Arquivo mensal: abril 2010

>Navios roubam água dos rios da Amazônia – mito ou verdade?

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Erik von Farfan

Eco 21 – http://www.eco21.com.br
Ano XIV – nº 93 – Agosto – 2004

Depois de sofrer com a biopirataria, com o roubo de minérios e madeiras nobres, agora a Amazônia está enfrentando o tráfico de água doce. Uma nova modalidade de saque aos recursos naturais denominada hidropirataria. Cientistas e autoridades brasileiras foram informadas que navios petroleiros estão reabastecendo seus reservatórios no Rio Amazonas antes de sair das águas nacionais. Porém a falta de uma denúncia formal tem impedido a Agência Nacional de Águas (ANA), responsável por esse tipo de fiscalização, de atuar no caso.

Enquanto as grandes embarcações estrangeiras recriam a pirataria do Século 16, a burocracia impede o bloqueio desta nova forma de saque das riquezas nacionais.

Ivo Brasil, Diretor de Outorga, Cobrança e Fiscalização da Agência Nacional de Águas, sabe desta ação ilegal; contudo, aguarda uma denúncia oficial chegar à entidade para poder tomar as providências necessárias. “Só assim teremos condições legais para agir contra essa apropriação indevida”, afirmou.

O dirigente está preocupado com a situação. Precisa, porém, dos amparos legais para mobilizar tanto a Marinha como a Polícia Federal, que necessitam de comprovação do ato criminoso para promover uma operação na foz dos rios de toda a região amazônica próxima ao Oceano Atlântico. “Tenho ouvido comentários neste sentido, mas ainda nada foi formalizado”, observa.

A defesa das águas brasileiras está na Constituição Federal, no Artigo 20, que trata dos Bens da União. Em seu inciso III, a legislação determina que rios e quaisquer correntes de água no território nacional, inclusive o espaço do mar territorial, é pertencente à União.

Isto é complementado pela Lei 9.433/97, sobre Política Nacional de Recursos Hídricos, em seu Art. 1, inciso II, que estabelece ser a água um recurso limitado, dotado de valor econômico. E ainda determina que o poder público seja o responsável pela licença para uso dos recursos hídricos, “como derivação ou captação de parcela de água”. O gerente do Projeto Panamazônia, do INPE, o geólogo Paulo Roberto Martini, também tomou conhecimento do caso em conversa com técnicos de outros órgãos estatais. “Têm nos chegado diversas informações neste sentido, infelizmente sempre estão tirando irregularmente algo da Amazônia”, comentou o cientista, preocupado com o contrabando.

Os cálculos preliminares mostram que cada navio tem se abastecido com 250 milhões de litros. A ingerência estrangeira nos recursos naturais da região amazônica tem aumentado significativamente nos últimos anos.

Águas amazônicas

Seja por ação de empresas multinacionais, pesquisadores estrangeiros autônomos ou pelas missões religiosas internacionais. Mesmo com o Sistema de Vigilância da Amazônia (SIVAM) ainda não foi possível conter os contrabandos e a interferência externa dentro da região.

A hidropirataria também é conhecida dos pesquisadores da Petrobras e de órgãos públicos estaduais do Amazonas. A informação deste novo crime chegou, de maneira não oficial, ao Instituto de Proteção Ambiental do Amazonas (IPAAM), órgão do governo local. “Uma mobilização até o local seria extremamente dispendiosa e necessitaríamos do auxílio tanto de outros órgãos como da comunidade para coibir essa prática”, reafirmou Ivo Brasil. A captação é feita pelos petroleiros na foz do rio ou já dentro do curso de água doce. Somente o local do deságüe do Amazonas no Atlântico tem 320 km de extensão e fica dentro do território do Amapá. Neste lugar, a profundidade média é em torno de 50 m, o que suportaria o trânsito de um grande navio cargueiro. O contrabando é facilitado pela ausência de fiscalização na área.

Essa água, apesar de conter uma gama residual imensa e a maior parte de origem mineral, pode ser facilmente tratada. Para empresas engarrafadoras, tanto da Europa como do Oriente Médio, trabalhar com essa água mesmo no estado bruto representaria uma grande economia. O custo por litro tratado seria muito inferior aos processos de dessalinizar águas subterrâneas ou oceânicas. Além de livrar-se do pagamento das altas taxas de utilização das águas de superfície existentes, principalmente, dos rios europeus.

As águas salinizadas estão presentes no subsolo de vários países do Oriente Médio, como a Arábia Saudita, Kuwait e Israel. Eles praticamente só dispõem desta fonte para seus abastecimentos. O Brasil importa desta região cerca de 5% de todo o petróleo que será convertido para gasolina e outros derivados considerados de densidade leve. Esse procedimento de retirada do sal é feito por osmose reversa, algo extremamente caro.

Na dessalinização é gasto US$ 1,50 por metro cúbico e US$ 0,80 com o mesmo volume de água doce tratada.

Hidro ou biopirataria?

O diretor de operações da empresa Águas do Amazonas, o engenheiro Paulo Edgard Fiamenghi, trata as águas do Rio Negro, que abastece Manaus, por processos convencionais. E reconhece que esse procedimento seria de baixo custo para países com grandes dificuldades em obter água potável. “Levar água para se tratar no processo convencional é muito mais barato que o tratamento por osmose reversa”, comenta.

O avanço sobre as reservas hídricas do maior complexo ambiental do mundo, segundo os especialistas, pode ser o começo de um processo desastroso para a Amazônia. E isto surge num momento crítico, cujos esforços estão concentrados em reduzir a destruição da flora e da fauna, abrandando também a pressão internacional pela conservação dos ecossistemas locais.

Entretanto, no meio científico ninguém poderia supor que o manancial hídrico seria a próxima vítima da pirataria ambiental. Porém os pesquisadores brasileiros questionam o real interesse em se levar as águas amazônicas para outros continentes. O que suscita novamente o maior drama amazônico, o roubo de seus organismos vivos. “Podem estar levando água, peixes ou outras espécies e isto envolve diretamente a soberania dos países na região”, argumentou Martini.

A mesma linha de raciocínio é utilizada pelo professor do Departamento de Hidráulica e Saneamento da Universidade Federal do Paraná, Ary Haro. Para ele, o simples roubo de água doce está longe de ser vantajoso no aspecto econômico. “Como ainda é desconhecido, só podemos formular teorias e uma delas pode estar ligada ao contrabando de peixes ou mesmo de microorganismos”, observou.

Essa suposição também é tida como algo possível para Fiamenghi, pois o volume levado na nova modalidade, denominada “hidropirataria” seria relativamente pequeno. Um navio petroleiro armazenaria o equivalente a meio dia de água utilizada pela cidade de Manaus, de 1,5 milhão de habitantes. “Desconheço esse caso, mas podemos estar diante de outros interesses além de se levar apenas água doce”, comentou.

Segundo o pesquisador do INPE, a saturação dos recursos hídricos utilizáveis vem numa progressão mundial e a Amazônia é considerada a grande reserva do Planeta para os próximos mil anos. Pelos seus cálculos, 12% da água doce de superfície se encontram no território amazônico. “Essa é uma estimativa extremamente conservadora, há os que defendem 26% como o número mais preciso”, explicou.

Em todo o Planeta, dois terços são ocupado por oceanos, mares e rios. Porém, somente 3% desse volume são de água doce. Um índice baixo, que se torna ainda menor se for excluído o percentual encontrado no estado sólido, como nas geleiras polares e nos cumes das grandes cordilheiras. Contando ainda com as águas subterrâneas. Atualmente, na superfície do Planeta, a água em estado líquido, representa menos de 1% deste total disponível.

A previsão é que num período entre 100 e 150 anos, as guerras sejam motivadas pela detenção dos recursos hídricos utilizáveis no consumo humano e em suas diversas atividades, com a agricultura. Muito disto se daria pela quebra dos regimes de chuvas, causada pelo aquecimento global. Isto alteraria profundamente o cenário hidrológico mundial, trazendo estiagem mais longas, menores índices pluviométricos, além do degelo das reservas polares e das neves permanentes.

