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>U.S. Scientists Urge Action on Climate Change

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On March 11, 2000 U.S. scientists and economists signed on to a statement imploring the Senate to move swiftly and comprehensively on the issue of climate change. The signatories are all experts in relevant fields of study on climate change. The statement is the first time leading U.S. scientists and economists have come together to issue a joint message of concern on climate change. The list of signatories included eight Nobel laureates, 32 members of the National Academy of Sciences, 10 members from the National Academy of Engineering, and more than 100 members of the Intergovernmental Panel on Climate Change, who shared a 2007 Nobel Peace Prize.

“If anything, the climate problem is actually worse than reported earlier,” wrote Leon Lederman, Director Emeritus of the Fermi National Accelerator Laboratory in Batavia, Illinois, and a Nobel Prize-winning physicist, in an individual statement in the letter to the Senate. “Physicists tend to be super critical of strong conclusions, but the data on global warming now indicate the conclusions are not nearly strong enough.”

Read the statement here.

>Iphan faz levantamento para localizar fotógrafos conhecidos como lambe-lambes (O Globo)

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O Globo – 13 de março de 2010

Foto: Osvaldo de Andrade Neves fotografa uma cliente na Praça da Matriz, em São João de Meriti/Foto de Ana Branco (Agência O Globo)

RIO – Com a chegada das máquinas instantâneas de retrato e após a explosão da fotografia digital, os lambe-lambes foram, pouco a pouco, deixando seus pontos. Para preservar a memória dos últimos representantes da categoria, o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan-RJ) iniciou um levantamento desses cronistas visuais que ainda existem no estado.Testemunhas privilegiadas das transformações pelas quais o Rio passou desde o início do século XIX, os lambe-lambes estão praticamente em extinção. Até agora, foram localizados cinco fotógrafos de jardim (como a profissão era chamada em seu auge). Entre eles, há desde os que já não trabalham mais no ofício aos que ainda sobrevivem da fotografia.

– O que estamos buscando é registrar este tipo de atividade e salvaguardar a memória – explica o superintendente do Iphan no estado, Carlos Fernando Andrade, à repórter Jacqueline Costa.

O levantamento – que está sendo realizado pelo antropólogo João Carlos de Oliveira, com a ajuda da estudante de história Anne Lima – inclui entrevistas e depoimentos gravados em vídeo. O material reunido tem a chance de ser transformado em um livro ou um DVD.

Dos oito lambe-lambes que trabalhavam no Jardim do Méier, só restou um. Aos 83 anos, o português Bernardo Soares Lobo ainda marca ponto por lá, às segundas, terças e quartas. Da velha câmera, não saem mais imagens. Seu Lobo se rendeu à fotografia digital e hoje usa o antigo equipamento de trabalho apenas como um chamariz. Com orgulho, lembra de já ter fotografado Tenório Cavalcanti, político que ficou conhecido como o Homem da Capa Preta, e Dercy Gonçalves. E diz que não consegue abandonar o jardim onde está há 54 anos.

Outro que ainda não abandonou o batente e que também usa máquina digital é Osvaldo de Andrade Neves, de 66 anos. Há quatro décadas, diariamente, ele monta sua máquina na Praça da Matriz, em São João de Meriti. Ele admite que o movimento caiu com o passar dos anos, mas diz que ainda tira da fotografia o sustento da família.

Já Inácio Teodósio da Silva armou o tripé de sua máquina na Praça General Osório, em Ipanema, durante quase 30 anos. Mas, hoje, guarda com zelo o equipamento que fotografou de ilustres anônimos a personalidades cariocas. Seis de seus irmãos trabalharam na mesma profissão, em diversos pontos do Rio. Jorge Teodósio da Silva, irmão de Inácio, e Francisco Victor Cavalcanti foram os outros lambe-lambes encontrados pelo pesquisador do Iphan.

Ver artigo original e vídeo.

>Coronelismo eletrônico: políticos aceleram concessão de rádios comunitárias (OESP)

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Políticos aceleram concessão de rádios comunitárias

15/03/2010 – 09:22
Agência Estado

Legalizadas há 12 anos, as rádios comunitárias são cada vez mais usadas como instrumentos de política eleitoral, num processo que vem sendo chamado de novo coronelismo eletrônico. Ligadas a entidades que quase sempre têm um político municipalista por trás – um prefeito ou um vereador -, as rádios comunitárias são concedidas depois que os políticos federais desempenham o papel de despachantes de luxo no Ministério das Comunicações.

Alegando que precisam agir para vencer a intrincada burocracia de Brasília, senadores e deputados pressionam para acelerar a tramitação do processo de autorização das rádios comunitárias e ganham status de seus padrinhos políticos.

É desse jeito que passam a integrar uma teia de captura de votos. A estimativa é de que cerca de 50% das 3.911 rádios comunitárias, que hoje funcionam legalmente no País, tenham contado com as bênçãos de padrinhos políticos.

“O parlamentar intercede aqui (em Brasília) para atender o cara (prefeito ou vereador) que vota nele lá no município. Aí, essa rádio fica falando bem dele para o resto da vida”, confirma o deputado e ex-ministro das Comunicações (2004- 2005) Eunício Oliveira (PMDB-CE). “Há centenas de pedidos de políticos, mas a pressão maior ainda é de vereadores e associações. A rádio comunitária é o local da fofoca municipal. Para prefeito e vereador, ela é o cão”, atesta ele, dono de três rádios comerciais no Ceará.

Os pedidos de concessão de rádios comunitárias não têm cor partidária – mobilizam de petistas a tucanos, passando pelo DEM, pelo PTB e por outros partidos. Depois da legalização, em 1998, o boom das comunitárias ocorreu no governo do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, quando foram autorizadas em apenas três anos 1.707 emissoras – 569 a cada ano. Em pouco mais de sete anos do governo Lula, foram legalizadas 2.204 comunitárias – mais de 300 ao ano.

Apesar da baixa presença no Congresso, ao longo da semana passada a reportagem localizou facilmente dez exemplos de deputados e senadores confirmando que atuaram para ajudar na liberação de rádios comunitárias.

Tática permanece

No fim da década de 90, a praxe, segundo parlamentares, era procurar o titular das Comunicações para acelerar o processo. Isso ocorreu nos casos dos deputados José Linhares (PP-CE) e Arnon Bezerra (PTB-CE). Em 1999 eles se apressaram a procurar o então ministro Pimenta da Veiga (PSDB) para interceder a favor de duas rádios comunitárias, Sal da Terra e Juazeiro, localizadas em seus redutos eleitorais – Sobral e Juazeiro do Norte. “Pedi a concessão não só dessa, mas de várias (rádios) em todo o Estado onde temos acesso à votação”, conta Linhares.

Passada a fase inicial da legalização das rádios comunitárias, os deputados e senadores começaram a atuar como despachantes, não necessariamente recorrendo ao ministro de Estado, mas ao departamento responsável pela tramitação dos papéis. A tática permaneceu igual: o lobby é sempre direcionado aos redutos eleitorais.

>Climate change scientists losing ‘PR war’ (BBC)

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A Nobel peace prize-winning Welsh physicist says climate change scientists are losing “a PR war” against sceptics with vested interests.

BBC News, Thursday, 11 February 2010

Sir John Houghton said there were millions of internet references to a comment he never made which appears to to show him “hyping up” global warming.

A poll for BBC news suggests the number of British people who are sceptical about climate change is rising.

Sir John believes recent news stories may have contributed to scepticism.

He told BBC Wales’ Dragon’s Eye programme: “If you Google my name on the web and look for a quote, the quote you will find is one that goes like this.

“It says ‘unless we announce disasters, no-one will listen’.

“I have never said that. The origin of the quote according to some of the people who write about it… [they] say it comes from the first edition of my global warming book, published in 1994.

“It does not appear in that book in any shape or form.”

Sir John, who co-chaired the UN Intergovernmental Panel on Climate Change’s (IPCC) scientific assessment group for 14 years, received the Nobel peace prize in 2007 as part of an IPCC delegation.

He said most scientists were not very good at public relations and just wanted to get on with their work.

Asked if he believed climate change scientists were now in a “PR war” with sceptics, he said: “We are in a way and we’re losing that war because we’re not good at PR.

“Your average scientist is not a good PR person because he wants to get on with his science.

Stolen e-mails

“So we need to look, I suppose, for some good PR people to help us get our messages across in an honest and open and sensible way, without causing the sort of furore, the sort of polarisation that has occurred because of the people who are trying to deny it, and trying to deny it so vehemently that the media is taking so much notice of them.”

The number of British people who are sceptical about climate change is rising, according to a new poll.

The Populus poll of 1,001 adults found 25% did not think global warming was happening, an increase of 10% since a similar poll in November.

Stolen e-mails from the University of East Anglia led to accusations, since denied, that climate change data was being manipulated.

Last month, the IPCC had to admit it had been mistaken in claiming Himalayan glaciers could disappear by 2035.

Sir John said some reporting of these stories had given mistakes undue significance and deliberately misrepresented other information.

‘Vested interests’

He believes some sceptics are influenced by concerns other than scientific truth, comparing them to now discredited lobbyists who argued smoking did not cause cancer.

He said: “A lot of it comes from the United States, from vested interests, coal and oil interests in the United States which are very strong and which employ thousands of lobbyists in Washington to try and influence members of Congress that climate change is not happening.

“So it’s a major problem in the United States and it does spill over to this country too.”

>Memória da imprensa

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Especiais

9/2/2010

Por Alex Sander Alcântara

Agência FAPESP – Há décadas a historiografia contemporânea tem incorporado a imprensa como fonte fundamental para se compreender momentos históricos e a atuação de protagonistas. Mas a fragilidade e as limitações do papel impresso, especialmente seu acesso, representam dificuldades aos pesquisadores.

Com o objetivo de ampliar o acesso a jornais e revistas do século 19 e início do século 20 no Brasil, o Arquivo Público do Estado de São Paulo acaba de lançar o site Memória da Imprensa, uma seleção de periódicos digitalizados do acervo da instituição.

O serviço reúne por enquanto 14 títulos de jornais e revistas de época, que permitem acompanhar a trajetória da imprensa paulista e brasileira a partir da seleção de exemplares de 1854 a 1981.

