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Visão medieval de antropólogos deixa índios na penúria (Veja)

04/11/2012 – 09:24

Mato Grosso do Sul

Na crise dos guaranis-caiovás estão envolvidos interesses da Funai, de antropólogos e de ONGs. Ninguém se preocupa com os próprios índios

Leonardo Coutinho
A OUTRA MARGEM - Crianças caiovás brincam na área invadida em Iguatemi. Seus pais deixaram a reserva do outro lado do rio em busca de mais terrasA OUTRA MARGEM – Crianças caiovás brincam na área invadida em Iguatemi. Seus pais deixaram a reserva do outro lado do rio em busca de mais terras (Wilton Junior/Estadão Conteúdo)

O Tribunal Regional Federal da 3ª Região, em São Paulo, tomou uma decisão para abrandar um movimento sem precedentes de homens brancos em nome de um grupo indígena brasileiro. Acatando um pedido da Advocacia-Geral da União, o TRF determinou que os índios guaranis-caiovás podem continuar ocupando as terras da Fazenda Cambará, no município de Iguatemi, em Mato Grosso do Sul. Em uma carta divulgada na internet no dia 10 do mês passado, membros do Conselho Indigenista Missionário (Cimi) condenaram a ordem de despejo dada pela Justiça Federal de Naviraí, em Mato Grosso do Sul, comparando-a a uma “morte coletiva”. Logo se espalhou pelas redes sociais a versão de que os índios iriam cometer um ritualístico suicídio coletivo. Das redes, a solidariedade ganhou as ruas de diversas cidades, onde muitas brasileiras não perderam a chance de protestar de peito aberto diante das câmeras.

O governo agiu rápido, pediu a suspensão da ordem de despejo e exigiu que a Fundação Nacional do Índio (Funai) conclua em um mês o laudo antropológico que serviria como o primeiro passo para a demarcação oficial da terra reclamada pelo Cimi em nome dos índios.

Com o episódio, o Cimi conseguiu mais uma vez aproveitar a ignorância das pessoas das grandes cidades sobre a realidade em Mato Grosso do Sul e, principalmente, sobre quais são as reais necessidades dos índios. As terras indígenas já ocupam 13,2% da área total do país. Salvo raras exceções, a demarcação de reservas não melhorou em nada a vida dos índios. Em alguns casos, o resultado foi até pior. A 148 quilômetros da Fazenda Cambará, no município de Coronel Sapucaia, há uma reserva onde os caiovás dispõem de confortos como escolas e postos de saúde, mas não têm emprego, futuro nem esperança. Ficam entregues à dependência total da Funai e do Cimi, sem a menor chance de sobrepujar sua trágica situação de silvícolas em um mundo tecnológico e industrial. São comuns ali casos de depressão, uso de crack e abuso de álcool. A reserva Boqueirão, próximo a Dourados, abriga caiovás submetidos ao mesmo estado desesperador. Levantamento feito por agentes de saúde locais revelou que 70% das famílias indígenas têm um ou mais membros viciados em crack. “Infelizmente, a vida dos 170 caiovás acampados na fazenda em Iguatemi não melhorará com um simples decreto de demarcação”, diz o antropólogo Edward Luz.

Os caiovás formam o segundo grupo indígena mais populoso do Brasil, atrás apenas dos ticunas, do Amazonas. Segundo o IBGE, há 43 400 membros dessa etnia no país. Outros 41 000 residem no Paraguai. Eles transitam livremente entre os dois países, como parte de sua tradição nômade. Os antropólogos os convenceram de que o nascimento ou o sepultamento de um de seus membros em um pedaço de terra que ocupem enquanto vagam pelo Brasil é o suficiente para considerarem toda a área de sua propriedade. Com base nessa visão absurda, todo o sul de Mato Grosso do Sul teria de ser declarado área indígena – e o resto do Brasil que reze para que os antropólogos não tenham planos de levar os caiovás para outros estados, pois em pouco tempo todo o território brasileiro poderia ser reclamado pelos tutores dos índios.

Em sua percepção medieval do mundo, os religiosos do Cimi alimentam a cabeça dos índios da região com a ideia de que o objetivo deles é unir-se contra os brancos em uma grande “nação guarani”. Ocorre que o território dessa “nação” coincide com a zona mais produtiva do agronegócio em Mato Grosso do Sul. O Cimi e algumas ONGs orientam os índios a invadir propriedades. A Funai também apoia o expansionismo selvagem. Os 170 caiovás acampados na Fazenda Cambará moravam em uma reserva situada do outro lado da margem do Rio Hovy. Em novembro do ano passado, membros dos clãs Pyelito Kue e Mbarakay foram levados pelos religiosos e antropólogos a cruzar o rio e se estabelecer em uma área de 2 hectares. O secretário nacional de Articulação Social da Secretaria-Geral da Presidência da República, Paulo Maldos, visitou os caiovás em Iguatemi um dia antes e deu-lhes a garantia de que o governo federal zelaria pelos seus direitos. Ex-marido da presidente da Funai, Marta Azevedo, Maldos é um conhecido oportunista que não perde a chance de usar a desgraça alheia em favor de suas convicções políticas. “Além de terra, queremos ter condições de plantar e trabalhar, mas isso nem a Funai nem ninguém faz por nós”, diz o cacique caiová Renato de Souza, da aldeia Jaguapiru, em Dourados. Enquanto os índios tiverem a vida manipulada pelos medievalistas do Cimi, pelos ideólogos da Funai e pelas ONGs, seu destino será de sofrimento e penúria.

VEJA

VEJA

Com reportagem de Kalleo Coura

Insensatez (OESP)

JC e-mail 4617, de 05 de Novembro de 2012.

Por Denis Rosenfield

Denis Lerrer Rosenfield é professor de Filosofia na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Artigo publicado no jornal O Estado de São Paulo de hoje (5).

Quando tudo parece já ser conhecido, causa surpresa, se não espanto, observar que ministros e titulares de órgãos do Estado agem à revelia de si mesmos e de decisões maiores do Supremo Tribunal Federal (STF). Refiro-me, em particular, à edição e à suspensão da Portaria 303 da Advocacia-Geral da União (AGU), normatizando as condicionantes do STF relativas ao julgamento do caso da Raposa-Serra do Sol.

Na edição dessa portaria, a AGU nada mais fez do que regulamentar um acórdão do Supremo, seguindo suas determinações. Cumpriu um preceito constitucional. Em nota n.º 24/2012/DENOR/CGU/AGU, ao responder à solicitação da Funai pela revogação dessa Portaria 303, constam, no seu arrazoado, importantes considerações.

O texto da AGU, no inciso 3: “Seu texto segue rigorosamente o que foi determinado pelo STF no julgamento do caso Raposa-Serra do Sol, em 2009, pois é mera reprodução de sua decisão na Petição 3.388/RR”. Trata-se de decisão da mais Alta Corte do País sendo aplicada. É o Estado de Direito em funcionamento.

No inciso 5, frisa que seu principal objetivo, “ao publicar essa Portaria, é a promoção da estabilidade das relações jurídicas”. Observe-se que a segurança jurídica é o objetivo maior. Logo, há um marco a partir do qual os conflitos podem ser equacionados, no estrito cumprimento da lei.

Não obstante essas considerações, a AGU conclui pela suspensão da portaria, considerada tão necessária. A contradição é flagrante. Ela deixa de seguir o que foi fixado pelo STF, não mais se preocupa com a estabilidade jurídica apregoada, dissemina a insegurança jurídica e aumenta os conflitos existentes nessa área. O que era um marco constitucional deixa abruptamente de o ser.

A questão é a seguinte: o que levou a AGU a agir contra si mesma, na verdade, contra o próprio governo? Convém salientar que a suspensão dessa portaria atinge não somente agricultores (familiares, pequenos e médios) e o agronegócio, mas a construção de hidrelétricas, hidrovias e estradas, a mineração e, de modo mais geral, a soberania nacional e a presença das Forças Armadas, em particular o Exército, em todo o território nacional.

Para responder àquela questão é necessário remontar ao Ofício n.º 260/GAB/PRES-FUNAI, assinado por sua presidente, Marta Maria do Amaral Azevedo, e dirigido ao advogado-geral da União, ministro Luís Inácio Adams. Em sua consideração n.º 1 consta: “Em atenção às reivindicações apresentadas pelos povos indígenas e organizações da sociedade civil e considerando os compromissos e esforços do Estado brasileiro para a regulamentação e implementação do direito de consulta dos povos indígenas, previsto na Convenção 169 da OIT, solicito a suspensão temporária dos efeitos da Portaria AGU n.º 303/2012, que foi publicada no DOU de 17/07/2012”.

Posteriormente, em declarações publicadas em jornais, é advogada a suspensão definitiva dessa mesma portaria. Observe-se que uma decisão do Supremo, seguida pela AGU, deveria ser submetida à apreciação e aprovação dos povos indígenas e de organizações da sociedade civil. O STF não seria instância máxima do País na interpretação constitucional das leis, mas deveria ser referendada por outras instâncias. O Supremo deixaria de ser supremo!

Note-se o eufemismo “organizações da sociedade civil” para designar, na verdade, o Conselho Indigenista Missionário (Cimi), órgão da Igreja Católica, o Instituto Socioambiental e outras ONGs indigenistas, nacionais e internacionais, além dos ditos movimentos sociais. Eles se tornariam, então, a instância máxima para a decisão dessas questões. A insensatez é total.

O ofício ainda recorre à Convenção 169 da OIT, como se ela estivesse acima da Constituição nacional e da decisão do STF. De nova conta, nossa mais alta Corte aparece como instância subordinada. Ocorre aqui uma transferência de soberania.

Em sua consideração n.º 2 consta que “tal medida (de suspensão) se justifica em razão da repercussão negativa que a edição da Portaria causou em âmbito nacional e internacional, fato atestado, inclusive, pela Secretaria-Geral da Presidência da República”. Ora, ora! Uma portaria da AGU normatizando uma decisão do Supremo deveria estar condicionada às suas repercussões em ONGs nacionais e estrangeiras, graças às suas influências em certos jornais, revistas e meios de comunicação no País e em escala global. A mensagem é a seguinte: Brasil, não exerça sua soberania e siga essas ONGs e os movimentos sociais.

Mais estarrecedor ainda é o fato de o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, assumir para si essa posição de um órgão de sua pasta, a Funai. Em seu aviso n.º 1744/2012/MJ, de 14/9/2012, endereçado ao advogado-geral da União, é dito ter ele recebido no ministério a presidente da Funai, o ministro substituto da AGU e vários representantes de etnias indígenas, que “solicitaram a revogação da Portaria n.º 303”. Ou seja, órgãos estatais e representantes de algumas etnias apregoam a revogação da portaria, o que significa dizer que a decisão do STF não deve ser normatizada, logo, seguida.

Que o ministro receba grupos com demandas insensatas, pode perfeitamente fazer parte do seu trabalho. Que ele assuma essa insensatez, é algo totalmente diferente. Assim, escreve após ter ouvido as lideranças: “Declarei de próprio punho” que encaminharia à AGU a proposta de “criação de um Grupo de Trabalho composto pelo Ministério da Justiça, AGU, Funai e representantes dos Povos Indígenas com o objetivo de discutir as condicionantes estabelecidas na Portaria n.º 303/2012 e outras formas de viabilização de processos de demarcação de Terras Indígenas, na conformidade com o estabelecido na Constituição Federal”.

Como assim? Agir em conformidade com o estabelecido na Constituição submetendo à consulta uma decisão do Supremo, como se essa Corte não tivesse seguido a nossa Lei Maior? A instância máxima do País tornou-se mínima?

Violência de torcidas organizadas ganha cada vez mais espaço na academia (Jornal da Ciência)

JC e-mail 4577, de 05 de Setembro de 2012.

Clarissa Vasconcellos – Jornal da Ciência

Com a proximidade da Copa do Mundo no Brasil em 2014, a violência das torcidas organizadas ganha foco e atrai o interesse de pesquisadores.

Nas últimas semanas, o noticiário voltou a se encher de notícias relacionadas a conflitos entre torcedores que vêm demonstrando pouco espírito esportivo dentro e fora dos estádios. A recente morte de um torcedor e as brigas entre as torcidas organizadas vêm sendo motivo de debates e sanções. Estudiosos que analisam o fenômeno há décadas, dentro e fora do País, trazem novos dados sobre o problema.

É o caso de Heloísa Reis, pesquisadora e professora da Faculdade de Educação Física (FEF) da Unicamp, que investiga o tema há 17 anos. Uma de suas motivações foi uma experiência pessoal: ex-jogadora de futebol, ela sentiu na pele a hostilidade dos torcedores masculinos, algo muito comum na década de 80. “Minha indignação com aquela violência simbólica fez com que eu tivesse grande interesse em entender a atuação dos torcedores e o que leva eles a xingar os jogadores e brigar entre si”, conta Heloísa ao Jornal da Ciência.

Reconhecida internacionalmente – acaba de voltar de Londres, onde foi convidada para trabalhar com a polícia durante as Olimpíadas -, Heloísa conta que o assunto é um tema social muito relevante, já que, além de ter provocado um elevado número de mortos nos últimos anos, trata-se de uma situação que muitas vezes mobiliza a cidade, especialmente no grande raio que abrange os estádios. “Há uma tensão dos moradores, toda segurança pública fica envolvida e o transporte público é afetado”, enumera.

De acordo com dados divulgados, no dia 30 de agosto, pelo Grupamento Especial de Policiamento em Estádios (Gepe), de um ano para cá, mais de 370 torcedores foram presos no Rio de Janeiro – 83 apenas na semana passada. As causas foram promoção de tumulto, baderna e lesão corporal no caminho ou na volta dos estádios. Além disso, a Polícia Civil fluminense anunciou a criação do Núcleo de Apoio aos Grandes Eventos (Nage), para combater as ações criminosas promovidas por integrantes de torcidas organizadas de clubes de futebol.

Semelhanças e diferenças – Além de estudar a violência no futebol brasileiro, Heloísa já pesquisou o problema em outros países, como a Espanha e a Inglaterra. Em comum, ela afirma que os torcedores violentos de todos os países (incluindo os hooligans, considerados os mais violentos desse grupo de indivíduos) em geral são homens e jovens.

“A questão surge com mais evidência no Reino Unido na década de 80, mas já havia esse tipo de violência no Brasil e na Espanha. Dessa época para cá, podemos verificar também um aumento na idade dos homens, pois cada vez mais a ‘adolescência’ é estendida, para inclusive além dos 30 anos, por exemplo”, relata. Heloísa vê como traços comuns entre os hooligans estrangeiros e brasileiros o fato de serem homens jovens que se satisfazem brigando e correndo risco, utilizando o enfrentamento e o confronto (tanto com torcedores rivais quanto com a polícia) para terem prazer. “Também buscam uma autoafirmação masculina; não à toa guardam a vestimenta do time adversário como troféu de conquista”, completa.

Porém, os países guardam algumas diferenças significativas entre seus torcedores violentos. Uma das principais é que em diversas sociedades mais desenvolvidas o acesso a armas de fogo é difícil, o que diminui drasticamente o número de mortes. “Brasil e Argentina são os países com mais mortes no futebol na América do Sul pelo acesso a armas de fogo. A entrada delas, principalmente nos anos 80, fez com que aumentasse muito o numero de mortes aqui”, conta, lembrando que, em toda história do futebol francês, por exemplo, houve três mortes por violência de torcedores, enquanto no Brasil o número atual é de 69 falecimentos.

Ela também destaca uma diferença entre o “código de conduta” de torcedores europeus e latino-americanos. “Lá, a intenção não é levar o inimigo à morte e sim fazê-lo sofrer”, conta. Outro dado interessante apurado por Heloísa no Brasil, mais especificamente nas torcidas organizadas de São Paulo, é que 85% dos jovens de 15 a 24 anos pesquisados moram com a família, “o que contraria um discurso da mídia de que as famílias precisam voltar aos estádios”, afirma, já que lares estruturados não são garantia para se evitar esse tipo de conflito.

Álcool e violência – Heloísa explica que, como o futebol se tornou um “produto valiosíssimo na economia mundial”, “há um grande interesse de países mais desenvolvidos em ter uma política de prevenção para que se garanta o lazer seguro de qualidade”. Isso passa pelo controle de bebidas alcoólicas nos estádios, de acordo com a pesquisadora.

“Em todos os países onde se fez política de prevenção da violência relacionada a futebol, em algum momento o álcool foi proibido, já que todos esses países verificaram que a maioria das pessoas detidas estava sob efeito do álcool”, informa. Heloísa lamenta que tenha prevalecido, para a Copa de 2014, “o interesse econômico das cervejarias” na chamada Lei da Copa. “Acho temerário, estou muito preocupada”, alerta.

A pesquisadora também se inquieta com o fato de algumas autoridades pensarem que é um exagero se preocupar com torcedores violentos durante a Copa, diante da alegação que não estarão envolvidos torcedores de grandes clubes. Ela relembra os conflitos que aconteceram durante a Copa da Alemanha, em 2006, que geraram inclusive um documentário da rede inglesa BBC.

No dia 30 de agosto, o governo brasileiro divulgou o planejamento estratégico de segurança que será aplicado na Copa do Mundo de 2014, no qual considera os torcedores violentos, tanto nacionais como estrangeiros, como um dos fatores de risco. O plano, publicado no Diário Oficial (http://www.in.gov.br/visualiza/index.jsp?data=30/08/2012&jornal=1&pagina=45&totalArquivos=120), foi elaborado pela Secretaria Extraordinária para a Segurança de Grandes Eventos e inclui todas as ações que serão implementadas para garantir a segurança da competição.

O texto detalha, por exemplo, os responsáveis pela segurança do evento, as medidas já pensadas, os objetivos perseguidos, os recursos investidos, os preparativos, a cooperação com outros países e a interação com as firmas privadas contratadas pela Fifa para a segurança. A instalação de circuitos internos de televisão e a identificação dos torcedores são vistas como algumas medidas de sucesso utilizadas nas competições europeias.

“Por aqui existe um grande risco, especialmente entre embates de Inglaterra e Argentina ou Brasil e Argentina”, pontua Heloísa. Ela acredita que, no caso de jogo entre esses países, o ideal seria deslocar a partida para o Norte ou Nordeste do Brasil, dificultando o acesso. Outra medida de prevenção, observada in loco por ela nas Olimpíadas de Londres, seria realizar um trabalho conjunto com todos os órgãos de segurança nacionais. “Todas as organizações que deveriam prestar algum socorro ou assistência estavam concentradas da mesma sala. Os comandos saíam do mesmo lugar; foi tudo muito orquestrado”, relembra.

“Virão hooligans para o Brasil com certeza. Podem vir menos devido à distância em que se encontra o Brasil, mas virão. Eles se aproveitam do dia do jogo, seja do seu time ou de seu país, para brigar. A competição deles é paralela ao jogo do campo”, conclui.

Livros sobre a violência e as torcidas de futebol

Gol, guerra e gozo: o prazer pode golear a violênciaGol, Guerra E Gozo – o Prazer Pode Golear a Violência

Por Joaquim Z. B. Motta

Casa do Psicólogo, 2005

 

 

 

 

 

A violência e o futebol: dos estudos clássicos aos dias de hoje

Por Maurício Murad

FGV Editora, 2007

Violência nos estádios de futebol: um olhar sobre quem faz a segurança (Universidade do Futebol)

Um estudo consistente sobre a relação entre os organismos de segurança e os eventos esportivos no Brasil

Felipe Leivas Alves* e Méri Rosane Santos da Silva

Resumo

Violência e futebol se confundem enquanto produções relevantes dentro de uma sociedade que vem ganhando noções de complexidade. Esta análise buscou uma abordagem da questão da violência nos estádios, partindo da ideia de se verificar a atuação dos órgãos de segurança pública em tais espetáculos e a relação estabelecida entre esses e os torcedores envolvidos em tal processo. Na busca por elementos contribuintes no debate, foram utilizados diários de campo e entrevistas com sujeitos responsáveis pela segurança nos estádios. Diante dos elementos emergentes da pesquisa, foi possível perceber a relação existente entre os órgãos públicos de segurança e os espetáculos de futebol, suas formas de lidar com o fenômeno da violência, bem como se dá a noção de violência com a qual trabalham esses organismos.

 

Introdução

Pensar o fenômeno do futebol atual é analisá-lo diante de diversas possibilidades. A partir das temáticas que emergiram com o decorrer do desenvolvimento desse esporte, a questão da violência nos estádios surge como elemento constituinte nesse processo. Como não encontramos nas referências pesquisadas nenhum estudo que discutisse a questão da violência no futebol na perspectiva dos organismos de segurança, essa temática se fez importante de ser analisada.

Sendo assim, propõe-se um estudo que possa contribuir no sentido de acrescentar informações, acredita-se, incomuns quando o assunto da violência em estádios de futebol é debatido. Para isso, se pretendeu analisar a temática, tomando como objeto de análise os organismos de segurança pública envolvidos no processo, invertendo a lógica presente na maioria dos estudos que tratam sobre esse tema, os quais apresentam as torcidas como foco de pesquisas que abordam a violência no futebol.

Para isso, se apresenta uma análise que tem como objetivo norteador verificar a relação dos órgãos de segurança pública com a temática da violência nos estádios de futebol, buscando elementos que indiquem como se dá a organização de tais organismos, a forma como atuam e a partir de que pressupostos trabalham no sentido de abordar essa questão.

Trabalhar com a ideia de analisar a violência nos estádio de futebol nem sempre apareceu como uma de minhas prioridades na abordagem que possuo com o esporte. Intencionado a desenvolver um trabalho mais voltado para questões técnicas do desporto, a temática do trabalho apareceu como uma oportunidade de desenvolver questões pertinentes ao campo de atuação ao qual pertenço, mas que nem sempre surgem como relevantes, mesmo que possuam relação com as atividades presentes no meu cotidiano.

Interessante foi perceber que, no decorrer da pesquisa, acaba-se deparando com o surgimento de diversos elementos, antes nunca imaginados, em uma partida de futebol. Quando apresentado ao campo de estudo, percebeu-se que elementos imaginados previamente, os quais havia suspeitas que fossem surgir, acabaram por não brotar ou tomaram outras proporções, da mesma forma que outros surgiram de forma surpreendente no decorrer da análise. Nesse sentido, foi importante a realização deste estudo no momento em que se pode confrontar ideias que pareciam estar em um completo estado de conformidade, mas no instante em que se procurou uma abordagem de suas aplicações, surgiram discussões relevantes com relação aos organismos de segurança nos jogos de futebol.

Para que se pudessem buscar elementos contribuintes no debate sobre a questão, alguns procedimentos metodológicos foram tomados. Como se tratou de uma análise qualitativa, que se interessou na busca por dados para posterior análise, foram utilizados dois instrumentos principais de coleta dos dados obtidos. Com o objetivo de levantar as informações relevantes presentes nos ambientes investigados, utilizou-se a ferramenta do Diário de Campo, onde foram feitos os registros de 11 partidas do Campeonato Gaúcho da Segunda Divisão de 2009, que aconteceram no estádio Aldo Dapuzzo, pertencente ao Sport Club São Paulo e no estádio Arthur Lawson, de propriedade do Sport Club Rio Grande. Tais observações e registros preocuparam-se, em suma, em relatar a organização dos órgãos de segurança envolvidos nos jogos, sua atuação no espetáculo, bem como nos fatos que pudessem contribuir na análise da pesquisa.

Além da confecção do Diário de Campo, foram utilizadas entrevistas semi-estruturadas com representantes dos organismos de segurança envolvidos nos jogos de futebol, sendo um entrevistado por parte da Brigada Militar e outro do Corpo de Bombeiros. A definição das pessoas para a realização das entrevistas foi realizada pelos próprios órgãos de segurança, tendo sido apenas solicitada a entrevista com os organismos e não com determinados sujeitos de tais instituições.