Sob esse aspecto, a Amazônia se transforma num local estratégico. Muito devido às suas características particulares, como o fato de ser a maior bacia existente na Terra e deter a mais complexa rede hidrográfica do planeta, com mais de mil afluentes. Diante deste quadro, a conclusão é óbvia: a sobrevivência da biodiversidade mundial passa pela preservação desta reserva.

Mas a importância deste reduto natural poderá ser, num futuro próximo, sinônimo de riscos à soberania dos territórios panamazônicos. O que significa dizer que o Brasil seria um alvo prioritário numa eventual tentativa de se internacionalizar esses recursos, como já ocorre no caso das patentes de produtos derivados de espécies amazônicas. Pois 63,88% das águas que formam o rio se encontram dentro dos limites nacionais.

Esse potencial conflito é algo que projetos como o Sistema de Vigilância da Amazônia procuram minimizar. Outro aspecto a ser contornado é a falta de monitoramento da foz do rio. A cobertura de nuvens em toda Amazônia é intensa e os satélites de sensoriamento remoto não conseguem obter imagens do local. Já os satélites de captação de imagens via radar, que conseguiriam furar o bloqueio das nuvens e detectar os navios, estão operando mais ao norte.

As águas amazônicas representam 68% de todo volume hídrico existente no Brasil. E sua importância para o futuro da humanidade é fundamental. Entre 1970 e 1995 a quantidade de água disponível para cada habitante do mundo caiu 37% em todo mundo, e atualmente cerca de 1,4 bilhão de pessoas não têm acesso a água limpa. Segundo a Water World Vision, somente o Rio Amazonas e o Congo podem ser qualificados como limpos.

* * *

O professor José Nilson Campos, da UFC, me mandou o seguinte comentário, baseado em questionamentos meus sobre o tema:

“Vou fazer um pequeno relato. Deveria ter sido feito há algum tempo, porém agora vou aproveitar o requentamento do assunto.

Quando presidente da ABRH (1993-1995) fui convidado a proferir uma palestra em Santarém, onde há um grupo bem atuante e interessado nas questões da água e do meio ambiente da Amazônia. Havia na grande platéia com pessoas de diversas visões da questão ambiental e hídrica.

Nos debates um participante comentou que havia registros de que navios estrangeiros estavam “pirateando” água da Amazônia e perguntou minha opinião sobre o assunto. Respondi que não poderia informar sobre a veracidade ou não da informação mas que, no atual momento (1994) os custos de transportar água em navios da Amazônia para a Europa ou Estados Unidos seriam bem maiores do que conseguir água por outros meios alternativos (…).

Na Platéia havia um comandante da Marinha Mercante Brasileira que comentou que não podia precisar a veracidade, porém havia situações nas quais os navios precisavam fazer lastro (colocar peso) e que a água doce era uma alternativa. Para mim, aquela afirmação vindo de um Comandante da Marinha era bastante convincente e a aceitei como verdadeira.

Esse é um relato. Não significa que eu não acredite que haja entre as grandes potências econômicas mundiais grupos que pratiquem algum tipo de pirataria. Na bio pirataria da Amazônia eu acredito, na hidro pirataria ainda não.

Saudações a todos.”

>Militares pedem ao STF a punição dos torturadores

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15/04/2010 – 10h04

Por Redação Agência Carta Maior

Grupo de militares que não apoiaram o golpe de 1964, e por isso foram punidos, consideram que “os crimes comuns e de tortura praticados pelos agentes do Estado e da Repressão durante o regime militar brasileiro são atos absolutamente nulos e impassíveis também de anistia”. Os postulantes usam argumentos com base na legislação nacional e internacional para afirmar que a Lei da Anistia não a não pode provocar um esquecimento artificial dos fatos ocorridos. STF adia julgamento sobre o caso que estava marcado para esta quarta-feira.

O Major Brigadeiro Rui Moreira Lima – um dos três heróis de guerra remanescentes da Força Expedicionária Brasileira combatente do nazi-fascismo, durante a II Guerra Mundial – protocolou segunda-feira (12), no Supremo Tribunal Federal (STF) um pedido para que a lei de Anistia não abarque os crimes de tortura. O documento, assinado pelo Brigadeiro como presidente da Associação Democrática e Nacionalista de Militares (ADNAM), afirma:

“Pede-se a este Pretório Excelso uma interpretação da Lei 6.683/79 conforme a Constituição de tal modo que a anistia concedida pela referida lei aos crimes políticos e conexos não abarque os crimes comuns praticados pelos agentes repressores da oposição ao regime militar à época vigente (1964/1985), devendo, assim, a presente ADPF ser julgada integralmente procedente.”

A petição, protocolada pelos militares, requer ingresso, como amicus curiae na ação de Argüição de Descumprimento de Preceito Fundamental proposta pela Ordem dos Advogados do Brasil. A ação da OAB questiona quais tipos de violação podem ser classificadas como crimes comuns e quais continuam a ser entendidos como ações políticas, – o que as enquadra dentro da Lei de Anistia. A lei concede perdão a todos os envolvidos com crimes políticos entre 1961 e 1979. Com quase dois anos de atraso, foi marcado, de forma repentina, para quarta-feira (14), o julgamento da referida ação pelo STF. Esse julgamento foi adiado nesta terça-feira (ver abaixo).

Segundo a petição assinada por Moreira Lima, “anistia não pode significar que atos de terror cometidos pelo Estado através de seus agentes e que ensejaram verdadeiros crimes contra a humanidade não possam ser revistos”. A Associação Democrática e Nacionalista de Militares congrega militares das três forças armadas, policiais militares e corpos de bombeiros que se comprometem com a manutenção da democracia no país e lutam pela preservação do patrimônio nacional. A ADNAM visa também a promoção e a defesa dos direitos dos seus associados nas esferas executiva, legislativa e judiciária e dos militares punidos com fundamento nos Atos Institucionais e complementares ou outros diplomas legais emitidos durante o período de 1964-1985, sob o qual o país foi governado por sucessivos governos militares.

Na peça jurídica de 26 páginas os militares que não apoiaram o golpe de 1964, e por isso foram punidos, consideram que “os crimes comuns e de tortura praticados pelos agentes do Estado e da Repressão durante o regime militar brasileiro são atos absolutamente nulos e impassíveis também de anistia”. Os postulantes usam argumentos com base na legislação nacional e internacional para afirmar que:

“Anistia não é esquecimento. (…) A Lei de Anistia não pode provocar um esquecimento artificial dos fatos ocorridos. (…) Anistia não é perdão. (…) A questão que se coloca, é se a Lei da Anistia significa o auto-perdão, ou seja, o Estado na condição de perpetrador da violência deve ser por ele mesmo perdoado? Se anistia não se confunde com perdão, muito menos pode significar auto-perdão”.

Sobre a alegação de que a anistia foi um pacto político, escrevem os militares:

“Não se pode justificar o Estado Democrático de Direito atual sob o esquecimento e negação da violação de direitos perpetrada pelo regime militar. Não há acordo, pacificação, reconciliação, perdão e/ou reconstrução se a uma das partes é vedada o conhecimento do que efetivamente se passou e quem foram os responsáveis”.

Julgamento adiado
A Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 153, que contesta a Lei da Anistia (Lei nº 6.683/79), não entrará na pauta da sessão ordinária desta quarta-feira (14) como estava previsto. Embora haja o quórum mínimo exigido para análise de matéria constitucional (oito ministros), a Presidência do STF decidiu adiar o julgamento alegando que “a importância e complexidade da questão recomendam a análise do processo com quórum completo”. Ainda não há previsão acerca da nova data para julgamento do processo.