De acordo com o Carlos de Almeida Prado Bacellar, coordenador do Arquivo Público, além de ampliar o acesso, outro objetivo importante do novo site é preservar os raros originais das publicações.

“Jornais e revistas antigos têm um suporte muito delicado. O papel amarela com facilidade e a consulta é muito complicada. O acesso direto aos originais ajuda a destruir ainda mais. Quanto mais conseguirmos passar para o formato digital, mais colaboraremos na preservação dos originais”, disse à Agência FAPESP .

Segundo ele, a partir de agora pesquisadores não terão acesso aos originais dos jornais e revistas que já estão em formato digital. “Só poderão consultar em casos muito específicos e que serão analisados. Essa é uma iniciativa importante para preservar o acervo”, disse.

Parte do acervo já digitalizado ajuda a reconstituir momentos importantes dos mais de 200 anos de história da imprensa no Brasil. Pesquisadores já podem acessar desde publicações que marcaram época, como a revista A Cigarra (1914-1975) e o jornal Última Hora (1951-1971), até títulos menos conhecidos, como o jornal sindical Notícias Gráficas (1945-1964) e o anarquista La Barricata (1912-1913).

Segundo Bacellar, a ideia é colocar à disposição do público um conjunto variado de fontes. “Buscamos alguns exemplos de periódicos famosos, mas que ilustrem tendências ou conceitos diferentes. Temos desde a grande imprensa até pequenos jornais e revistas com perfis mais variados, como sindicais, políticos ou culturais”, disse.

A digitalização dos jornais e revistas é uma iniciativa interna do Arquivo do Estado. “Algumas digitalizações em curso estão envolvidas diretamente em projetos de pesquisa relacionados, como, por exemplo, à imigração em São Paulo, e à resistência política durante a Ditadura Militar”, explicou.

Movimento

O Memória da Imprensa já soma mais de 1.670 páginas de jornais, mas, de acordo com seu coordenador, as páginas disponíveis ainda representam uma amostra ínfima, se comparadas com a totalidade disponível no Arquivo do Estado.

“Esperamos que esse material sirva para o uso do professor em sala de aula e dos próprios alunos. Caso o professor queira dar uma aula sobre o período da República Velha no Brasil pode, por exemplo, consultar alguns jornais anarquistas do período”, disse.

Um dos destaques é o periódico alternativo Movimento, que liderou a campanha pela anistia durante a ditadura militar. Lançado em 1975 e fechado em 1981, teve 3.093 artigos e 3.162 ilustrações censurados pela ditadura.

Segundo Bacellar, a alimentação do site será feita ao longo do ano de forma aleatória, com relação aos títulos. “Mas, às vezes, coincide com solicitação externa. Uma entidade pede, por exemplo a digitalização de um determinado jornal. De qualquer forma, pretendemos chegar, até o fim do ano, com mais de 2 milhões de páginas digitalizadas”, disse.

O Arquivo Público do Estado de São Paulo é um dos maiores arquivos públicos brasileiros. Sua hemeroteca tem cerca de 1,2 mil títulos e 32 mil exemplares de revistas e mais de 200 títulos de jornais.

Já estão disponíveis no site as revistas O Malho (1902-1954), Panóplia (1901-1935), Anauê! (1935), Vida Moderna (1907-1925) e Escrita (1975-1988), além dos jornais Lanterna (1901-1935), Acção (1936), Germinal (1902-1913) e Correio Paulistano (1854-1963), este último o primeiro diário da província de São Paulo.

Para acessar a página e mais informações: http://www.arquivoestado.sp.gov.br/memoria

>Império por escrito

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Especiais

10/2/2010

Por Alex Sander Alcântara

Agência FAPESP – Qual é o papel da comunicação escrita nos séculos seguintes à invenção da imprensa (ocorrida por volta de 1440)? Essa é a principal questão abordada por O Império por escrito – Formas de transmissão da cultura letrada no mundo ibérico (séculos 16 a 19), organizado pelas historiadoras Leila Mezan Algranti e Ana Paula Megiani, que acaba de ser lançado.

Das leituras da vida na corte às gazetas manuscritas revolucionárias do século 18, do cotidiano na colônia desde o Descobrimento aos registros da Biblioteca Real, o livro mostra como a comunicação escrita foi fundamental para a administração e a manutenção do Império português.

De acordo com Leila, professora de história na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), a obra destaca o papel da escrita envolvendo os dois lados do Atlântico, não só nas relações entre Brasil e Portugal, mas também entre Portugal, Espanha e África.

“Nesse circuito de circulação de ideias, a escrita manuscrita teve um papel importante, apesar da presença crescente da imprensa, no período analisado, e dos impressos na cultura letrada. Isso se faz presente nas narrativas de viagens, cartas, nas correspondências régias, receitas e na poesia”, disse à Agência FAPESP.

Os ensaios são resultado do colóquio internacional “Escrita, Memória e Vida Material: formas de transmissão da cultura letrada no Império português”, realizado na Universidade de São Paulo (USP) em outubro de 2006, no âmbito do Projeto Temático “Dimensões do Império Português”, apoiado pela FAPESP e coordenado por Laura de Mello e Souza, do Departamento de História da Universidade de São Paulo (USP).

O Império por escrito, que também teve o apoio da FAPESP na modalidade Auxílio à Pesquisa – Publicações, é o segundo livro publicado dentro do Temático. O primeiro foi O governo dos povos, que aborda as relações de poder no mundo ibérico, e serão publicados outros dois.

Dividido em quatro partes, o foco do novo livro é a escrita e não a leitura propriamente dita. “Apesar de alguns ensaios abordarem a discussão dos livros e bibliotecas, principalmente na segunda parte da obra, a atenção maior é com a produção e circulação de escritos, manuscritos e impressos”, disse Leila.

A primeira parte do livro, Cultura letrada: vida de corte, instituições e poder, tem como unidade a dinâmica das relações de poder em ambientes letrados.

Segundo Leila, há muitos momentos na administração oficial em que a comunicação se torna extremamente importante. “Em termos de Portugal e Brasil, é evidente que sem a comunicação por escrito seria praticamente inviável administrar o Império. O livro mostra, em vários contextos, a importância da escrita na manutenção do Império”, disse.

“Além dos impressos, registros manuscritos de todo tipo (cartas, regulamentos, crônicas, gramáticas) desempenharam um papel fundamental na transmissão de ideias, valores, normas, costumes e saberes entre as metrópoles e suas colônias, bem como entre as diferentes possessões ultramarinas que integravam tais impérios coloniais”, destacam as organizadoras.

De acordo com a historiadora, ao se expandir, o Império português sentiu a necessidade de trocar informações com mais rapidez. “As ordens que até então eram feitas oralmente começaram a ser feitas por escrito. As normas regulavam não só a administração, mas também outras esferas, no âmbito político e jurídico, envolvendo queixas ou denúncias, por exemplo”, explicou.

É a partir desse momento, segundo Leila, que surgiram os arquivos, como o da Torre do Tombo, em Portugal. “Todo navio que chegava ao Brasil de Portugal, e vice-versa, trazia documentos. A manutenção do Império se deu a partir da troca de informações, grande parte com deliberações para os encarregados locais”, disse.

A segunda parte do livro, Suportes, circulação e colecionismo, reúne trabalhos que abordam conjuntos de escritos, impressos ou manuscritos, além de gravuras e mapas que circularam e foram objetos de coleções.

Um dos artigos, de Maria Aparecida de Menezes Borrego, pesquisadora na USP e no Temático, analisa a presença de livros impressos e manuscritos entre os bens materiais arrolados nos inventários de mercadores paulistas, no decorrer do século 18.

A partir da análise de inventários contidos no Arquivo do Estado de São Paulo, a autora conclui que a propriedade dos livros disseminou-se no período.

“Ainda que os proprietários de livros representassem uma parcela insignificante da população livre, é pouco satisfatório acreditar que somente os comerciantes focalizados nesta pesquisa fossem proprietários de livros, o que nos leva a especular sobre a presença de mais impressos nas casas de outros habitantes da capital”, destacou.

Cultura e salvação

A terceira parte, Traduções culturais e transmissões de saberes, aborda a questão de contatos e intercâmbios entre povos de culturas distintas, a partir da análise de manuscritos e impressos que circularam entre América e África.

No artigo Bebida dos deuses, por exemplo, Leila analisa técnicas de fabricação e utilidades do chocolate no império português. “A bebida feita com cacau pelos índios da América Espanhola não era mais o mesmo chocolate tomado na corte europeia nos séculos 17 e 18, por exemplo. É um saber que foi transformado. E tudo isso passa pela escrita”, disse a historiadora, que pesquisa sobre a história da alimentação.

A quarta e última parte do livro, Usos da escrita e formas de contestação política, enfoca o estudo da circulação de informações e ideias consideradas sediciosas, heréticas ou libertinas no império luso-brasileiro, a partir de vários tipos de manuscritos e impressos.

No capítulo Do destino das almas dos índios, por exemplo, Evergton Sales Souza, professor adjunto na Universidade Federal da Bahia, comenta as mudanças no paradigma da teologia portuguesa entre o século 17 e o 18, a partir de visões antagônicas sobre a salvação dos gentios expostas nas textos do jesuíta Simão de Vasconcellos e do padre Antônio Pereira de Figueiredo.

“Os textos da quarta parte abordam, ainda, a questão da produção, divulgação e recepção de notícias, bem como de proposições políticas contra a administração portuguesa na América”, contam as organizadoras.

Título: O Império por escrito: Formas de transmissão da cultura letrada no mundo ibérico – séculos 16 a 19
Páginas: 608
Preço: R$ 78
Mais informações: http://www.alamedaeditorial.com.br

>Internet e depressão

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Divulgação Científica
Internet e depressão

3/2/2010

Agência FAPESP – Pessoas que passam muito tempo navegando pela internet têm maior risco de apresentar sintomas depressivos, de acordo com uma pesquisa feita no Reino Unido por cientistas da Universidade de Leeds.

O estudo, que será publicado na edição de 10 de fevereiro da revista Psychopathology, procurou analisar o fenômeno de usuários que têm desenvolvido o uso compulsivo da internet, substituindo a interação social no mundo real pelo virtual, em redes sociais, chats ou em outros serviços eletrônicos.