Ainda sobre o Diário de Campo, como atividade inédita para esse pesquisador, algumas dificuldades foram enfrentadas na realização de tal tarefa. Como o estádio de futebol é um ambiente rico, que proporciona uma gama grande de elementos que acontecem a todo instante, foi difícil estar presente nos quatro cantos ao mesmo tempo. Se fosse possível, convidaria um auxiliar, para que não se perdesse tudo o que acontece nos 90 minutos de cada jogo.

Cabe salientar que, no decorrer da análise dos dados obtidos, aqueles referentes ao Diário de Campo acabaram por não serem utilizados na discussão dos elementos alcançados. Isso ocorreu pelo fato de não haverem nos registros em campo, pontos que pudessem demonstrar relevância nas discussões apresentadas no texto.

Portanto, com o intuito de verificar essa relação existente entre organismos de segurança e espetáculos de futebol, foi necessária a verificação de diversas questões envolvidas nesse processo. Nesse sentido, é que se propõe um debate de três temáticas presentes no tema proposto: a primeira se refere ao futebol moderno e seu envolvimento com as questões da violência, bem como um panorama sobre o futebol brasileiro, aproximando as questões estudadas com o objeto de análise; a segunda dirá respeito aos órgãos de segurança envolvidos na realização de uma partida oficial de futebol, buscando desenvolver uma visão histórica e conceitual dessas instituições e, por fim, far-se-á a discussão dos dados coletados diante do que foi apreendido no decorrer da pesquisa.

Localizando o futebol profissional moderno

Falar sobre o fenômeno futebol nos tempos atuais é pensar em uma atividade com ares de complexidade. Deixar de associar esse desporto com outras questões presentes em nossa sociedade já não é algo distante de nosso cotidiano. Portanto, discutiremos o futebol profissional moderno visto sob o ângulo da atuação dos organismos de segurança nos espetáculos de futebol.

É sabido, que a origem do futebol moderno remonta à Inglaterra do século XIX. O processo de transformação do jogo em esporte culminou em uma série de mudanças na maneira de se praticar o agora desporto, como a criação de regras mais rígidas, a sistematização das funções dentro do campo de jogo etc. Mas, passando a discussão para o foco principal deste trabalho, apontamos a criação da Fifa (Federation Internationale de Football Association) como um marco importante nos rumos do futebol moderno.

Hoje, se sabe que a Fifa possui um papel centralizador nas mais variadas questões relativas à futebol profissional, estabelecendo padrões que são “adquiridos” em todos os lugares do globo em que se pratique futebol. Outra característica importante da instituição é a sua segmentação por todas as partes do globo por meio de federações nacionais, sendo que essas, por sua vez, apresentam atuação pautada sob as diretrizes da Fifa. Além disso, organiza eventos de grande visibilidade mundial, como a Copa do Mundo, que hoje é vista não só como um acontecimento reduzido somente à disputa esportiva, mas também como um tempo/espaço para oportunidades de negócio, como afirma Heloisa dos Reis Brunhs, em seu texto “Relação entre futebol moderno e Sociedade: Uma análise histórico-social a partir da teoria do processo civilizador”, em que diz:

Em torno não só do futebol, mas também da realização da Copa do Mundo de Futebol, criou-se um mundo do negócio milionário e que atrai os mais diferentes setores, como, por exemplo, o turismo, a indústria têxtil e de calçados, – particularmente de materiais esportivos, além da criação de novos profissionais, todos esportivos – os empresários, advogados, juízes, economistas, gestores e dirigentes (2005. p, 6).

Nesse sentido, buscando uma vinculação com o objeto de estudo deste artigo que trata das questões referentes à órgãos de segurança pública e espetáculos de futebol, vislumbro uma discussão em que se possa associar a unidade Fifa como mentora dos rumos de todo e qualquer campeonato de futebol profissional no mundo e mais precisamente aqui o Campeonato Gaúcho da Segunda Divisão. Quem estabelece os dias dos jogos? Os horários? A organização do espetáculo? Se observarmos a relação macro e “micro” nos jogos pelo mundo, veremos semelhanças que parecem apresentar “padrões”. Jogos geralmente às quartas e quintas, ou aos sábados o domingos, nas tardes e noites, tudo isso “estabelecido” informalmente, mas que parece virar uma verdade para todos os “ramos” de futebol profissional no mundo.

Porém, pensar o futebol desvinculado da sociedade em que está inserido já não parece ser mais uma opção possível, e nesse sentido é que tais “designações” para os dias de jogos acabam por modificar o panorama de um lugar. Pela proporção dos espetáculos de futebol e por sua importância dentro do contexto social atual, as instituições de segurança pública passaram a ter papel importante nesse processo. E nesse contexto é que a centralidade das determinações da Fifa nem sempre vai de encontro às possibilidades dos locais em que se veja futebol profissional, pois não considera as peculiaridades de cada lugar e as possibilidades de cada ambiente. Com isso, pensar o futebol de hoje é vê-lo com um olhar de complexidade, pois além de tratar de questões técnicas de campo ele atinge também setores da vida social-cultural-econômica.

Outros pontos que pode contribuir nessa discussão é o papel da mídia na “venda” do futebol profissional como produto e espetáculo. Veículo cada vez mais dotado de legitimidade e confiança dentro de nossa sociedade possui força em promover qualquer fato que lhe pareça oportuno e rentável.

Aproximando nossa discussão sobre órgãos de segurança e futebol nos estádios, abordemos aqui como a mídia contribui na ideia de transformar um “simples jogos de bola” em algo monumental. A partir do momento em que ela percebeu o quanto pode ser favorável financeiramente esse fenômeno, os veículos de comunicação passaram a explorar diariamente tudo aquilo que “cheire” a futebol. A maioria dos canais de TV reserva nem que seja um comentário sobre futebol profissional, sem falar naqueles que o exploram 24 horas por dia.

Partindo dessa ideia é que percebemos o quanto a mídia tende a vender os jogos de futebol e criar uma necessidade no torcedor de que esse se sinta tentado a investir nesse produto. Ela promove e vende o espetáculo ao mesmo tempo, pois “convida” o torcedor a ir ao estádio, mas também oferece opções para aqueles que fiquem em casa.

Nesse sentido, é que, muitas vezes, na tentativa de engrandecer um jogo de futebol, as organizações midiáticas acabam promovendo algo que “teoricamente” não existe. Constantemente tratam o jogo com expressões de guerra, com ares de uma batalha e que assim o torcedor seria mais um guerreiro dentro do estádio a vencer esse “duelo”. Mas nem sempre esse discurso contribui em um estado de pacificação no ambiente de jogo, transformando um espetáculo em, aí sim, verdadeiros campos de batalha entre torcedores.
Ainda assim, a mídia possui papel “catalisador” na apreciação do espetáculo, promovendo e explorando-o, seja da maneira que for, mas vendendo a ideia ao torcedor da “importância” de ser um agente fundamental nesse processo.

Notas sobre o futebol profissional do Brasil

Falar sobre o futebol brasileiro sob o ponto de vista das diversidades culturais que um país continental como o nosso apresenta nem sempre parece uma das ideias mais fáceis de realizar, contudo, faz-se necessário abordar neste trabalho noções sobre o campo de pesquisa observado. Nesse caminho, será apresentado neste espaço um panorama daquilo que é vivenciado principalmente em termos de futebol profissional no Brasil, seus órgãos de comando, competições etc.

De maneira a iniciar a discussão, se faz necessário realizar uma abordagem de âmbito nacional a respeito do assunto referido anteriormente. Sobre esse aspecto, ressalta-se a presença da Confederação Brasileira de Futebol – CBF , como entidade encarregada pela grande maioria das ações referentes ao futebol profissional no Brasil. Entidade ligada e subordinada à Federação Internacional de Futebol e Associados – Fifa é ela quem, por exemplo, organiza os Campeonatos Brasileiros, desde a Série A até a D, como também a Copa do Brasil, essa constituída inclusive por sua versão feminina.

Mas, saindo um pouco da discussão sobre a CBF, passemos a direcionar a atenção em como funcionam essas competições de nível nacional, realizados no país. Conhecida por reunir os clubes de maior representatividade em cada época, a Série A do Campeonato Brasileiro conta com as grandes potências em termos de futebol no país. Atualmente, funciona com 20 clubes sob a forma de disputa de turno e returno, em que cada equipe joga 38 rodadas, 19 em seu estádio e mais 19 fora dele, alternadamente, e o campeão será aquele que somar o maior número de pontos no total. .O Campeonato Brasileiro da Série A apresenta em 2009 um calendário com início previsto em Maio e término em Dezembro. Algo similar pode também ser observado na disputa do Campeonato das Séries B e C também.

Entretanto, quando se observa os dias e horários dos jogos, nota-se uma alternância nos diferentes níveis. Enquanto, por exemplo, na Série A os jogos são realizados, usualmente, às quartas, quintas, sábados e domingos, os jogos da Série B apresentam dias de jogos nas terças, sábados e domingos. Com relação aos horários das partidas, tanto os da Série A, quanto os da Série B, apresentam horários que variam das 16h até jogos realizados às 20h50. Já os da Série C e D apresentam, em sua maioria, jogos entre 16h e 18h.

Já com relação à Copa do Brasil, como o próprio nome sugere, o torneio é disputado em forma de confrontos eliminatórios e não em turno e returno, sendo composto por 64 clubes, contando com a participação de equipes de todos os estados brasileiros. Os horários dos jogos se assemelham aos do Campeonato Brasileiro da Série A. Realizada no primeiro semestre de cada ano, é fortemente conhecida por também proporcionar ao campeão uma vaga para a disputa da Copa Libertadores, já que o Campeonato Brasileiro proporciona vagas para tal competição da mesma forma. Ainda cabe ressaltar a realização, desde 2007, da versão feminina do torneio, que, em 2009, contou com a participação de 32 clubes, sendo disputada no mesmo molde da masculina.

Saindo um pouco da apresentação sobre os campeonatos nacionais, vale comentar a existência de 26 federações estaduais de futebol, todas ligadas à CBF. Sobre essas, que são órgãos responsáveis, entre outras coisas, pelo suporte aos clubes de cada estado, se observa a tarefa principal de organização dos campeonatos estaduais. Esses, atualmente realizados no primeiro semestre de cada ano, normalmente com duração de Janeiro à Maio, salvo algumas exceções, representam uma das formas de disputa que dão a oportunidade de congregar o maior número de clubes profissionais em torno de uma competição regionalizada.

Trazendo a análise para o espaço e tempo de estudo deste trabalho, no estado do Rio Grande do Sul, verifica-se a presença da Federação Gaúcha de Futebol – FGF, como a entidade responsável em organizar tanto o Campeonato Gaúcho da Primeira Divisão quanto o da Segunda Divisão de Futebol Profissional.

Com relação ao Campeonato da Primeira Divisão, no ano de 2009, a competição contou com a presença de 16 clubes, dispostos em dois grupos. A disputa, realizada em dois turnos, promovendo a realização de jogos entre todas as equipes, obteve nessa edição como campeã a equipe do Sport Club Internacional, vencedora de ambos os turnos. No que diz respeito aos dias de jogos em que foram realizadas as partidas, os dias reservados foram quarta, quinta, sábado e domingo, com horários que variavam entre 16h e 22h. Resumidamente, tal campeonato representa uma disputa entre os clubes que, em anos anteriores, apresentaram os melhores desempenhos técnicos no campo de jogo, já que aqueles que não o obtiveram, se encontram disputando o Campeonato Gaúcho da Série B.

Sobre a disputa da Série B do Gaúcho, a mais relevante para este estudo, já que contempla alguns dos objetos de pesquisa deste trabalho, encontramos algumas diferenças se o compararmos ao da Primeira Divisão. No ano de 2009, a participação dos 23 clubes contrasta, por exemplo, com os 26 participantes do ano de 2008, algo não observado na Primeira Divisão, que conta sempre com o mesmo número de clubes. Tal situação se deve basicamente à falta de interesse ou de recursos econômicos de muitos clubes do estado, já que atualmente não existe uma Terceira Divisão, portanto, impossibilitando o acesso por promoção de divisão.
Em 2009, os tais 23 clubes, dentre eles o Sport Club Rio Grande e o Sport Club São Paulo, ambos objetos deste estudo, foram inicialmente distribuídos em três grupos, e por meio de qualificação e posteriores formações de outros grupos dentro da competição, renderam, ao final do campeonato, o acesso à Primeira Divisão do Campeonato Gaúcho para os clubes classificados em primeiro e segundo lugares.

No decorrer da competição, os jogos foram usualmente realizados as quartas, quintas, sábados e domingos, com horários dispostos entre e 20h30. Porém, por muitas vezes se observou mudanças imprevistas nos horários dos jogos. Muitas destas alterações visavam, entre outras razões, a diferenciação do horário de seus jogos em comparação com aqueles televisionados no mesmo momento, ocorrendo, por exemplo, jogos como o do Sport Club São Paulo e Grêmio Atlético Farroupilha, que foi realizado às 11h.

Transitando pelo debate sobre as torcidas

Hoje já não se percebe o fenômeno futebol sem a participação direta e/ou indireta do torcedor nesse processo. Aliada à noção mercadológica atribuída ao evento esportivo atual, criou-se um pensamento de que o papel do espectador nos jogos de futebol é tão vital para todo o espetáculo quanto para os profissionais envolvidos. Nesse panorama é que, principalmente nos períodos mais recentes, o foco dado às discussões sobre torcida/torcedor ganhou mais visibilidade. Diante disso, abordar-se-á, na discussão seguinte, questões presentes na relação torcida, espetáculo esportivo e órgãos de segurança.

Quando se fala em torcida/torcedor nos eventos de futebol, surge como carro chefe da discussão o conceito de torcida organizada. Altamente ligada à ideia de pertencimento ao clube, esses grupos se distinguem dos demais torcedores por possuírem, entre outras características, uma organização própria, geralmente de forma independente do clube; por sua fácil identificação em detrimento dos torcedores considerados “comuns”, no que diz respeito às suas vestimentas, uma vez que se utilizam de roupas próprias do seu grupo, “diferenciando-se” dos demais espectadores no estádio; por se utilizarem da criação de um espaço, dentro da vida urbana, que lhes possibilite uma visibilidade social enquanto grupo organizado, edificando a ideia em meio ao imaginário social de que devem ser vistos como uma categoria presente no futebol profissional, enfim, passaram a ser um dos mais importantes elementos envolvidos no fenômeno do futebol.

Sobre esses grupos, TOLEDO (1996), citando VELHO (1987), aponta para uma noção à cerca de tais organizações:

Estas organizações de torcedores são formadas por meio das paixões individuais que cada um traz consigo por um mesmo time, mas que, em torno de projetos coletivos, adquirem uma dimensão social pautada por interesses comuns. A organização de tais emoções, gostos e preferências, a priori subjetivos, norteia-se por estes projetos capazes de viabilizar, simbólica e materialmente, um sentido às emoções e expectativas individuais (p. 32).

Assumindo que as análises relacionadas às torcidas organizadas ganharam repercussão dentro das temáticas do futebol profissional atual, muito do que se pensa sobre violência nos estádios de futebol acaba por ser atribuído a tais grupos como forma de associar esses conjuntos a todo e qualquer episódio de confronto.

Sobre esse pensamento, podemos observar por meio do que pensa a Brigada Militar, como esses grupos são vistos por tal instituição: “principalmente nas torcidas organizadas (…) a gente se preocupa mais. Geralmente ali, o problema maior tá ali, do que as pessoas mais isoladas. (…) Geralmente sai dali, é uma preocupação com eles”.

Observa-se que independentemente do que aconteça, sempre se espera, por parte das torcidas organizadas, um episódio de conflito. Muito desta concepção emergiu do momento em que houve a associação entre as torcidas organizadas, típicas do Brasil, e os “hooligans”. Sobre esse assunto, TOLEDO (1996) aponta para uma diferenciação entre tais grupos, buscando um distanciamento entre tais:

A concepção de organização grupal das torcidas organizadas também difere daquela estrutura entre os hooligans que, de modo geral, prima pela transgressão deliberada e pelo anonimato (…) As Torcidas Organizadas almejam um lugar dentro do futebol profissional como participantes oficiosos do espetáculo (p,129).

Corroborando com a ideia de Toledo sobre torcida organizada e contrastando com o olhar dos órgãos de segurança sobre tal grupo, podemos observar que, esse grupo de torcedores tem obtido uma abordagem, por meio de exploração midiática e de discussões políticas, que procura problematizar a questão da violência nos jogos de futebol buscando nas torcidas organizadas o objeto fomentador de todo e qualquer tipo de transgressão que ocorra nos espetáculos de futebol. Contrastando com essa ideia, TOLEDO (1996), fala sobre a necessidade de uma reflexão sobre o tema da violência de forma mais ampla:

Longe de pertencerem ao universo estrito dos agrupamentos de torcedores, os fenômenos da transgressão e violência, veiculados de forma dramática por meio do futebol, fazem parte da própria experiência urbana mais ampla vivenciada nas cidades brasileiras: segregação espacial, desigualdades sociais, concepções sobre justiça e a polícia (p. 134).

Outra questão interessante a ser refletida é a percepção concebida pelos órgãos de segurança com relação ao trato com a torcida no estádio. Se analisarmos a fala da Brigada Militar que diz: “o nosso serviço no campo é a segurança da arbitragem e, depois, evitar que haja confronto entre torcedores assim né, qualquer tipo de confronto que haja lá dentro”, verificaremos que, no discurso, a principal função da Brigada Militar está na segurança do árbitro e não nas questões de torcida, contrastando com o que foi indicado anteriormente com relação, por exemplo, das torcidas organizadas, em que havia uma preocupação maior, mas que diante dessa fala já não se pode observar no mesmo sentido citado.

Assim, é que se observa por parte dos órgãos de segurança uma indefinição sobre a sua atuação dentro do espetáculo de futebol como também uma dificuldade em conceituar aquilo que é da torcida ou que papel que ela exerce, pois se nota uma dificuldade tanto em definir a sua preocupação principal dentro do estádio como órgão atuante, assim como definir em que “tipos” de torcedores é que os confrontos possam ocorrer.

Organismos de Segurança: pressupostos e ações

Em tempos atuais, quando se pensa futebol no Brasil, uma das principais preocupações referentes a esse espetáculo tem sido a questão da segurança dentro e fora dos estádios. Fruto de muita discussão científica e política, especialmente a partir da década de 1990, quando casos de conflitos entre torcedores obtiveram maior repercussão pública, esse assunto passou a ser tema da maioria dos debates que envolvem uma partida de futebol.

No âmbito político, inúmeras sansões visando à segurança já foram tomadas por meio de diversas leis e decretos, porém, uma em especial, ganhou maior destaque por sua “pretendida” reformulação no cenário esportivo, em especial no futebol. Tal medida, o Estatuto do Torcedor, surgiu trazendo consigo uma proposta de reestruturação dos locais esportivos, especialmente, os estádios de futebol, buscando uma “assepsia” desses locais, com fins preventivos e de combate à violência. Nesse sentido, analisando a aplicação de tal Estatuto dentro da realidade de nosso futebol, é apontada por RIGO et al (2006) com desconfiança, pois:

Sabemos também que em muitos casos algumas medidas preventivas por parte dos responsáveis pela organização do espetáculo podem evitar trágicos acidentes e muitas cenas de violência Nesse sentido consideramos que mais do que ocorreu durante a sua elaboração é importante que a implementação do EDT aconteça conectada a realidade do mundo futebolístico brasileiro, respeitando as peculiaridades dos clubes, dos jogadores e dos torcedores (p, 236).

Tratar de segurança no futebol é, antes de tudo, debater, analisar, verificar sobre qual espetáculo estamos falando, em qual realidade que ele é aplicado, para que se possa elaborar medidas que busquem, em meio às especificidades do ambiente ao qual elas serão aplicadas, um panorama de controle das atividades referentes ao espetáculo.

No caso do futebol da cidade de Rio Grande (RS), os órgãos de segurança pública envolvidos nos jogos, no campo da conceituação do que é segurança nesses ambientes, deixam entendidos, por meio de suas falas, uma tendência interessante: “a Polícia em geral trabalha em preventivo e ostensivo, ostensivo porque a gente trabalha fardado (…) nos mostrando ao máximo né? (…) e preventivo porque tu está ali para que não aconteça nada, para que a presença do policial faça com que as pessoas se desestimulem a fazer alguma coisa errada(…) para evitar que ocorra um tumulto, para evitar que daqui a pouco tu te estresse lá com um torcedor e queira partir para a paulada com ele. A gente ta lá nesse sentido, preventivo para que não ocorram esses fatos, essa é toda a finalidade do policiamento”.

“Prevenir”, “se mostrar”, essas palavras demonstram uma tendência clara dos órgãos de segurança, na qual a estabilidade nos estádios deve ser atingida por meio, primeiro, de ações concretas, do “corpo a corpo” e, em segundo, pela figura de autoridade que deve ser exposta e “temida” pelas pessoas presentes nas partidas. Diferentemente de como atuam os Bombeiros, que nesse processo se preocupam com as questões estruturais e de material nos estádios , como afirma uma representante desse órgão: “na verdade não há Lei ou Decreto Estadual que regulamente a atuação do Corpo de Bombeiros nos dias de jogos, a função é vistoriar a segurança do Estádio ou Ginásio para liberação do Alvará de Prevenção e Proteção contra incêndios”, o papel da Brigada está mais vinculado à ação de conter e combater as “agitações” presentes no estádio do que propriamente oferecer, atrelada às intenções do Estado, um espetáculo esportivo que ofereça um ambiente organizado e que respeite as pessoas envolvidas .

Sobre a Brigada Militar

Na tentativa de caracterizar essa instituição peculiar ao Estado do Rio Grande do Sul, primeiramente, abordaremos fatos referentes à sua criação e seu estabelecimento como órgão de segurança, para, então, falarmos sobre as questões pertinentes a sua linha de atuação sob uma perspectiva contemporânea.

A Brigada Militar tem sua origem ligada à Revolução Farroupilha, de 1835, que por meio da Lei Provincial nº 7, de 18 de novembro de 1837, instituiu a Força Policial, um órgão responsável por auxiliar na justiça, manter a ordem e a segurança na capital, nos subúrbios e comarcas. Exceto em caso de invasão inimiga, não poderiam deixar de cumprir essas obrigações.

Em 5 de maio de 1841, por meio da determinação do Dr. Saturnino de Souza Oliveira, então presidente da Província de São Pedro do Rio Grande do Sul, ficou estabelecido a mudança da Força Policial para Corpo Policial, na qual se pode observar um destaque maior à tal companhia. Sua principal atuação inicial foi a de agir na tentativa de pacificação da província.

Passado alguns anos atuando como Corpo Policial, podendo ser observada sua participação na Guerra do Paraguai, em 1873, se deu a criação da Força Policial em seu lugar, que manteria algumas características militares anteriores, mas provocaria diversas mudanças em sua estrutura.

Posteriormente, com a Proclamação da República, o estado passou por diferentes adaptações ao novo panorama político e no campo dos órgãos de segurança não foi diferente. Em 1889, há novamente uma substituição na Força Policial, transformando-a em Guarda Cívica do Estado. Em um período curto de tempo, tal corporação obteve diferentes denominações, tais como Corpo Policial, Brigada Policial, Guarda Cívica, mas todas com pequena duração.

Já em 15 de outubro de 1892, a então Guarda Cívica, foi extinta e culminou com a criação da hoje conhecia Brigada Militar, que “nascia” com a função de “zelar pela segurança pública, manutenção da República e do Governo do Estado, fazendo respeitar a ordem e executar as leis” . Apresentando essa denominação, a Brigada esteve presente na Revolução Federalista, Campanha da Legalidade entre outras.

Com isso, por meio de uma busca histórica a respeito do surgimento da Brigada Militar e de suas primeiras ações, chegamos ao momento atual dessa instituição que hoje apresenta inúmeros desdobramentos dentro da sociedade gaúcha e que atua vinculado a estruturas administrativas que a regem dentro de leis, sendo essas capazes de organizar e legitimar a Brigada.