A norma, que completou 30 anos em agosto de 2009, é questionada na Suprema Corte pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). O relator da ADPF é o ministro Eros Grau. A OAB contesta o artigo 1º da Lei da Anistia, defendendo uma interpretação mais clara quanto ao que foi considerado como perdão aos crimes conexos “de qualquer natureza” quando relacionados aos crimes políticos ou praticados por motivação política.

Segundo a OAB, a lei “estende a anistia a classes absolutamente indefinidas de crime” e, nesse contexto, a anistia não deveria alcançar os autores de crimes comuns praticados por agentes públicos acusados de homicídio, abuso de autoridade, lesões corporais, desaparecimento forçado, estupro e atentado violento ao pudor, contra opositores ao regime político da época.

Com informações do STF e da Comissão de Anistia.

>Weathermen, and other climate change skeptics (The New Yorker)

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Comment
Up in the Air

by Elizabeth Kolbert – April 12, 2010

Joe Bastardi, who goes by the title “expert senior forecaster” at AccuWeather, has a modest proposal. Virtually every major scientific body in the world has concluded that the planet is warming, and that greenhouse-gas emissions are the main cause. Bastardi, who holds a bachelor’s degree in meteorology, disagrees. His theory, which mixes volcanism, sunspots, and a sea-temperature trend known as the Pacific Decadal Oscillation, is that the earth is actually cooling. Why don’t we just wait twenty or thirty years, he proposes, and see who’s right? This is “the greatest lab experiment ever,” he said recently on Bill O’Reilly’s Fox News show.

Bastardi’s position is ridiculous (which is no doubt why he’s often asked to air it on Fox News). Yet there it was on the front page of the Times last week. Among weathermen, it turns out, views like Bastardi’s are typical. A survey released by researchers at George Mason University found that more than a quarter of television weathercasters agree with the statement “Global warming is a scam,” and nearly two-thirds believe that, if warming is occurring, it is caused “mostly by natural changes.” (The survey also found that more than eighty per cent of weathercasters don’t trust “mainstream news media sources,” though they are presumably included in this category.)

Why, with global warming, is it always one step forward, two, maybe three steps back? A year ago, it looked as if the so-called climate debate might finally be over, and the business of actually addressing the problem about to begin. In April, the Obama Administration designated CO2 a dangerous pollutant, thus taking the first critical step toward regulating carbon emissions. The following month, the Administration announced new fuel-efficiency standards for cars. (These rules were finalized last week.) In June, the House of Representatives passed a bill, named for its co-sponsors, Edward Markey and Henry Waxman, that called for reducing emissions seventeen per cent by 2020. Speaking in September at the United Nations, the President said that a “new era” had dawned. “We understand the gravity of the climate threat,” he declared. “We are determined to act.”

Then, much like the Arctic ice cap, that “new era” started to fall to pieces. The U.N. climate summit in Copenhagen in December broke up without agreement even on a possible outline for a future treaty. A Senate version of the Markey-Waxman bill failed to materialize and, it’s now clear, won’t be materializing anytime this year. (Indeed, the one thing that seems certain not to be in a Senate energy bill is the economy-wide emissions reduction required by the House bill.) Last week, despite the Senate’s inaction, President Obama announced that he was opening huge swaths of the Atlantic and Alaskan coasts to oil drilling. The White House billed the move as part of a “comprehensive energy strategy,” a characterization that, as many commentators pointed out, made no sense, since comprehensiveness is precisely what the President’s strategy lacks. As Josh Nelson put it on the blog EnviroKnow, “Obama is either an exceptionally bad negotiator, or he actually believes in some truly awful policy ideas. Neither of these possibilities bodes well.”

As lawmakers dither, public support for action melts away. In a Gallup poll taken last month, forty-eight per cent of respondents said that they believe the threat of global warming to be “generally exaggerated.” This figure was up from thirty-five per cent just two years ago. According to the same poll, only fifty-two per cent of Americans believe that “most scientists believe that global warming is occurring,” down from sixty-five per cent in 2008.

The most immediate explanation for this disturbing trend is the mess that’s come to be known as Climategate. Here the situation is the reverse of what’s going on in the troposphere: Climategate really is a hyped-up media phenomenon. Late last year, hackers broke into the computer system at the Climatic Research Unit of Britain’s University of East Anglia and posted online hundreds of private e-mails from scientists. In the e-mails, C.R.U. researchers often express irritation with their critics—the death of one detractor is described as “cheering news”—and discuss ways to dodge a slew of what they consider to be nuisance Freedom of Information requests. The e-mails were widely portrayed in the press and in the blogosphere as evidence of a conspiracy to misrepresent the data. But, as a parliamentary committee appointed to investigate the matter concluded last week, this charge is so off base that it is difficult even to respond to: “Insofar as the committee was able to consider accusations of dishonesty against CRU, the committee considers that there is no case to answer.”

The e-mail brouhaha was followed by—and immediately confused with—another overblown controversy, about a mistake in the second volume of the U.N. Intergovernmental Panel on Climate Change’s Fourth Assessment Report, from 2007. On page 493 of the nine-hundred-and-seventy-six-page document, it is asserted, incorrectly, that the Himalayan glaciers could disappear by 2035. (The report cites as a source for this erroneous information a report by the World Wildlife Fund.) The screw-up, which was soon acknowledged by the I.P.C.C. and the W.W.F., was somehow transformed by commentators into a reason to doubt everything in the three-volume assessment, including, by implication, the basic laws of thermodynamics. The “new scandal (already awarded the unimaginative name of ‘Glaciergate’) raises further challenges for a scientific theory that is steadily losing credibility,” James Heiser wrote on the Web site of the right-wing magazine New American.

No one has ever offered a plausible account of why thousands of scientists at hundreds of universities in dozens of countries would bother to engineer a climate hoax. Nor has anyone been able to explain why Mother Nature would keep playing along; despite what it might have felt like in the Northeast these past few months, globally it was one of the warmest winters on record.

The message from scientists at this point couldn’t be clearer: the world’s emissions trajectory is extremely dangerous. Goofball weathermen, Climategate, conspiracy theories—these are all a distraction from what’s really happening. Which, apparently, is what we’re looking for. ♦

Read more: http://www.newyorker.com/talk/comment/2010/04/12/100412taco_talk_kolbert#ixzz0lBqmFCnu

>A tragédia no Rio e o jornalismo participativo

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Leitores dão show de jornalismo

Por Larissa Morais, do Observatório da Imprensa
Envolverde/Observatório da Imprensa – 08/04/2010 – 11h04

O dia em que o Rio de Janeiro parou, submerso por chuvas de abril, entra para a história do jornalismo brasileiro como marco da participação dos leitores no noticiário. No fim da manhã, enquanto muitos jornalistas ainda tentavam chegar às redações, ilhados como tantos cariocas, sites de notícias já veiculavam fotos, vídeos amadores e depoimentos de cidadãos registrando o caos instalado em toda a cidade.

A força desse conteúdo levou ao noticiário áreas da cidade normalmente esquecidas pela grande imprensa: Pavuna, Olaria, Rocha Miranda, Niterói e São Gonçalo, entre outras. Sim, no dia em que a Lagoa Rodrigo de Freitas transbordou, Rocha Miranda teve um lugar na cobertura.

O site do Globo, que desde 2006 vem apostando no jornalismo participativo, inovou ao produzir, com a ajuda dos leitores, um mapa da devastação na cidade. A equipe de arte apontou no Google Maps pontos de alagamento, locais de acúmulo de lixo e lama, pontos de deslizamento e postos de doação. Navegando pelo mapa, era possível ter acesso a fotos e indicações de leitores e/ou jornalistas “da casa”. Dicas como “nessa rua a queda de uma árvore bloqueia a passagem de automóveis”, com a indicação do horário de envio ou atualização da informação.

Outro padrão

O Twitter do blog de Ricardo Noblat ganhou na terça-feira (7/4) 390 novos seguidores graças à rede informativa que criou para a troca de informações sobre as conseqüências das chuvas. Das centenas informações que chegaram, nenhuma estava errada – o que, nas palavras de Noblat, “derruba a idéia cultivada por muitos jornalistas de que leitores não jornalistas carecem de compromisso com a veracidade do que relatam”.