Segundo os pesquisadores, os resultados do estudo apontam que esse tipo de dependência pode ter impactos sérios na saúde mental. “A internet ocupa hoje parte importante na vida moderna, mas seus benefícios são acompanhados por um lado negro”, disse Catriona Morrison, um dos autores do estudo.

“Enquanto a maioria usa a rede mundial para se informar, pagar contas, fazer compras e trocar e-mails, há uma pequena parcela dos usuários que acha difícil controlar o tempo gasto on-line. Isso ao ponto em que tal hábito passa a interferir em suas atividades diárias”, apontou a cientista.

Os “viciados em internet” passam, proporcionalmente em relação à maioria dos usuários, mais tempo em comunidades virtuais e em sites pornográficos e de jogos. Os pesquisadores verificaram que esse grupo tem incidência maior de depressão de moderada a grave.

“Nossa pesquisa indica que o uso excessivo da internet está associado com depressão, mas o que não sabemos é o que vem primeiro. As pessoas depressivas são atraídas pela internet ou é o uso da rede que causa depressão?”, questionou Catriona.

A pesquisa examinou 1.319 pessoas com idades entre 16 e 61 anos. Do total, 1,2% foi considerado como “viciado em internet”. Apesar de ser uma pequena parte do total, segundo os pesquisadores o número de internautas nessa categoria tem crescido.

Incidentes como a onda de suicídios entre adolescentes ocorrida na cidade de Bridgend, no País de Gales, em 2008, têm levado a questionamentos a respeito da influência das redes sociais em indivíduos vulneráveis à depressão.

No estudo, os pesquisadores observaram que o grupo dos “viciados em internet” era formado principalmente por usuários mais jovens, com média de idade de 21 anos.

“Está claro que para uma pequena parte dos usuários o uso excessivo da internet é um sinal de perigo para tendências depressivas. Precisamos considerar as diversas implicações dessa relação e estabelecer claramente os efeitos desse uso na saúde mental”, disse a pesquisadora.

O artigo The relationship between excessive internet use and depression: a questionnaire-based study of 1,319 young people and adults, de Catriona Morrison e outros, pode ser lido por assinantes da Psychopathology (2010;43:121-126 – DOI:10.1159/000277001) em http://www.karger.com/psp.

>Rebecca Solnit: When the Media Is the Disaster – Covering Haiti

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When the Media Is the Disaster
Covering Haiti
By Rebecca Solnit

Soon after almost every disaster the crimes begin: ruthless, selfish, indifferent to human suffering, and generating far more suffering. The perpetrators go unpunished and live to commit further crimes against humanity. They care less for human life than for property. They act without regard for consequences.

I’m talking, of course, about those members of the mass media whose misrepresentation of what goes on in disaster often abets and justifies a second wave of disaster. I’m talking about the treatment of sufferers as criminals, both on the ground and in the news, and the endorsement of a shift of resources from rescue to property patrol. They still have blood on their hands from Hurricane Katrina, and they are staining themselves anew in Haiti.

Within days of the Haitian earthquake, for example, the Los Angeles Times ran a series of photographs with captions that kept deploying the word “looting.” One was of a man lying face down on the ground with this caption: “A Haitian police officer ties up a suspected looter who was carrying a bag of evaporated milk.” The man’s sweaty face looks up at the camera, beseeching, anguished.

Another photo was labeled: “Looting continued in Haiti on the third day after the earthquake, although there were more police in downtown Port-au-Prince.” It showed a somber crowd wandering amid shattered piles of concrete in a landscape where, visibly, there could be little worth taking anyway.

A third image was captioned: “A looter makes off with rolls of fabric from an earthquake-wrecked store.” Yet another: “The body of a police officer lies in a Port-au-Prince street. He was accidentally shot by fellow police who mistook him for a looter.”

People were then still trapped alive in the rubble. A translator for Australian TV dug out a toddler who’d survived 68 hours without food or water, orphaned but claimed by an uncle who had lost his pregnant wife. Others were hideously wounded and awaiting medical attention that wasn’t arriving. Hundreds of thousands, maybe millions, needed, and still need, water, food, shelter, and first aid. The media in disaster bifurcates. Some step out of their usual “objective” roles to respond with kindness and practical aid. Others bring out the arsenal of clichés and pernicious myths and begin to assault the survivors all over again.

The “looter” in the first photo might well have been taking that milk to starving children and babies, but for the news media that wasn’t the most urgent problem. The “looter” stooped under the weight of two big bolts of fabric might well have been bringing it to now homeless people trying to shelter from a fierce tropical sun under improvised tents.

The pictures do convey desperation, but they don’t convey crime. Except perhaps for that shooting of a fellow police officer — his colleagues were so focused on property that they were reckless when it came to human life, and a man died for no good reason in a landscape already saturated with death.

In recent days, there have been scattered accounts of confrontations involving weapons, and these may be a different matter. But the man with the powdered milk? Is he really a criminal? There may be more to know, but with what I’ve seen I’m not convinced.

What Would You Do?

Imagine, reader, that your city is shattered by a disaster. Your home no longer exists, and you spent what cash was in your pockets days ago. Your credit cards are meaningless because there is no longer any power to run credit-card charges. Actually, there are no longer any storekeepers, any banks, any commerce, or much of anything to buy. The economy has ceased to exist.

By day three, you’re pretty hungry and the water you grabbed on your way out of your house is gone. The thirst is far worse than the hunger. You can go for many days without food, but not water. And in the improvised encampment you settle in, there is an old man near you who seems on the edge of death. He no longer responds when you try to reassure him that this ordeal will surely end. Toddlers are now crying constantly, and their mothers infinitely stressed and distressed.

So you go out to see if any relief organization has finally arrived to distribute anything, only to realize that there are a million others like you stranded with nothing, and there isn’t likely to be anywhere near enough aid anytime soon. The guy with the corner store has already given away all his goods to the neighbors. That supply’s long gone by now. No wonder, when you see the chain pharmacy with the shattered windows or the supermarket, you don’t think twice before grabbing a box of PowerBars and a few gallons of water that might keep you alive and help you save a few lives as well.

The old man might not die, the babies might stop their squalling, and the mothers might lose that look on their faces. Other people are calmly wandering in and helping themselves, too. Maybe they’re people like you, and that gallon of milk the fellow near you has taken is going to spoil soon anyway. You haven’t shoplifted since you were 14, and you have plenty of money to your name. But it doesn’t mean anything now.

If you grab that stuff are you a criminal? Should you end up lying in the dirt on your stomach with a cop tying your hands behind your back? Should you end up labeled a looter in the international media? Should you be shot down in the street, since the overreaction in disaster, almost any disaster, often includes the imposition of the death penalty without benefit of trial for suspected minor property crimes?

Or are you a rescuer? Is the survival of disaster victims more important than the preservation of everyday property relations? Is that chain pharmacy more vulnerable, more a victim, more in need of help from the National Guard than you are, or those crying kids, or the thousands still trapped in buildings and soon to die?

It’s pretty obvious what my answers to these questions are, but it isn’t obvious to the mass media. And in disaster after disaster, at least since the San Francisco earthquake of 1906, those in power, those with guns and the force of law behind them, are too often more concerned for property than human life. In an emergency, people can, and do, die from those priorities. Or they get gunned down for minor thefts or imagined thefts. The media not only endorses such outcomes, but regularly, repeatedly, helps prepare the way for, and then eggs on, such a reaction.

If Words Could Kill

We need to banish the word “looting” from the English language. It incites madness and obscures realities.

“Loot,” the noun and the verb, is a word of Hindi origin meaning the spoils of war or other goods seized roughly. As historian Peter Linebaugh points out, “At one time loot was the soldier’s pay.” It entered the English language as a good deal of loot from India entered the English economy, both in soldiers’ pockets and as imperial seizures.

After years of interviewing survivors of disasters, and reading first-hand accounts and sociological studies from such disasters as the London Blitz and the Mexico City earthquake of 1985, I don’t believe in looting. Two things go on in disasters. The great majority of what happens you could call emergency requisitioning. Someone who could be you, someone in the kind of desperate circumstances I outlined above, takes necessary supplies to sustain human life in the absence of any alternative. Not only would I not call that looting, I wouldn’t even call that theft.

Necessity is a defense for breaking the law in the United States and other countries, though it’s usually applied more to, say, confiscating the car keys of a drunk driver than feeding hungry children. Taking things you don’t need is theft under any circumstances. It is, says the disaster sociologist Enrico Quarantelli, who has been studying the subject for more than half a century, vanishingly rare in most disasters.

Personal gain is the last thing most people are thinking about in the aftermath of a disaster. In that phase, the survivors are almost invariably more altruistic and less attached to their own property, less concerned with the long-term questions of acquisition, status, wealth, and security, than just about anyone not in such situations imagines possible. (The best accounts from Haiti of how people with next to nothing have patiently tried to share the little they have and support those in even worse shape than them only emphasize this disaster reality.) Crime often drops in the wake of a disaster.

The media are another matter. They tend to arrive obsessed with property (and the headlines that assaults on property can make). Media outlets often call everything looting and thereby incite hostility toward the sufferers as well as a hysterical overreaction on the part of the armed authorities. Or sometimes the journalists on the ground do a good job and the editors back in their safe offices cook up the crazy photo captions and the wrongheaded interpretations and emphases.

They also deploy the word panic wrongly. Panic among ordinary people in crisis is profoundly uncommon. The media will call a crowd of people running from certain death a panicking mob, even though running is the only sensible thing to do. In Haiti, they continue to report that food is being withheld from distribution for fear of “stampedes.” Do they think Haitians are cattle?

The belief that people in disaster (particularly poor and nonwhite people) are cattle or animals or just crazy and untrustworthy regularly justifies spending far too much energy and far too many resources on control — the American military calls it “security” — rather than relief. A British-accented voiceover on CNN calls people sprinting to where supplies are being dumped from a helicopter a “stampede” and adds that this delivery “risks sparking chaos.” The chaos already exists, and you can’t blame it on these people desperate for food and water. Or you can, and in doing so help convince your audience that they’re unworthy and untrustworthy.