Sob o ponto de vista da Constituição Federal, o item relacionado à segurança Pública estabelece que a Polícia Militar, que, no caso do Rio Grande do Sul, é a Brigada Militar, deve ser vista como um dos órgãos do Estado destinados a preservar a ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio (BRASIL, 1988). Ainda sobre o artigo, no parágrafo quinto, que trata especificamente sobre as polícias militares, em que se enquadra a Brigada, fica estabelecida uma outra função além daquelas vistas anteriormente, que é a de policiamento ostensivo.

Contudo, mesmo com as atribuições previstas na Constituição Federal, a Brigada Militar possui espaço dentro da Constituição Estadual do Rio Grande do Sul. Fica localizada mais precisamente dentro do Capítulo sobre Segurança Pública e aparece nos artigos 129 a 132. Nesses, pode se notar uma diferença com relação á disposição presente na Constituição Federal, que fala sobre as funções das polícias militares, sendo que agora fica incluída a função de policiamento externo de presídios e de polícia judiciária militar.

Pode ser citada ainda a Lei 10.991 do Estado do Rio Grande do Sul, em que são definidas as diretrizes que dispõem sobre a Organização Básica da Brigada, que entre muitas competências e cargos, vincula administrativa e operacionalmente esse órgão à Secretaria de Segurança Pública do estado do RS.

Um fato interessante sobre essa corporação atuante no Rio Grande do Sul é a sua denominação diferenciada com relação aos demais estados da União, mas como vimos em sua perspectiva histórica e como afirma o Regimento Interno da Brigada Militar, “a Brigada Militar, instituição permanente e regular, organizada com base na hierarquia e na disciplina […] é a Polícia Militar do Estado do Rio Grande do Sul”.

Sobre o Corpo de Bombeiros

Quando pensamos em Bombeiros, talvez uma das primeiras e principais funções das quais possamos atribuir a esse órgão seja a de combate aos incêndios, o que não nos induz a nenhuma inverdade, certamente, mas quando se faz uma análise mais minuciosa à respeito, é possível observar que outras incumbências também fazem parte das obrigações do Corpo de Bombeiros. É sobre essa perspectiva que trataremos a discussão a seguir, objetivando uma possível conceituação sobre o que é Corpo de Bombeiros (e aqui se entenda aqueles pertencentes ao Estado do Rio Grande do Sul), percorrendo um pouco de sua história e de sua legitimação enquanto órgão público.

Na Porto Alegre de 1895 era notável a expansão urbana do município, principalmente no que se tratava à questão de serviços, com destaque para os transportes, comércio e iluminação pública. Porém, a cidade em meio a tanto crescimento também via seus problemas aumentados. Incêndios eram cada vez mais difíceis de serem controlados em meio a ruas que se amontoavam umas por cima das outras, nascidas pelo aumento da cidade e também ainda pelo pouco aparato material que continham os corpos de voluntários, que mesmo desorganizados tentavam agir em meio aos acontecimentos, já que a cidade não possuía um serviço oficial para tal fim.

Diante desse panorama é que as Companhias de Seguros instaladas em Porto Alegre, sofrendo economicamente com as queimadas constantes, se organizaram e fundaram um Corpo de Bombeiros, administrando e estruturando-o. A iniciativa das Companhias oficializou o primeiro Corpo de Bombeiros da cidade, com aparelhamento semelhante ao das principais capitais do país na época. Foi então que em 1º de março de 1895 que a ideia de corpo de Bombeiros no Rio Grande do Sul surgiu, inicialmente com o efetivo de 17 funcionários, sendo 10 chamados de “soldados de fogo”, que contavam com um carro de bomba manual puxado por parelhas de cavalos usados no combate à incêndios na cidade de Porto Alegre.

Passados cerca de 40 anos, já era consenso nas Companhias que com os avanços nas exigências de serviços na cidade de Porto Alegre, o aumento de materiais mais modernos exigia mais recursos e, portanto, era vinculada a ideia de que esse serviço de Bombeiros fosse assumido pelo Governo ou Município, o que já era prática comum em grandes cidades. Nesse sentido, é que, em 27 de junho de 1935, o General Flores da Cunha, interventor no Governo do RS, emitiu um decreto transferindo a responsabilidade do corpo de Bombeiros, à época particular, de Porto Alegre à brigada Militar. Tal medida contribuiu no sentido de melhora estrutural dos Bombeiros, que agora usufruiriam dos recursos da Brigada Militar. Mas mesmo com o crescimento técnico obtido após a unificação do CCB (Comando do Corpo de Bombeiros) com a BM, por meio do Decreto 20.277 de 1970, a diretoria dos Bombeiros e seus órgãos foram desativados, transformados em Pelotões Especiais de Socorro, com subordinação às unidades de Policiamento. Durante o período de 1970 a meados de 1974, o que se pode observar foi um sucateamento do CCB.

Entre idas e vindas, depois de decretos e mais decretos, extinções e ressurgimentos dos Bombeiros, em 2002, o CCB foi novamente religado à Brigada Militar, com o objetivo de: “planejar, organizar, fiscalizar, controlar e instruir, é também responsável pelas atividades técnicas de bombeiro em todo o Estado, bem como pela orientação e instrução dos serviços auxiliares de combate a incêndio” . Cabe salientar que em 1997, com a reestruturação da Brigada Militar em 1997, foram criados 8 Comandos Regionais de Bombeiros, sendo que, em Rio Grande/RS (espaço desta pesquisa), se encontra atualmente o 3º Comando Regional de Bombeiros. Hoje, o CCB conta com três divisões principais que são: Divisão Técnica de Prevenção de Incêndio e Investigação, Divisão de Operações e Defesa Civil e Divisão Administrativa.

Agora, trazendo a discussão sob o ponto de vista legal, daquilo que organiza o Corpo de Bombeiros, temos em âmbito nacional, visto na constituição de 1989, uma pequena citação no art. 144, que trata sobre Segurança Pública que considera o Corpo de Bombeiros como um dos órgãos destinados a preservar a ordem social, como também cita no parágrafo 5º do mesmo artigo, ao determinar que cabe aos Bombeiros, além daquilo previsto na lei, a execução de atividades de defesa civil.

Considerando o que diz respeito ao Corpo de Bombeiros no estado do Rio Grande do Sul, observamos que no Decreto 42.871 de 2004, a localização do CCB dentro da Brigada Militar. No art. 3º, inciso II, nota-se que o Comando do Corpo de Bombeiros é compreendido como um órgão de apoio à BM, cabendo, de acordo com a seção II, do capítulo que trata dos comandos regionais e especiais, “administrar e executar as atividades de bombeiros, defesa civil e de segurança pública em seus respectivos espaços de responsabilidades territoriais, e também as atividades administrativo-operacionais dos OPM que lhes são subordinados” .

Futebol e organismos de segurança: uma relação a ser analisada

Aproximando essa discussão com o tópico tratado neste trabalho, que verifica a relação dos órgãos de segurança com os espetáculos de futebol, observar-se-á que surgem elementos interessantes que serão abordados a seguir.

Inicialmente, faz-se necessário discutir o envolvimento dos organismos de segurança em eventos como são os jogos de futebol.

Em termos organizacionais, a Brigada Militar, órgão presente nos dias de jogos, apresenta dois artifícios que norteiam sua atuação nos espetáculos. Um deles são as ordens de serviço, uma espécie de documento prévio que delega quais funções cada Brigada irá executar dentro do estádio, ou fora desse. Desde quem vai cuidar da segurança do árbitro até aqueles que trabalharão nas arquibancadas, tudo é estabelecido dentro desse documento, assim como são definidos, nas escalas, aqueles que serão incumbidos de participarem dos eventos, ou seja, uma forma de estabelecer aqueles brigadeanos que estarão presentes no estádio.

Basicamente, são esses os procedimentos utilizados pela Brigada Militar no que se refere à sua atuação e planejamento com relação aos jogos de futebol na cidade de Rio Grande(RS), como aponta um representante da BM: “todo o tipo de serviço da Brigada funciona assim, nada é feito ao “léu” assim, tem ordem de serviço para tudo, não só para o campo de futebol, qualquer operação”.

Já em termos conceituais, por parte da Brigada, o termo violência aparece vinculado a algo próprio das torcidas, uma tendência quase que “natural” desses grupos, uma vez que é apontado diante de uma fala da Brigada que:”já é diferente se eu sei que vai ter São Paulo e Brasil de Pelotas, aí eu sou obrigado a escalar um efetivo maior, porque eu sei que vai dar problema, porque é um jogo que dá problema, justamente por essa rivalidade que tem Rio Grande e Pelotas”.

Partindo do entendimento dessa fala, se percebe a noção de que a presença de policiamento nos estádios de futebol está mais relacionada à possibilidade de que ocorra algum episódio de violência do que propriamente da necessidade lógica de que esse serviço tenha que ser oferecido em tais ambientes. Interessante é pensar que não são só as partidas de futebol que produzem uma presença massiva de público, ou seja, outros eventos também a mesma perspectiva de concentração de pessoas, mas parece haver, nos estádios de futebol, uma tendência maior de que situações de conflito aconteçam. Sob essa questão, REIS (2005) contribui para essa discussão, afirmando que:

As formas de violência observadas em estádios de futebol são similares às presentes em eventos de multidões, o que respalda a análise de que a violência não é fruto do futebol em si, mas está associada aos eventos futebolísticos por vários fatores, e, em nosso país, podemos dizer que há uma cultura do vínculo de uma relação quase simbiótica entre futebol e violência (p. 117).

Partindo dessa suspeita com relação ao trato com as partidas de futebol e buscando uma análise com relação à atuação dos órgãos de segurança em tal evento, se percebe uma desvalorização de aspectos inerentes ao jogo de futebol, uma vez que esse ambiente produz situações próprias, o público envolvido gera momentos que são únicos daquele espaço/tempo, e que, normalmente são sufocados ou desprezados por quem é incumbido de realizar a segurança nesses lugares. Pensar uma partida de futebol e um show musical, por exemplo, é considerar que diferentes emoções estão envolvidas, das mais variadas motivações com relação ao evento podem ser esperadas, como também, que a configuração espacial também é, no mínimo, diferente.

No sentido de corroborar essas ideias apresentadas, são apresentadas algumas falas que indicam essas tendências: “só que no pequeno evento a gente vai tranquilo, menos efetivo, não é tão preocupante. (…) Tudo o que acontece aqui acontece em outros lugares (…) é a mesma coisa trabalhar aqui, lá no Olímpico, no Beira-Rio”.

Entretanto, do ponto de vista dos órgãos de segurança, independentemente do evento, a atuação deve ser a mesma. Elementos que possam caracterizar um lugar, um estádio, uma torcida não são levados em consideração na atuação da Brigada Militar. Para corroborar com esse pensamento, surge um depoimento do representante da Brigada Militar, afirmando que “a diferença é só em termos de efetivo O serviço é sempre o mesmo,o que nós temos que fazer em um grande evento, nós temos que fazer em um pequeno evento também”.

Não considerar as diferenças é acreditar na padronização de comportamentos. Nesse sentido, se pressupõe que, diante de uma unificação no modo de agir nos espetáculos de futebol por parte dos órgãos de segurança, estaria implícita uma intenção de criar no imaginário dos espectadores presentes nos estádios, uma uniformização no modo de torcer, modelando os sujeitos a um “jeito” de se portarem nas arquibancadas que fosse aceitável dentro de padrões esperados de um cidadão.

Contudo, ao analisarmos uma torcida de futebol, veremos que não há uma universalização no modo de torcer. Cada torcida apresenta configuração própria, influenciada por diferentes questões e locais, portanto, difícil é imaginar em uma uniformização no modo de portar-se e viver o futebol nas arquibancadas.

Ainda, cabe ressaltar uma discussão sobre a relação dos órgãos de segurança públicos em eventos, essencialmente, de cunho privado que são os jogos de futebol profissional. Se por um lado os jogos de futebol envolvem grandes massas, sendo locais com considerável aglomeração de pessoas, e que talvez seja uma justificativa para a presença dos órgãos de segurança nesses ambientes, não se pode conceber esses eventos como de interesse da vida pública, uma vez que possuem caráter privado por serem organizados por instituições particulares. Nesse sentido, considerando a Polícia um órgão de interesse do Estado, sob o ponto de vista lógico, qual a relação desses organismos com eventos produzidos de maneira privada? Sobre essa questão, uma fala retrata bem como os órgãos de segurança pública encaram esse assunto: “mas mesmo assim é missão nossa, é missão constitucional da Polícia Militar atuar em eventos esportivos (…) uma determinação que as Polícias Militares, elas estejam presentes onde haja qualquer tipo de aglomeração de pessoas, de qualquer evento que possa causar algum tumulto, que tenha necessidade, então é permissão constitucional”.

Conclusão

Vistas como umas das principais instituições públicas no nosso Estado, a Brigada Militar e o Corpo de Bombeiros apresentam, em termos históricos, um envolvimento nas questões sociais, que os proporcionaram um status de referência enquanto órgãos de segurança pública. Tanto o é que, somente no estado do Rio Grande do Sul, a Polícia Militar possui uma denominação diferenciada, sendo conhecida como Brigada Militar, visto sua importância dentro da sociedade gaúcha.

Tendo o futebol como um elemento produzido pela nossa sociedade, o qual, inclusive esses órgãos de segurança aparecem envolvidos, apresenta diversas ramificações no interior de nosso cotidiano, percebemos a importância desse desporto nos acontecimentos de nossa comunidade. Pensar que o futebol moderno determina, em meio a suas peculiaridades, como por exemplo, os horários de suas partidas, os funcionamentos de uma cidade, a organização espacial dessa, podemos pensá-lo em uma das atividades que, atualmente, fazem parte dos elementos constituintes de nossa sociedade.

Sobre esse futebol, alguns elementos aparecem como importantes em sua discussão, primeiro, a torcida, elemento, hoje visto como um das partes que constitui o espetáculo do jogo de futebol; em segundo lugar, a preocupação crescente com questões de segurança nos estádios de futebol, tema bastante debatido em tempos atuais; e a relação existente entre os organismos de segurança e os eventos esportivos, no caso, o futebol e seus desdobramentos.

Sob o ponto de vista das discussões sobre as partidas de futebol profissional, identifica-se que a presença da Brigada Militar, no caso do Rio Grande do Sul, e do Corpo de Bombeiros constitui um fato demarcador sobre os órgãos envolvidos nesse evento. Os Bombeiros, como órgão preocupado com questões estruturais e de combate a incêndios, possui uma atribuição mais relacionada à vistoria nos ambientes esportivos, do que propriamente de atuação nesses eventos, função essa, destinada à Brigada. Essa por sua vez, assume papel centralizador nas questões que dizem respeito a tudo que envolve futebol profissional.

No que diz respeito à Brigada, observa-se uma organização baseada em protocolos apenas voltados às questões de atuação, seja por ordem de serviço ou escala, mas que produzem a ideia de não haver uma preocupação em debater questões pertinentes a um jogo de futebol, no que diz respeito a elementos próprios de cada partida. Mesmo com essas intenções de protocolo, pareceu haver uma flexibilização diante de diferentes situações, uma vez que, o discurso apontava para uma organização-padrão diante de certas partidas, contrastando com o observado, já que, em algumas vezes, o número de efetivo não foi condizente com aquele apontado nas falas das pessoas entrevistadas.

Uma outra questão bastante importante nessa análise, centrou-se no papel estabelecido pela Brigada de se preocupar, prioritariamente, com a segurança da arbitragem, definido como função principal desse órgão nas partidas. Fato esse, não observado tanto nos jogos como nas entrevistas, já que, constantemente, foi veiculado uma obrigação da presença da Brigada quando se tratasse de eventos com multidão, bem como um discurso que apontavam as Torcidas Organizadas como o elemento causador de preocupação por parte da Brigada dentro do espetáculo. Enfim, muito do que se observou no discurso produzido por aqueles da Brigada Militar apontavam para uma realidade não observada no ambiente de atuação desse órgão, deixando claro que são várias as preocupações dentro de um jogo de futebol, mesmo que isso não apareça quando se observa o pensamento dos organismos de segurança.

Diante do que foi refletido, analisado, verificado, dois fatos surgiram como de necessidade para posteriores estudos. Primeiro, fica claro que os órgãos de segurança buscam, por meio de ações baseadas em um modelo pré-estabelecido, uma resposta padrão por parte dos espectadores nas arquibancadas, apontando para um comportamento definido do “torcer”.

Ainda, especula-se a necessidade de abrir um debate sobre a localização de um órgão de utilização pública dentro de um evento prioritariamente privado, sendo necessária a análise de quais argumentos co-relacionam ambos, buscando uma problematização do tema surgido a partir do estudo das questões de órgãos de segurança nas partidas de futebol.

Em suma, o estudo da violência nos espetáculos de futebol passa pela verificação de alguns aspectos constituintes de todo esse processo complexo que é uma partida de futebol. Como elementos incluídos nesse fenômeno, os organismos de segurança apresentam papel importante e decisivo na organização do espetáculo e das pessoas, entretanto, necessitariam de uma maior observação dos elementos presentes nas partidas, bem como de um debate que aproximasse a sua atuação com elementos conceituais, de forma a enxergar nos eventos de futebol algo mais complexo do que pode parecer.

Bibliografia

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*Acadêmico do Curso de Educação Física-Licenciatura da Universidade Federal de Rio Grande-FURG e Treinador da categoria sub-13 do Sport Club Rio Grande/RS. E-mail: felipzzz@hotmail.com

(1) Órgão maior responsável pelo futebol profissional no Brasil, que possui vinculação à FIFA.

(2) Seguindo a ideia de TOLEDO (1996), umas das características dos membros pertencentes às Torcidas Organizadas passa pela idéia existir, nesses grupos, uma congregação de paixões individuais em torno de uma mesma instituição, de maneira que emoções, gostos e preferências expressam-se de forma coletiva.

(3) Para mais acessar: http://www.brigadamilitar.rs.gov.br/museubm/index.html

(4) Aqui se refere a algo aparente ou aquilo para se mostrar.

(5) Para mais acessar em: http://www.brigadamilitar.rs.gov.br/bombeiros/hist-rs.html

(6) Para mais, ver no decreto 42.871, de 04 de fevereiro de 2004 do Governo do Estado do Rio Grande do Sul, que Regula a Lei de Disposição Básica da Brigada Militar.

Heloisa Reis, estudiosa da relação futebol x violência (Universidade do Futebol)

Na entrevista a pesquisadora trata do tema violência no futebol e seus reflexos sociais

Marcelo Iglesias

03/07/2009

Para os apaixonados por futebol, ir aos estádios assistir às partidas é uma experiência única de prazer. No entanto, por conta da violência que se observa em dias de jogos e pelas condições precárias de segurança, de conservação e de serviços que são oferecidas no Brasil, o momento genuíno do torcedor perde muito do seu valor.

Em alguns países em que a violência nos dias de jogos de futebol também era um problema grave, houve alterações nas leis para punir exemplarmente os causadores de episódios de tumulto. Além disso, foram realizadas melhorias nas condições dos estádios para que o público, agora visto como consumidor do espetáculo, pudesse desfrutar daquele momento da melhor maneira possível. Com isso, a própria população passou a enxergar o futebol de forma diferente, e a modalidade ganhou status de grande evento.

“Em países como a Espanha e a Inglaterra, que minimizaram a questão da violência, fizeram-se leis que criaram responsabilidades não apenas para as torcidas e para os torcedores, mas também para os dirigentes, técnicos e jogadores que façam declarações provocativas”, contou Heloisa Reis, professora assistente da Universidade Estadual de Campinas, graduada, mestra e doutora em Educação Física, atuando com ênfase em Sociologia do Esporte, Lazer e Pedagogia do Esporte, em entrevista exclusiva à Universidade do Futebol.

Pensando no problema sério que se tornou a violência entre torcedores, dentro, no entorno e no caminho para os estádios, e na maneira como outros países fizeram para minimizar os casos de violência em dias de jogos, Heloisa Reis desenvolveu um estudo sobre o tema comparando o Brasil com a Espanha.

Durante a entrevista, ela falou sobre as conclusões dessa pesquisa, além de expor a sua opinião sobre algumas medidas governamentais brasileiras que visam a redução da violência nos estádios, como a proibição da venda de bebidas alcoólicas. A pesquisadora também se posicionou em relação à preparação do Brasil para a Copa do Mundo de 2014.

Universidade do Futebol – Quais são as raízes da violência no futebol brasileiro?

Heloisa Reis – Elas estão centradas em dois focos: um macroestrutural e um microestrutural. Esse, eu chamo de ambiente do futebol e aquilo que está relacionado à infraestrutura dos estádios. Os países que montaram uma política de prevenção à violência com sucesso tomaram como principio básico a melhoria das estruturas dos locais de jogo e da organização do espetáculo.

Nessa atmosfera, alguns aspectos que mais têm relação com a violência são a venda dos ingressos, a maneira como os torcedores são conduzidos para dentro dos estádios e a sua abertura com grande antecedência. Seria interessante oferecer partidas preliminares para estimular os torcedores a entrarem antes, além da comercialização de ingressos de maneira mais eficiente.

Incluo nessas questões microestruturais, mas que também fazem parte das macroestruturais, um grupo de agentes de segurança especializados, que entendam mais a problemática da violência e conheçam o público de futebol, tratando-o como gente, e não como animais.

No entanto, quando se fala em raízes, temos que considerar mais a questão macroestrutural. Nós ainda vivemos em uma sociedade em que a violência é predominante em várias esferas. Sendo assim, tem-se o uso abusivo de armas de fogo, o que tem uma relação com o crescimento de homicídios no futebol.

Mais do que isso, as condições de moradia são precárias, a juventude está ociosa e a qualidade das escolas é muito baixa. Apesar de nos últimos anos ter-se aberto mais o acesso da população à escola, a qualidade do ensino caiu muito.

Essa questão da escolaridade de baixa qualidade desestimula os jovens ao estudo e faz com que eles não tenham projetos de vida em sociedade, o que os leva a procurar os seus iguais em grupos em que as maneiras de expressar, via de regra, são pela violência.

Outro ponto que deve ser destacado nessa questão das raízes é a exacerbação dos valores de masculinidade expressos por meio do futebol e por meio do esporte espetáculo, de modo geral, o que criou a cultura de que o esporte é para os homens, de maneira que, demonstrar nesses ambientes futebolísticos que se é agressivo, violento e forte, passa a ser uma marca distintiva de gênero, de masculinidade. Isso é uma questão mundial, não só brasileira, e que se atribui como a principal raiz da violência relacionada ao futebol.

Universidade do Futebol – Qual o melhor caminho para acabarmos com a violência entre as torcidas? Que medidas devem ser tomadas pelas autoridades?

Heloisa Reis – É importante que se coloque que o problema da violência é muito complexo e que abrange uma série de motivos, raízes e agentes que têm de ser modificados.

Então, a expressão que se poderia utilizar para sermos mais corretos sobre esse assunto é: como fazemos para minimizar os casos de violência que acontecem no futebol? É nessa perspectiva que se trabalha na Europa e que eu trabalho aqui no Brasil.

Acredito que para ocorrer a redução dessa violência, há que se diminuir, também, a impunidade no Brasil. A falta de punição, tanto nas questões relacionadas com a violência no futebol quanto no que se refere aos nossos políticos (a Câmara e o Senado), tem de mudar. Os governantes passam a ser modelos para a juventude. Muitas vezes eu ouvi torcedores dizendo que “os nossos exemplos, os políticos, são corruptos, não são sérios e não fazem o seu papel. Por que estão cobrando de mim que só quero ser respeitado e ter dignidade para assistir a um jogo de futebol?”.

Portanto, tem-se a impunidade como a grande inimiga da diminuição da violência na sociedade como um todo e, particularmente, no futebol. Por que particularmente no futebol? Porque é nesse ambiente que se concentra o maior número de jovens do sexo masculino, grande parte deles com a intenção de se auto-afirmarem, torcendo, sendo agressivos, alimentando a intolerância e as individualidades.