O G1 se destacou em relação ao outros sites pelo excelente aproveitamento dos vídeos produzidos pelos leitores (esclareço que nesse termo incluo também internautas, espectadores, ouvintes e quem mais vier). Ao fim do dia, o portal da TV Globo havia colocado no ar mais de 70 vídeos e 60 fotos de leitores – material claramente selecionado mais por seu valor informativo do que por sua qualidade técnica.

Foi curioso ver tantos vídeos tremidos, escuros e com som ruim no site da emissora conhecida internacionalmente pela alta qualidade técnica de seus produtos jornalísticos e de entretenimento. A produção dos leitores ficou ali, lado a lado com as imagens produzidas pela equipe da Globo. O “ibope” dos leitores foi tamanho que parte do material foi aproveitada em uma longa matéria levada ao ar no mais tradicional dos telejornais brasileiros, o Jornal Nacional.

O JN aproveitou flagrantes como o do motociclista que perdeu a moto em uma cratera sob a águas. De seus celulares e câmeras amadoras, os leitores deram conta de mostrar o que não era possível para uma única emissora ou site, simplesmente porque não havia como distribuir equipe em tantos lugares num espaço tão curto de tempo. A capilaridade que os cidadãos deram ao noticiário pesou mais do que o fato de seus registros fugirem a um padrão estético vigente.

Quem arrisca?

Acredito que a maior participação do público no noticiário já está alterando, e vai alterar ainda mais, a estética e as práticas produtivas do jornalismo mainstream, e o episódio de terça-feira reforça essa impressão. Vejo, por exemplo, a tendência a uma maior valorização do flagrante em relação ao pautado, e das narrações espontâneas – nas quais caibam as tensões do momento – em relação às roteirizadas. Ganham força ainda os relatos participativos dos leitores que fazem registros jornalísticos e dos jornalistas que se colocam como testemunhas dos acontecimentos, como os leitores.

Como fez na terça-feira o jornalista e apresentador Márcio Gomes, que deixou sua casa, na Fonte da Saudade, rumo à TV Globo, no bairro vizinho do Jardim Botânico, com uma câmera amadora na mão e uma pauta na cabeça. No trajeto foi gravando imagens, colhendo depoimentos e narrando impressões do alagamento da cidade, num registro que misturou o estilo que vem ganhando força com os leitores com o modelo jornalístico da emissora na qual fez carreira. A matéria foi ao ar no RJ TV, telejornal que ancora, e, mais tarde, veiculada em rede no Jornal Nacional.

Quem ainda se arrisca a estabelecer fronteiras rígidas para o jornalismo de hoje?

© Copyleft – É livre a reprodução exclusivamente para fins não comerciais, desde que o autor e a fonte sejam citados e esta nota seja incluída.

>Limites incertos no desenvolvimento sexual

>
Grupo de pesquisa paulista caracteriza 23 disfunções orgânicas do desenvolvimento sexual

Pesquisa FAPESP
Edição 170 – Abril 2010

Carlos Fioravanti

— Maria, você quer ser mulher ou homem?

A médica Berenice Bilharinho Mendonça, ao fazer essa pergunta, buscava uma informação importante para planejar o tratamento de Maria, então com 16 anos, naquele dia usando um vestido florido. Berenice já tinha reparado que Maria olhava constantemente para o chão para que o cabelo comprido encobrisse os pelos de barba do rosto. Os níveis do principal hormônio masculino, a testosterona, eram normais para um homem. Os genitais eram ao mesmo tempo masculinos e femininos, com predomínio do aspecto masculino. Diante da médica, em uma sala do Hospital das Clínicas (HC) de São Paulo, Maria respondeu de modo evasivo, com voz grave e forte sotaque do interior de Minas Gerais:

— Ah. A senhora é que sabe.

Berenice conta que não soube o que fazer de imediato. Não poderia escolher por Maria. Como lhe parecia claro que Maria não se sentia bem como mulher, ela chamou a equipe com que trabalhava – Walter Bloise, Dorina Epps e Ivo Arnhold. Em conjunto, decidiram fazer o que não estava nos manuais de atendimento a pessoas com distúrbios do desenvolvimento sexual. Sugeriram que Maria morasse em São Paulo por um ano e vivesse como homem para ver com qual sexo se adaptava melhor à vida em sociedade.

Maria vestiu roupas masculinas pela primeira vez, ganhou outro nome – digamos, João –, saiu do hospital com o cabelo cortado e trabalhou em um emprego que a assistente social lhe arrumou. Maria gostou de ser João. No HC, desde aquela época uma referência nacional nessa área, Maria passou por uma cirurgia que corrigiu a ambiguidade dos genitais, tornando-os masculinos. Quando Maria nasceu, a parteira havia comentado que bebês como aquele morriam logo, mas João tem hoje 50 anos e, de acordo com as notícias mais recentes, vive bem no interior de Minas Gerais.

João sempre foi homem, do ponto de vista genético. Suas células contêm um cromossomo X e um Y, como todo homem – as mulheres têm dois cromossomos X –, além de 23 pares de cromossomos não ligados ao sexo. Por causa de uma falha em um gene em cromossomo não sexual, porém, seu organismo produz uma quantidade muito baixa da enzima 5-alfa-redutase tipo 2. Em consequência, seus genitais masculinos não tinham se formado por completo e se apresentavam com um aspecto feminino, o que fez com que fosse registrado como mulher.

Seu problema – hoje controlado, embora as células continuem com essa deficiência – expressa um dos 23 tipos de distúrbios de desenvolvimento sexual (DDS) cujas possíveis origens, evolução, sinais e tratamentos Berenice, Arnhold, Elaine Maria Frade Costa e Sorahia Domenice apresentaram no final de 2009 em um artigo publicado na revista Clinical Endocrinology. Reunindo os 30 anos de experiência do próprio grupo ao de outros do Brasil e de outros países, esse trabalho mostra como os defeitos genéticos podem gerar desvios metabólicos que ampliam ou reduzem a produção dos hormônios masculinos e induzem à formação de órgãos sexuais masculinos e femininos, parciais ou completos, em um mesmo indivíduo.

Os relatos que acompanham os diagnósticos normalmente chegam carregados de angústia de pais que nunca souberam dizer com certeza se o bebê que viram nascer era menino ou menina. Berenice lembra que saber o sexo de um recém-nascido é importante não só para responder a uma das primeiras perguntas que os pais ouvem depois que nasce o filho ou filha. É uma informação essencial para decidir que nome dar ao bebê e como tratar a criança, já que muitos adjetivos e substantivos da língua portuguesa têm gênero (masculino ou feminino), tudo isso contribuindo para definir a identidade psicológica das crianças.

Segundo ela, histórias de rejeição normalmente acompanham as crianças com ambiguidade sexual, antes pejorativamente chamadas de hermafroditas ou de pseudo-hermafroditas. O fato de apresentar genitais masculinos e femininos faz muitas meninas serem registradas e viver como meninos – e muitos meninos viverem como meninas. Confundir o sexo de recém-nascidos com ambiguidade sexual é fácil, porque “os genitais geralmente não são bem examinados ao nascimento e as meninas, principalmente as prematuras, muitas vezes apresentam um clitóris aparentemente hipertrofiado”, diz ela.