Back to looting: of course you can consider Haiti’s dire poverty and failed institutions a long-term disaster that changes the rules of the game. There might be people who are not only interested in taking the things they need to survive in the next few days, but things they’ve never been entitled to own or things they may need next month. Technically that’s theft, but I’m not particularly surprised or distressed by it; the distressing thing is that even before the terrible quake they led lives of deprivation and desperation.

In ordinary times, minor theft is often considered a misdemeanor. No one is harmed. Unchecked, minor thefts could perhaps lead to an environment in which there were more thefts and so forth, and a good argument can be made that, in such a case, the tide needs to be stemmed. But it’s not particularly significant in a landscape of terrible suffering and mass death.

A number of radio hosts and other media personnel are still upset that people apparently took TVs after Hurricane Katrina hit New Orleans in August 2005. Since I started thinking about, and talking to people about, disaster aftermaths I’ve heard a lot about those damned TVs. Now, which matters more to you, televisions or human life? People were dying on rooftops and in overheated attics and freeway overpasses, they were stranded in all kinds of hideous circumstances on the Gulf Coast in 2005 when the mainstream media began to obsess about looting, and the mayor of New Orleans and the governor of Louisiana made the decision to focus on protecting property, not human life.

A gang of white men on the other side of the river from New Orleans got so worked up about property crimes that they decided to take the law into their own hands and began shooting. They seem to have considered all black men criminals and thieves and shot a number of them. Some apparently died; there were bodies bloating in the September sun far from the region of the floods; one good man trying to evacuate the ruined city barely survived; and the media looked away. It took me months of nagging to even get the story covered. This vigilante gang claimed to be protecting property, though its members never demonstrated that their property was threatened. They boasted of killing black men. And they shared values with the mainstream media and the Louisiana powers that be.

Somehow, when the Bush administration subcontracted emergency services — like providing evacuation buses in Hurricane Katrina — to cronies who profited even while providing incompetent, overpriced, and much delayed service at the moment of greatest urgency, we didn’t label that looting.

Or when a lot of wealthy Wall Street brokers decide to tinker with a basic human need like housing…. Well, you catch my drift.

Woody Guthrie once sang that “some will rob you with a six-gun, and some with a fountain pen.” The guys with the six guns (or machetes or sharpened sticks) make for better photographs, and the guys with the fountain pens not only don’t end up in jail, they end up in McMansions with four-car garages and, sometimes, in elected — or appointed — office.

Learning to See in Crises

Last Christmas a priest, Father Tim Jones of York, started a ruckus in Britain when he said in a sermon that shoplifting by the desperate from chain stores might be acceptable behavior. Naturally, there was an uproar. Jones told the Associated Press: “The point I’m making is that when we shut down every socially acceptable avenue for people in need, then the only avenue left is the socially unacceptable one.”

The response focused almost entirely on why shoplifting is wrong, but the claim was also repeatedly made that it doesn’t help. In fact, food helps the hungry, a fact so bald it’s bizarre to even have to state it. The means by which it arrives is a separate matter. The focus remained on shoplifting, rather than on why there might be people so desperate in England’s green and pleasant land that shoplifting might be their only option, and whether unnecessary human suffering is itself a crime of sorts.

Right now, the point is that people in Haiti need food, and for all the publicity, the international delivery system has, so far, been a visible dud. Under such circumstances, breaking into a U.N. food warehouse — food assumedly meant for the poor of Haiti in a catastrophic moment — might not be “violence,” or “looting,” or “law-breaking.” It might be logic. It might be the most effective way of meeting a desperate need.

Why were so many people in Haiti hungry before the earthquake? Why do we have a planet that produces enough food for all and a distribution system that ensures more than a billion of us don’t have a decent share of that bounty? Those are not questions whose answers should be long delayed.

Even more urgently, we need compassion for the sufferers in Haiti and media that tell the truth about them. I’d like to propose alternative captions for those Los Angeles Times photographs as models for all future disasters:

Let’s start with the picture of the policeman hogtying the figure whose face is so anguished: “Ignoring thousands still trapped in rubble, a policeman accosts a sufferer who took evaporated milk. No adequate food distribution exists for Haiti’s starving millions.”

And the guy with the bolt of fabric? “As with every disaster, ordinary people show extraordinary powers of improvisation, and fabrics such as these are being used to make sun shelters around Haiti.”

For the murdered policeman: “Institutional overzealousness about protecting property leads to a gratuitous murder, as often happens in crises. Meanwhile countless people remain trapped beneath crushed buildings.”

And the crowd in the rubble labeled looters? How about: “Resourceful survivors salvage the means of sustaining life from the ruins of their world.”

That one might not be totally accurate, but it’s likely to be more accurate than the existing label. And what is absolutely accurate, in Haiti right now, and on Earth always, is that human life matters more than property, that the survivors of a catastrophe deserve our compassion and our understanding of their plight, and that we live and die by words and ideas, and it matters desperately that we get them right.

Copyright 2010 Rebecca Solnit

>Como transformar informação em ação? Info-ativismo.

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10 tactics for turning information into action shows how rights advocates around the world have used the internet and digital technologies to create positive change.

http://www.informationactivism.org/

http://vimeo.com/moogaloop.swf?clip_id=7079347&server=vimeo.com&show_title=1&show_byline=1&show_portrait=0&color=&fullscreen=1
Info Activism from Tactical Technology Collective on Vimeo.

>University adds Twitter to the curriculum in Australia

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Uni adds Twitter to the curriculum

October 16, 2009
The Sydney Morning Herald – smh.com.au

Social networking upstart Twitter has made the jump to academia’s hallowed halls, with ‘tweets’ made compulsory writing for would-be journalists at Griffith University.

“Some students’ tweets are not as in depth as you might like. But I don’t know if getting them to write an essay is any more beneficial,” said Jacqui Ewart, senior lecturer at the university.

Twitter microblogs have become an online phenomenon with users sending ‘tweets’ of up to 140 characters, or just a few words, to increasing numbers of ‘followers’.

The service rose to global prominence during unrest in the wake of Iran’s recent presidential elections with tweets used to broadcast otherwise restricted information.

The service is being used more frequently by politicians, including Australia’s bookish Prime Minister Kevin Rudd, who has asked followers to recommend movie choices and this week ‘tweeted’ about his visit to a rural bakery.

Students were using twitter as “an exercise in self-reflection,” Ewart said, citing increasing demand from employers for people to use social networking tools.

But reaction from students has been mixed, she said, raising questions over the utility of using sites like Twitter and Facebook in a formal education curriculum.

“Quite surprisingly, a lot of students didn’t know what Twitter was. There were a couple of really vocal students who were saying they couldn’t believe we were using it and thought it was a waste of time,” Ewart said.

Reuters

>Conferência Nacional de Comunicação: Como democratizar as comunicações

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15/09/2009 – 01h09 – Envolverde/Observatório da Imprensa
Por Venício A. de Lima, para o Observatório da Imprensa

Nesses tempos de preparação da 1ª Conferência Nacional de Comunicação, uma das questões recorrentes é: o que deve ser feito para “democratizar as comunicações”? Boa pergunta, sem dúvida. Na verdade, essa é a questão síntese de todos os muitos e difíceis aspectos envolvidos na problemática geral do setor.

“Democratizar as comunicações” tem sido o principal paradigma conceitual, uma espécie de bandeira a orientar boa parte dos segmentos organizados da sociedade civil comprometidos com o avanço na área de comunicação. E não só no Brasil. Todavia, uma das falácias desta bandeira é que ela pressupõe a possibilidade de que a grande mídia dominante, privada e comercial, seria passível de ser democratizada. Vale dizer, em termos da teoria liberal da liberdade de imprensa, trazer para dentro de si mesma, “o mercado livre de idéias” (the market place of ideas) – representativo do conjunto da sociedade, isto é, plural e diverso.

Seria este pressuposto realizável?

Retrabalhando a teoria liberal

Há mais de 50 anos, isto é, pelo menos desde a Hutchins Commission (EUA, 1942-1947), a teoria liberal foi “retrabalhada” e passou a se apoiar em três idéias centrais: pluralismo interno, responsabilidade social e profissionalismo. Esse “retrabalhar” decorreu da impossibilidade de se prosseguir sustentando o discurso do “market place of ideas” – semelhante ao mercado “autocontrolado” de Adam Smith – em face do avanço real da concentração (oligopolização) da mídia e da formação de redes regionais e nacionais de rádio e televisão.

A solução encontrada, porém, esbarra em dificuldades incontornáveis identificadas pelo desenvolvimento da pesquisa na área – sobretudo em relação aos mitos da imparcialidade e da objetividade jornalística e da independência dos conglomerados de mídia – e também se torna inviável em sociedades, como a Inglaterra, onde existe uma tradição historicamente consolidada de imprensa partidária.

Tudo isso trouxe de volta o ideário do “market place of ideas”, agora complementarmente ao pluralismo interno, à responsabilidade social e ao profissionalismo, e pela intervenção do Estado por intermédio de políticas públicas para garantir a concorrência das empresas de mídia (a não oligopolização) no mercado de idéias.

Além das dificuldades discursivas que a necessidade de intervenção do Estado cria para a teoria liberal, os próprios fatos têm revelado, sem margem a dúvidas, que nem um nem outro caminho tem garantido o “market place of ideas”.

Complementaridade dos sistemas

Uma variante dessas possibilidades foi contemplada na Constituição de 1988: trata-se da complementaridade dos sistemas privado, público e estatal de radiodifusão (Artigo 223).

Em função de opções feitas ainda na década de 1930, temos no Brasil um sistema de radiodifusão predominantemente privado. A Constituição, no entanto, determina a busca do equilíbrio entre os sistemas como forma de democratizar as comunicações: a criação da Empresa Brasil de Comunicação (EBC), em 2007, caminha nesta direção.

Outra alternativa seria o apoio à criação e consolidação de sistemas privados não comerciais, isto é, associações sem fins lucrativos, cooperativas ou fundações. Aqui as rádios e TVs comunitárias são exemplos em curso.

Re-enquadrando a “democratização” das comunicações

Há, no entanto, uma inflexão conceitual que precisa ser feita. Devemos re-enquadrar toda a discussão da democratização das comunicações em torno do conceito de “direito à comunicação”. É preciso que a mídia seja entendida como um poder e a comunicação como um direito que compreenda não só a liberdade de expressão como os direitos à informação e ao conhecimento. Um direito tão fundamental como a educação e/ou a saúde, por exemplo.