É preciso fazer modificações nas leis para que existam instrumentos legais de punição efetiva para aqueles que cometem crimes ou transgressões graves nos dias de jogos de futebol. Além disso, o Estado deve trabalhar junto às torcidas organizadas, tendo como intermediário a universidade, pois ela possui profissionais competentes e mecanismos para oferecer à população masculina jovem, que se concentra nessas entidades de torcedores, atividades de lazer esportivo de qualidade e oficinas as quais vão tratar das questões mais graves da juventude atual: o uso abusivo de álcool, responsável por parte da violência nos dias de jogos, e o uso de outras drogas não-lícitas, principalmente a maconha, a cocaína e o crack, os quais são usados dentro dos estádios com a permissividade da Polícia Militar.

Portanto, juntamente com as novas leis, há de se realizar campanhas educativas e projetos de desenvolvimento pessoal para esses jovens do sexo masculino, em parceria com as torcidas organizadas (todas elas). Essa é uma questão.

A outra, no âmbito do Estado, do governo, é a urgente retomada dos trabalhos da Comissão Nacional de Prevenção da Violência. Porque ela, que foi sugerida por mim e criada pelo presidente da República em 2004, tem como objetivo reunir os maiores especialistas sobre o tema para propor mudanças na lei, montar um arquivo nacional das ocorrências de violência e sugerir mudanças de curto, médio e longo prazos para prevenção e diminuição da violência nos dias de jogos.

Contudo, na época, essa comissão não foi constituída pelos melhores especialistas, mas sim pelos amigos do ex-ministro Agnelo Queiroz, responsável por indicar os seus membros. Mas, enfim…

Nos anos 2005 e 2006, a comissão foi coordenada por Marco Aurélio Klein, um sociólogo e especialista em marketing esportivo, e conseguiu elaborar um relatório com muitas qualidades, o qual ouviu os torcedores e vários especialistas. Só que esse trabalho está estagnado. Foi feita a primeira fase do projeto proposto e nunca mais a comissão se reuniu. É preciso que isso seja retomado.

Por outro lado, tenho sugerido trabalhos que propõem aos estados que possuem essa problemática mais agravada (São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais e Bahia) que criem comissões estaduais de prevenção da violência, reunindo os seus especialistas para proporem medidas, incluindo nessas discussões os representantes de torcidas organizadas, para que se possa tê-los como aliados na constituição de uma política de prevenção estadual e nacional de prevenção da violência.

Universidade do Futebol – Muitas pessoas acreditam que a extinção das torcidas organizadas resolveria esses problemas. Qual sua opinião sobre isso?

Heloisa Reis – Essa visão é completamente infundada e absurda, porque não são todos os torcedores organizados que brigam e aqueles que cometem os delitos nem sempre são torcedores organizados. Isso já justificaria a questão.

Conceituo as torcidas organizadas como agremiações de torcedores que se reúnem, inicialmente, para torcer por um clube. Essa associação se faz, principalmente, por membros do sexo masculino (93% dos componentes das principais torcidas organizadas de São Paulo são homens), os quais se juntam, em grande parte das vezes, não pura e simplesmente para torcer, mas para que se forme um grupo em que haja pessoas capazes de discutirem a política do clube, a política de esportes, e uma série de outras questões que, principalmente o jovem (entre 15 e 30 anos, os quais constituem o grosso dessas torcidas), não tem outro espaço para debater.

As escolas e as universidades não têm mais os centros acadêmicos desenvolvidos para a discussão dessas questões, e os ambientes de trabalho não são locais onde as pessoas congregam-se para debater sobre as políticas do país.

Acabar com as torcidas organizadas seria extinguir uma das poucas possibilidades de instituição social criada pela própria juventude. Acredito que seria matar uma juventude que está tentando participar do processo político. Além disso, existe o fato de que nem todos os membros são aqueles que brigam. Acho um tremendo equívoco.

Mais do que isso, o Estado perderia uma grande oportunidade de ter alguma influência sobre essas torcidas, as quais deixariam de ser instituições regularizadas. Outra questão que contribui para a minha posição contrária à extinção dessas agremiações é o fato de se saber que aquelas que não são legalizadas, que se auto-intitulam torcidas organizadas, com grupos pequenos de jovens, são, hoje, o maior problema da violência nos dias de jogos. Essas, normalmente, formam-se em bairros muito distantes, onde há enorme carência de políticas públicas de lazer, de educação, de moradia e de emprego. A partir daí, reúnem-se 10 ou 20 jovens que vão em direção aos estádios pelas estações de trem, de metrô e pela rua, intimidando e ameaçando as pessoas ou grupos de outros torcedores.

Esse fato demonstra que extinguir as torcidas organizadas e jogá-las na clandestinidade, junto de muitas outras, tornará o problema algo muito mais complicado para o Estado.

Porém, o meu posicionamento contrário à pura e simples extinção das torcidas organizadas não exclui a necessidade de punir aqueles grupos de torcedores que cometem crimes em dias de jogos ou mesmo as torcidas organizadas que não se prontificarem a colaborar com a política nacional, exigindo, por exemplo, os antecedentes criminais dos seus associados. Na medida em que se admitem pessoas em débito com a sociedade dentro dessas torcidas, elas também estão sendo coniventes com a violência e com a impunidade.

Universidade do Futebol – Você acredita que imprensa, jogadores e dirigentes também têm sua parcela de responsabilidade pela violência no futebol ao incitarem a rivalidade entre os times?

Heloisa Reis – Eles têm uma enorme responsabilidade. O que acontece nas análises da mídia, em geral, é responsabilizar de maneira rápida e leviana apenas as torcidas organizadas.

Eu penso que o coletivo formado pela imprensa, dirigentes, técnicos e demais agentes talvez seja mais responsável pela violência do que as próprias agremiações de torcedores, porque esses grupos pertencem a uma elite que pode até ser distinguida como intelectualizada. Grande parte deles frequentou a universidade, os dirigentes são parte de uma elite social, os próprios jogadores pertencem à elite econômica do país, e teriam que saber melhor a sua responsabilidade e o seu papel quando se dirigem ao público por meio da mídia.

Em países como a Espanha e a Inglaterra, que minimizaram a questão da violência, fizeram-se leis que criaram responsabilidades não apenas para as torcidas e para os torcedores, mas também para os dirigentes, técnicos e jogadores que façam declarações provocativas.

O que vivenciamos no Brasil nos últimos 12 meses em relação à declaração de dirigentes, certamente, na Espanha, teria resultado em cassações. Houve uma grande incitação da violência por parte dos dirigentes brasileiros, por exemplo, nos episódios em que se falou contra ou a favor da existência de 5% ou 10% de torcedores visitantes nos estádios.

De acordo com uma proposta do Ministério Público para tentar diminuir a violência, os dirigentes não poderiam insultar o outro público que recebeu apenas 10% dos ingressos. Esses dirigentes e representantes dos sindicatos dos técnicos e dos jogadores teriam que ser chamados para uma comissão nacional e outra estadual a fim de que se firmassem acordos e termos de ajustes de conduta com o Ministério Público, que é o instrumento legal adequado para que eles também se comprometam a não proferir declarações que incitem a violência. Por outro lado, a legislação também tem que prever multas e penas mais duras para dirigentes, técnicos, jogadores e imprensa quando um desses personagens incitar a violência.

A imprensa é um ator que merece ser responsabilizado em grande parte, porque poderia dar um foco diferente às entrevistas com dirigentes, não os provocando a declarações em que a intolerância ao outro aparece.

Realizei uma vasta pesquisa com os torcedores organizados do estado de São Paulo, e um percentual muito alto deles tem plena convicção de que são incitados à violência pela própria imprensa na maneira como são veiculadas as notícias durante a semana. Ou mesmo porque a principal emissora de TV do país, segundo os próprios torcedores, privilegia um determinado clube paulista na veiculação maior de jogos dessa equipe do que das demais.

As pesquisas inglesas, de Norbert Elias e Eric Dunning, que foram os principais estudos sobre violência nos anos 1980 e 1990, verificaram que a imprensa falada e a escrita têm grande responsabilidade sobre a violência no futebol, principalmente quando a televisão repete muitas vezes cenas de violência ou quando o jornal utiliza palavras bélicas para relatar os fatos ocorridos no futebol.

O que foi feito, em termos de legislação, na Espanha, para minimizar essa questão? O sindicato da imprensa foi chamado por uma comissão e foi elaborado um termo de ajuste de conduta para que não se repetissem cenas de violência em dias de jogos, ou mesmo de invasão de campo. As imagens de brigas não podem ser exibidas mais do que três vezes durante seis segundos por uma mesma emissora de TV, no mesmo dia. Já as invasões de campo não devem ser veiculadas para não incentivar outras pessoas a agirem da mesma maneira.

Na final da Copa do Mundo da Alemanha houve uma invasão de campo, e o Galvão Bueno comentou que nenhuma emissora do mundo estava transmitindo o acontecido, somente a “Globo”. Mal sabia ele que essa é uma política do Conselho da Europa para que não haja incentivo à invasão de campo.

Para quem gosta de ser o centro das atenções e nunca invadiu um campo, as imagens de invasões podem ser um chamariz. Como o principal motivo dessas pessoas é a aparição pelos meios de comunicação, essas mídias não estimulam as invasões dos campos, deixando de mostrar esse tipo de situação.

Universidade do Futebol – Em abril deste ano, foi proibida a venda de bebidas alcoólicas dentro dos estádios. No entanto, um contrato entre a Fifa e a Budweiser fará com que a comercialização seja liberada durante a Copa do Mundo de 2014, no Brasil. O que você pensa sobre a questão? 

Heloísa Reis – É um absurdo! Uma entidade do esporte ditar as regras do que deva e do que não deva ser mudado em um país para que ocorra um evento esportivo é ferir a soberania nacional.

Conseguiram isso com sucesso na Alemanha e estão impondo o mesmo para o Brasil. Encaro como uma questão de desrespeito à legislação e ao povo brasileiro, impondo isso como regra.

Além disso, essa situação demonstra claramente o poder do capital. A parceria da Fifa com uma empresa que só visa lucros e que está pouco preocupada com a saúde da população em qualquer país, porque vende bebida alcoólica e incentiva o seu consumo, acaba sobrepondo-se a uma legislação recém-criada, a qual foi feita a muito custo, com um trabalho enorme do Ministério Público junto à Confederação Brasileira de Futebol.

Na verdade, não foi uma lei que proibiu o consumo e a comercialização de bebidas alcoólicas dentro e nas proximidades dos estádios, mas sim um protocolo de intenções celebrado, em 31 de agosto de 2007, pelo Conselho Nacional de Procuradores Gerais (CTNG) do Ministério Público dos estados e da União, e pela CBF, para jogos sob responsabilidade da confederação brasileira (Copa do Brasil e Campeonato Brasileiro). Para os Estados de São Paulo e Minas Gerais, os respectivos Ministérios Públicos também formaram um termo de ajuste de conduta com as federações locais. O de São Paulo foi feito após a guerra do Pacaembu, em 1995, por iniciativa do promotor público Fernando Capez. Os termos nacional e de Minas Gerais tiveram como base as minhas pesquisas, as quais demonstram que existe forte relação entre o consumo de bebidas alcoólicas e a violência em dias de jogos.

De fato, ainda não existe uma lei proibindo, mas há um termo de ajuste de conduta que a CBF vai deixar de cumprir. Esse termo é recente e pode não ter desdobramentos. O meu grupo de pesquisas, por exemplo, está começando a elaborar um texto para enviar à grande mídia e para esse conselho de procuradores, mostrando que a intervenção da Fifa fere o direito de soberania nacional. Até que ponto um país tem que se curvar a uma instituição internacional?

Tenho plena convicção de que essa submissão se dá por conta do grande poder que o capital tem sobre qualquer outro valor humano em uma sociedade como a nossa, principalmente em relação ao capital periférico, que é o caso brasileiro.

Universidade do Futebol – Uma das medidas para reduzir a violência dentro dos estádios e nos dias de jogos seria termos clássicos com a presença apenas da torcida do time mandante. Qual é sua opinião sobre isso? Qual o impacto sociológico no curto, médio e longo prazos de uma medida como essa? 

Heloísa Reis – Primeiramente, uma medida como essa fere completamente a cultura do futebol. Sempre houve acesso aos ingressos por parte dos torcedores visitantes e, de repente, o Ministério Público vê como inviável garantir a segurança de uma quantidade grande de torcedores visitantes e impõe a restrição de 10% de público.

Isso é uma diminuição significativa na quantidade de pessoas, o que facilita o controle por parte dos agentes públicos de segurança. Só que quando se coloca esses 10% em números de espectadores, ainda é uma quantidade muito grande de torcedores visitantes, pois são entre 3.500 e sete mil lugares dos estádios brasileiros.

Existe uma experiência de sucesso na Espanha, onde se permite, em clássicos, nos maiores estádios do país, como, por exemplo, o do Barcelona, de 300 a 500 torcedores da equipe visitante. Funciona muito bem, porque a polícia nacional espanhola consegue dar proteção para esse número reduzido de torcedores. Então, por um lado, a diminuição do número de público visitante ou a sua inexistência pode facilitar o trabalho das autoridades públicas.

Por outro lado, quando essa iniciativa parte do Ministério Público é grave, pois as próprias autoridades estão decretando a falência da instituição que cuida da segurança pública no estado e no país, dizendo que não há condições de se dar segurança para a população em dias de jogos. Isso é muito grave!

Enquanto medida paliativa pode dar resultado. Deu certo na Espanha.

A mídia, de maneira geral, tem dito que isso acontece na Argentina. É mentira. Estive em contato com pesquisadores desse país há pouco tempo e eles disseram que essa experiência ocorreu em apenas um jogo entre River Plate e Boca Juniors, mas não se repetiu porque a população não admitiu esse tipo de mudança cultural no futebol. No entanto, isso é feito na terceira divisão do futebol argentino, na qual a medida foi bem vista.

Penso que, em vez de se proporem soluções mágicas para um problema complexo, já que isso não dá resultado, deve ser atacado em diversas frentes e por diferentes instituições governamentais. Deveria se tomar mais cuidado e agir com mais cautela ao realizar certos tipos de declarações e propostas, trabalhando mais as questões estruturais com projetos junto às torcidas organizadas para aproximá-las da universidade e mostrar que o Estado está preocupado com a juventude e, por isso, está auxiliando no desenvolvimento dos jovens por meio de propostas de lazer e de oficinas que vão ajudá-los no seu desenvolvimento humano, em um sentido mais positivo.

Isso surtiria muito mais efeito do que inflamar os torcedores, dizendo que eles não poderão mais assistir aos jogos como visitantes.

Universidade do Futebol – Você realizou um estudo comparativo entre a violência nos estádios no Brasil e na Espanha. Qual o resultado desse estudo? É possível traçar um paralelo com outros países, como Inglaterra, por exemplo?

Heloísa Reis – Realizei um estudo aprofundado sobre a Espanha, questionando por que diminuiu a violência por lá. Como houve essa redução? Quais eram as raízes dessa violência?

A pesquisa abordou a Europa de maneira geral, porque as ações tomadas na Espanha foram motivadas por um convênio feito no continente em 1985, o que também serviu de base para o que foi realizado na Inglaterra.

É gritante a diferença entre o que se observa no Brasil e o que se faz na Europa. Isso habita exatamente nas questões sobre as quais conversamos de maneira mais detalhada, que passam por uma legislação específica, muito bem elaborada e detalhada, que fez com que praticamente zerasse a impunidade nesses países. Realmente, as pessoas que cometem atos de violência são punidas e se tornam casos exemplares, o que desmotiva outras pessoas a fazerem o mesmo.

Simultaneamente a esses trâmites legais, houve a remodelação de todos os estádios, de maneira que se deu condições de conforto e segurança a todos os torcedores. Além disso, houve uma mudança radical no que se refere à venda de ingressos, motivando as pessoas a comprarem as entradas por temporada, o que minimizou muitos problemas de conflitos na busca por ingressos. Isso, no Brasil, é um dos fatores que mais gera conflitos: ninguém consegue comprar entradas nas bilheterias oficiais, para conseguir é preciso ficar de cinco a sete horas na fila, e ingressos de estudante acabam muito rápido, entre outros agravantes na situação.

Nesses países da Europa sobre os quais estamos falando, também há uma polícia especializada, altamente qualificada e competente para lidar com o público que vai aos estádios.

Resumidamente, essas mudanças, que são necessárias no Brasil, foram realizadas na Espanha e na Inglaterra, juntamente com campanhas educativas, que lá foram feitas em menor quantidade do que eu acredito que precise ser feito no Brasil, porque, nesses países europeus, a população tem educação pública de qualidade, tem, de fato, direitos de cidadão, o que ainda não conquistamos no Brasil, além de terem instituições públicas que protegem o cidadão. Ou seja: existe, verdadeiramente, cidadania nesses países-modelo; no Brasil, não.

Então, o paralelo que tem que se traçar é: o quanto estamos distantes de resolver esses tipos de problema? Porque, para minimizar a violência em dias de jogos temos que levar em conta pelo menos essas frentes que eu apontei, aliadas às questões estruturais de uma população com melhor nível de instrução, com moradia decente, que tenha projetos de vida, com condições familiares e de emprego adequadas. O que não se observa no Brasil.

Universidade do Futebol – Pela sua experiência no tema violência no futebol e na forma como ele é tratado pelas autoridades, seria possível projetar como o país estará na Copa do Mundo de 2014 nesse quesito?

Heloisa Reis – Se as coisas continuarem da maneira como estão, na Copa de 2014 vai estar tudo muito ruim nesse sentido. Isso me preocupa muito e parece que preocupa só a mim, talvez porque eu tenha uma dimensão maior do problema.

Por um lado, pode ser que não aconteçam grandes casos de violência, porque as cidades-sede poderão ser tomadas pelo Exército Brasileiro, como aconteceu no Pan de 2007, o que irá transmitir para as pessoas que estiverem no Brasil durante esses dias uma sensação de vigilância e de repressão que iniba casos de violência. Essa experiência do Pan do Rio de Janeiro mostrou que o governo brasileiro, quando quer colocar a tropa na rua, consegue inibir a violência.

Por outro lado, esse tipo de policiamento não é o melhor e põe em risco a população por não existir uma polícia especializada. Se houver a vinda dos hooligans ingleses e dos aguante (barra bravas) argentinos, será algo realmente preocupante. Existe um ódio muito grande entre a população desses dois países, em função da Guerra das Malvinas, e temo que elas tomem a Copa do Mundo do Brasil para continuar com um conflito político, que foi essa guerra. Acho muito provável que isso ocorra, porque um dos afazeres desses torcedores ingleses é viajar para outros países e causar tumultos que tomem espaço na mídia. Aliado a isso, os aguante também têm motivação de estar nos meios de comunicação. Acredito que esse encontro pode ser muito perigoso, principalmente nas regiões Sudeste e Sul do Brasil, onde eles devem acontecer.

Por isso, se as nossas autoridades continuarem tratando o problema apenas com medidas paliativas, repressivas e autoritárias, não vamos chegar à Copa do Mundo de 2014 com uma política pública de qualidade como é necessário para se prevenir a violência nos estádios. Mas, no evento em si, como citei, pode ser que se coloque as tropas nas ruas, e isso seja uma tremenda intimidação para a população de um modo geral.

Essa questão também estará aliada ao tratamento que a mídia vai dar para a Copa, o que ainda não foi desenhado. É necessário conscientizar a população brasileira de que essa Copa não foi feita para nós. Esse evento vai ser, como sempre foi, para quem tem mais recursos financeiros, para os detentores do capital, que vão comprar os ingressos com muita antecedência.

Para o brasileiro vão sobrar os jogos que ninguém assiste, mas só para alguns brasileiros também. Não para as torcidas organizadas, não para os menos abastados. É importante deixar claro que esse é um macro-espetáculo esportivo que sempre foi das elites e não vai ser no Brasil que também não ficará nas mãos delas.

Universidade do Futebol – Como você acredita que o trabalho da imagem do atleta e a maneira que ele aparece na mídia podem influenciar a sociedade?

Heloísa Reis – A política da Espanha, por exemplo, demonstrou para o sindicato dos jogadores e para os clubes que é necessária a criação de uma imagem diferenciada do jogador. Não como um semideus, como um rei, como um ídolo intocável. É preciso que esses atletas tenham uma imagem de um ser comum que teve a oportunidade e se esforçou para se tornar um profissional bem-remunerado.

Então os jogadores, ao fazerem parte de um grande clube, precisam criar uma imagem exemplar, não ser uma figura que faça propaganda de bebidas alcoólicas ou de outras drogas lícitas. Uma imagem que está muito mais vinculada aos valores positivos do desenvolvimento humano, pessoas que não usam drogas. É inconcebível pensar um jogador fazendo campanha publicitária de uma marca de cerveja.

Além disso, na medida do possível, os jogadores têm que ficar mais próximos da torcida. Ao final do treino, os atletas dirigem-se aos torcedores que estão assistindo à preparação e, eventualmente, conversam com alguém que os procure. Quando estão em público, são atenciosos com as pessoas que se dirigem a eles de maneira educada para não criar a ilusão de que o atleta é uma estrela intangível, o que acaba fazendo com que as pessoas criem um fanatismo mais perigoso do que se for construída uma imagem de uma pessoa comum que, durante aquele momento da sua vida, está servindo a um grupo de torcedores que tem, nesse jogador, uma grande expectativa de despertar de emoções, de acordo com o que ele possa fazer dentro de campo.

É essencial que os jogadores não se envolvam em acidentes de carro estando bêbados. Na Europa, a pressão em relação a isso é muito grande, ao contrário do que acontece no Brasil. Aqui, o atleta envolve-se em acidentes, mata pessoas por estar dirigindo embriagado, e isso passa a ser uma questão privada, e não uma questão pública, como tem que ser. Ele tem que ser um exemplo, e não alguém que é beneficiado e vive a impunidade por ser uma figura pública.

Universidade do Futebol – Você acredita que a Sociologia pode ser uma ferramenta para que os brasileiros entendam a importância de receber uma Copa do Mundo e para que eles se preparem para acolher os turistas das diferentes partes do planeta? Como a universidade pode ajudar nessa conscientização e como ela pode dialogar com a população brasileira?

Heloisa Reis – A Sociologia é uma das áreas do conhecimento que mais podem contribuir para o entendimento da população sobre o que é esse esporte-espetáculo, o que é esse mega evento, e as razões pelas quais a Copa do Mundo acontecerá no Brasil.

A grande contribuição da universidade será como parte da construção de uma política nacional de prevenção da violência da maneira como tentamos fazer.

No entanto, participamos muito menos do que gostaríamos, pois existe uma resistência do Poder Público para que isso ocorra. Eventualmente, ele nos chama. Não falo só sobre mim, mas vários outros professores universitários já desenvolveram e desenvolvem pesquisas sobre o tema e, mesmo assim, são muito pouco acionados.

Acredito que o nosso papel é veicular, por meio da mídia ou por meio de artigos publicados nos meios de comunicação, os resultados obtidos com todas as pesquisas. Creio que não se pode negar entrevistas, não se pode eximir de falar com a imprensa e divulgar os resultados desses estudos.

A questão também passa pela falta de seriedade, pela falta de respeito com a universidade, o que vem até do próprio Poder Público. Ele poderia levar adiante mais sugestões dadas pelos pesquisadores. Isso é parte das instituições brasileiras, pois, na Espanha, por exemplo, a universidade era a voz mais ouvida na comissão em que se sugeriam propostas legislativas e de implementação de políticas educacionais.

Contudo, acredito que seja parte do caminho a ser seguido. Há pouco tempo, não existiam estudos, não havia o Estatuto do Torcedor, e não havia a comissão de prevenção da violência. Hoje, ela não funciona, mas já existe no papel. É um caminho muito lento, mas algumas coisas estão mudando para melhor. A própria cultura governamental ainda não reconheceu o papel que a universidade pode ter.

