups appear to be explained by differences in the conservative psychological traits; higher scores for authoritarianism and SDO were significant predictors. In addition, physical identity and athletic attributes based around masculine ideals also appear related to prejudice in males.

The authors conclude that sport settings may benefit from ‘prejudice reduction initiatives that address the overinvestment in physical attributes and masculine ideas’ and which reinforce social equality and diversity. Such initiatives also need to address the contextual and psychosocial factors that underpin homophobia. While there is of course no suggestion that sportiness itself encourages prejudice, the authors warn that the high levels of anti-gay and anti-lesbian sentiment they found ‘may be due to the contextual influences that enhance or support the expression of homophobia’. In other words, prejudice can become entrenched in a group over time, in accordance with social identity theory (SIT).

The findings presented in this ground-breaking study provide vital new quantitative evidence to support qualitative and anecdotal reports that homophobia is higher in sport and PE than in other settings, making it essential reading for the educators, coaches and sporting professionals who must work together to root it out.

Journal Reference:

  1. Kerry S. O’Brien, Heather Shovelton, Janet D. Latner.Homophobia in physical education and sport: The role of physical/sporting identity and attributes, authoritarian aggression, and social dominance orientationInternational Journal of Psychology, 2012; : 1 DOI: 10.1080/00207594.2012.713107

Mathematical Counseling for All Who Wonder Why Their Relationship Is Like a Sinus Wave (Science Daily)

ScienceDaily (Nov. 15, 2012) — Neuroinformaticians from Radboud University Nijmegen provide a mathematical model for efficient communication in relationships. Love affair dynamics can look like a sinus wave: a smooth repetitive oscillation of highs and lows. For some couples these waves grow out of control, leading to breakup, while for others they smooth into a state of peace and quietness. Natalia Bielczyk and her colleagues show that the ‘relationship-sinus’ depends on the time partners take to form their emotional reactions towards each other.

The publication in Applied Mathematics and Computation is now available online.

An example of a modeled relationship, in this case between Romeo (solid lines) and Juliet (dashed lines). The tau (τ) above the individual figures indicates the delay in reactivity. Delays that are too short (<0,83) cause instability, just like delays that are too long (>2,364). Delays in the range of 0,83-2,364 cause stability in Romeo and Juliet’s relationship. (Credit: Image courtesy of Radboud University Nijmegen)

In 1988, Steven Strogatz was the first to describe romantic relationships with mathematical dynamical systems. He constructed a two-dimensional model describing two hypothetical partners that interact emotionally. He used a well known example: the changes of Romeo’s and Juliet’s love (and hate) over time. His model became famous and inspired others to analyze (fictional) relationship case studies like Jack and Rose in the Titanic movie. However, the Strogatz model does not include delays in the partner’s responses to one another. Therefore it is only a good start for fruitful studies on human emotions and relationships.

That is why Natalia Bielczyk adjusted Strogatz to a more life-like model by considering the time necessary for processing and forming the complex emotions in relationships. The reactivity in the relationship model is based on four parameters: both partners have a personal history (their ‘past’), and a certain reactivity to their partner and his/her history. Depending on these parameters, different classes of relationships can be found: some seem doomed to break regardless of the partners promptness to one another while others are solid enough to always be stable. In the calculated models, stability occurs when both partners reach a stable level of satisfaction and the sinus wave disappears. The paper concludes that for a broad class of relationships, delays in reactivity can bring stability to couples that are originally unstable.

These results are pretty intuitive: too prompt or too delayed responses evoke trouble. Below a certain value, delays caused instability and above this value they caused stability, showing that some minimum level of sloth can be beneficial for a relationship. The fact that too fast emotional reactivity can lead to destabilization, shows that reflecting each other’s moods is not enough for a stable relationship: a certain time range is necessary for compound emotions to form. Summarized, the publication offers mathematical justification for intuitive phenomena in social psychology. Working on good communication, studying each other’s emotions and working out the right timing can improve your relationship, even without trying to change your partners traits (which is harder and takes more time).

Journal Reference:

  1. Natalia Bielczyk, Marek Bodnar, Urszula Foryś. Delay can stabilize: Love affairs dynamicsApplied Mathematics and Computation, 2012; DOI: 10.1016/j.amc.2012.10.028

Brazilian Mediums Shed Light On Brain Activity During a Trance State (Science Daily)

ScienceDaily (Nov. 16, 2012) — Researchers at Thomas Jefferson University and the University of Sao Paulo in Brazil analyzed the cerebral blood flow (CBF) of Brazilian mediums during the practice of psychography, described as a form of writing whereby a deceased person or spirit is believed to write through the medium’s hand. The new research revealed intriguing findings of decreased brain activity during the mediums’ dissociative state which generated complex written content. Their findings will appear in the November 16th edition of the online journal PLOS ONE.

The 10 mediums — five less expert and five experienced — were injected with a radioactive tracer to capture their brain activity during normal writing and during the practice of psychography which involves the subject entering a trance-like state. The subjects were scanned using SPECT (single photon emission computed tomography) to highlight the areas of the brain that are active and inactive during the practice.