A construção desse direito não é nova. Sua primeira formulação já tem quase 40 anos. Também não é novo que entidades e movimentos sociais que lutam pela democratização da comunicação no Brasil inscrevam esse direito – direta ou indiretamente – entre os eixos principais de seus programas de ação.

São muitos, no entanto, os obstáculos à sua consolidação, exatamente porque o direito à comunicação abre perspectivas imensas do ponto de vista de garantias ao cidadão, inclusive já praticadas em outras democracias liberais, das quais ainda estamos muito distantes: o direito de resposta como interesse difuso e o direito de antena são apenas dois exemplos.

O direito à comunicação não logrou ainda o status de direito positivado nem mesmo em nível dos organismos multilaterais que têm a capacidade de provocar o reconhecimento internacional do conceito – como, por exemplo, a Unesco. Esse fato faz com que, simultaneamente à articulação política de ações específicas, desenvolva-se também a luta pelo reconhecimento formal do direito.

Existem ainda históricas e poderosas resistências ao conceito, exatamente pelo poder que ele tem de abarcar um imenso leque de reivindicações e bandeiras em relação à democratização da comunicação. Mas, não há dúvida, esse é o caminho.

O que fazer?

Enquanto se segue na construção do direito à comunicação, há de se tentar que o “market place of ideas” funcione no Brasil – sem ilusões.

Democratizar a comunicação passa a ser, portanto, garantir a circulação da diversidade e da pluralidade de idéias existentes na sociedade, isto é, a universalidade da liberdade de expressão individual. Essa garantia tem que ser buscada tanto “externamente” – por meio da regulação do mercado (sem propriedade cruzada e sem oligopólios; priorizando a complementaridade dos sistemas público, privado e estatal) – quanto “internamente” à mídia – cobrando o cumprimento dos manuais de Redação que prometem (mas não praticam) a imparcialidade e a objetividade jornalística.

>Jesús Martín-Barbero: As formas mestiças da mídia

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Entrevista

As formas mestiças da mídia
Pesquisador fez da América Latina laboratório de uma original teoria da comunicação num mundo globalizado

Mariluce Moura

Pesquisa FAPESP – Edição Impressa 163 – Setembro 2009
Fotos: Eduardo César

O vasto auditório do Memorial da América Latina, com 870 lugares, estava lotado na tarde da segunda-feira, 17 de agosto. Viam-se sobretudo rostos jovens emergindo na quase penumbra da plateia, e era isso o surpreendente: difícil entender de primeira por que tantos deles tinham livremente decidido participar da instalação do Fórum Permanente dos Programas de Pós-Graduação de Comunicação do Estado de São Paulo, programação no mínimo um tanto aborrecida para fases e tempos inquietos da vida. Registre-se, a propósito, que em São Paulo estão hoje 14 dos 34 programas de pós em comunicação existentes no país. Sem sinais explícitos de impaciência, enquanto se sucediam as falas dos integrantes da mesa, a verdadeira expectativa que dominava o auditório, entretanto, era a aula magna do professor Jesús Martín-Barbero que abordaria a comunicação no presente.

Barbero começou a falar e logo lançou a pergunta de caráter epistemológico sobre “como pesquisar a comunicação hoje”. Entrou pelo conceito moderno de incerteza e suas raízes fincadas na lógica difusa (ou lógica fuzzy), passou por Merleau-Ponty e sua descrença nas leis da história, declarada em 1956, junto com a afirmação de que a história só é pensável em termos de ambiguidade, e deteve-se no medo que hoje nos provoca um conceito novíssimo de informação, o da informação genética.

O professor passeou o olhar pelas metodologias de pesquisa em comunicação fundadas no estruturalismo, no marxismo e no funcionalismo e aportou no ecossistema especial em que os homens contemporâneos veem e são vistos (algo como o “terceiro entorno” de Javier Echeverría ou o “bios midiático” de Muniz Sodré). Estava na seara da imagem sob todas as formas, no campo especial da comunicação já nem tanto concebido a partir de um conjunto de meios e aparelhos que se transformam, se desfazem e refazem “ante nossos olhos”, mas tateado com uma atenção especial para a internet e o computador, que trazem “algo de radicalmente novo” à história dos homens. Um “algo”, para Barbero, jamais comparável à imprensa, ao avião ou a qualquer das máquinas fundamentais das mais conhecidas revoluções tecnológicas, e comparável, como quer Roger Chartier, à invenção do alfabeto. Algo radical a ponto de assinalar uma divisão entre épocas – ou eras. “Estamos na crise. O velho já morreu e não conhecemos ainda o que está por vir”, Barbero disse, trazendo Gramsci para a plateia.

Na véspera ele já dissera à Pesquisa FAPESP que os meios e os gêneros que os meios produzem estão sendo reinventados à luz da interface da televisão com a internet, numa interação e contaminação que desestabilizam os discursos próprios de cada meio e criam o que ele tem nomea¬do de “as formas mestiças da comunicação”. Formas um tanto incoerentes que atuam transversalmente em todos os meios.

Esse homem de quase 72 anos é, como apresentou Maria Immacolata Vassalo Lopes, coordenadora do programa de pós-graduação em comunicação da Universidade de São Paulo (USP), um “cidadão latino-americano nascido na Espanha”, em Ávila. Barbero escolheu a América Latina como lugar para viver e sobre o qual pensar muito cedo, quando a Espanha, sob a ditadura de Francisco Franco, “era um lugar muito triste”.

Autor, entre outras obras, do já clássico Dos meios às mediações: comunicação, cultura e hegemonia (Editora UFRJ, 5ª edição, tradução de Ronald Polito e Sérgio Alcides), Ofício de cartógrafo: travessias latino-americanas de comunicação na cultura (Edições Loyola, 2004, tradução de Fidelina González) e Os exercícios do Ver: hegemonia audiovisual e ficção televisiva, este em coautoria com Germán Rey (Editora Senac, 2004, tradução de Jacob Gorender), Jesús Martín-Barbero é doutor em filosofia pela Universidade de Louvain e pós-doutor em antropologia e semiologia na Escola de Altos Estudos em Paris. Em seu currículo, há que se destacar a criação do Departamento de Ciências da Comunicação da Universidad del Valle, Colômbia, que se transformou em Escola de Comunicação Social, e suas atividades de professor e pesquisador nas universidades Complutense de Madri, Autônoma de Barcelona, de Guadalajara e na Escola Nacional de Antropologia e História do México. No segundo semestre de 2008 foi professor visitante na Escola de Comunicações e Artes (ECA) da USP. Hoje é professor e coordenador de pesquisa da Faculdade de Comunicação e Linguagem da Universidade Javeriana de Bogotá. A seguir, os principais trechos da entrevista (ver a versão mais completa no site http://www.revista.fapesp.br).

Eu gostaria de começar esta entrevista lhe perguntando como falar de comunicação hoje. O que é, em seu olhar, a comunicação?

Há basicamente três maneiras de enfocar a comunicação em nosso mundo latino-americano: as duas primeiras estiveram em contraposição. Partimos da visão hegemônica que dois pesquisadores norte-americanos construíram no fim da Segunda Guerra Mundial, com base em um profundo mal-entendido: um engenheiro de telefonia chamado [Claude] Shannon teve a ousadia de chamar teoria geral da comunicação a um livro que fala de economia da transmissão de informação, ou seja, como fazer para que a transmissão de informação tivesse o menor ruído possível e durasse o menor tempo possível, portanto, com a menor redundância possível. Essa proposta de um engenheiro de telefones, manipulada por [Harold] Lasswell e [Paul] Lazarsfeld, se converteu na grande teoria da comunicação. Quando voltei à Colômbia em 1973, depois de meu doutorado, entrei no campo de comunicação e o encontrei identificado com essa concepção de transmissão de informação – ora, à luz do que vejo, a comunicação está nos modos de se comunicar das pessoas nas ruas, na casa, na igreja, na praça – nada tinha a ver com a ideia de transmissão da informação como estava proposta. De maneira que entro nesse campo – em castelhano se diria – “como um burro na cacharrería”.

Mas quando Lasswell e outros fizeram essa proposta, eles não tinham uma clareza de que havia uma distância enorme entre uma teoria proposta para a engenharia e aquilo que se dava no campo humano das comunicações?

Shannon pensou seu objeto. Os que nos armaram uma armadilha foram Lasswell e Lazarsfeld, que passaram a estudar com base nessa teoria os grandes fenômenos de opinião pública, por exemplo, a grande propaganda para convencer as mães norte-americanas a aceitarem que seus filhos fossem lutar a guerra contra Hitler na Europa. O primeiro estudo foi esse e depois vieram vários outros baseados nessa concepção de destinador/destinatário, fonte, canal etc. Era o que cabia no esquema. Para mim, o mais terrível foi se identificar comunicação com transmissão, um conceito muito mecânico. Portanto, os dois propuseram uma concepção que depois chamamos de instrumental, o meio era um instrumento. E a elaboração dos marxistas, mais adiante, caiu na mesma armadilha, com a noção reduzida dos meios para manipular a consciência.

Como, ao voltar de seu doutorado em filosofia na França, em 1973, acontece seu interesse pela comunicação?

Foi uma mescla de conjuntura e circunstâncias. Primeiro, a conjuntura: voltei à Colômbia apaixonado pela filosofia contemporânea. Fui aluno de Paul Ricoeur e de Maurice Merleau-Ponty que, para mim, foi o grande filósofo ocidental do século XX – não foi [Martin] Heidegger ou [Richard] Rorty. Ele inverte o olhar ocidental porque inclui o corpo como o grande tema da filosofia. Mas não havia nenhuma universidade em Bogotá que me permitisse continuar nesse percurso, eu teria que seguir falando de Aristóteles, de ética etc. Quanto à circunstância, aquela que é minha esposa hoje estava estudando comunicação em uma faculdade que começara havia pouco. Era uma pequena universidade privada, mas reunira um grupo de loucos que tinham lido algo de Roland Barthes, de Lévi-Strauss e queriam fazer alguma coisa, ainda que não soubessem muito bem o quê. Conversei com eles, lhes levei todos esses livros que queriam e outros que enchiam duas caixas que tinham chegado de barco da Europa. Eles me propuseram abrir uma área nova de pesquisa na faculdade. Aceitei e a organizei com dois semestres de linguística, dois de semiótica e dois de estética. Aí vem a segunda circunstância: podia-se aplicar de diferentes maneiras aquilo de que obtínhamos informação, mas aprendi ali que estudar comunicação era estudar meios: imprensa, rádio – pouquíssimo –, cinema, visto como forma de arte, e a televisão, que era, digamos, “a prostituta da calçada”. Naquele momento as grandes emissoras de televisão na América Latina, nos melhores horários, tinham uma programação toda norte-americana, e havia aquele discurso do império cultural etc. etc. Em suma, tínhamos que tratar de meios modernos, contemporâneos, e estudar meios tinha então basicamente duas formas: economia política dos meios e leitura ideológica das mensagens.