Por isso, confio que é super importante, por exemplo, o trabalho da Universidade do Futebol, que desempenha o seu real papel: divulgando novas pesquisas, novas tecnologias, novas visões, novas perspectivas e proporcionando várias coisas interessantes para o futebol e para a educação física, também.

Leia mais:
O cravo da violência
Na Europa, combate à violência ganhou força nos anos 1980
Estatuto do torcedor
A venda de bebidas alcoólicas dentro dos estádios e ginásios
Medidas tomadas pela Uefa para conter a violência
A infra-estrutura dos estádios e a gestão do espetáculo futebolístico
Visão psicológica da violência no esporte
Sociologia explica violência das torcidas
O perfil do torcedor brasileiro

Futebol – A gênese da estupidez (Portal Esportivo)

por http://www.portalesportivo.com.br (sem data; acessado em 4 de setembro de 2012)

Maurício Murad, sociólogo e autor do livro “A violência e o futebol – dos estudos clássicos aos dias hoje”

O sociólogo Maurício Murad, Coordenador do Núcleo de Sociologia do Futebol da Uerj, é um dos pioneiros nos estudos do impacto que o futebol pode ter na sociedade – ou o contrário. Com vários artigos, capítulos de livros e cinco obras completas publicadas, Murad acaba de lançar pela Fundação Getúlio Vargas, o livro “A violência e o futebol – dos estudos clássicos aos dias de hoje. A obra traça um panorama da relação histórica entre violência e futebol.

Como se deu a relação entre violência e futebol ao longo dos anos?

Maurício Murad “O futebol acaba expressando a violência geral da sociedade. Então, aumentando a violência geral na sociedade, ela tende a aumentar também no futebol. É o que aconteceu no futebol brasileiro a partir dos anos 1980. Também há situações específicas da realidade brasileira que aumentaram a violência. Essas situações são basicamente duas: corrupção e impunidade. A corrupção principalmente policial e dos órgãos da Justiça, que nós temos acompanhado nos jornais. Outro fator que complementa a corrupção, porque um é irmão gêmeo do outro, é a impunidade. Também, à partir de 1996, aumentou o tráfico de drogas entre as torcidas. A polícia sabia, isso foi avisado e muito pouco foi feito para conter”.

Em que nível aumentou a violência no futebol brasileiro a partir dos anos 1980?

Maurício Murad – “As torcidas organizadas começaram no Brasil nos anos de 1940. A primeira é do São Paulo, em 1940, e no Rio de Janeiro é a “Charanga Rubro-Negra”, de 1942. Mas as torcidas entre o início dos anos 1940 e o final dos anos 1960 eram torcidas ‘carnavalizadas’. Famílias iam para o estádio fazer festa, cânticos, batucadas. Havia, inclusive, um concurso no qual a torcida mais animada ganhava uma geladeira, um eletrodoméstico raríssimo na época. No final dos anos 1960, no quadro da Ditadura Militar, começaram surgir essas torcidas organizadas violentas. Elas surgiram observando os padrões de autoritarismo e repressão, de militarismo que reinava naquela época. As torcidas se organizam em pelotões, tropas de choque, em destacamento. Curiosamente, não por coincidência, é época do governo Médici, o mais repressivo da Ditadura Militar.

Só que para essas torcidas, nascerem, crescerem, ganharem corpo e começarem a praticar atos de violência levou um tempo. Então, foi entre 1970 e 1985, que elas nasceram, saíram do papel, foram para a prática e começaram a aparecer nas páginas policiais, porque não houve contenção. Mas é importante frisar que são minorias dentro da organizadas, algo em torno de 5% ou 7%. Mas são minorias perigosas.

Banir as torcida organizadas ajuda a combater a violência?

Maurício Murad – “Houve uma tentativa por parte da Promotoria Pública do Estado de São Paulo – em 1995, após a morte de um torcedor – de acabar com as torcidas organizadas. Eles acabaram com a “Mancha Verde” do Palmeiras, que era considerada a torcida mais violenta do Brasil. A “Mancha Verde” não deixou de existir, ela mudou o nome, passou a se chamar “[Mancha] Alvi-Verde”, com os mesmos dirigentes, os mesmos grupos. Eles deram um drible na justiça.
Não é por aí. Se você tenta acabar com as torcidas você as empurra para a marginalidade, elas deixam de existir legalmente. Com isso se facilita a ação de grupos marginais, grupos infiltrados nas torcidas. Assim, se inibe a participação dos grupos legais, que estão ali para festa, para manifestar seu gosto pelo futebol”.

Como você avalia a cobertura da mídia com relação aos casos de violência nos futebol brasileiro?

Maurício Murad “A mídia acaba ajudando muito a violência. Ela vive como o país todo – e não é só o Brasil, esse é um traço da época contemporânea – a espetacularização. Tudo vira espetáculo, tudo vai para a televisão. A mídia não cria o fato, mas aumenta a sensação dele. Ela tinha que tomar cuidado, ter critérios éticos claros sobre o que publicar e como publicar.

O que as pesquisas provam é que os torcedores que vão para as primeiras páginas dos jornais, ou para a televisão no horário nobre, adoram isso. Eles viram heróis, ficam glamourizados. No entanto, os torcedores que querem defender a pacificação das torcidas sempre reclamam que não tem espaço. A mídia é uma situação dúbia: por um lado, ela aumenta a sensação de violência, mas por outro, ela é um instrumento fundamental de parceria que a gente tem para melhorar as coisa, porque na sociedade da imagem ela é essencial para educar”.

Qual a diferença entre a violência praticada por torcedores europeus para a praticada por torcedores brasileiros?

Maurício Murad – “Eu passei um período na Europa estudando isso e participei de um grupo de discussão da UEFA [entidade máxima do futebol europeu]. Na Europa tem grupos neo-nazistas, grupos contra imigrantes, grupos racistas, o que não tem muito aqui.

Lá tem tráfico de drogas e armas, coisa que aqui no Brasil é muito menor e mais recente. Na Europa tem violência de forma organizada muito maior do que aqui. Em compensação a punição é maior também, a ação dos órgãos de segurança é muito mais rápida e ágil do que aqui. Lá as práticas de violência são maiores e mais graves, mas em compensação a ação da sociedade estruturalmente organizada pela lei e pelos critérios da democracia é muito mais forte, então ocorre mais ou menos um equilíbrio.

O que me surpreende no Brasil é como não acontece uma grande tragédia a cada jogo. A inoperância policial, a falta de planejamento e a ineficácia é tão grande que o difícil não é entender quando acontece um fenômeno da violência, e sim como não acontece sempre esse fenômeno em cada grande jogo”.

Violência das torcidas de futebol na mídia

Cadastro de torcedores: solução para a violência nos estádios? (Universidade do Futebol)

Gustavo Lopes

06/07/2012

Autoridade e entidades organizadoras de eventos não devem aumentar exigência, mas tratar fãs com respeito

A segurança corresponde a um direito individual e social do cidadão brasileiro previsto nos artigos 5º e 6º da Constituição Federal. Sendo assim, de fato, é um dever de todos assegurá-la, impedindo a violência.

A violência no esporte é uma das faces da ausência de segurança cotidiana na sociedade e justamente na atividade esportiva onde deveria haver sua sublimação. Famílias por diversas vezes evitam os estádios, pois os vêem mais como espaço violento, que palco de acontecimentos esportivos.

Neste esteio, a união de todos os envolvidos com a atividade esportiva é essencial para que o desporto brasileiro não faça mais vítimas como o jovem Alex Fornan de Santana, de 29 anos, torcedor do Palmeiras, morto em 21 de fevereiro de 2010 após partida entre Palmeiras e São Paulo válida pelo campeonato paulista, em confronto de torcidas. Este caso recente é apenas um dentre centenas de outros ocorridos pelo mundo.

Muitas medidas são aventadas, propostas e estudadas. O Estatuto do Torcedor, após as alterações introduzidas pela Lei 12.299/2010, passou a exigir o cadastro de torcedores por parte das torcidas organizadas e, ainda, criminalizou uma série de atos dos torcedores. Há quem defenda que o cadastro de torcedores não deve se restringir às “Organizadas”, mas que deve se estender à totalidade de torcedores.

É imprescindível destacar que a violência nos estádios não é característica exclusiva dos desportos brasileiros, cujo nascedouro é atribuído às torcidas organizadas.

Na América Latina, especialmente na Argentina, os torcedores violentos são conhecidos como Barra Brava que correspondem a um tipo de movimento de torcedores que incentivam suas equipes com cantos intermináveis e fogos de artifício que, ao contrário das torcidas organizadas não possuem uniformes próprios, estrutura hierárquica e muitas vezes nem mesmo associados.

Na Europa, os torcedores violentos são conhecidos como hooligans, em especial a partir da década de 1960 no Reino Unido com o hooliganismo no futebol.

A maior demonstração de violência dos hooligans foi a tragédia do Estádio do Heysel, na Bélgica, durante a final da Taça dos Campeões Europeus de 1985, entre o Liverpool da Inglaterra e a Juventus da Itália. Esse episódio resultou em 39 mortos e um elevado número de feridos.

Os hooligans ingleses foram responsabilizados pelo incidente, o que resultou na proibição das equipes britânicas participarem em competições européias por um período de cinco anos.

A escalada de violência nos estádios do Reino Unido foi tamanha que começou a afetar não apenas os residentes locais, mas também a ter consequências para a Europa continental.

Por este motivo, o hooliganismo arranhou a imagem internacional do Reino Unido, que passou a ser visto por todos como um país de violentos arruaceiros, cujo ápice se deu com a tragédia de Heysel.

Insuflada por esse acontecimento, a então primeira-ministra britânica Margareth Thatcher entendeu que o hooliganismo havia se tornado problema crônico e que alguma providência deveria ser tomada.

Entendendo que o aumento do controle estatal minimizaria a violência, a “Dama de Ferro” sugeriu a criação da carteira de identidade dos torcedores de futebol (National Membership Scheme) no Football Spectators Act (FSA), em 1989.

Alguns meses após a divulgação do FSA, ocorreu a maior tragédia do futebol britânico. Na partida válida pelas semifinais da FA Cup entre Liverpool e Nottingham Forest, no estádio de Hillsborough, do Sheffield Wednesday, 96 torcedores do Liverpool morreram, massacrados contra as grades que separavam a arquibancada do campo.

A fim de apurar os motivos da tragédia, o governo britânico iniciou investigação cuja conclusão foi de que o problema não seria os torcedores, mas as estruturas que os atendiam. Muito pior que os hooligans, era a situação dos estádios britânicos naquela época. Não seria possível exigir que as pessoas se comportassem de maneira civilizada em um ambiente que não oferecia as menores condições de higiene e segurança.

Para evitar que novas tragédias se repetissem a investigação realizada, em sua conclusão, estabeleceu uma série de recomendações como, por exemplo a obrigação da colocação de assentos para todos os lugares do estádio, a derrubada das barreiras entre a torcida e o gramado e a diminuição da capacidade dos estádios. Dentre as recomendações estava o cancelamento do projeto da carteira de identificação dos torcedores, eis que havia o receio de que o cadastramento aumentasse o problema da violência, e não o contrário.

Além dos questionamentos sobre a real capacidade dos clubes conseguirem colocar em prática um sistema confiável de cadastro, controle e seleção de torcedores e, ainda, sobre a confiança na tecnologia que seria utilizada, o argumento se baseava na ideia de que a carteira de identidade para torcedores não seria uma ação focada na segurança, mas na violência e as tragédias nos estádios não seriam questão de violência, mas de segurança. Inclusive, a polícia inglesa, que poderia ser beneficiada com a carteira, rejeitou o projeto, que, acabou sendo abandonado.

Em razão das novas exigências, os clubes ingleses se organizaram e na temporada 1992/1993 criaram a “Premier League” que atualmente é o campeonato de futebol mais valioso do mundo.

Além do índice técnico, um dos requisitos para que um clube inglês dispute a “Premier League” é a existência de estádio com boa infra-estrutura aos torcedores.

É fato que no Brasil o problema da violência é grande, mas muito pior é o problema da insegurança. Muitas tragédias como o buraco nas arquibancadas da Fonte Nova, só aconteceu porque o estádio estava em condições ruins, caso em que a carteirinha de identificação não teria salvado as vítimas, mas melhor fiscalização nas reais condições do espaço e o fornecimento de uma estrutura apropriada para o público, certamente teria evitado a tragédia.

Destarte, apesar dos avanços conquistados, especialmente com o advento do Estatuto do Torcedor, o consumidor dos eventos esportivos no Brasil ainda não é respeitado.

Estádios com infraestrutura precária, venda de ingressos e acesso a estádios tumultuados são alguns dos problemas enfrentados rotineiramente pelos torcedores brasileiros.

O fato é que as autoridade e as entidades organizadoras de eventos esportivos ao invés de aumentar a exigência dos torcedores, devem passar a tratá-los com respeito atentando-se ao estabelecido no Estatuto do Torcedor e nos direitos básicos como segurança e organização dos eventos esportivos.
Referências bibliográficas

http://www.cidadedofutebol.com.br/Jornal/Colunas/Detalhe.aspx?id=10782, acessado em 13 de novembro de 2010.

http://www.universidadedofutebol.com.br/2010/10/1,14853,A+IMPORTANCIA+DO+DIREITO+DESPORTIVO.aspx?p=4, acessado em 13 de novembro de 2010.

http://esporte.ig.com.br/futebol/2010/02/22/confrontos+entre+torcidas+deixam+1+morto+e+20+feridos+9404363.html, acessado em 13 de novembro de 2010.

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A violência nos estádios de futebol (Universidade do Futebol)

Gustavo Lopes

15/06/2012

Colunista trabalha em dissertação de mestrado para analisar o tema e divide a questão em três partes

Nas últimas semanas, estive envolvido na conclusão da minha dissertação de mestrado que trata das causas e soluções para a violência nos estádios de futebol da América do Sul.

O trabalho desenvolveu a memória de algumas correntes existentes sobre a violência no futebol, a intenção de obter uma interpretação a partir das mais diversas teorias, como as de Eric Dunning, Norbert Elías, Heloisa Helena Bady dos Reis e outros para tentar esclarecer esse fenômeno esse fenômeno tão complexo que é a violência nos espetáculos esportivos, focando-se nos países da América do Sul filiados à Conmebol.

Os países sulamericanos filiados à entidade foram divididos em três grupos. O primeiro denominado América Andina é composto por Bolívia, Chile, Colômbia, Equador, Peru e Venezuela. O segundo, a América Platina, é composta por Argentina, Paraguai e Uruguai.

Finalmente, por suas peculiaridades e importância futebolística, política e econômica, o Brasil é apresentado separadamente. Cada país é descrito geopolítica e futebolisticamente analisando-se a legislação antiviolência.

No capítulo seguinte, faz-se um histórico dos principais casos de violência na América do Sul para, no tópico seguinte, apontar as suas causas.

Dentre as causas da violência, busca-se a doutrina internacional para enumerar as que melhor se aplicam à América do Sul, com destaque para a falta de respeito para com os direitos dos torcedores, a precariedade da infraestrutura dos estádios de futebol, a situação sócio-econômica da população do país, a impunidade e a falta de atuação governamental.

Após, apontam-se medidas adotadas na legislação alienígena, especialmente na Inglaterra, Portugal, Espanha, Estados Unidos, dentre outros.

Por fim, na conclusão, apontam-se as causas investigadas com as respectivas soluções legislativas e/ou governamentais. Ante todo o estudado, pesquisado e avaliado, constata-se que é possível combater a violência nos estádios de futebol com medidas eficientes. Desenvolveremos algumas conclusões em colunas futuras.

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Violência das torcidas organizadas: um desafio para a Copa do Mundo de 2014

Setores radicais desses grupos precisam abandonar a violência como prática. Com isso, ganharão legitimidade e terão um longo caminho a percorrer na história do nosso esporte

Rodrigo Monteiro*

03/04/2012

A Copa de 2014 e as Olimpíadas de 2016 no Rio de Janeiro têm mobilizado autoridades e a sociedade brasileira em discussões acerca do legado que esses megaeventos deixarão para o país e, sobretudo, para as cidades-sede desses eventos.

Uma dessas heranças é o novo Estatuto do Torcedor, sancionado em julho de 2011. Seu principal objetivo é coibir a violência nos estádios.

Em pesquisa realizada pelo Ibope e pelo jornal Lance!, publicada em agosto de 2010, 60% dos entrevistados disseram-se a favor da extinção das torcidas organizadas. Por um motivo simples: depois de já terem ocorrido tantos conflitos violentos envolvendo torcedores, a sociedade enxerga esses grupos como uma ameaça.

Masculinidade exacerbada e disputa territorial constituem práticas comuns de alguns grupos de torcedores organizados e revelam o que o sociólogo alemão Norbert Elias chamou de ethos guerreiro (entendido como vontade e disposição para agredir e destruir fisicamente o rival) que constrói uma das muitas identidades masculinas.

A esperança é que a reforma do estatuto ajude a combater o problema. Uma das novas punições previstas para torcedores violentos exige que eles se apresentem em delegacias durante os jogos. A norma é inspirada na legislação inglesa que cuida dos famosos hooligans. O texto também proíbe e pune cambistas, exige maior transparência dos organizadores dos campeonatos e prevê penas severas para os árbitros desonestos. Não há, no entanto, qualquer menção a policiais que abusem de seus poderes ou desviem-se de suas funções contra torcedores.

Alguns pontos do estatuto, porém, são polêmicos. Ele determina, por exemplo, que as torcidas organizadas se tornem juridicamente responsáveis pelos atos de seus membros. Mas será justo condenar, social e legalmente, o todo pela parte? Isso pode criminalizar as organizadas e ameaçar o direito à livre associação, uma das garantias constitucionais básicas de qualquer democracia.

O estatuto também mantém a proibição da venda de bebidas alcoólicas. No entanto, é sabido que os únicos produtos que podem ser vendidos nos estádios e em seus arredores são os licenciados pela Fifa. Entre esses produtos, estão bebidas alcoólicas de empresas patrocinadoras da entidade. Ao que parece, essa questão já foi superada e a favor dos interesses da Fifa e de suas associadas.

Cabe, então, a pergunta: de quem será a soberania nos dias de Copa? Do Estado brasileiro ou da Fifa?

É evidente que os setores radicais das organizadas precisam abandonar a violência como prática. Com isso, ganharão legitimidade e terão um longo caminho a percorrer na história do nosso esporte. Para que isso ocorra, algumas medidas simples podem ser eficazes.

Bandeiras (em duplo sentido) legítimas para as organizadas não faltam: questionar o comando da CBF; bem como os mandos e desmandos das federações estaduais; a relação promíscua entre técnicos, empresários e dirigentes; o elevado preço dos ingressos; os bizarros e contraproducentes horários de transmissões esportivas; transparência nos gastos públicos para a construção de equipamentos esportivos para a Copa e as Olimpíadas, etc.

Caso nenhum desses argumentos sensibilize as organizadas, ao menos que critiquem e incentivem seus clubes amados de forma civilizada. Já terá sido válido.

*Rodrigo Monteiro é sociólogo, pós-doutorando (FAPERJ), pesquisador do NUPEVI/IMS/UERJ e autor do livro “Torcer, lutar, ao inimigo massacrar: Raça Rubro Negra!”, pela Editora FGV.

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Maurício Murad diz que impunidade motiva violência das torcidas (03:14)

Redação SportTV – 28/03/2012

Sociólogo explica problema tem níveis nacionais e exige soluções.

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Isto É – N° Edição:  2212 |  30.Mar.12 – 21:00 |  Atualizado em 04.Set.12 – 05:06

COMPORTAMENTO

Como acabar com as gangues do futebol

As torcidas organizadas agem como quadrilhas, matam e aterrorizam cidades por todo o país. A repressão a esses baderneiros se tornou um desafio nacional

Rodrigo Cardoso

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APÓS A BRIGA
Torcida do Palmeiras na quarta-feira 28: calmaria depois da batalha campal do domingo

A polícia de São Paulo tomou um drible desconcertante de gangues uniformizadas que usam as cores de times de futebol para espalhar medo e matar. No domingo 25, 300 palmeirenses e corintianos, membros de torcidas organizadas, se encontraram na avenida Inajar de Souza, zona norte de São Paulo, para brigar. Dois jovens morreram após uma batalha campal às 10 horas em uma via pública movimentada, a dez quilômetros do estádio do Pacaembu, onde Corinthians e Palmeiras disputariam uma partida seis horas depois. O confronto havia sido agendado pela internet na semana anterior. Diante de tanta gente enfurecida, armada e com sede de sangue, os quatro policiais presentes em duas viaturas não tiveram como evitar a tragédia anunciada. “Eles estavam usando fogos de artifício e bombas. E a polícia não teve outra saída a não ser recuar e praticamente assistiu ao conflito”, admitiu o cabo Adriano Lopomo.

A ação das torcidas organizadas há muito ultrapassou o limite da civilidade. A situação de São Paulo é mais grave, até pelo tamanho das torcidas. Por isso, mesmo regiões distantes dos estádios ficam reféns dessas gangues. Trechos de várias cidades brasileiras estão sujeitos à violência desses baderneiros em dia de futebol e a população fica sitiada. No mesmo domingo 25, na capital cearense, o clássico Ceará e Fortaleza foi marcado por ocorrências antes, durante e depois do jogo. Guardas municipais foram baleados por torcedores em um terminal de ônibus, pessoas consumindo drogas, praticando furtos e brigando na arquibancada acabaram na delegacia. Objetos foram lançados contra os carros na BR-116. Uma semana antes, em Campinas, um jovem de 28 anos foi espancado e morreu em uma briga entre torcedores dos times rivais Guarani e Ponte Preta.

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BADERNA
Torcida do Corinthias a caminho do jogo no
domingo 25: armas, bombas e fogos de artifício

Esses encrenqueiros começaram a frequentar as páginas policiais em meados dos anos 1980. Depois, desceram das arquibancadas e passaram a se enfrentar nas proximidades dos estádios. Ultimamente, porém, candidatam-se para brigas pré-agendadas pela internet em locais distante dos jogos. Rastrear esses choques de torcidas – com a utilização de softwares modernos e pessoal treinado para esse tipo de trabalho – é obrigação da polícia. É a maneira mais inteligente de prevenir brigas que podem causar mortes. “Um monitoramento mais eficiente das redes sociais é algo a ser pensado”, admite o major Marcel Soffner, porta-voz da PM paulista.

O procurador de Justiça Fernando Capez, que combateu a violência das torcidas organizadas antes de se tornar deputado estadual pelo PSDB paulista, defende medidas mais radicais. “Policiais devem se infiltrar nas organizadas para identificar os baderneiros. É preciso fazer interceptações telefônicas para rastrear as comunicações de quem marca esses encontros pela internet, providencia as armas, as drogas e comete outros delitos”, diz ele. O promotor Paulo Castilho, diretor do Departamento de Defesa dos Direitos do Torcedor do Ministério do Esporte, reforça que é necessário promover uma prisão em massa por formação de quadrilha, tráfico de entorpecentes e espancamento. Tem de ser assim porque as torcidas organizadas estão se transformando em criminosos organizados.

Isso foi constatado no estudo “A violência e as mortes do torcedor de futebol no Brasil”, realizado entre 1999 e 2008 pelo professor Maurício Murad, titular de sociologia do esporte no mestrado da Universidade Salgado de Oliveira (Universo). Investigador do comportamento de torcidas organizadas há 20 anos, ele acompanhou integrantes dessas facções nos estádios, onde ouviu de alguns que não gostavam de futebol e ficavam de costas para o campo provocando outras pessoas simplesmente para brigar. “Falta ação, vontade política para tratar o problema”, diz o professor. Os clubes de futebol também devem ser cobrados, pois as organizadas têm regalias. Existem agremiações que distribuem ingressos de graça para as facções ou disponibilizam a venda para elas em guichês exclusivos. Além disso, há membros de torcidas organizadas que participam de conselhos deliberativos de times.