Genes situados nos cromossomos sexuais (X e Y) ou em qualquer outro dos 23 pares de cromossomos de uma célula humana normal podem apresentar defeitos – ou mutações – e causar um dos 23 tipos de DDS. Tais distúrbios representam um grupo heterogêneo de problemas, alertam Martine Cools, da Universidade de Gent, Bélgica, e três pesquisadores da Holanda em um estudo de maio de 2009 na revista World Journal of Pediatrics. Os mesmos defeitos genéticos podem levar a sinais e sintomas diferentes e, por outro lado, um quadro clínico similar pode resultar de genes diferentes. Em apenas um gene, o SRY, que atua apenas nos primeiros dias de vida intrauterina, podem ocorrer 53 alterações que prejudicam o desenvolvimento sexual. Outras mutações podem reduzir ou ampliar a produção dos hormônios esteroides sexuais, dos quais o mais importante é a testosterona, ou de compostos como o colesterol, um precursor desses hormônios.

Em um estudo de 2004, o grupo da USP apresentou 14 mutações em oito genes que impedem a produção de hormônios ligados ao desenvolvimento sexual. A médica Ana Claudia Latronico, â frente desse trabalho, associou cada mutação às respectivas manifestações externas, com base na avaliação de quase 400 crianças, adolescentes e adultos de todo o país e de países vizinhos atendidos na USP.

Sob a coordenação de Tânia Bachega e Guiomar Madureira, a equipe identificou 18 mutações – pelo menos quatro específicas da população brasileira – que podem levar à forma mais comum de distúrbio de desenvolvimento sexual, a hiperplasia adrenal congênita virilizante, caracterizada pelo desenvolvimento excessivo do clitóris, a ponto de assemelhar-se a um pênis.

Esse distúrbio do desenvolvimento sexual resulta de mutações no gene CYP21A2, localizado no cromossomo 21 (não sexual), que reduzem a produção da enzima 21-hidroxilase. Em consequência, as glândulas suprarrenais produzirão menos do que deveriam de um hormônio, o cortisol, e mais de outro, a testosterona. As meninas sofrem uma virilização dos genitais ao longo da vida uterina – nascem com o clitóris hipertrofiado e uma bolsa escrotal sem testículos recobrindo a vagina – e podem ser registradas como meninos quando a alteração não é identificada logo ao nascimento. Por causa de alterações nesse mesmo gene, os meninos podem apresentar uma forma de hiperplasia que não traz ambiguidade sexual, mas pode implicar uma perda intensa de sal, a ponto de causar lesões cerebrais ou morte por desidratação, caso não sejam tratados a tempo.

Uma em cada 15 mil pessoas tem ou deveria ter essa forma de hiperplasia, de acordo com estudos feitos na Europa ou na América do Norte. Os levantamentos no Brasil são raros. “A geneticista Elizabeth Silveira, co-orientada pela Tânia Bachega, examinou amostras de sangue de recém-nascidos coletadas no estado de Goiás, que faz rotineiramente o teste do pezinho para detectar a deficiência da 21-hidroxilase, e concluiu que a incidência de hiperplasia no Brasil por ano é de um caso para cada 10 mil nascidos vivos”, diz Berenice. Pelo menos 840 casos, portanto, deveriam ter sido diagnosticados nas universidades paulistas e de outros estados. O HC da USP, que deve ter acolhido o maior número de casos, só registrou 380.

“Os pais tendem a esconder ou a negar os distúrbios do desenvolvimento sexual dos filhos, porque reconhecer pode ser emocionalmente doloroso, e a maioria dos portadores de distúrbios de desenvolvimento sexuais só chega aqui quando já são adolescentes ou adultos”, diz Berenice. Em uma situação extrema, há menos de um ano ela atendeu uma mulher de 70 anos que apresentava ambiguidade sexual e só resolveu expor seu problema depois de a mãe, que não a deixava falar, ter morrido.

“Quanto mais cedo possível se fizer o diagnóstico e desfizer a ambiguidade sexual, melhor, de preferência antes dos 2 anos de idade, quando as crianças ainda não estabeleceram as noções de sexo e gênero”, diz a psicóloga Marlene Inácio, que acompanha as pessoas com ambiguidade sexual no HC há 28 anos. No início, ela conta, o diagnóstico que embasava o tratamento podia demorar de seis meses a um ano. “Hoje os resultados dos testes laboratoriais saem em uma semana”, diz.

Em sua tese de doutorado, Marlene reuniu os relatos de 151 pessoas com ambiguidade sexual atendidas no HC, das quais 96 são geneticamente homens (XY) e 55 geneticamente mulheres (XX), com idade entre 18 e 53 anos. Seu propósito, por meio de um questionário com 121 perguntas, era verificar como essas pessoas viveram durante a infância, adolescência e vida adulta, antes e depois de terem sido diagnosticadas e tratadas, e se conseguiram se adaptar do ponto de vista psíquico, social e sexual com o sexo que adotaram.

Marlene conclui que, de modo geral, estão bem. Muitas se casaram ou pretendem se casar. Os homens com ambiguidade sexual são estéreis, por causa da baixa fertilidade do líquido seminal ou por consequências da cirurgia corretiva, mas dois tiveram filhos, por meio de fertilização in vitro com seu próprio sêmen. De um grupo de 20 mulheres com uma das formas do distúrbio do desenvolvimento sexual 46,XY, 18 mudaram de sexo e hoje são homens.

É o caso de outra Maria, que veio do interior da Bahia há cerca de três anos. Tinha voz grossa de homem, ombros largos e braços fortes de tanto trabalhar na lavoura. Vivera até os 16 anos isolada em um quarto nos fundos da casa, com pouco contato com a família, e não sabia ler nem escrever. “Psicologicamente, era um homem, e preferiu ser homem porque precisava da força para se opor aos pais que a tinham feito viver como mulher”, conta Marlene. “Ela tinha clitóris grande, que, segundo ela, lhe dava prazer sexual, e queria ser mecânico.”

Em outro levantamento, Maria Helena Palma Sircili, uma das médicas do grupo, verificou que 90% das 65 pessoas com cariótipo 46,XY (geneticamente homens, mas socialmente mulheres) operadas de 1964 a 2008 no serviço de urologia do HC da USP estavam satisfeitas com o sexo que haviam adotado e haviam se ajustado à mudança; 69% das que optaram pelo sexo masculino e 29% das que preferiram o feminino estavam casadas. Esse estudo, a ser publicado no Journal of Urology, trouxe uma constatação que surpreendeu a própria equipe: a qualidade da atividade sexual não depende do tamanho do pênis.

Os homens que apresentavam ambiguidade sexual podem não ter os genitais tão desenvolvidos quanto os de outros homens – e não reclamaram. “Foi uma surpresa, porque os urologistas dizem que frequentemente os homens, mesmo sem distúrbios sexuais biológicos, reclamam do tamanho peniano”, diz Berenice. Marlene atribuiu esse resultado a uma satisfação maior com a identidade masculina do que simplesmente com as dimensões do pênis: “Nosso trabalho de aconselhamento psicológico propõe a exploração de outras possibilidades de satisfação sexual, erotizando o corpo todo, e não apenas os genitais”.

Esses resultados animam Berenice e sua equipe a entrar em novas situações. Uma delas foi planejada e está em andamento, sob a coordenação de Elaine: as pesquisas com um pequeno peixe de água doce, o paulistinha, também conhecido como zebrafish ou Danio rerio, com o qual pretendem examinar o surgimento de distúrbios sexuais do desenvolvimento. Outra situação foi inesperada: em um congresso realizado no ano passado nos Estados Unidos, Berenice recebeu o convite para participar de uma equipe de cinco assessores do Comitê Olímpico Internacional. Tinham de ajudar a resolver um problema difícil: uma corredora com ambiguidade sexual pode correr entre mulheres? A conclusão a que chegaram é que sim, “se essa corredora estiver sob tratamento, com níveis de testosterona normal para as mulheres”, diz Berenice. Outra proposta dos médicos para o Comitê Olímpico: “Não podemos impedir quem tem genitália ambígua de participar de qualquer modalidade esportiva”.