Eram as vias propostas pelo marxismo, pelo estruturalismo…

Sim, eram os métodos que propunham para ler como a ideologia dominante domina. A mim isso sempre pareceu muito estreito, porque já sabemos que a ideologia dominante é a da classe dominante, e o que a classe dominante faz é dominar do jeito que puder. Reprimindo, às vezes, como fez, por exemplo, na América andina em 1977, em episódios que contribuíram bastante para a criação da Associação Latino-americana de Pesquisadores de Comunicação (Alaic). Aliás, quando [Héctor] Schmucler fez na Universidade Autônoma Metropolitana (UAM-Xochimilco), no México, o I Encontro Latino-americano de Escolas de Comunicação, fiz ali uma conferência que marcou toda a minha vida. Porque eu disse coisas que acreditava elementares, mas eram grandes blasfêmias, tanto para nossos funcionalistas quanto para os marxistas estruturais.

Por exemplo…

Esta frase: e se, em lugar de pensar a comunicação como dominação, pensássemos a dominação como processo de comunicação? Porque Gramsci me ensinou que a dominação é de dois tipos. Primeiro, há a repressão bruta, os tanques e tal. E dei um exemplo que guardei para sempre: essa dominação é como a relação entre a bota do militar e a barata, entre uma e outra não pode haver uma relação senão de esmagamento, e a barata tem que correr. Mas Gramsci nos ensinou também a noção de dominação como hegemonia e a hegemonia é feita de cumplicidade, de sedução, de fascinação. E há que se pensar sobre “o que, nos dominados, trabalha a favor do dominador”.

Foi um escândalo!

Sim, começaram a dizer que, não bastasse a exploração, eu ainda queria tornar os pobres culpados da dominação. E então lhes disse que o problema na comunicação era justamente os meios terem sido esmagados na queda produzida para explicar economicamente o seu funcionamento. E ainda se ter inferido dessa explicação econômica as análises das mensagens, as análises dos discursos. Mas quero ser justo: isso teve muito a ver com o percurso da teoria da dependência no desenvolvimento do pensamento social latino-americano. Para mim, a teoria da dependência é um pensamento bastante complexo, mas à comunicação se aplicou um pensamento muito menos complexo.

Ou seja, ao se usar a teoria da dependência também para entender a comunicação e o funcionamento dos meios, terminou por se empobrecer nesse âmbito a própria teoria.

Sim. Veja, eu sempre tomei Paulo Freire como um autor-chave da teoria da dependência. Há um livrinho não traduzido para o português que fiz para uma coleção latino-americana chamada La Educación desde la Comunicación. E há nele um capítulo de minha tese sobre a concepção de comunicação que havia em Paulo Freire. Penso que Freire tem que ser incluído na história dos meios culturais, os estudos latino-americanos não podem alijá-lo, porque se há quem agregue a noção de cumplicidade do oprimido, se há quem a percebeu fenomenologicamente na vida cotidiana, é Freire. Tive a sorte de conhecer muitos que fizeram a teoria da dependência, Teothônio dos Santos, por exemplo, e eles tinham uma concepção de economia muito menos economicista, muito menos de fundo positivista, do que os leitores dela no campo da comunicação. Mas resumindo: primeira concepção, comunicação como transmissão, e segunda concepção, os meios tomados de forma muito empobrecida, porque se tratava de economia política e análise de mensagem. Evidentemente, era o que se podia fazer naquele tempo.

E a terceira concepção de comunicação, em que não entramos até aqui?

Deixo de lado as brigas em que entrei para introduzir a ideia de que a comunicação de massa era mais ampla que os meios, e que os meios não podiam ser pensados só em sua economia e ideologia, tinham que ser relacionados com a cultura cotidiana da maioria – ¬portanto, havia grandes mediações que vinham de formatos históricos, de matrizes culturais. Assim saltamos ao contemporâneo. Em resumo, travou-se uma luta entre uma concepção positivista e uma outra concepção muito mais fenomenológico-antropológica, que envolve Nestor Canclini e todo o pessoal que foi forçando a entrada dessa nova visão a partir de outubro de 1983 – uma data-chave. O que aconteceu foi um encontro entre estudiosos de comunicação e de ciência política, crítica literária e arte, propiciado pelo Conselho Latino-americano de Ciên¬cias Sociais (Clacso), em Buenos Aires, num momento muito rico de retorno da Argentina à democracia.

E então começam a se desenvolver as ideias que vão aparecer em seu livro de 1987, Dos meios às mediações.

Essas ideias começaram sete anos antes. Eu tinha ficado por um ano e meio naquela pequena universidade para onde fora em 1973. Então a Universidad del Valle, a mais avançada da Colômbia, em Cali, me convidou para que eu fundasse um departamento de ciências da comunicação. Criei um departamento no qual estavam as ciências sociais, a economia, a sociologia, a ciência política e reuni alguns dos melhores sociólogos, politólogos, historiadores que havia no país. Armamos um plano de estudos no qual as ciências sociais iriam pensar, pesquisar os meios, os processos e as práticas de comunicação. Fiz isso por cima de todas as escolas de comunicação, que eram as de jornalismo, publicidade e relações públicas, o que as colocou em rota de colisão comigo e pôs em crise o Ministério da Educação. Isso porque o diretor da instituição, que dentro do ministério era responsável pela aprovação dos planos de estudos, se encantou com o projeto e decidiu defendê-lo. E aprovaram o plano de estudos! Quero dizer que a segunda “cara” desse departamento foi muito importante, porque a imprensa em Cali era muito ruim, e então atendi os alunos, que me pediram cursos de música e cinema. Cali era a cidade da salsa, e fazia e segue fazendo filmes! Quase metade dos alunos estudava no conservatório de música e o que interessava às pes¬soas era rádio, que tem a ver com música e com realidades populares, e cinema. Fiz, assim, uma composição tão explosiva que na primeira reunião, em Lima, para a criação da Alaic, em que eu era um dos três conferencistas convidados, junto com um chileno e um peruano, quase me lincham. Na verdade, eu passei 10 anos na Colômbia muito ilhado. Eu vinha ao Brasil, ia à Argentina, ao México, aos Estados Unidos, a Barcelona, mas na Colômbia ninguém queria saber nada de mim. Fizeram-me uma guerra.

Quando foi seu primeiro contato com a América Latina?

Em 1963, quando eu era professor de filosofia na Espanha, fui à Colômbia num programa de intercâmbio de professores, e lá entrei em contato com aqueles anos loucos, divinos, tempo da teologia da libertação etc. Era muito forte o debate cristão-marxista na Colômbia, aliás tendência da igreja em toda a América Latina, e me encarregam de uma fundação cristã, mas para criar uma revista de debates. Então eu vivi o processo de Camilo Torres, a discussão da guerrilha, o debate na universidade nacional, traduzimos textos de [Louis] Althusser etc.

Mas por que um espanhol formado em filosofia se deixou seduzir pela Colômbia e pela América Latina?

Primeiro, o franquismo era horrível, muito triste, excessivamente estreito. Eu nasci e vivi em Ávila, um povoado pequeno junto a Madri, e tive a sorte de ter meus amigos desde a infância por lá. E esse meu grupo importava discos da América Latina, era ligado nessa música muito parecida à andaluza, e que era afinal a nossa música, porque o franquismo utilizou o folclore andaluz para convertê–lo na música da Espanha. No começo dos anos 1960, eu estava esperando uma bolsa para doutorado em Paris, quando soube que estavam pedindo professores de filosofia na Colômbia. Fui. Fiquei por cinco anos, vivi a aventura apaixonante de criar um espaço de debate cristão-marxista na universidade.

Mas voltando à teoria…

Só para lembrar, a segunda abordagem da comunicação entre nós é a versão latino-americana do que nos vinha dos Estados Unidos e da Europa ou o funcionalismo dos Estados Unidos traduzido em funcionalismo marxista. Há um texto famoso de Eliseo Verón que se chama O funcionalismo marxista. Mas podemos voltar a Dos meios às mediações.

No livro há um esforço para ir buscar lá no começo do século XX os fundamentos da radionovela, do cinema latino-americano. Como se processa esse diálogo entre teoria e história da comunicação?

Foi ao escrever a introdução para a quinta edição que percebi que fiz esse livro para as ciências sociais. Ou seja, a comunicação estava tomando uma tal envergadura que ia se tornar algo central no mundo e eu queria transformar os estudos de comunicação. Na América Latina tinha sido passada uma ideia demasiado técnica do que é comunicação. No livro situo o grande debate sobre a cultura popular, depois mostro como se estudou isso e, na terceira parte, falo da América Latina na história política da comunicação “popular”. Ou seja, como reagiram os populismos históricos, sob Getúlio Vargas, Perón, Cárdenas etc. Estes, sim, foram capazes de perceber o potencial de criação, à sua maneira, de cidadania com as massas urbanas.

Como sua teoria avança para dar conta do conceito de comunicação depois dos anos 1990?

As ideias do livro começam a funcionar entre os alunos com uma pesquisa que eu coordeno no final dos anos 1980 sobre a telenovela em toda a América Latina. Fui ao México, Peru, Chile, Argentina e Brasil. Li um montão de livros do Brasil. Aliás, pediram-me e fiz um balanço trabalhoso que apresentei no IV Intercom com o título “O que os estudos de comunicação na América Latina devem às ciências sociais brasileiras”. E é muito o que devem a Octavio Ianni, a Milton Santos, a Renato Ortiz, a Roberto da Matta, à coleção O Nacional e o Popular na Cultura Brasileira, de vários autores… Mas essa pesquisa a que me refiro é a que torna explícita a maneira como os estudiosos de comunicação latino-americanos leram meu livro. Ou seja, leram desde o descobrimento do sujeito, do ator do processo, que é o receptor. Ou seja, contra a visão positivista, a descoberta era que o receptor reagia!