Diante da incapacidade do poder público de prevenir o problema e garantir a segurança de todos, alguns clubes estão partindo para medidas extremas. A repercussão negativa da morte do torcedor em Campinas na semana passada fez com que os presidentes do Guarani e da Ponte Preta optassem, até segunda ordem, pela disputa do clássico com apenas uma torcida. O mesmo aconteceu no mês passado no Paraná. Apenas os torcedores do Atlético Paranaense puderam assistir ao clássico contra o Coritiba no estádio da Vila Capanema. A medida, porém, fere o Estatuto do Torcedor. Com esse argumento, a procuradoria paranaense denunciou os clubes e, na quarta-feira 4, o Tribunal de Justiça Desportiva julgará o caso. Os times podem ser penalizados com multa de até R$ 100 mil. A torcida única não é novidade. Em Minas Gerais, a medida é adotada nos jogos entre Atlético e Cruzeiro desde 2010. Por causa da Copa, o Mineirão está em obras e a Arena do Jacaré, que tem capacidade para 18.850 pessoas e passou a abrigar os clássicos, não oferece segurança para comportar as duas torcidas juntas.

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PLACAR
Acima, André Lezo, que morreu na briga das duas
torcidas. Sete pessoas foram presas pela polícia

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Em São Paulo, providências mais concretas foram tomadas no dia seguinte às mortes na Inajar de Souza. Sete pessoas foram presas, policiais inspecionaram as quadras da Gaviões da Fiel e Mancha Alviverde e apreenderam computadores nas duas sedes. Na casa de um dos presos, que é irmão de um dos torcedores mortos, a polícia encontrou munição, canivete e cassetete. Para a delegada que conduz o caso, Margarette Barreto, da Delegacia de Crimes Raciais e Delitos de Intolerância, não há mocinhos nesse caso. “Todos os indícios mostram que eles também são brigadores. Não estamos falando de vítimas, não estamos falando de nenhum chapeuzinho vermelho passeando na floresta”, diz ela. E, por ora, a Federação Paulista de Futebol proibiu a entrada das duas facções nos jogos.

A experiência internacional pode ser útil ao Brasil. Segundo o sociólogo Murad, que por dois anos viajou por 16 países europeus como integrante do grupo de estudos e prevenção à violência da Uefa, a entidade que rege o futebol na Europa, ninguém conseguiu acabar com a violência das torcidas. Mas contê-la e colocá-la em níveis aceitáveis foi possível em vários lugares. Na Inglaterra, a Scotland Yard criou um gabinete só para vigiar e punir os hooligans, os torcedores violentos daquele país, que foram proibidos de viajar para outras localidades da Europa. “Lá, eles foram cadastrados; clubes perderam pontos quando a torcida deles provocou conflitos; e chefes de torcidas, que também fazem tráfico de drogas, foram responsabilizados criminalmente”, enumera o professor. Os hooligans não foram extintos, mas estão sob controle da polícia e da Justiça. Na Itália, a polícia fiscaliza e prende quem combina brigas pela internet. Há muito a ser feito no Brasil e os caminhos são conhecidos. Prevenir, reprimir, prender e condenar exemplarmente é o que se espera do poder público.

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IN LOCO
A polícia apreendeu computadores nas sedes
da Gaviões da Fiel e Mancha Alviverde

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Hooliganismo e a sedução da violência (Universidade do Futebol)

Caráter lúdico desse tipo de ação e ineficiência da prevenção simplesmente policial remete à necessidade de estudos sobre o comportamento social e dos governos das cidades

Carlos Alberto de Camargo

25/02/2011

Uma das ameaças a ser consideradas no planejamento da segurança da Copa do Mundo é o hooliganismo, que não se confunde com a violência das torcidas organizadas brasileiras – esta última, em termos de Copa do Mundo, representa uma ameaça mais remota; mas o estudo do hooliganismo contribui para o entendimento da violência de nossas torcidas.

A capacidade de sedução da violência é a principal mensagem que o diretor Phillip Davis pretendeu passar no vídeo “Fúria nas Arquibancadas”, em que o personagem John Brandon, policial britânico infiltrado com três outros companheiros na torcida do Shadwell (um time fictício) a fim de conseguir informações necessárias ao controle da violência, acaba sendo cooptado por essa violência, absolutamente fascinado por ela, adotando o mesmo modo de vida dos hooligans, com suas inúmeras brigas e intermináveis bebedeiras.

É a mesma sedução que consta no testemunho pessoal do jornalista Bill Buford, em seu livro “Entre os Vândalos”, também infiltrado durante quatro anos na torcida do Manchester United a fim de descobrir por que os jovens ingleses do sexo masculino se envolviam em tumultos todos os sábados.

Na estação londrina de Marble Arch, retornando de um fim de semana violento em Turim, onde fora com a torcida acompanhar o Manchester, o jornalista surpreendeu-se com sua própria atitude. Irritado com um casal de idosos que caminhava lentamente à sua frente, amparados por suas bengalas, ele os ultrapassou, empurrando-os bruscamente e, já na dianteira, voltou-se para xingar.

Bill Buford descreve assim a violência: “Fiquei espantado com aquilo que descobri. Não esperava que violência fosse tão prazerosa. Poderia supor, caso me tivesse disposto a pensar a respeito, que a violência fosse provocante – no sentido em que um acidente de trânsito é provocante -, mas aquele prazer puro e elementar era de uma intensidade diferente de tudo que eu previra ou experimentara anteriormente. Não se tratava, contudo, de uma violência qualquer. Não se tratava de violência fortuita, ou violência de sábado à noite ou brigas de pub – era violência de massa, era essa que importava; os mecanismos muito particulares da violência das multidões”.

E o autor arrisca-se mesmo a apontar o principal combustível que movimenta esse comportamento: “a adrenalina, que pode ser tanto mais poderosa, porque é gerada pelo próprio corpo, contendo, fiquei convencido, muitas das mesmas propriedades viciantes que caracterizam as drogas sinteticamente produzidas”.

O personagem John Brandon entregou-se a essa mesma sedução, mergulhando de cabeça na espiral descendente que leva à total degradação, à negação da dignidade humana, à negação das mínimas regras necessárias a uma sadia convivência em sociedade. Entregou-se, iludido pela miragem assim descrita por Bill Buford:

“A violência apresenta uma das experiências vividas com mais intensidade e, para aqueles capazes de se entregar a ela, um dos mais intensos prazeres”. Mesmo advertido pelos seus companheiros de que essa ilusão o estava levando à autodestruição.

Tanto o livro como o filme apresentam uma impressionante sequência de escaramuças entre torcidas rivais; destacam a imagem desagradável e mesmo repulsiva do torcedor violento, acostumado a ingerir enorme quantidade de álcool, que sente tédio nos dias em que não vê futebol e que pratica delitos; e ainda procuram mostrar uma polícia inglesa às vezes omissa e à vezes excessivamente violenta.

As imagens que reproduzem a atuação da polícia nos estádios não resistem a uma análise técnica: revista pessoal falha e por amostragem, o que permite a introdução de armas, dardos e outros objetos perigosos; o policial que não mantém detidos os torcedores apreendidos por comportamento inconveniente; cenas de violência policial e a omissão da polícia em certos casos ou sua impotência quando algumas pessoas decidem desobedecer às leis.

O filme termina com nosso personagem participando de uma passeata neonazista. O livro também aborda o assunto, descrevendo como os rapazes de terno do National Front assediam as torcidas, que são o campo ideal para o recrutamento, já que se constituem em massas violentas ainda não politicamente dirigidas.

O repórter Bill Buford, ao contrário, termina sua narrativa confessando que em dado momento – quando preparava-se para viajar para Turim, nas eliminatórias para a Copa de 90 – entrou em depressão profunda: a simples ideia de um novo contato com a violência e as bebedeiras dos Hooligans o deixou doente.

Para melhor ilustrar o que pretendemos alertar, novamente nos socorremos de um exemplo inglês, desta vez narrado pelo jornalista Otávio Dias. Reportando a rebelião ocorrida na cidade de Luton, ao norte de Londres, em julho de 1995, quando durante vários dias grupos de jovens entraram em choque com a polícia, incendiando carros, apedrejando e saqueando lojas e casas, ele transcreveu depoimento de um deles: “enfrentar a polícia é a única maneira de conseguirmos um pouco de emoção”.

Todas essas observações nos fazem ficar preocupados com um dos aspectos da violência coletiva: o seu caráter eventualmente lúdico, que torna ineficaz a prevenção simplesmente policial, e que, por isso, recomenda seja objeto da preocupação de estudiosos do comportamento social e dos governos das cidades. A cuidadosa observação da forma como este problema tem sido enfrentado em todo mundo nos demonstra como eficazes: a rápida e rigorosa punição dos infratores, capaz de eliminar o sentimento de impunidade; a ocupação territorial inteligente e preventiva pela polícia, tomando o espaço dos violentos; e atuação sobre as causas da violência, como fenômeno social.

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Violência entre torcidas: respeito é a solução

(Universidade do Futebol)

Estatuto do Torcedor preocupa-se demasiadamente com a violência, sem ater-se à qualidade no trato com o torcedor, o verdadeiro destinatário do espetáculo esportivo

Gustavo Lopes Pires de Souza*

28/01/2011

No dia 27 de novembro de 2010, os amantes de futebol foram surpreendidos com um fato bárbaro: o assassinato de um torcedor do Cruzeiro Esporte Clube, em Belo Horizonte. Responsáveis foram identificados e indiciados, mas a pergunta que sobe à garganta é: “até quando?”.

Segundo pesquisa realizada pela professora Heloísa Reis, da Unicamp, o ponto de partida da violência em Minas Gerais teria sido a morte de um torcedor atleticano, que entrou em confronto direto com um cruzeirense, em Belo Horizonte, em 1967, após o Atlético perder para o Uberaba e ser eliminado da disputa pelo seu primeiro título mineiro na “era Mineirão”.

Desde então, foram vários incidentes entre atleticanos e cruzeirenses que nos últimos quinze anos contabilizam dez mortes e centenas de feridos.

Em julho de 2010, por meio da Lei 12.299, o Estatuto do Torcedor foi alterado passando a prever punição às torcidas organizadas e criminalização de atos violentos dos torcedores.

Sem embargo, o Estatuto do Torcedor fora criado em 2003 para assegurar os direitos do torcedor, e não para puni-lo. Causa estranheza haver alterações que não cuidem de algumas das principais necessidades dos torcedores, como o preço dos ingressos e o horário dos jogos.

O Estatuto do Torcedor preocupa-se demasiadamente com a violência, sem ater-se à qualidade no trato com o torcedor, o verdadeiro destinatário do espetáculo esportivo.

De fato, os responsáveis devem ser punidos exemplarmente, mas a punição após a tragédia não é capaz de trazer de volta a vida de inocentes. Aliás, o italiano Beccaria, no século XVIII, já defendia a intervenção mínima, em sua obra “Dos Delitos e das Penas”.

Para a tão almejada paz nos estádios é necessário planejamento, respeito e organização. É preciso que a sociedade civil reivindique os direitos insculpidos no Estatuto do Torcedor, que o Poder Público atenda aos anseios e que os clubes e entidades organizadoras de eventos esportivos passem a tratar os torcedores com respeito, atentando-se ao fato de que fazem parte do patrimônio do clube.

Medidas como venda organizada de ingressos, conforto nos estádios, trariam efeitos positivos na luta contra a violência, tal como comprova a eficiente experiência inglesa que em uma década retirou o futebol local do ostracismo e transformou a Premier League em exemplo de organização e lucratividade.

Portanto, a cada ato de violência torna-se mais necessária a aplicação do Estatuto do Torcedor em sua plenitude, pois somente a lhanheza no trato com os torcedores oportunizará a queda do índice de violência nos estádios. E não se trata de inovar, mas tão somente de espelhar experiências de sucesso.

Referências

Jornal “Hoje em Dia”, Belo Horizonte, Minas Gerais, dos dias 20, 21, 23 e 24 de agosto de 2010.

SOUZA, Gustavo Lopes Pires de. O respeito ao torcedor como investimento com retorno esportivo e financeiro. Derecho Deportivo em Linea, Madrid. Disponível em Acesso em 27 jul. 2010

SOUZA, Gustavo Lopes Pires de. Os Direitos do Torcedor Brasileiro. Cidade do Futebol, São Paulo. Disponível em . Acesso em 27 jul. 2010

SOUZA, Gustavo Lopes Pires de. Estatuto do Torcedor: a evolução dos direitos do consumidor do esporte (Lei 10.671/2003), Alfstudio: Belo Horizonte, 2009.

*Coordenador do Curso de Capacitação em Direito Desportivo da SATeducacional. Professor de Organização Jurídica do Esporte no MBA de Gestão em Eventos Esportivos das Faculdades Del Rey. Autor do livro: “Estatuto do Torcedor: A Evolução dos Direitos do Consumidor do Esporte” (Lei 10.671/2003) Formado em Direito pela PUC/MG, Pós Graduado em Direito Civil e Processual Civil pela Unipac, Membro e colunista do Instituto Brasileiro de Direito Desportivo, Membro do Instituto Mineiro de Direito Desportivo e da Associação Portuguesa de Adepstos Colunista do Instituto de Direito Desportivo da Bahia e do portal “Papo de Bola”.

Agraciado com a medalha ” Dom Serafim Fernandes de Araújo” pela eficiência na atuação jurídica. Jurista, Articulista, Advogado licenciado em razão de função pública no TJMG. Professor de matérias Jurídicas no MEGA CONCURSOS, FAMINAS e Arnaldo Jansen.

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I Fórum Permanente para Discussão sobre a Violência das Torcidas de Futebol (Universidade do Futebol)

15 de setembro de 2010

Visando discutir sobre as questões sociais relevantes na atualidade que envolvem os eventos nos espetáculos futebolísticos, será realizado, em setembro, o I Fórum Permanente para Discussão sobre a Violência das Torcidas de Futebol.

O evento terá como presidente da mesa e mediador os advogados Fábio Sá Filho e Expedito Bandeira. Além deles, também contribuem para a realização do fórum o palestrante José Luiz Ratton e o debatedor Ailton Alfredo.

Veja a programação e outras informações:

Organização: Instituto Pernambucano de Direito Desportivo (IPDD), Tribunal de Justiça do Estado de Pernambuco (TJ/PE), Ordem dos Advogados do Brasil da Seccional de Pernambuco (OAB/PE) e Escola Superior de Advocacia de Pernambuco (ESA/PE).

19:00 – Abertura

19:10
Painel Violência das Torcidas de Futebol

Presidente de mesa: Fábio Sá Filho/PE (Advogado. Mestre em Direito. Professor da FBV, UNICAP e ESA/PE. Membro da AIDTSS, do IBDD, da Comissão de Direito Desportivo da OAB/PE e do INAMA/PE. Diretor Presidente e Associado fundador do IPDD)

Mediador: Expedito Bandeira/PE (Advogado militante da área de Direito Público. Conselheiro da OAB/PE. Presidente da Comissão de Direito Desportivo da OAB/PE)

Tema: Torcidas organizadas, cultura e sociabilidade no Brasil

Palestrante: José Luiz Ratton/PE (Professor pesquisador do Departamento de Ciências Sociais e do Programa de Pós-Graduação em Sociologia da UFPE. Coordenador do Núcleo de Estudos e Pesquisa em Criminalidade, Violência e Políticas de Segurança – NEPS – da UFPE. Assessor Especial do Governador para a área de Segurança Pública)

Debatedor: Ailton Alfredo/PE (Juiz Coordenador do Juizado Especial Cível e Criminal do Torcedor de Pernambuco. Mestrando em Direito. Professor Universitário. Membro do IBDD e Associado fundador do IPDD)

20:50 Encerramento

Inscrições:

Ordem dos Advogados do Brasil da Seccional de Pernambuco (OAB/PE)

Rua do Imperador Pedro II, 235, Santo Antônio

Junto às Sras. Ana da Hora e Ana Maristela (Setor de Comissões)

Das 9h às 12h e 14h às 18h

Telefone: (81) 3424-1012 Ramal 230

Doações:

Não será cobrada taxa alguma. Apenas quem quiser, poderá doar 1 kg de alimento não-perecível, água mineral, roupas e/ou cobertores para serem repassados às vítimas da enchente em Pernambuco.

Atenção: os donativos serão coletados a qualquer tempo na sede da OAB/PE (de preferência, o quanto antes).

Organização: IPDD, TJ/PE, OAB/PE e ESA/PE

Apoio: Sport Club do Recife, Clube Náutico Capibaribe e Santa Cruz Futebol Clube.
Local: Auditório da OAB, Recife/PE

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Especial: violência na esfera do futebol (Universidade do Futebol)

Acontecimentos do último fim de semana no Estado de São Paulo reacendem necessidade de debate pautado na técnica e na profundidade social

Equipe Universidade do Futebol

26/02/2010

O saldo do clássico do último fim de semana entre Palmeiras e São Paulo não foi apenas os três pontos na tabela de classificação do Campeonato Paulista à equipe alviverde comandada pela primeira vez por Antônio Carlos Zago. Fora de campo – ou melhor, fora do estádio -, diversas ocorrências envolvendo torcedores das duas equipes foram relatadas pelas câmeras e detectadas pela polícia. Mas ainda mais distante da esfera principal, o jogo no estádio Palestra Itália, que se deu o chamariz.

Na Rodovia dos Bandeirantes, região de Jundiaí, um palmeirense foi morto. Dois suspeitos pelo crime foram presos pela Polícia Civil, que efetuou uma busca em pelo menos seis cidades do interior. A vítima pertencia à Mancha Alviverde. Enquanto os suspeitos têm ligação com a torcida organizada Tricolor Independente.

Além de ter provocado a morte de Alex Furlan de Santana, 29, a briga entre os dois grupos deixou 12 feridos, entre eles um são-paulino que teve amputada parte da mão direita após a explosão de uma bomba caseira. Ele foi ouvido e negou que tenha atirado o artefato.

Para a polícia, a briga pode ter sido premeditada. Na terça-feira, foram presos em São Carlos dois suspeitos de participação no crime. Os membros da Independente confessaram ter participado da briga. Mas o empresário Evandro Magno Vicentini Júnior, 29, e um adolescente, de 17 anos, negaram o crime. Vicentini continua preso, e o adolescente está numa unidade para menores de idade de São Carlos.

O menor de idade admitiu ter feito dois disparos durante a briga. Segundo ele, ninguém foi atingido, pois um tiro foi dado para cima e o outro, para o chão. Na casa do empresário, a polícia apreendeu duas espingardas cartucheiras, que passarão por perícia.

Delegado da DIG (Delegacia de Investigações Gerais) de Jundiaí e responsável pelo caso, Antonio Dota Júnior, acredita que os membros da organizada são-paulina que participaram da briga viajaram para assistir ao jogo em ônibus e vans que partiram de São José do Rio Preto e apanharam torcedores em outras cidades, como Piracicaba, Limeira, Campinas e Araras.

 

O comando da Polícia Rodoviária Estadual informou que policiais fizeram quatro disparos durante a briga na tentativa de dispersar o confronto. Um dos tiros atingiu a perna de um torcedor ainda não identificado.

Para Heloisa Reis, socióloga de formação e estudiosa dessa relação, a violência urbana nos dias de jogos de futebol transformou-se em uma questão de segurança pública em diversos países. Inicialmente, parecia um problema localizado apenas na Inglaterra, sob o nome de hooliganismo. Atualmente, entretanto, é um problema quase planetário. E para pensar em prevenção desta violência, é necessário buscar suas raízes, suas causas diretas e indiretas.

Todos os levantamentos científicos realizados no Velho Continente especificamente concluíram que a falta de infraestrutura dos estádios é geradora de atos de vandalismo e de outras formas de violência. Muitas recomendações do tratado europeu, então, dizem respeito à modernização dos estádios: ambientes confortáveis e seguros inibiriam ocorrências.

“No Brasil, as frustrações geradas com o mau funcionamento dos serviços e da estrutura dos estádios contribuem para manifestações violentas, inclusive como forma de protesto e enfrentamento. Aqui, a gota d’água foi o confronto de torcedores no Pacaembu em 1995, na final da Copa SP de juniores. O episódio chocou a sociedade pela crueldade dos jovens agressores armados com entulhos encontrados no próprio estádio, o que é inadmissível”, relatou Heloisa, citando justamente um duelo envolvendo palmeirenses e são paulinos, há 15 anos, pela Supercopa de Juniores.

Para ela, uma das explicações das raízes da violência relacionada ao esporte pode ser encontrada na gênese e no desenvolvimento do futebol moderno, visto como ambiente de produção e reprodução de valores de masculinidade. E outra, no sistema de metabolismo social do capital.

“Se levarmos em conta a primeira, não é de se estranhar que a ‘linha dura’ dos grupos agressores seja formada basicamente por jovens do sexo masculino. Para eles, a valentia e a força são elementos necessários para o enfrentamento do inimigo, que pode ser os torcedores adversários, a polícia – que representa ali o Estado -, os árbitros e até os jogadores do próprio time”, completou a mestra e doutora em Educação Física, atuando com ênfase em Sociologia do Esporte, Lazer e Pedagogia do Esporte.

A seguir, além da entrevista na íntegra com Heloisa Reis, a Universidade do Futebol apresenta ao público uma série de artigos relacionados à temática. E convida a comunidade a debater no espaço de comentários.

Leia mais:
Entrevista: Heloisa Reis, estudiosa da relação futebol x violência
Mais do mesmo
Medidas tomadas pela Uefa para conter a violência
Na Europa, combate à violência ganhou força nos anos 1980
Os cegos do castelo e a violência das torcidas de futebol
O combate ao problema e não às causas da violência
O perfil do torcedor brasileiro
Sociologia explica violência das torcidas
Apontamentos sobre o protagonismo do torcedor no espetáculo de futebol
Torcedores de futebol: uma análise sociológica
Violência nos estádios
Violência no futebol: quando as causas vão ser investigadas?
O cravo da violência
Comportamento e infraestrutura para a segurança nos estádios
Estado de choque. De novo
A consequência da violência para os clubes de futebol
Civilização e barbárie
Simpatia a organizadas estabelece momento de comemoração no futebol

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Violência no futebol: quando as causas vão ser investigadas? (Universidade do Futebol)

A atuação dos meios de comunicação em relação ao tema no meio esportivo é um aspecto que deve ser repensado

GEF

16/08/2009

Mortes relacionadas ao futebol brasileiro reacendem a discussão em torno da violência no esporte. Normalmente declarações precipitadas de autoridades públicas, assim como informações desencontradas e incoerentes veiculadas pela imprensa contribuem para a formulação de “soluções mágicas”, mas que poderão comprovar-se ineficazes, dado que não consideram a amplitude e a importância do
fenômeno.

Em um primeiro momento, consideramos ser fundamental a retomada dos trabalhos da Comissão Nacional de Prevenção da Violência nos Espetáculos Esportivos pelos Ministérios do Esporte e da Justiça e a criação de colegiados similares nos estados, que tenham a atribuição de tratar o tema com o devido cuidado e de trazer o poder público para o cerne da discussão. Há a necessidade, também urgente, de atualização da legislação específica para o esporte, como o Estatuto do Torcedor. A tarefa é especialmente oportuna neste momento, dado que o tema está sendo discutido no Senado. Alguns pontos importantes foram acrescentados à lei, mas outros, como a melhoria da infraestrutura dos estádios, ainda não foram contemplados.

Para que as atividades sejam efetivas e contínuas, é preciso incentivar e assegurar a participação, nas referidas comissões, de representantes de diferentes esferas da sociedade (governo, entidades esportivas, torcidas organizadas, imprensa e estudiosos), de maneira a enriquecer e ampliar o enfoque das análises. Da mesma forma, ainda verificamos a urgência da criação de uma corporação de segurança especializada em eventos esportivos, pois é notório que o despreparo dos atuais agentes públicos, e o tratamento por eles conferido aos torcedores – organizados ou não -, estão entre as principais causas dos conflitos violentos.