Esses estudos expressam um estilo de trabalho que valoriza a escolha dos pais de crianças com ambiguidade sexual ou dos próprios adultos com esses distúrbios. Dar voz aos pais implica o reconhecimento de expectativas frustradas com filhos que morreram ao nascer ou com meninas que chegaram no lugar imaginado para meninos. “Antes de o filho nascer, a mãe imagina o que o bebê vai ser; ele existe primeiro em sua mente”, diz a psicanalista Norma Lottenberg Semer, professora da Universidade Federal de São Paulo e membro associado da Sociedade Brasileira de Psicanálise de São Paulo. “O que os filhos serão, em termos sexuais e psíquicos, em parte reflete as fantasias, os sentimentos e os pensamentos dos pais.”

“As condutas de tratamento são estabelecidas em consenso entre os pais e a equipe multidisciplinar”, diz Berenice. Do diagnóstico, segundo ela, participam endocrinologistas, cirurgiões, clínicos, biólogos, psicólogos, psiquiatras e assistentes sociais. “Quando não há consenso entre a orientação médica e o desejo dos pais, o desejo dos pais deve ser respeitado.”

Uma vez sua equipe tratou de uma menina recém-nascida, hoje com 11 anos, que apresentava hiperplasia adrenal congênita, com um clitóris semelhante a um pênis, e tinha sido registrada como menino. Segundo Marlene, os pais escolheram que ela seria homem e não aceitaram a orientação de mudança para o sexo social feminino porque já tinham duas filhas e desejavam um filho. A escolha resultou também de outra razão. “A mãe achava que ser mulher era sinônimo de sofrimento e convivia com a culpa, como o marido dizia, de ter tido uma criança anormal”, conta Marlene. Na cirurgia, os médicos removeram ovários e útero dessa Maria, que terá de tomar hormônio masculino por toda a vida adulta, já que seu organismo não o produz.

Quando são adultos, eles próprios escolhem que sexo querem manter. Foi assim que outra Maria com deficiência da enzima 5-alfa-redutase-2 apareceu lá com um lenço colorido cobrindo o cabelo curto, camisa masculina abotoada até o pescoço e sutiã com enchimento. Maria tinha se apaixonado por outra funcionária da casa em que trabalhava como empregada doméstica. No hospital, Maria vestiu-se como homem e gostou. Também adotou outro nome, Moacir. “Vimos essa transformação imediata, foi linda”, conta Marlene. “O sexo social de Moacir era feminino, mas o psíquico era masculino.” Segundo Marlene, Moacir está casado e feliz.

O diagnóstico para definição do sexo ou da ambiguidade sexual inclui sete itens. Alguns são biológicos, como os níveis de hormônios e as estruturas genitais externas e internas. Outros são subjetivos, como o sexo social – pelo qual um indivíduo é reconhecido por outras pessoas – e a identidade de gênero – se essa mesma pessoa se assume psiquicamente como homem ou como mulher. “A identidade de gênero é ser e ao mesmo tempo sentir-se homem ou mulher”, diz Marlene. Uma pessoa que apenas se sente homem ou mulher, sem nenhum distúrbio biológico nem a identidade sexual correspondente, pode apresentar transtorno psíquico de identidade de gênero.

Em uma dessas vertentes, o transexualismo, uma pessoa biologicamente normal tem a convicção de pertencer a outro sexo, sem aceitar seu próprio sexo. “O transexualismo não está associado a questões genéticas”, diz Norma. “É mais um problema de identidade do que de sexualidade.” São os homens que dizem que são mulheres em corpo de homem. O mais famoso transexual brasileiro, Roberta Close, depois de muitas cirurgias para tornar-se mulher, obteve em 2005 o direito de fazer outra certidão de nascimento, mudando o nome de Luís Roberto Gambine Moreira para Roberta Gambine Moreira e o gênero, de masculino para feminino.

O homossexualismo constitui outro universo distante dos distúrbios biológicos. Nesse caso, a identidade de gênero se mantém: são homens ou mulheres que se aceitam como homens ou mulheres e escolhem outros homens ou mulheres como objetos amorosos. Já nos travestis a identidade de sexo é estável, mas a de gênero é flutuante: os travestis sabem que são homens, mas podem às vezes se comportar como mulheres.

No hospital da USP, só depois do diagnóstico e da escolha do sexo a ser adotado é que a ambiguidade sexual pode ser desfeita, por meio de uma cirurgia de correção da genitália externa masculina ou feminina, seguida de reposição hormonal. “Não queremos apenas tratar e resolver, mas entender as causas de um problema, examinando os dados e a história pessoal de cada paciente, elaborando uma hipótese e, a partir daí, pedindo os exames”, diz Berenice. “Não adianta pedir exames e mais exames sem uma hipótese a ser investigada. Só investigamos os possíveis genes envolvidos em um problema depois de termos em mãos o diagnóstico hormonal. Se não, é caro e inútil.” Ela diz que não quer formar apenas médicos, mas investigadores médicos.

Foi o que se passou com ela. Berenice chegou ao Hospital do Servidor Público Estadual em 1972 para cursar o sexto ano do curso de medicina que havia feito até então na Universidade Federal do Triângulo Mineiro, em Uberaba, Minas Gerais. Voltou um ano depois para fazer residência médica no Hospital das Clínicas da USP e conheceu Walter Bloise, que na época cuidava dos então chamados casos de intersexo.

“Aprendi muito mais do que medicina com o doutor Bloise”, lembra ela. “Aprendi que temos de tratar esses problemas com simplicidade e com tranquilidade, como se fosse uma doença cardíaca ou um lábio leporino.”

Nessa época os testes de dosagem de hormônios eram feitos por meio das clínicas dos próprios médicos, quando possível, já que não havia um laboratório de endocrinologia no hospital. Um dia Antonio Barros de Ulhoa Cintra, o chefe anterior da endocrinologia que havia sido reitor da USP e presidente da FAPESP, cobrou-lhe a dosagem hormonal de um paciente. Ela respondeu:

— Como o senhor sabe, não dosamos hormônios aqui no hospital.

— Na minha época, eu andava com um tubo com sangue de paciente no bolso para dosar cálcio.

— Hoje só de hormônios são 30. Precisamos de um laboratório, doutor Cintra.

Emílio Matar, outro professor, soube da conversa e decidiu pela compra dos equipamentos de dosagem de hormônios. Bloise a incentivou: “Por que você não faz um laboratório?”. Ela fez, em colaboração com o professor Wilian Nicolau. Hoje os 80 funcionários e pesquisadores de sua equipe cuidam da dosagem de 60 hormônios para todo o hospital. Agora ela pretende ampliar a discussão on-line de casos suspeitos de DDS com outros médicos, especialmente pediatras, de todo o país, por internet, para que as pessoas com distúrbios de desenvolvimento sejam logo identificadas e tratadas.

Outra batalha à frente – dela e de toda a equipe – é a implementação do diagnóstico em recém-nascidos das alterações 21-hidroxilase, a enzima que causa a hiperplasia adrenal congênita virilizante no estado de São Paulo. “É um teste que custa apenas R$ 5 e pode evitar erros de diagnóstico do sexo ao nascimento e a mortalidade, que afeta principalmente os meninos, que nascem com os genitais masculinos normais e não são identificados.”

Artigo científico

Mendonça, B.B.; Domenice, S.; Arnhold, I.J.; Costa, E.M. 46,XY disorders of sex development (DSD). Clinical Endocrinology. 2009, 70(2):173-87.

>Metáfora religiosa ajuda a entender a ciência? Bóson de Higgs

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Em busca da “Partícula de Deus”

Redação do Site Inovação Tecnológica – 02/04/2007

Atlas era um dos titãs da mitologia grega, condenado para sempre a sustentar os céus sobre os ombros. Aqui, Atlas é um dos quatro gigantescos detectores que farão parte do maior acelerador de partículas do mundo, o LHC, que está em fase adiantada de testes e deverá entrar em operação nos próximos meses.

LHC é uma sigla para “Large Hadron Collider”, ou gigantesco colisor de prótons. Parece difícil exagerar as grandezas desse laboratório que está sendo construído a 100 metros de profundidade, na fronteira entre a França e a Suíça. A estrutura completa tem a forma de um anel, construída ao longo de um túnel com 27 quilômetros de circunferência.