E aí, quando Immacolata vai para a casa do receptor de novela, ela leva seu trabalho por essa mesma via no Brasil.

Immacolata foi a pessoa que instaurou no Brasil a perspectiva do estudo das mediações para poder entender o processo inteiro. Já não se tratava do “por um lado, a política…”, “por outro lado, a audiência”, não, podíamos pensar tudo junto. Esse aporte é um feito: a investigação da telenovela aproveita meu aporte começando a atribuir valor à figura do sujeito. O sujeito da comunicação não é o meio, mas a relação. Importante não é o que diz o meio, mas o que fazem as pessoas com o que diz o meio, com o que elas veem, ouvem, leem… Esta é a mudança. E isso foi o que realmente produzi, o que propus. A telenovela vai ser ao mesmo tempo como que a demonstração da minha teoria – está lá a importância da cultura popular, dos formatos populares, dos gêneros populares para entender os meios, entender a comunicação – e a via para que se comece a estudar o contexto local, quando para aquele marxismo catequético a ideologia era a mesma na Europa, nos Estados Unidos ou na América Latina.

No trânsito dos anos 1990 ao presente, queria saber da crítica de seus amigos no sentido de que talvez já fosse hora de retornar “das mediações aos meios”.

Essa crítica de dois amigos eu respondi no prefácio à quinta edição.

Gosto particularmente neste prefácio de seu mapa das mediações e deste trecho [respectivamente páginas 16 e 14]: “Mais do que substituí-la [a política], a mediação televisiva ou radiofônica passou a constituir, a fazer parte da trama dos discursos e da própria ação política”.

Que proponho com o mapa? Eu sei que os meios estão tendo um protagonismo cada vez maior. A televisão já não é simplesmente uma ajuda à política, é a própria política, a política se faz na televisão, há muito menos rua para a política. O prefácio saiu originalmente em 1998. Aqui aceito a proposição de meus amigos, dizendo: “a investigação agora já não será sobre as matrizes culturais da comunicação, mas sobre as matrizes comunicativas da cultura […]”. Naturalmente o computador pessoal levava a essa mudança, mas aqui há uma pergunta, um esboço para entender o que eu estava propondo. Digo: “Como assumir então a complexidade social e perceptiva que hoje reveste as tecnologias comunicacionais, seus modos transversais de presença na cotidianidade, desde o trabalho até o jogo, suas intrincadas formas de mediação tanto do conhecimento como da política, sem ceder ao realismo do inevitável produzido pela fascinação tecnológica, e sem deixar-se apanhar na cumplicidade discursiva da modernização neoliberal – racionalizadora do mercado como único princípio organizador da sociedade em seu conjunto – com o saber tecnológico, segundo o qual, esgotado o motor da luta de classes, a história teria encontrado seu substituto nos avatares da informação e comunicação?” Esta é a mudança, para mim. E isto é o que nos situaria no presente.

Graças à tevê a cabo, programas de vários países, sobretudo dos Estados Unidos, são cada vez mais vistos pela classe média brasileira e, imagino, de outros países da América Latina. Em paralelo, há o fenômeno da expansão do acesso à internet. O Brasil tem hoje 65 milhões de pessoas acessando a internet

Quase 35% da população.

O que isso muda na configuração das matrizes comunicativas da cultura?

No meu novo mapa [ver página 12]temos: tempo, espaço, migrações, fluxos. Então as mediações passam a ser transformação do tempo e transformação do espaço a partir de dois grandes eixos, ou seja, migrações e fluxos de imagens. De um lado, grandes migrações de população, como jamais visto. De outro, os fluxos virtuais. Temos que pensá-los conjuntamente. Os fluxos de imagens, a informação, vão do norte ao sul, as migrações vão do sul ao norte. E há a compressão do tempo, a compressão do espaço e é aí que eu recomponho as duas mediações fundamentais hoje: a identidade e a tecnicidade – eu adoto essa palavra não por esnobismo, mas sim porque um antropólogo francês, André Leroi-Gourhan, contemporâneo de Marcel Mauss, forja a ideia de que a técnica entre os “povos primitivos” também é sistema, não apenas um conjunto de ferramentas. Eu ligo tecnicidade ao que está se movendo na direção da identidade. Por exemplo, a quantidade de adolescentes que inventam uma personagem para si mesmos é impressionante. Fiz uma pesquisa em Guadalajara sobre o acesso dos adolescentes à internet e constatei que era enorme a quantidade de meninas de 15 e 16 anos que fabricavam para si uma identidade de homem para escreverem a mulheres da Suécia. As mães quando descobriam diziam “não é minha filha”, não conseguiam acreditar.

É um campo livre de experimentação e invenção.

Sim, o próprio “eu” é o campo de experimentação. Portanto, a questão da identidade cultural hoje está sofrendo, na base da identidade subjetiva, uma transformação gigantesca. Porque os modelos de conduta, os padrões de conduta de que falavam Parson e Piaget não funcionam. Nós, os pais, não somos mais os modelos de nossos filhos, a televisão acabou com isso. Os modelos são os seus contemporâneos: ginastas, cantores, atrizes, jogadores de futebol, esses são os padrões de conduta, são seus pares. Então eu junto em meu mapa tecnicidade e identidade, ponho ritualidade ao lado de cognitividade. Retiro dele as duas mediações que eram mais sociais, institucionalidade e socialidade, para colocar a transformação.

Então, se colocamos seu mapa anterior junto com o novo temos qual foi o trânsito para a transformação ocorrida.

Temos quais são as chaves da mudança. Ela é muito maior do que estamos pensando na comunicação. O filósofo basco Javier Echeverría, em El tercer entorno, um de seus livros mais importantes, afirma que o ser humano habitou durante milhares de séculos um entorno natural. A partir dele conseguiu sobreviver e passar de nômade a sedentário. Depois de centenas ou milhares de séculos, criou a cidade. E a cidade, desde suas formas mais primitivas, é o lugar das instituições políticas e culturais. Esse é o segundo entorno, urbano, ligado às instituições da família, do trabalho, da religião, da política. Hoje estamos assistindo à emergência de um novo entorno que se chama tecnocomunicativo.

Não lhe parece que esse conceito tem parentesco com a noção de bios midiático de Muniz Sodré?

Sim, é isso, a imersão não é pontual, na base do eu ligo, desligo. Assim como estou imerso na natureza e nas instituições, agora estou imerso nesse terceiro entorno. Eu não posso ligar o computador sem saber que sou visto. Vejo, mas sou visto, não há forma de impedir isso.

É um mundo de total visibilidade.

É um mundo onde somos vistos e vemos. E vemos ativamente. Produzimos visibilidade. Construímos visibilidade para nós e outros. A ideia importante então é o “entorno”, o novo ecossistema. Não podemos mais falar de comunicação como um conjunto de meios, e tal como são eles não duram mais 10 anos. É uma mudança de tempo, lembre-se. Passamos do sino do convento que na Idade Média dizia aos camponeses quando deviam levantar, rezar, comer, dormir, ao rádio, tempo da notícia, da radionovela, da música, das dedicatórias aos noivos… E a televisão potencializou mais essa marcação.

E o que é hoje o nosso “sino da igreja”?

Não existe mais. Há uma liberação do tempo e, simultaneamente, uma mobilidade que comprime o tempo – cada vez temos menos tempo. De fato, se o capitalismo não tivesse enlouquecido quando o Muro de Berlim caiu, se tivesse tido um pouco de visão histórica, em vez de produzir a crise em que estamos mergulhados, teria criado um modelo no qual a humanidade trabalharia quatro horas, e não oito. Mas se pôs a produzir dinheiro com dinheiro, sem produzir nada. Então, há uma transformação radical do tempo e do tempo de trabalho.

Mas a ideia de que o tempo de trabalho diminuiria parece morta a essa altura.

Sim, porque a morte é outra. A morte é a saída do mundo do trabalho de milhares. O ideal do capitalismo, enquanto existia o socialismo real, era o pleno emprego. O ideal era incluir, agora não, agora se desconecta e a população que trate de saber como viverá.

Nessa sua análise do encolhimento do trabalho, fica só uma visão pessimista?

No último número de uma revista brasileira [Cult], Zygmunt Bauman cita uma coisa que aprendi diretamente de Gramsci. Ele entende a crise como sendo um tempo em que o velho já se foi, mas o novo não tem forma ainda. Portanto estamos habitando algo para que ninguém nos preparou, segundo minha amiga Hannah Arendt, que é a incerteza. Ninguém no cristianismo nem no marxismo nos ensinou a conviver com a incerteza. Então, eu habito um tempo de profunda incerteza. Não é uma incerteza que me dá o direito de fazer o que tenho vontade porque não sei para onde vai o mundo, e então passo a me dedicar aos grandes prazeres intelectuais, corporais, eróticos, o que seja, porque nada vale a pena. Desconfigurou-se aquilo em que eu acreditava, aquilo que eu cria que sabia. Creio que a minha incerteza é não otimista, mas esperançosa. Sabe como tinha esperança um judeu ateu chamado Walter Benjamin? Sem esperança os judeus não existiriam. Veja o que disse Benjamin: “Não podemos viver sem esperança, mas a esperança só nos é dada pelos desesperados”. Eu vejo cada vez mais desesperados no mundo e daí a minha esperança cresce. Porque são pessoas que, à sua maneira, estão se rebelando, estão inventando.

Como essa sua visão filosófica flui para o campo dos estudos de comunicação?

Percebi que eu só quero pesquisar o que me dê esperança. Temos que pesquisar não só o que permite denunciar, mas o que permite transformar, mesmo em pequena medida. Eu sempre recorro a uma teoria não escrita brasileira, a teoria das brechas, segundo a qual todo muro, por mais maciço que pareça, tem sempre uma brecha que alguém pode aumentar para derrubá-lo. Eu transmito cada vez mais esperança. Cada vez ponho mais paixão no que digo, porque é a única maneira de fazer as pessoas perceberem algum valor no que digo. A paixão é contagiosa, não se deve pedir desculpas pela paixão.