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Brasil lidera ranking de mortes ligadas ao futebol (Universidade do Futebol)

20/07/2009

No início das pesquisas, em 1999, o país estava atrás da Itália e da Argentina. Porém, em 10 anos, o Brasil passou a liderar essa estatística

Equipe Universidade do Futebol

Um dos principais problemas a ser solucionado até a Copa do Mundo de 2014, no Brasil, é a questão da violência ligada ao futebol. De acordo com a Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), com base em dados fornecidos por jornais, revistas e rádios, nos últimos 10 anos, o país foi o que registrou o maior número de mortes de torcedores. Foram 42 casos.

“Quando começamos a fazer o levantamento, o Brasil estava em terceiro lugar na comparação com outros países no número de óbitos. A ordem era Itália, Argentina e Brasil. Hoje, 10 anos depois, o Brasil conquistou o primeiro lugar. É uma conquista trágica, perversa”, afirmou Maurício Murad, sociólogo e autor do estudo.

Ele afirmou a violência deveria ser um dos temas que mais deve receber atenção de governantes, e que deve ser solucionado, caso o Brasil queira ser sede da Copa de 2014.

“Essa violência é uma preocupação para a Copa porque, de todos os problemas que a Fifa acompanha, e de tudo o que o caderno de exigências determina, a segurança pública é um dos principais. O problema da segurança pública é da maior importância para o Mundial”, disse Murad, em entrevista publicada pela Agência Brasil.

De acordo com o pesquisador, ao contrário da Itália, que promoveu uma reforma na legislação para punir exemplarmente dirigentes ou torcedores que estimularem a violência, o Brasil ainda não adotou medidas efetivas.

Segundo o estudo, os números pioraram. Se no período de 10 anos a média é de 4,2 mortes a cada ano, no período entre 2004 e 2008 o número de mortos totaliza 28, dando uma média de 5,6 por ano. Apenas em 2007 e 2008, 14 pessoas morreram, o que dá uma média de sete por ano.

“Cresceu a violência no futebol porque cresceu a violência no país. E cresceu a violência no país porque a impunidade e a corrupção são cada vez maiores”, disse o sociólogo.

Conforme a pesquisa, a maior parte das vítimas fatais era composta por jovens entre 14 e 25 anos, de classe baixa ou média baixa, com escolaridade até o ensino fundamental e, em geral, desempregado. Também foi constatado que, em grande parte, esses torcedores não eram ligados a práticas de violência.

“Em quase 80% dos casos, as pessoas não tinham nenhuma ligação com setores violentos ou delinquentes de torcidas organizadas. Apenas em 20% é que os óbitos eram de pessoas ligadas a grupos de vândalos”, concluiu Murad.

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O cravo da violência (Universidade do Futebol)

No Brasil, as frustrações geradas com o mau funcionamento dos serviços e da estrutura dos estádios contribuem para manifestações violentas

Heloisa Reis

03/07/2009

A violência urbana nos dias de jogos de futebol transformou-se em uma questão de segurança pública em diversos países. Inicialmente, parecia um problema localizado apenas na Inglaterra, onde recebeu o nome de hooliganismo. Hoje, no entanto, é um problema quase planetário. E para pensar em prevenção desta violência, é necessário buscar suas raízes, suas causas diretas e indiretas.

Quarenta e seis países europeus adotaram políticas nacionais de prevenção elaboradas a partir de um acordo firmado no Conselho da Europa. A gota d’água foi a tragédia do estádio Heysel, na Bélgica, em 1985, que deixou 39 mortos após tumulto na final da Copa dos Campeões.

Os primeiros participantes do Convênio Europeu sobre a violência e mau comportamento em eventos esportivos foram Inglaterra, Itália e Espanha. Hoje, países com o maior sucesso na promoção de espetáculos de futebol. Na Espanha, foram constituídas duas comissões para o estudo do problema: uma de senadores, com um período de trabalho de dois anos; e outra em âmbito interministerial. Tais trabalhos subsidiaram a elaboração da lei de esporte espanhola de 1990, que dedica um capítulo especificamente ao tema. A nova legislação tornou ágil o julgamento dos delitos e delimitou as penas impostas aos clubes em casos de violência de seus espectadores.

Todos os estudos realizados concluíram que a falta de infraestrutura dos estádios é geradora de atos de vandalismo e de outras formas de violência. Por isso, muitas recomendações do tratado europeu dizem respeito à modernização dos estádios. Ambientes confortáveis e seguros inibem a violência.

No Brasil, as frustrações geradas com o mau funcionamento dos serviços e da estrutura dos estádios contribuem para manifestações violentas, inclusive como forma de protesto e enfrentamento. Aqui, a gota d’água foi o confronto de torcedores no Pacaembu em 1995, na final da Copa SP de juniores. O episódio chocou a sociedade pela crueldade dos jovens agressores armados com entulhos encontrados no próprio estádio, o que é inadmissível.

Uma das explicações das raízes da violência relacionada ao esporte pode ser encontrada na gênese e no desenvolvimento do futebol moderno, visto como ambiente de produção e reprodução de valores de masculinidade. E outra, no sistema de metabolismo social do capital. Se levarmos em conta a primeira, não é de se estranhar que a “linha dura” dos grupos agressores seja formada basicamente por jovens do sexo masculino. Para eles, a valentia e a força são elementos necessários para o enfrentamento do inimigo, que pode ser os torcedores adversários, a polícia -que representa ali o Estado-, os árbitros e até os jogadores do próprio time.

A Europa vem enfrentando há alguns anos dificuldades com o racismo. Uma causa direta do problema é a intolerância dos integrantes de movimentos neonazistas que encontraram nos estádios um local para divulgar sua ideologia. Este cenário é mais um exemplo de que a violência pode se manifestar de diferentes formas. Lá, agora, a principal é o racismo. Aqui, ainda é o enfrentamento com os torcedores rivais e/ou com a polícia.

A quem serve negar o impacto PCC? (Caros Amigos)

Publicado em Sexta, 24 Agosto 2012 14:26

Por Daniel Hirata, Adalton Marques, Gabriel Feltran e Karina Biondi

“Ao ser citada em um relatório com uma redução que posiciona a cidade abaixo da linha imaginária do índice “epidêmico”, as políticas governamentais de segurança ganham enorme respaldo nacional e internacional”

As taxas de homicídios são atualmente o grande parâmetro de avaliação das políticas de segurança em todo o mundo. Assim como a cotação do dólar e a taxa de juros para a política monetária, as flutuações das taxas de homicídios vêm sendo parâmetro de avaliação da gestão pública: cidades que conseguem reduções expressivas são vistas como modelos de ”boas práticas” a replicar. São Paulo foi incluída recentemente, no relatório de 2011 do Onudoc (United Nations Office on Drugs and Crime), como um ‘case’ na redução da taxa de homicídios em comparação com outras cidades latino americanas e brasileiras. Ao ser citada em um relatório desse tipo, sobretudo com uma redução que posiciona a cidade abaixo da linha imaginária do que é considerado um índice “epidêmico”, as políticas governamentais de segurança ganham enorme respaldo nacional e internacional.

Crédito Eleitoral

Sabe-se bem como esse ganho foi capitalizado rapidamente pelo governo paulista durante a última década. Contudo, esse crédito eleitoral e, acima de tudo, político-administrativo, não foi usufruído sem que, bem longe das razões governamentais, se constituísse um lastro que sustenta outra história acerca da redução das taxas de homicídios.

Nossas pesquisas voltaram os olhos precisamente para esta versão, levando a sério aquilo que se insiste em considerar anômico: o que dizem presos e moradores das periferias de São Paulo sobre a violência, a segurança e os homicídios. Nessa mesma direção, desde 2005, temos registrado entre eles relatos da política de “paz” do PCC (Primeiro Comando da Capital) em prisões e “quebradas”, e a importância dos seus “debates” na redução dos homicídios por ali. Sabe-se que, nesses territórios, desde a primeira metade dos anos 2000, “não se pode mais matar” sem o aval do “Comando”.

“A emergência dessa forma de regulação torna complexa a deslegitimação da “segurança pública” nas periferias, onde a repressão é sua única face: seja pela política de encarceramento em massa, pela militarização da gestão pública ou pelos achaques a que seus moradores são constantemente submetidos”

A emergência dessa forma de regulação torna complexa a deslegitimação da “segurança pública” nas periferias, onde a repressão é sua única face: seja pela política de encarceramento em massa, pela militarização da gestão pública ou pelos achaques a que seus moradores são constantemente submetidos. O impacto dessas políticas nas estatísticas é evidente, embora silenciado ativamente e sistematicamente por governos e imprensa e rejeitado por ‘think tanks’ que disputam o tema segurança pública, assim como fora praticamente desconsiderado em nossas universidades há poucos anos.

Fator PCC

Há uma razoável concordância entre os especialistas de que a violência e o homicídio são fenômenos históricos e multidimensionais. Nesse sentido, é claro que o PCC não é a única causa dessa redução. Mas digamos francamente: é um absurdo fingir que o PCC não é central para compreender esse fenômeno. Em São Paulo, há muito mais mistérios por detrás da redução dos homicídios do que supõe nossa vã criminologia. Mas, principalmente, há muito mais evidências ofuscadas sob o holofote das suposições.

Afirmamos, portanto, que os sucessivos governos do PSDB em São Paulo não são os únicos fiadores da redução da taxa de homicídios no Estado, nem mesmo os majoritários. E, ao invés de atribuirmos a fiança majoritária ao PCC, preferimos falar de sua centralidade, da importância inegável de sua política de “paz entre os ladrões” para a queda dos homicídios em São Paulo.

Etnografia

Nossa aferição não é sociométrica; antes, se trata de uma problematização etnográfica. Além do que, sabe-se que os critérios de construção dessas medidas são polêmicos e cheios de controvérsias. No Rio de Janeiro, por exemplo, onde esse tipo de controvérsia emerge de forma mais visível publicamente, uma pesquisa recente do Núcleo de Estudos da Cidadania, Conflito e Violência Urbana (NECVU) sobre os “autos de resistência” problematiza a leitura fácil sobre as taxas de homicídio justamente quando volta a atenção para onde os olhos dos governos insistem em não olhar: a atuação das polícias.

“Ao largo das condecorações fáceis dos responsáveis pela miraculosa queda dos homicídios, preferimos seguir os rastros das “guerras” que continuam a aterrorizar a periferia – ainda que suas manifestações mais espetaculares tenham se tornado cíclicas”

Ao largo das condecorações fáceis dos responsáveis pela miraculosa queda dos homicídios, preferimos seguir os rastros das “guerras” (categoria usada por “ladrões” e por policiais) que continuam a aterrorizar a periferia – ainda que suas manifestações mais espetaculares tenham se tornado cíclicas. É notório em nossas pesquisas que parte das dinâmicas que produzem mortes na cidade estão relacionadas aos jogos de poder entre coletivos criminais e corporações policiais, em suas atividades oficiais e extra oficiais. A atual intensificação do caráter repressivo e militar das políticas de segurança não apenas acentua a “lógica da guerra” no controle oficial do crime, como também aumenta os custos e os conflitos operantes nos mercados extra oficiais de proteção, cujos desfechos letais são muito frequentes no cotidiano dos alvos preferenciais desse controle.

Equilíbrios Instáveis

Neste momento, ao contrário do discurso oficial que insiste em negar a existência do PCC e exibe a polícia de São Paulo como a mais eficaz do Brasil, a cidade presencia diversos assassinatos em todas as regiões da Grande São Paulo. O fato é que tanto a atuação do PCC como a das polícias são feitas a partir de equilíbrios instáveis, construídos pelas suas heterogeneidades internas e pelas relações entre ambos. Quando algo desestabiliza esse encadeamento sensível os acordos se rompem e os ciclos de mortes são detonados sem que nem mesmo seus participantes consigam identificar os autores: guerras estancadas começam a correr subterraneamente, acertos adiados passam a acontecer entre grupos com interesses conflitantes sem declaração aberta, acordos são suspensos secretamente, de modo que sempre é possível culpar o “outro lado” pela morte que não se pode nomear o autor nem as razões.

Enquanto não escancararmos com pesquisa rigorosa a caixa de pandora dessas relações para ao menos dar início ao debate, continuaremos sem qualquer resposta pública, digna, para as dezenas de assassinatos que voltaram a marcar a Grande São Paulo, bem como sem uma explicação satisfatória que correlacione a política de “pacificação” do PCC com os surtos de combate entre Estado e crime.


Daniel Hirata é pesquisador do Núcleo de Estudos da Cidadania, Conflito e Violência Urbana (NECVU) da UFRJ; Adalton Marques é doutorando do Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social da UFSCar (PPGAS-UFSCar); Gabriel Feltran é sociólogo, docente da UFSCar e membro do Centro de Estudos da Metrópole (CEM) da universidade e Karina Biondi é doutoranda do PPGAS-UFSCar

 

Mais:

Ataques em SP: “O governo fez opção pela ação direta da PM”

Ataques em SP: Defensora pública vê relação entre mortes atuais e as de maio de 2006

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Mães de Maio pede ação de Dilma para conter ataques em SP

Signs of divine intervention for Republicans? (Washington Post)

By , Published: August 21, 2012

Has God forsaken the Republican Party?

Well, sit in judgment of what’s happened in the past few days:

●A report comes out that a couple dozen House Republicans engaged in an alcohol-induced frolic, in one case nude, in the Sea of Galilee, where Jesus is believed to have walked on water, calmed the storm and, nearby, turned water into wine and performed the miracle of the loaves and fishes.

●Rep. Todd Akin, Missouri’s Republican nominee for Senate, suggests there is such a thing as “legitimate rape” and purports that women’s bodies have mysterious ways to repel the seed of rapists. He spends the next 48 hours rejecting GOP leaders’ demands that he quit the race.

●Weather forecasts show that a storm, likely to grow into Hurricane Isaac, may be chugging toward . . . Tampa, where Republicans will open their quadrennial nominating convention on Monday.

Coincidence? Or part of some Intelligent Design?

By their own logic, Republicans and their conservative allies should be concerned that Isaac is a form of divine retribution. Last year, Rep. Michele Bachmann, then a Republican presidential candidate, said that the East Coast earthquake and Hurricane Irene — another “I” storm, but not an Old Testament one — were attempts by God “to get the attention of the politicians.” In remarks later termed a “joke,” she said: “It’s time for an act of God and we’re getting it.”

The influential conservative broadcaster Glenn Beck said last year that the Japanese earthquake and tsunami were God’s “message being sent” to that country. A year earlier, Christian broadcaster and former GOP presidential candidate Pat Robertson tied the Haitian earthquake to that country’s“pact to the devil.”

Previously, Robertson had argued that Hurricane Katrina was God’s punishment for abortion, while the Rev. John Hagee said the storm was God’s way of punishing homosexuality. The late Jerry Falwellthought that God allowed the Sept. 11 attacks as retribution for feminists and the ACLU.

Even if you don’t believe God uses meteorological phenomena to express His will, it’s difficult for mere mortals to explain what is happening to the GOP just now.

By most earthly measures, President Obama has no business being reelected. No president since World War II has won reelection with the unemployment rate north of 7.4 percent. Of the presidents during that time who were returned to office, GDP growth averaged 4.7 percent during the first nine months of the election year — more than double the current rate.

But instead of being swept into office by the worst economic recovery since the Great Depression, Republicans are in danger of losing an election that is theirs to lose. Mitt Romney, often tone-deaf, has allowed Obama to change the subject to Romney’s tax havens and tax returns. And congressional Republicans are providing all kinds of reasons for Americans to doubt their readiness to assume power.

The Politico report Sunday about drunken skinny-dipping in the Sea of Galilee gave House Republicans an unwanted image of debauchery — a faint echo of the Capitol page scandal that, breaking in September 2006, cemented Republicans’ fate in that November’s elections. The 30 Republican lawmakers on the “fact-finding” mission to Israel last summer earned a rebuke from Majority Leader Eric Cantor and attracted the attention of the FBI. The naked congressman, Rep. Kevin Yoder (R-Kan.), admitted in a statement: “[R]egrettably I jumped into the water without a swimsuit.”

A boozy frolic at a Christian holy site might have been a considerable embarrassment for the party, but it was eclipsed by a bigger one: Akin’s preposterous claim on a St. Louis TV program that pregnancy is rare after a “legitimate rape” because “the female body has ways to try to shut that whole thing down.”

Republican leaders spent the next 48 hours trying to shut Akin’s whole thing down, but after a period of panic (a no-show on Piers Morgan’s show led the CNN host to show his empty chair and call him a “gutless little twerp”), Akin told radio host Mike Huckabee on Tuesday that he would fight the “big party people” and stay in the race.

The big party people had a further complication: In Tampa on Tuesday, those drafting theGOP platform agreed to retain a plank calling for a constitutional amendment banning abortion without specifying exceptions for cases of rape. In other words, the Akin position.

For a party that should be sailing toward victory, there were all the makings of a perfect storm. And, sure enough: Tuesday afternoon, the National Weather Service forecast that “Tropical Depression Nine” would strengthen into a hurricane, taking a northwesterly track over Cuba on Sunday morning — just as Republicans are arriving in Florida.

What happens next? God only knows.

George Will, Doomsday, and the Straw-Man Sighting (steadystate.org)

by Brian Czech

A funny thing happened on the way to this column. Right when I was ready to accuseWashington Post columnist George Will of building another straw man to tear apart, one of Will’s straw men appeared! It’s as if Will himself cued it up, as I’ll describe in a bit.

Meanwhile don’t get me wrong. Will isn’t right about a lot. He has long been loose with the facts on environmental issues, denying the causes and effects of resource scarcity, pollution, and climate change. His vision of perpetual economic growth is neoclassical naiveté. He displayed it again with “Calls for doomsday remain unheeded.”

Will stubbornly remains a fawning fan of the late perpetual growther Julian Simon. No one likes to criticize the deceased, and Will counts on this and other social conventions to protect himself from critique. (Recently he hid behind society’s respect for Native American tribes to shoot at federal government clean-air efforts.) But it’s not a fair tactic, I’m not falling for it, and Simon was no saint anyway. Simon’s culminating book (The Ultimate Resource 2) was the shoddiest semblance of “scholarship” I’ve ever seen, as I described at length in Shoveling Fuel for a Runaway Train. For Will to stick with Simon after all this time is a red flag over the teeny terrain of his scientific credentials.

Will has even been sucked into the junk-science vortex of Bjorn Lomborg, Simon’s disciple and darling of pro-growth propagandists like the Competitive Enterprise Institute. Will thinks “potential U.S. gas resources have doubled in the last six years,” as if even potential (not just economic) gas resources change with technology! No stranger to bad facts, Will says, “One of [Paul] Ehrlich’s advisers, John Holdren, is President Barack Obama’s science adviser.” In reality it was the other way around: Ehrlich was Holdren’s adviser. In other words Will uses a mistaken claim to unleash a twice-removed, guilt-by-association attack, all in one sentence!

Despite the fact that Will has the combined credibility of Barry Bonds and BP Oil on environmental and sustainability affairs, there are reasons for empathizing with him at times. In fact, one reason plopped in my inbox this morning! The sender, a sustainability activist, first quoted from a website of the Center for the Advancement of the Steady State Economy, “The CASSE position calls for a desirable solution — a steady state economy with stabilized population and consumption — beginning in the wealthiest nations and not with extremist tactics.” Then he went on to complain:

“Unfortunately, there is no ‘desirable solution’ — I wish there were… Industrialism is by its very nature a temporary phenomenon; in the process of perpetuating it we consume the natural resources — primarily finite, non-replenishing, and increasingly scarce NNRs — that enable it. Unfortunately the chickens are coming home to roost now — instead of 1,000 years from now — and there’s nothing that we as a species can or will do about it, except suffer the inevitable consequences.”

So when George Will talks pejoratively about “calls for doomsday,” he’s got that one legitimate point, at least. For someone (a sustainability activist no less) to claim there is no desirable solution to the problem of uneconomic growth is defeatist at best, and patently false besides. Just because a solution — such as a steady state economy running at optimal size — is difficult to achieve does not mean it is out of the question or undesirable. What we should all agree on is that perpetual growth is out of the question, and then strive for the best alternative, handling the growing pains (or in this case, the de-growing pains) along the way.

Next, to paint “industrialism” with such a broad brush that it cannot be sustained, period, is another target on the straw man’s back. We should expect Mr. Will to hit that bulls-eye every time. First of all, de-industrializing is no panacea; it’s easy to envision an unsustainable, non-industrial economy hell-bent on growth. More to the point, who is to say we cannot sustain some industrial capital and production, especially with the use of renewable resources (picture a sawmill running on hydropower), for such a very long time that no one would consider it unsustainable. The problem is perpetual growth — always expanding the capital base and trying to produce more — regardless of the mechanical means by which that growth occurs.

And then, to top it off with, “there’s nothing that we as a species can or will do about it, except suffer the inevitable consequences,” almost makes me wonder who is farther from the truth: Will or the sustainability activist. After all, the activist is either not doing anything “about it” after all, or considers himself too exceptional to be part of the human species. But I don’t, and CASSE doesn’t. We are trying to do something about it. That is, we’re advancing the steady state economy — a desirable solution — instead of sitting on our doomed derrières while lamenting the forces of “industrialism.”

I never thought I’d agree with George Will on a matter of sustainability, but I’ll admit one thing: The caricatures he constructs are not always comprised of straw. Doomsday straw does exist but, unfortunately, some sustainability activists wear it too well.

Calls for doomsday remain unheeded (Washington Post)

By George Will

11:15 PM, Aug 20, 2012

WASHINGTON — Sometimes the news is that something was not newsworthy. The United Nation’s Rio+20 conference — 50,000 participants from 188 nations — occurred in June, without consequences. A generation has passed since the 1992 Earth Summit in Rio, which begat other conferences and protocols (e.g., Kyoto). And, by now, apocalypse fatigue — boredom from being repeatedly told the end is nigh.

This began two generations ago, in 1972, when we were warned (by computer models developed at MIT) that we were doomed. We were supposed to be pretty much extinct by now, or at least miserable. We are neither. So, what when wrong?

That year begat “The Limits to Growth,” a book from the Club of Rome, which called itself “a project on the predicament of mankind.” It sold 12 million copies, staggered The New York Times (“one of the most important documents of our age”) and argued that economic growth was doomed by intractable scarcities. Bjorn Lomborg, the Danish academic and “skeptical environmentalist,” writing in Foreign Affairs, says it “helped send the world down a path of worrying obsessively about misguided remedies for minor problems while ignoring much greater concerns,” such as poverty, which only economic growth can ameliorate.

MIT’s models foresaw the collapse of civilization because of “nonrenewable resource depletion” and population growth. “In an age more innocent of and reverential toward computers,” Lomborg writes, “the reams of cool printouts gave the book’s argument an air of scientific authority and inevitability” that “seemed to banish any possibility of disagreement.” Then — as now, regarding climate change — respect for science was said to require reverential suspension of skepticism about scientific hypotheses. Time magazine’s story about “The Limits to Growth” exemplified the media’s frisson of hysteria:

“The furnaces of Pittsburgh are cold; the assembly lines of Detroit are still. In Los Angeles, a few gaunt survivors of a plague desperately till freeway center strips … Fantastic? No, only grim inevitability if society continues its present dedication to growth and ‘progress.’”

The modelers examined 19 commodities and said 12 would be gone long before now — aluminum, copper, gold, lead, mercury, molybdenum, natural gas, oil, silver, tin, tungsten and zinc. Lomborg says:

Technological innovations have replaced mercury in batteries, dental fillings and thermometers, mercury consumption is down 98 percent and its price was down 90 percent by 2000. Since 1970, when gold reserves were estimated at 10,980 tons, 81,410 tons have been mined and estimated reserves are 51,000 tons. Since 1970, when known reserves of copper were 280 million tons, about 400 million tons have been produced globally and reserves are estimated at almost 700 million tons. Aluminum consumption has increased 16-fold since 1950, the world has consumed four times the 1950 known reserves, and known reserves could sustain current consumption for 177 years. Potential U.S. gas resources have doubled in the last six years. And so on.