As partículas são aceleradas por campos magnéticos ao longo dessa órbita de 27 Km, até atingir altíssimos níveis de energia. Mais especificamente, 7 trilhões de volts. Em quatro pontos do anel, sob temperaturas apenas levemente superiores ao zero absoluto, as partículas se chocam, produzindo uma chuva de outras partículas, recriando um ambiente muito parecido com as condições existentes instantes depois do Big Bang.

Nesses quatro pontos estão localizados quatro detectores. O Atlas, mostrado na foto nas suas etapas finais de montagem, é um deles. O Atlas, assim como o segundo detector, o CMS (“Compact Muon Detector”), é um detector genérico, capaz de detectar qualquer tipo de partícula, inclusive partículas ainda desconhecidas ou não previstas pela teoria. Já o LHCb e o ALICE são detectores “dedicados”, construídos para o estudo de fenômenos físicos específicos.

Bóson de Higgs

Quando os prótons se chocam no centro dos detectores as partículas geradas espalham-se em todas as direções. Para capturá-las, o Atlas e o CMS possuem inúmeras camadas de sensores superpostas, que deverão verificar as propriedades dessas partículas, medir suas energias e descobrir a rota que elas seguem.

O maior interesse dos cientistas é descobrir o Bóson de Higgs, a única peça que falta para montar o quebra-cabeças que explicaria a “materialidade” do nosso universo. Por muito tempo se acreditou que os átomos fossem a unidade indivisível da matéria. Depois, os cientistas descobriram que o próprio átomo era resultado da interação de partículas ainda mais fundamentais. E eles foram descobrindo essas partículas uma a uma. Entre quarks e léptons, férmions e bósons, são 16 partículas fundamentais: 12 partículas de matéria e 4 partículas portadoras de força.

A Partícula de Deus

O problema é que, quando consideradas individualmente, nenhuma dessas partículas tem massa. Ou seja, depois de todos os avanços científicos, ainda não sabemos o que dá “materialidade” ao nosso mundo. O Modelo Padrão, a teoria básica da Física que explica a interação de todas as partículas subatômicas, coloca todas as fichas no Bóson de Higgs, a partícula fundamental que explicaria como a massa se expressa nesse mar de energias. É por isso que os cientistas a chamam de “Partícula de Deus”.

O Modelo Padrão tem um enorme poder explicativo. Toda a nossa ciência e a nossa tecnologia foram criadas a partir dele. Mas os cientistas sabem de suas deficiências. Essa teoria cobre apenas o que chamamos de “matéria ordinária”, essa matéria da qual somos feitos e que pode ser detectada por nossos sentidos.

Mas, se essa teoria não explica porque temos massa, fica claro que o Modelo Padrão consegue dar boas respostas sobre como “a coisa funciona”, mas ainda se cala quando a pergunta é “o que é a coisa”. O Modelo Padrão também não explica a gravidade. E não pretende dar conta dos restantes 95% do nosso universo, presumivelmente preenchidos por outras duas “coisas” que não sabemos o que são: a energia escura e a matéria escura.

É por isso que se coloca tanta fé na Partícula de Deus. Ela poderia explicar a massa de todas as demais partículas. O próprio Bóson de Higgs seria algo como um campo de energia uniforme. Ao contrário da gravidade, que é mais forte onde há mais massa, esse campo energético de Higgs seria constante. Desta forma, ele poderia ser a fonte não apenas da massa da matéria ordinária, mas a fonte da própria energia escura.

Em dois ou três anos saberemos se a teoria está correta ou não. Ou, talvez, nos depararemos com um mundo todo novo, que exigirá novas teorias, novos equipamentos e novas descobertas.

>O maior túmulo do samba (isto é, as ciências cognitivas), levado ao absurdo

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Next Big Thing in English: Knowing They Know That You Know

By PATRICIA COHEN
The New York Times, March 31, 2010

To illustrate what a growing number of literary scholars consider the most exciting area of new research, Lisa Zunshine, a professor of English at the University of Kentucky, refers to an episode from the TV series “Friends.”

(Follow closely now; this is about the science of English.) Phoebe and Rachel plot to play a joke on Monica and Chandler after they learn the two are secretly dating. The couple discover the prank and try to turn the tables, but Phoebe realizes this turnabout and once again tries to outwit them.

As Phoebe tells Rachel, “They don’t know that we know they know we know.”

This layered process of figuring out what someone else is thinking — of mind reading — is both a common literary device and an essential survival skill. Why human beings are equipped with this capacity and what particular brain functions enable them to do it are questions that have occupied primarily cognitive psychologists.

Now English professors and graduate students are asking them too. They say they’re convinced science not only offers unexpected insights into individual texts, but that it may help to answer fundamental questions about literature’s very existence: Why do we read fiction? Why do we care so passionately about nonexistent characters? What underlying mental processes are activated when we read?

Ms. Zunshine, whose specialty is 18th-century British literature, became familiar with the work of evolutionary psychologists while she was a graduate student at the University of California, Santa Barbara in the 1990s. “I thought this could be the most exciting thing I could ever learn,” she said.

At a time when university literature departments are confronting painful budget cuts, a moribund job market and pointed scrutiny about the purpose and value of an education in the humanities, the cross-pollination of English and psychology is a providing a revitalizing lift.

Jonathan Gottschall, who has written extensively about using evolutionary theory to explain fiction, said “it’s a new moment of hope” in an era when everyone is talking about “the death of the humanities.” To Mr. Gottschall a scientific approach can rescue literature departments from the malaise that has embraced them over the last decade and a half. Zealous enthusiasm for the politically charged and frequently arcane theories that energized departments in the 1970s, ’80s and early ’90s — Marxism, structuralism, psychoanalysis — has faded. Since then a new generation of scholars have been casting about for The Next Big Thing.

The brain may be it. Getting to the root of people’s fascination with fiction and fantasy, Mr. Gottschall said, is like “mapping wonderland.”

Literature, like other fields including history and political science, has looked to the technology of brain imaging and the principles of evolution to provide empirical evidence for unprovable theories.

Interest has bloomed during the last decade. Elaine Scarry, a professor of English at Harvard, has since 2000 hosted a seminar on cognitive theory and the arts. Over the years participants have explored, for example, how the visual cortex works in order to explain why Impressionist paintings give the appearance of shimmering. In a few weeks Stephen Kosslyn, a psychologist at Harvard, will give a talk about mental imagery and memory, both of which are invoked while reading.

Ms. Zunshine said that in 1999 she and about 10 others won approval from the Modern Language Association to form a discussion group on cognitive approaches to literature. Last year their members numbered more than 1,200. Unlike Mr. Gottschall, however, Ms. Zunshine sees cognitive approaches as building on other literary theories rather than replacing them.

Ms. Zunshine is particularly interested in what cognitive scientists call the theory of mind, which involves one person’s ability to interpret another person’s mental state and to pinpoint the source of a particular piece of information in order to assess its validity.

Jane Austen’s novels are frequently constructed around mistaken interpretations. In “Emma” the eponymous heroine assumes Mr. Elton’s attentions signal a romantic interest in her friend Harriet, though he is actually intent on marrying Emma. She similarly misinterprets the behavior of Frank Churchill and Mr. Knightly, and misses the true objects of their affections.

Humans can comfortably keep track of three different mental states at a time, Ms. Zunshine said. For example, the proposition “Peter said that Paul believed that Mary liked chocolate” is not too hard to follow. Add a fourth level, though, and it’s suddenly more difficult. And experiments have shown that at the fifth level understanding drops off by 60 percent, Ms. Zunshine said. Modernist authors like Virginia Woolf are especially challenging because she asks readers to keep up with six different mental states, or what the scholars call levels of intentionality.