“Spiritual experiences affect cerebral activity, this is known. But, the cerebral response to mediumship, the practice of supposedly being in communication with, or under the control of the spirit of a deceased person, has received little scientific attention, and from now on new studies should be conducted,” says Andrew Newberg, MD, director of Research at the Jefferson-Myrna Brind Center of Integrative Medicine and a nationally-known expert on spirituality and the brain, who collaborated with Julio F. P. Peres, Clinical Psychologist, PhD in Neuroscience and Behavior, Institute of Psychology at the University of Sao Paulo in Brazil, and colleagues on the research.

The mediums ranged from 15 to 47 years of automatic writing experience, performing up to 18 psychographies per month. All were right-handed, in good mental health, and not currently using any psychiatric drugs. All reported that during the study, they were able to reach their usual trance-like state during the psychography task and were in their regular state of consciousness during the control task.

The researchers found that the experienced psychographers showed lower levels of activity in the left hippocampus (limbic system), right superior temporal gyrus, and the frontal lobe regions of the left anterior cingulate and right precentral gyrus during psychography compared to their normal (non-trance) writing. The frontal lobe areas are associated with reasoning, planning, generating language, movement, and problem solving, perhaps reflecting an absence of focus, self-awareness and consciousness during psychography, the researchers hypothesize.

Less expert psychographers showed just the opposite — increased levels of CBF in the same frontal areas during psychography compared to normal writing. The difference was significant compared to the experienced mediums. This finding may be related to their more purposeful attempt at performing the psychography. The absence of current mental disorders in the groups is in line with current evidence that dissociative experiences are common in the general population and not necessarily related to mental disorders, especially in religious/spiritual groups. Further research should address criteria for distinguishing between healthy and pathological dissociative expressions in the scope of mediumship.

The writing samples produced were also analyzed and it was found that the complexity scores for the psychographed content were higher than those for the control writing across the board. In particular, the more experienced mediums showed higher complexity scores, which typically would require more activity in the frontal and temporal lobes, but this was not the case. Content produced during psychographies involved ethical principles, the importance of spirituality, and bringing together science and spirituality.

Several possible hypotheses for these many differences have been considered. One speculation is that as frontal lobe activity decreases, the areas of the brain that support mediumistic writing are further disinhibited (similar to alcohol or drug use) so that the overall complexity can increase. In a similar manner, improvisational music performance is associated with lower levels of frontal lobe activity which allows for more creative activity. However, improvisational music performance and alcohol/drug consumption states are quite peculiar and distinct from psychography. “While the exact reason is at this point elusive, our study suggests there are neurophysiological correlates of this state,” says Newberg.

“This first-ever neuroscientific evaluation of mediumistic trance states reveals some exciting data to improve our understanding of the mind and its relationship with the brain. These findings deserve further investigation both in terms of replication and explanatory hypotheses,” states Newberg.

Journal Reference:

  1. Julio Fernando Peres, Alexander Moreira-Almeida, Leonardo Caixeta, Frederico Leao, Andrew Newberg. Neuroimaging during Trance State: A Contribution to the Study of DissociationPLoS ONE, 2012; 7 (11): e49360 DOI:10.1371/journal.pone.0049360

Promotores e procuradores discutiram medidas preventivas contra a violência nos estádios (Esporte Essencial)

[Interessante como texto e fotos passam mensagens contraditórias no que diz respeito à atribuição de responsabilidade pela violência nos estádios. RT]

18/10/2012

Por Katryn Dias

violencia_nos_estadios_divulgacao_texto_400A violência dentro e fora dos estádios de futebol é uma triste realidade brasileira. Nos últimos 24 anos, mais de 150 pessoas foram mortas no país em decorrência de brigas entre torcidas organizadas e, segundo um levantamento realizado pelo jornal Lance! em abril deste ano.

Para discutir medidas de combate à violência, foi convocada nesta quarta-feira (17) uma reunião extraordinária da Comissão Permanente de Prevenção e Combate à Violência nos Estádios de Futebol. Promotores e procuradores discutiram medidas preventivas que serão apresentadas hoje (18) à Confederação Brasileira de Futebol (CBF).

“É muito importante que essa regulamentação amplie e aprofunde o espírito do Estatuto do Torcedor para que nós possamos ter nos estádios as famílias, as pessoas que querem torcer, as torcidas ordeiras. E não, eventualmente, pessoas que queiram cometer crimes ou praticar a violência”, afirmou o promotor de Justiça Sávio Bittencourt.

vne_280Durante a reunião, o Ministério Público defendeu a uniformização em todo o país de medidas para punir os criminosos. A meta é aplicar punições severas às torcidas responsáveis pela promoção da violência e do vandalismo, inclusive com prisões de alguns de seus membros. “A primeira questão é a impunidade. Precisamos discutir e verificar onde está a falha, porque muitas vezes a polícia militar atua, mas essa atuação não se reflete em prisões”, destacou José Antônio Baêta, presidente da Comissão de Prevenção e Combate à Violência.

Outra medida em discussão está levantando uma grande polêmica. A proposta da Comissão é estender a proibição da venda de bebidas alcoólicas a uma área de até 500 metros no entorno dos estádios em dias de jogos. Segundo Baêta, desde que foi implementada, a proibição da venda de bebidas dentro dos estádios já mostrou resultados, refletindo, inclusive, no aumento expressivo de mulheres e crianças nas torcidas.

Fotos: Divulgação