Em termos práticos, que pesquisas suas consideram essa ideia da esperança?

Dois temas. Um é o das transformações tecnológicas. Eu faço uma relação provocadora: García Márquez, quando ganhou o Prêmio Nobel, em seu discurso começou perguntando se os povos que tinham sofrido 100 anos de solidão teriam uma segunda oportunidade sobre a terra. Eu, agora, respondo que sim. Porque aquela cultura que foi desprezada pelos intelectuais da cultura letrada, que é a cultura visual, a cultura oral, sonora e gestual, agora elas entram como cultura pela internet e se juntam no hipertexto. Como disse Manuel Castells, o computador acabou com a separação dos dois lados do cérebro: o lado da razão, da argumentação, e o lado da paixão, da imaginação, que agora estão juntos. A imaginação não é mais um poder dos poetas e dos artistas. Então, viso às novas tecnologias enquanto permitem uma apropriação que, por sua vez, permitem a hibridação, a mestiçagem das culturas cotidianas da maioria com o que era a cultura da pequena elite que tinha a escritura. O segundo tema, as mudanças de sensibilidades das pessoas jovens, aparece no título do livro que estou preparando: Sentidos da técnica e figuras do sensível.

>Jesús Martín-Barbero: Comunidades falsificadas (FSP, 23/08/2009)

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Comunidades falsificadas

Filósofo espanhol diz que a utopia de democracia direta e igualdade total na internet é mentirosa e ameaça minar as práticas de representação e participação políticas reais

RENATO ESSENFELDER
DA REDAÇÃO

Com a emergência de gigantescas redes sociais virtuais, como o Facebook, a internet configura a sua utopia máxima: todos somos iguais. E, se somos todos iguais, não precisamos mais de eleições, pois não precisamos ser representados. Todos nos representamos no espaço democrático da internet.

O raciocínio é tentador, mas, para o filósofo espanhol Jesús Martín-Barbero, é mentiroso -e temerário. “Nunca fomos nem seremos iguais”, ele diz, e na vida cotidiana continuaremos dependendo de mediações para dar conta da complexidade do mundo, seja a mediação de partidos políticos ou a de associações de cidadãos.

Martín-Barbero vê a internet como um dos fatores de desestabilização do mundo hoje, que não pode ser pensado por disciplinas estanques. Mundo, aliás, tomado pela incerteza e pelo medo, que nos faz sonhar com a relação não mediada das comunidades pré-modernas. O filósofo conversou com a Folha durante visita a São Paulo, na semana passada.

FOLHA – Desde 1987, quando o sr. lançou sua obra de maior repercussão [“Dos Meios às Mediações”, ed. UFRJ], até hoje, o que mudou na comunicação e nas ciências sociais?

JESÚS MARTÍN-BARBERO – Estamos em um momento de pensar o conceito de conhecimento como certeza e incerteza. A incerteza intelectual dos modernos se vê hoje atravessada por outra sensação: o medo. A sociedade vive uma espécie de volta ao medo dos pré-modernos, que era o medo da natureza, da insegurança, de uma tormenta, um terremoto. Agora vivemos em uma espécie de mundo que nos atemoriza e desconcerta.
O medo vem, por exemplo, da ecologia: o que vai acontecer com o planeta, o nível do mar vai subir? A natureza voltou a ser um problema hoje, como aos pré-modernos. Depois vem o tema da violência urbana, a insegurança urbana. Por toda cidade que passo, de 20 mil a 20 milhões de habitantes, há esse medo.
Como terceira insegurança, que nos afeta cada vez mais, aparece a vida laboral. Do mundo do trabalho, que foi a grande instituição moderna que deu segurança às pessoas, vamos para um mundo em que o sistema necessita cada vez menos de mão de obra. O mundo do trabalho se desconfigurou como mundo de produção do sentido da vida.

FOLHA – Nesse mundo de incertezas, como se comporta a noção de comunidade? Como ela aparece em redes virtuais como o Facebook?

MARTÍN-BARBERO – Acho que ainda não temos palavras para nomear esse fenômeno. Falamos em rede social, mas o que significa social aí? Apenas uma rede de muita gente. Não necessariamente em sociedade. Há diferenças entre o que foi a comunidade pré-moderna e o que foi o conceito de sociedade moderna.
A comunidade era orgânica, havia muitas ligações entre os seus membros, religiosas, laborais. Renato Ortiz [sociólogo e professor na Universidade Estadual de Campinas] faz uma crítica muito bem feita a um livro famoso de [Benedict] Anderson, que diz que a nação é como uma comunidade imaginada [“Comunidades Imaginadas”, ed. Companhia das Letras], principalmente por jornais e a literatura nacional.
É verdade, são fundamentais para a criação da ideia de nação. Mas Renato Ortiz diz que há muito de verdade e muito de mentira nisso. O que acontece é que, quando a sociedade moderna se viu realmente configurada pelo Estado, pela burocracia do Estado, começou a sonhar novamente com a comunidade. Era uma comunidade imaginada no sentido de querer ter algo de comunidade, e não só de sociedade anônima.
Falar de comunidade para falar da nação moderna é complicado, porque se romperam todos os laços da comunidade pré-moderna. Eu diria que há aí um ponto importante, considerando que no conceito de comunidade há sempre a tentação de devolver-nos a uma certa relação não mediada, presencial. Essa é um pouco a utopia da internet.

FOLHA – Qual utopia?

MARTÍN-BARBERO – A utopia da internet é que já não necessitamos ser representados, a democracia é de todos, somos todos iguais. Mentira. Nunca fomos nem somos nem seremos iguais. E portanto a democracia de todos é mentira. Seguimos necessitando de mediações de representação das diferentes dimensões da vida. Precisamos de partidos políticos ou de uma associação de pais em um colégio, por exemplo.

FOLHA – As comunidades virtuais da atualidade têm pouco das comunidades originais, então?

MARTÍN-BARBERO – Quando começamos a falar de comunidades de leitores, de espectadores de novela, estamos falando de algo que é certo. Uma comunidade formada por gente que gosta do mesmo em um mesmo momento. Se a energia elétrica acaba, toda essa gente cai.
É uma comunidade invisível, mas é real, tão real que é sondável, podemos pesquisá-la e ver como é heterogênea. Comunidade não é homogeneidade. Nesse sentido é muito difícil proibir o uso da expressão “comunidade” para o Facebook. Mas o que me ocorre ao usarmos o termo “comunidade” para esses sites é que nunca a sociedade moderna foi tão distinta da comunidade originária.
O sentido do que entendemos por sociedade mudou. Veja os vizinhos, que eram uma forma de sobrevivência da velha comunidade na sociedade moderna. Hoje, nos apartamentos, ninguém sabe nada do outro. Outra chave: o parentesco. A família extensa sumiu. Hoje, uma família é um casal. O que temos chamado de sociedade está mudando. Estamos numa situação em que o velho morreu e o novo não tem figura ainda, que é a ideia de crise de [Antonio] Gramsci.

FOLHA – A proposta de sites como o Facebook não é exatamente de fazer essa reaproximação?

MARTÍN-BARBERO – Creio que há pessoas no Facebook que, pela primeira vez em suas vidas, se sentem em sociedade. É uma questão importante, mas não podemos esquecer da maneira como nos relacionamos com o Facebook.
Um inglês que passa boa parte de sua vida só, em um pub, com sua grande cerveja, desfruta muito desse modo de vida. Nós, latinos, desfrutamos mais estando juntos.
Evidentemente a relação com o Facebook é distinta. O site é real, mas a maneira como nos relacionamos, como o usamos, é muito distinta. O Facebook não nos iguala. Nos põe em contato, mas nada mais.

FOLHA – De que maneira essas questões devem transformar os meios de comunicação?

MARTÍN-BARBERO – Não sei para onde vamos, mas em muito poucos anos a televisão não terá nada a ver com o que temos hoje. A televisão por programação horária é herdeira do rádio, que foi o primeiro meio que começou a nos organizar a vida cotidiana. Na Idade Média, o campanário era que dizia qual era a hora de levantar, de comer, de trabalhar, de dormir. A rádio foi isso.
A rádio nos foi pautando a vida cotidiana. O noticiário, a radionovela, os espaços de publicidade… Essa relação que os meios tiveram com a vida cotidiana, organizada em função do tempo, a manhã, a tarde, a noite, o fim de semana, as férias, isso vai acabar. Teremos uma oferta de conteúdos. A internet vai reconfigurar a TV imitadora da rádio, a rádio imitadora da imprensa escrita… Creio que vamos para uma mudança muito profunda, porque o que entra em crise é o papel de organização da temporalidade.

FOLHA – A ascensão da internet e da oferta de informação por conteúdos suscita outra questão, ligada à formação do cidadão. Não corremos o risco de que um fã de séries de TV, por exemplo, só busque notícias sobre o tema, alienando-se do que acontece em seu país?

MARTÍN-BARBERO – Antigamente, todos líamos, escutávamos e víamos o mesmo. Isso para mim era muito importante. De certa forma, obrigava que os ricos se informassem do que gostavam os pobres -sempre defendi isso como um aspecto de formação de nação.
Quando lançaram os primeiros aparelhos de gravação de vídeo, disseram-me que isso era uma libertação: as pessoas poderiam selecionar conteúdos.
Mas esse debate já não é possível hoje. Passamos para um entorno comunicativo, as mudanças não são pontuais como antes. A questão não é se eu abro ou não abro o correio. Não quero ser catastrofista, mas o tanto que a internet nos permite ver é proporcional ao tanto que sou visto. Em quanto mais páginas entro, mais gente me vê. É outra relação.
Temos acesso a tantas coisas e tantas línguas que já não sabemos o que queremos. Hoje há tanta informação que é muito difícil saber o que é importante. Mas o problema para mim não é o que vão fazer os meios, mas o que fará o sistema educacional para formar pessoas com capacidade de serem interlocutoras desse entorno; não de um jornal, uma rádio, uma TV, mas desse entorno de informação em que tudo está mesclado. Há muitas coisas a repensar radicalmente.