Perhaps the human facility with three levels is related to the intrigues of sexual mating, Ms. Zunshine suggested. Do I think he is attracted to her or me? Whatever the root cause, Ms. Zunshine argues, people find the interaction of three minds compelling. “If I have some ideological agenda,” she said, “I would try to construct a narrative that involved a triangularization of minds, because that is something we find particularly satisfying.”

Ms. Zunshine is part of a research team composed of literary scholars and cognitive psychologists who are using snapshots of the brain at work to explore the mechanics of reading. The project, funded by the Teagle Foundation and hosted by the Haskins Laboratory in New Haven, is aimed at improving college-level reading skills.

“We begin by assuming that there is a difference between the kind of reading that people do when they read Marcel Proust or Henry James and a newspaper, that there is a value added cognitively when we read complex literary texts,” said Michael Holquist, professor emeritus of comparative literature at Yale, who is leading the project.

The team spent nearly a year figuring how one might test for complexity. What they came up with was mind reading — or how well an individual is able to track multiple sources. The pilot study, which he hopes will start later this spring, will involve 12 subjects. “Each will be put into the magnet” — an M.R.I. machine — “and given a set of texts of graduated complexity depending on the difficulty of source monitoring and we’ll watch what happens in the brain,” Mr. Holquist explained.

At the other end of the country Blakey Vermeule, an associate professor of English at Stanford, is examining theory of mind from a different perspective. She starts from the assumption that evolution had a hand in our love of fiction, and then goes on to examine the narrative technique known as “free indirect style,” which mingles the character’s voice with the narrator’s. Indirect style enables readers to inhabit two or even three mind-sets at a time.

This style, which became the hallmark of the novel beginning in the 19th century with Jane Austen, evolved because it satisfies our “intense interest in other people’s secret thoughts and motivations,” Ms. Vermeule said.

The road between the two cultures — science and literature — can go both ways. “Fiction provides a new perspective on what happens in evolution,” said William Flesch, a professor of English at Brandeis University.

To Mr. Flesch fictional accounts help explain how altruism evolved despite our selfish genes. Fictional heroes are what he calls “altruistic punishers,” people who right wrongs even if they personally have nothing to gain. “To give us an incentive to monitor and ensure cooperation, nature endows us with a pleasing sense of outrage” at cheaters, and delight when they are punished, Mr. Flesch argues. We enjoy fiction because it is teeming with altruistic punishers: Odysseus, Don Quixote, Hamlet, Hercule Poirot.

“It’s not that evolution gives us insight into fiction,” Mr. Flesch said, “but that fiction gives us insight into evolution.”

>Geoengenharia

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Especiais
Caminhos para o clima

31/3/2010

Por Fábio de Castro

Agência FAPESP – Cientistas brasileiros e britânicos discutiram nesta terça-feira (30/3), por meio de videoconferência, possibilidades de cooperação entre instituições dos dois países para desenvolvimento de estudos e programas de pesquisa conjuntos na área de geoengenharia, que inclui diversos métodos de intervenção de larga escala no sistema climático do planeta, com a finalidade de moderar o aquecimento global.

O “Café Scientifique: Encontro Brasileiro-Britânico sobre Geoengenharia”, promovido pelo British Council, Royal Society e FAPESP, foi realizado nas sedes do British Council em São Paulo e em Londres, na Inglaterra.

O ponto de partida para a discussão foi o relatório Geoengenharia para o clima: Ciência, governança e incerteza, apresentado pelo professor John Shepherd, da Royal Society. Em seguida, Luiz Gylvan Meira Filho, pesquisador do Instituto de Estudos Avançados da Universidade de São Paulo (USP), apresentou um breve panorama da geoengenharia no Brasil.

A FAPESP foi representada pelo coordenador executivo do Programa FAPESP de Pesquisa sobre Mudanças Climáticas Globais, Carlos Afonso Nobre, pesquisador do Centro de Previsão de Tempo e Estudos Climáticos (CPTEC) do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe).

De acordo com Nobre, a reunião serviu para um contato inicial entre os cientistas dos dois países. “A reunião teve um caráter exploratório, já que o próprio conceito de geoengenharia ainda não foi definido com precisão. O objetivo principal era avaliar o interesse das duas partes em iniciar alguma pesquisa conjunta nessa área e expor potenciais contribuições que cada um pode dar nesse sentido”, disse Nobre à Agência FAPESP.

Segundo Nobre, a geoengenharia é um conjunto de possibilidades de intervenção dividido em dois métodos bastante distintos: o manejo de radiação solar e a remoção de dióxido de carbono. Durante a reunião, os brasileiros deixaram claro que têm interesse apenas na segunda vertente.

O manejo de radiação solar, de acordo com o relatório britânico, inclui técnicas capazes de refletir a luz do Sol a fim de diminuir o aquecimento global, como a instalação de espelhos no espaço, o uso de aerossóis estratosféricos – com aplicação de sulfatos, por exemplo –, reforço do albedo das nuvens e incremento do albedo da superfície terrestre, com instalação de telhados brancos nas edificações.

A remoção de dióxido de carbono, por outro lado, inclui metodologias de captura do carbono da atmosfera – ou “árvores artificiais” –, geração de carbono por pirólise de biomassa, sequestro de carbono por meio de bioenergia, fertilização do oceano e armazenamento de carbono no solo ou nos oceanos.

A principal diferença entre as duas vertentes é que os métodos de manejo de radiação solar funcionam com mais rapidez, em prazos de um ou dois anos, enquanto os métodos de remoção de gás carbônico levam várias décadas para surtirem efeito.

Sem plano B

O relatório avaliou todas as técnicas segundo eficácia, prazo de funcionamento, segurança e custo. Seria preciso ainda estudar os impactos sociais, politicos e éticos, de acordo com os cientistas britânicos.

Nobre aponta que o Brasil teria interesse em contribuir com estudos relacionados à vertente da remoção de dióxido de carbono, que seria coerente com o estágio avançado das pesquisas já realizadas no país em áreas como bioenergia e métodos de captura de carbono.

“Sou muito cético em relação ao manejo de energia de radiação solar. A implementação dessas técnicas é rápida, mas, quando esses dispositivos forem desativados – o que ocorrerá inevitavelmente, já que não é sustentável mantê-los por vários milênios –, a situação do clima voltará rapidamente ao cenário anterior. Seria preciso, necessariamente, reduzir rapidamente a causa das mudanças climáticas, que são as emissões de gases de efeito estufa”, disse Nobre.

De acordo com ele, as técnicas de manejo de energia solar são vistas, em geral, como um “plano B”, em caso de iminência de um desastre climático de grandes consequências. Ou seja, seriam acionadas emergencialmente quando os sistemas climáticos estivessem atingindo pontos de saturação que provocariam mudanças irreversíveis – os chamados tipping points.

“Mas o problema é que vários tipping points foram atingidos e já não há mais plano B. O derretimento do gelo do Ártico, por exemplo, de acordo com 80% dos glaciologistas, atingiu o ponto de saturação. Em algumas décadas, no verão, ali não haverá mais gelo. Não podemos criar a ilusão de que é possível acionar um plano B. Não há sistemas de governança capazes de definir o momento de lançar essas alternativas”, disse.

A vertente da remoção do dióxido de carbono, por outro lado, deverá ser amplamente estudada, de acordo com Nobre. “Essa vertente segue a linha lógica do restabelecimento da qualidade atmosférica. O princípio é fazer a concentração dos gases voltar a um estado de equilíbrio no qual o planeta se manteve por pelo menos 1 ou 2 milhões de anos.”

Ainda assim, essas soluções de engenharia climáticas devem ser encaradas com cuidado. “A natureza é muito complexa e as soluções de engenharia não são fáceis, especialmente em escala global. Acho que vale a pena estudar as várias técnicas de remoção de gás carbônico e definir quais delas têm potencial – mas sempre lembrando que são processos lentos que vão levar décadas ou séculos. Nada elimina a necessidade de reduzir emissões”, disse Nobre.