The modelers missed something — human ingenuity in discovering, extracting and innovating. Which did not just appear after 1972.

Aluminum, Lomborg writes, is one of earth’s most common metals. But until the 1886 invention of the Hall-Heroult process, it was so difficult and expensive to extract that “Napoleon III had bars of aluminum exhibited alongside the French crown jewels, and he gave his honored guests aluminum forks and spoons while lesser visitors had to make do with gold utensils.”

Forty years after “The Limits to Growth” imparted momentum to environmentalism, that impulse now is often reduced to children indoctrinated to “reduce, reuse, and recycle.” Lomborg calls recycling “a feel-good gesture that provides little environmental benefit at a significant cost.” He says “we pay tribute to the pagan god of token environmentalism by spending countless hours sorting, storing and collecting used paper, which, when combined with government subsidies, yields slightly lower-quality paper in order to secure a resource” — forests — “that was never threatened in the first place.”

In 1980, economist Julian Simon made a wager in the form of a complex futures contract. He bet Paul Ehrlich (whose 1968 book “The Population Bomb” predicted “hundreds of millions of people” would starve to death in the 1970s as population growth swamped agricultural production) that by 1990 the price of any five commodities Ehrlich and his advisers picked would be lower than in 1980. Ehrlich’s group picked five metals. All were cheaper in 1990.

The bet cost Ehrlich $576.07. But that year he was awarded a $345,000 MacArthur Foundation “genius” grant and half of the $240,000 Crafoord Prize for ecological virtue. One of Ehrlich’s advisers, John Holdren, is President Barack Obama’s science adviser.

George F. Will writes about foreign and domestic politics and policy for the Washington Post Writers Group. Email:georgewill@washpost.com.

Cientistas apontam problemas da cobertura da imprensa sobre mudanças climáticas (Fapesp)

Especialistas reunidos em São Paulo para debater gestão de riscos dos extremos climáticos manifestam preocupação com dificuldades enfrentadas por jornalistas para lidar com a complexidade do tema (Wikimedia)

21/08/2012

Por Fábio de Castro

Agência FAPESP – Na avaliação de especialistas reunidos em São Paulo para discutir a gestão de riscos dos extremos climáticos e desastres, para que seja possível gerenciar de forma adequada os impactos desses eventos, é fundamental informar a sociedade – incluindo os formuladores de políticas públicas – sobre as descobertas das ciências climáticas.

No entanto, pesquisadores estão preocupados com as dificuldades encontradas na comunicação com a sociedade. A complexidade dos estudos climáticos tende a gerar distorções na cobertura jornalística do tema e o resultado pode ser uma ameaça à confiança do público em relação à ciência.

A avaliação foi feita por participantes do workshop “Gestão dos riscos dos extremos climáticos e desastres na América Central e na América do Sul – o que podemos aprender com o Relatório Especial do IPCC sobre extremos?”, realizado na semana passada na capital paulista.

O evento teve o objetivo de debater as conclusões do Relatório Especial sobre Gestão dos Riscos de Extremos Climáticos e Desastres (SREX, na sigla em inglês) – elaborado e recentemente publicado pelo Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) – e discutir opções para gerenciamento dos impactos dos extremos climáticos, especialmente nas Américas do Sul e Central.

O workshop foi realizado pela FAPESP e pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), em parceria com o IPCC, o Overseas Development Institute (ODI) e a Climate and Development Knowledge (CKDN), ambos do Reino Unido, e apoio da Agência de Clima e Poluição do Ministério de Relações Exteriores da Noruega.

Durante o evento, o tema da comunicação foi debatido por autores do IPCC-SREX, especialistas em extremos climáticos, gestores e líderes de instituições de prevenção de desastres.

De acordo com Vicente Barros, do Centro de Investigação do Mar e da Atmosfera da Universidade de Buenos Aires, o IPCC, do qual é membro, entrou há três anos em um processo de reestruturação que compreende uma mudança na estratégia de comunicação.

“A partir de 2009, o IPCC passou a ser atacado violentamente e não estávamos preparados para isso, porque nossa função era divulgar o conhecimento adquirido, mas não traduzi-lo para a imprensa. Temos agora um grupo de jornalistas que procura fazer essa mediação, mas não podemos diluir demais as informações e a última palavra na formulação da comunicação é sempre do comitê executivo, porque o peso político do que é expresso pelo painel é muito grande”, disse Barros.

A linguagem é um grande problema, segundo Barros. Se for muito complexa, não atinge o público. Se for muito simplificada, tende a distorcer as conclusões e disseminar visões que não correspondem à realidade.

“O IPCC trata de problemas muito complexos e admitimos que não podemos fazer uma divulgação que chegue a todos. Isso é um problema. Acredito que a comunicação deve permanecer nas mãos dos jornalistas, mas talvez seja preciso investir em iniciativas de treinamento desses profissionais”, disse.

Fábio Feldman, do Fórum Paulista de Mudanças Climáticas, manifestou preocupação com as dificuldades de comunicação dos cientistas com o público, que, segundo ele, possibilitam que os pesquisadores “céticos” – isto é, que negam a influência humana nos eventos de mudanças climáticas – ganhem cada vez mais espaço na mídia e no debate público.

“Vejo com preocupação um avanço do espaço dado aos negacionistas no debate público. A imprensa acha que é preciso usar necessariamente o princípio do contraditório, dando espaço e importância equânimes para as diferentes posições no debate”, disse.

De acordo com Feldman, os cientistas – especialmente aqueles ligados ao IPCC – deveriam ter uma atitude mais pró-ativa no sentido de se contrapor aos “céticos” no debate público.

Posições diferentes

Para Reynaldo Luiz Victoria, da Coordenação do Programa FAPESP de Pesquisa em Mudanças Climáticas Globais, é importante que a imprensa trate as diferentes posições de modo mais equitativo.

“Há casos específicos em que a imprensa trata questões de maneira pouco equitativa – e eventualmente sensacionalista –, mas acho que nós, como pesquisadores, não temos obrigação de reagir. A imprensa deveria nos procurar para fazer o contraponto e esclarecer o público”, disse Victoria à Agência FAPESP.

Victoria, no entanto, destacou a importância de que os “céticos” também sejam ouvidos. “Alguns são cientistas sérios e merecem um tratamento equitativo. Certamente que não se pode ignorá-los, mas, quando fazem afirmações passíveis de contestação, a imprensa deve procurar alguém que possa dar um contraponto. Os jornalistas precisam nos procurar e não o contrário”, disse.

De modo geral, a cobertura da imprensa sobre mudanças climáticas é satisfatória, segundo Victoria. “Os bons jornais publicam artigos corretos e há jornalistas muito sérios produzindo material de alta qualidade”, destacou.

Para Luci Hidalgo Nunes, professora do Departamento de Geografia da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), os negacionistas ganham espaço porque muitas vezes o discurso polêmico tem mais apelo midiático do que a complexidade do conhecimento científico.

“O cientista pode ter um discurso bem fundamentado, mas que é considerado enfadonho pelo público. Enquanto isso, um pesquisador com argumentos pouco estruturados pode fazer um discurso simplificado, portanto atraente para o público, e polêmico, o que rende manchetes”, disse à Agência FAPESP.

Apesar de a boa ciência ter, em relação ao debate público, uma desvantagem inerente à sua complexidade, Nunes acredita ser importante que a imprensa continue pluralista. A pesquisadora publicou um estudo no qual analisa a cobertura do jornal O Estado de S. Paulo sobre mudanças climáticas durante um ano. Segundo Nunes, um dos principais pontos positivos observados consistiu em dar voz às diferentes posições.

“Sou favorável a que a imprensa cumpra seu papel e dê todos os parâmetros, para que haja um debate democrático. Acho que isso está sendo bem feito e a própria imprensa está aberta para nos dar mais espaço. Mas precisamos nos manifestar para criar essas oportunidades”, disse.

Nunes também considera que a cobertura da imprensa sobre mudanças climáticas, de modo geral, tem sido satisfatória, ainda que irregular. “O tema ganha vulto em determinados momentos, mas não se mantém na pauta do noticiário de forma permanente”, disse.

Segundo ela, o assunto sobressaiu especialmente em 2007, com a publicação do primeiro relatório do IPCC, e em 2012 durante a RIO+20.

“Em 2007, a cobertura foi intensa, mas a popularização do tema também deu margem a distorções e exageros. O sensacionalismo é ruim para a ciência, porque faz o tema ganhar as manchetes rapidamente por algum tempo, mas no médio prazo o efeito é inverso: as pessoas percebem os exageros e passam a olhar com descrédito os resultados científicos de modo geral”, disse.

Pai de gêmeos, um negro e outro branco (Extra)

Bruno Cunha

Fonte Extra

Finalmente eles foram reconhecidos no futebol. Enquanto um é zagueiro, tem cabelos crespos e adora doce, o outro é atacante, tem fios louros e prefere salgado. Com as diferenças, ficava difícil perceber que David Evangelista de Oliveira, o branco, e Nícolas, o negro, são irmãos gêmeos.

— Os pais dos coleguinhas do futebol achavam que só um era meu filho e que o outro era um amiguinho dele. E olha que os dois já treinam há um ano e meio. Mas só agora descobriram que são irmãos gêmeos — conta o montador de peças de laboratório Luis Carlos de Oliveira Silva, de 42 anos, pai das crianças.

Fama no bairro

Morador de Campo Grande, Luis tomou um susto quando soube da dupla gravidez da mulher, Audicelia Evangelista, de 45 anos. E outro após o nascimento dos filhos, um negro, como o pai, e outro branco, como a mãe.

— Na época, os colegas brincavam: “ah, esse aí não é seu filho, não!”. Uma vez entrei numa maternidade e o David me chamou de pai. O segurança cochichou: “não é filho dele.” Mas eu penso: os dois puxaram ao pai e à mãe — afirma Luis.

Na porta do quarto, a frase “gêmeos em ação”
Na porta do quarto, a frase “gêmeos em ação” Foto: Nina Lima / Extra

Famosos no sub-bairro Santa Rosa, Nícolas e David, aos 9 anos, já começam a colher os frutos da fama que os levou a um programa de TV ainda recém-nascidos. Outro dia mesmo foram seguidos por duas meninas que descobriram onde moravam.

— Cheguei do trabalho umas 19h30m e peguei o Nícolas passando gel no cabelo e o Davi se arrumando. Logo em seguida, duas meninas gritaram o nome deles aqui no portão. Elas estavam tomando coragem para chamá-los para sair — explica o pai, que se diverte ao saber que os filhos já estão se interessando pelas meninas.

Os gêmeos
Os gêmeos Foto: Acervo pessoal / Divulgação

Estimativa: menos de 1% de chance de incidência

O nascimento de irmãos gêmeos, um negro e outro branco, ainda surpreende. Em 2006, por exemplo, o EXTRA mostrou o caso dos irmãos Pedro e Nathan Henrique Rodrigues, que intrigou Costa Barros.

Um ano depois, o cabeleireiro Carlos Henrique Fonseca, o pai, na época com 26 anos, contou que muitas pessoas ainda estranhavam quando viam Pedro, negro como ele, ao lado de Nathan, branco como mãe, a então frentista Valéria Gomes, de 22 anos.

Diferentes, mas torcem pelo mesmo time
Diferentes, mas torcem pelo mesmo time Foto: Nina Lima / Extra

Miscigenação

A cegonha também foi generosa, em Botafogo, onde vivem as gêmeas Beatriz e Maria Gaia Gerstner, hoje com 8 anos. Uma é morena como a mãe e a outra é branca como o pai, um alemão.

— Quando estou com a branca não acham que é minha filha. E quando o pai está com a morena é a mesma coisa — conta a mãe, Janaína Gaia, de 35 anos, hoje separada do pai delas.

A diretora do Centro Vida — Reprodução Humana Assistida, na Barra, na Zona Oeste, Maria Cecília Erthal, estima que há menos de 1% de chance do nascimento de gêmeos diferentes.

— É a miscigenação que faz com que os genes de pais negros e brancos se encontrem — explica.

*   *   *

Jemima Pompeu enviou o seguinte comentário:

Gêmeos com cores de pele diferentes surpreendem pais, mas não os cientistas. Veja alguns casos no link abaixo:

Post Normal Science: Deadlines (Climate Etc.)

Posted on August 3, 2012

by Steven Mosher

Science has changed. More precisely, in post normal conditions the behavior of people doing science has changed.

Ravetz describes a post normal situation by the following criteria:

  1. Facts are uncertain
  2. Values are in conflict
  3. Stakes are high
  4. Immediate action is required

The difference between Kuhnian normal science, or the behavior of those doing science under normal conditions, and post normal science is best illustrated by example. We can use the recent discovery of the Higgs Boson as an example. Facts were uncertain–they always are to a degree; no values were in conflict; the stakes were not high; and, immediate action was not required. What we see in that situation is those doing science acting as we expect them to, according to our vague ideal of science. Because facts are uncertain, they listen to various conflicting theories. They try to put those theories to a test. They face a shared uncertainity and in good faith accept the questions and doubts of others interested in the same field. Their participation in politics is limited to asking for money. Because values are not in conflict no theorist takes the time to investigate his opponent’s views on evolution or smoking or taxation. Because the field of personal values is never in play, personal attacks are minimized. Personal pride may be at stake, but values rarely are. The stakes for humanity in the discovery of the Higgs are low: at least no one argues that our future depends upon the outcome. No scientist straps himself to the collider and demands that it be shut down. And finally, immediate action is not required; under no theory is the settling of the uncertainty so important as to rush the result. In normal science, according to Kuhn,  we can view the behavior of those doing science as puzzle solving. The details of a paradigm are filled out slowly and deliberately.

The situation in climate science are close to the polar opposite of this. That does not mean and should not be construed as a criticism of climate science or its claims. The simple point is this: in a PNS situation, the behavior of those doing science changes. To be sure much of their behavior remains the same. They formulate theories; they collect data, and they test their theories against the data. They don’t stop doing what we notional  describe as science. But, as foreshadowed above in the description of how high energy particle physicists behave, one can see how that behavior changes in a PNS situation. There is uncertainty, but the good faith that exists in normal science, the faith that other people are asking questions because they actually want the answer is gone. Asking questions, raising doubts, asking to see proof becomes suspect in and of itself. And those doing science are faced with a question that science cannot answer: Does this person really want the answer or are they amerchant of doubt? Such a question never gets asked in normal science. Normal science doesn’t ask this question because science cannot answer it.

Because values are in conflict the behavior of those doing science changes. In normal science no one would care if Higgs was a Christian or an atheist. No one would care if he voted liberal or conservative; but because two different value systems are in conflict in climate science, the behavior of those doing science changes. They investigate each other. They question motives. They form tribes.  And because the stakes are high the behavior of those doing science changes as well. They protest; they take money from lobby groups on both sides and worse of all they perform horrendous raps on youTube. In short, they become human; while those around them canonize them or demonize them and their findings become iconized or branded as hoaxes.

This brings us to the last aspect of a PNS situation: immediate action is required. This perhaps is the most contentious aspect of PNS, in fact I would argue it is thedefining characteristic. In all PNS situations it is almost always the case the one side sees the need for action, given the truth of their theory, while the doubtersmust of necessity see no need for immediate action. They must see no need for immediate action because their values are at risk and because the stakes are high. Another way to put this is as follows. When you are in a PNS situation, all sides must deny it. Those demanding immediate action, deny it by claiming more certainty*than is present; those refusing immediate action, do so by increasing demands for certainty. This leads to a centralization and valorization of the topic of uncertainty, and epistemology becomes a topic of discussion for those doing science. That is decidedly not normal science.

The demand for immediate action, however, is broader than simply a demand that society changes. In a PNS situation the behavior of those doing science changes. One of the clearest signs that you are in PNS is the change in behavior around deadlines. Normal science has no deadline. In normal science, the puzzle is solved when it is solved. In normal science there may be a deadline to shut down the collider for maintenance. Nobody rushes the report to keep the collider running longer than it should. And if a good result is found, the schedules can be changed to accommodate the scienceBroadly speaking, science drives the schedule; the schedule doesn’t drive the science.

The climategate mails are instructive here. As one reads through the mails it’s clear that the behavior of those doing science is not what one would call disinterested patient puzzle solving. Human beings acting in a situation where values are in conflict and stakes are high will engage in behavior that they might not otherwise. Those changes are most evident in situations surrounding deadlines. The point here is not to rehash The Crutape Lettersbut rather to relook at one incident ( there are others, notably around congressional hearings ) where deadlines came into play. The deadline in question was the deadline for submitting papers for consideration. As covered in The Crutape Letters and in The Hockeystick Illusion, the actions taken by those doing science around the“Jesus Paper” is instructive. In fact, were I to rewrite the Crutape letters I would do it from the perspective of PNS, focusing on how the behavior of those doing science deviated from the ideals of openness, transparency and letting truth come on its own good time.

Climategate is about FOIA. There were two critical paths for FOIA: one sought data, the other sought the emails of scientists. Not quite normal. Not normal in that data is usually shared; not normal in that we normally respect the privacy of those doing science. But this is PNS, and all bets are off. Values and practices from other fields, such as business and government,  are imported into the culture of science: Data hoarding is defended using IP and confidentiality agreements. Demanding private mail is defended using values imported from performing business for the public. In short, one sign that a science is post normal, is the attempt to import values and procedures from related disciplines. Put another way, PNS poses the question of governance. Who runs science and how should they run it.

The “Jesus paper” in a nutshell can be explained as follows. McIntyre and McKittrick had a paper published in the beginning of 2005. That paper needed to be rebutted in order to make Briffa’s job of writing chapter 6 easier. However, there was a deadline in play. Papers had to be accepted by a date certain. At one point Steven Schneider suggested the creation of a new category, a novelty–  provisionally accepted — so that the “jesus paper” could make the deadline. McIntyre covers the issue here. One need not re-adjudicate whether or not the IPCC rules were broken. And further these rules have nothing whatsoever ever to do with the truth of the claims in that paper. This is not about the truth of the science. What is important is the importation of the concept of a deadline into the search for truth. What is important is that the behavior of those doing science changes. Truth suddenly cares about a date. Immediate action is required. In this case immediate action is taken to see to it that the paper makes it into the chapter. Normal science takes no notice of deadlines. In PNS, deadlines matter.

Last week we saw another example of deadlines and high stakes changing the behavior of those doing science. The backstory here explains .   It appears to me that the behavior of those involved changed from what I have known it to be. It changed because they perceived that immediate action was required. A deadline had to be met. Again, as with the Jesus paper, the facts surrounding the releasedo not go to the truth of the claims. In normal science, a rushed claimed might very well get the same treatment as an unrushed claim: It will be evaluated on its merits. In PNS, either the rush to meet an IPCC deadline– as in the case of the Jesus paper, or the rush to be ready for congress –as in the Watts case, is enoughfor some doubt the science.  What has been testified to in Congress by Christy, a co author, may very well be true. But in this high stakes arena, where facts are uncertain and values are in conflict, the behavior of those doing science can and does change. Not all their behavior changes. They still observe and test and report. But the manner in which they do that changes. Results are rushed and data is held in secret. Deadlines change everything. Normal science doesn’t operate this way; if it does, quality can suffer. And yet, the demand for more certainty than is needed, the bad faith game of delaying action by asking questions, precludes a naïve return to science without deadlines.

The solution that Ravetz suggests is extended peer review and a recognition of the importance of quality. In truth, the way out of a PNS situation is not that simple. The first step out of a PNS situation is the recognition that one is in the situation to begin with. Today, few people embroiled in this debate would admit that the situation has changed how they would normally behave. An admission that this isn’t working is a cultural crisis for science. No one has the standing to describe how one should conduct science in a PNS situation. No one has the standing to chart the path out of a PNS situation. The best we can do is describe what we see. Today, I observe that deadlines change the behavior of those doing science. We see that in climategate; we see that in the events of the past week. That’s doesn’t entail anything about the truth of science performed under pressure. But it should make us pause and consider if truth will be found any faster by rushing the results and hiding the data.

*I circulated a copy of this to Michael Tobis to get his reaction. MT took issue with this characterization. MT, I believe, originated the argument that our uncertainty is a reason for action. It is true that while the certainty about the science  has been a the dominant piece of the rhetoric, there has been a second thread of rhetoric that bases action in the uncertainty about sensitivity. I would call this certainty shifting. While the uncertainty about facts of sensitivity are accepted in this path of argument the certainty is shifted to certainty about values and certainty about impacts. In short, the argument becomes that while we are uncertain about sensitivity the certainty we have about large impacts and trans-generational obligations necessitates action.

This summer is ‘what global warming looks like’ (AP) + related & reactions

Jul 3, 1:10 PM EDT

By SETH BORENSTEIN
AP Science Writer

AP PhotoAP Photo/Matthew Barakat

WASHINGTON (AP) — Is it just freakish weather or something more? Climate scientists suggest that if you want a glimpse of some of the worst of global warming, take a look at U.S. weather in recent weeks.

Horrendous wildfires. Oppressive heat waves. Devastating droughts. Flooding from giant deluges. And a powerful freak wind storm called a derecho.

These are the kinds of extremes experts have predicted will come with climate change, although it’s far too early to say that is the cause. Nor will they say global warming is the reason 3,215 daily high temperature records were set in the month of June.

Scientifically linking individual weather events to climate change takes intensive study, complicated mathematics, computer models and lots of time. Sometimes it isn’t caused by global warming. Weather is always variable; freak things happen.

And this weather has been local. Europe, Asia and Africa aren’t having similar disasters now, although they’ve had their own extreme events in recent years.

But since at least 1988, climate scientists have warned that climate change would bring, in general, increased heat waves, more droughts, more sudden downpours, more widespread wildfires and worsening storms. In the United States, those extremes are happening here and now.

So far this year, more than 2.1 million acres have burned in wildfires, more than 113 million people in the U.S. were in areas under extreme heat advisories last Friday, two-thirds of the country is experiencing drought, and earlier in June, deluges flooded Minnesota and Florida.

“This is what global warming looks like at the regional or personal level,” said Jonathan Overpeck, professor of geosciences and atmospheric sciences at the University of Arizona. “The extra heat increases the odds of worse heat waves, droughts, storms and wildfire. This is certainly what I and many other climate scientists have been warning about.”

Kevin Trenberth, head of climate analysis at the National Center for Atmospheric Research in fire-charred Colorado, said these are the very record-breaking conditions he has said would happen, but many people wouldn’t listen. So it’s I told-you-so time, he said.

As recently as March, a special report an extreme events and disasters by the Nobel Prize-winning Intergovernmental Panel on Climate Change warned of “unprecedented extreme weather and climate events.” Its lead author, Chris Field of the Carnegie Institution and Stanford University, said Monday, “It’s really dramatic how many of the patterns that we’ve talked about as the expression of the extremes are hitting the U.S. right now.”

“What we’re seeing really is a window into what global warming really looks like,” said Princeton University geosciences and international affairs professor Michael Oppenheimer. “It looks like heat. It looks like fires. It looks like this kind of environmental disasters.”

Oppenheimer said that on Thursday. That was before the East Coast was hit with triple-digit temperatures and before a derecho – a large, powerful and long-lasting straight-line wind storm – blew from Chicago to Washington. The storm and its aftermath killed more than 20 people and left millions without electricity. Experts say it had energy readings five times that of normal thunderstorms.

Fueled by the record high heat, this was among the strongest of this type of storm in the region in recent history, said research meteorologist Harold Brooks of the National Severe Storm Laboratory in Norman, Okla. Scientists expect “non-tornadic wind events” like this one and other thunderstorms to increase with climate change because of the heat and instability, he said.

Such patterns haven’t happened only in the past week or two. The spring and winter in the U.S. were the warmest on record and among the least snowy, setting the stage for the weather extremes to come, scientists say.

Since Jan. 1, the United States has set more than 40,000 hot temperature records, but fewer than 6,000 cold temperature records, according to the National Oceanic and Atmospheric Administration. Through most of last century, the U.S. used to set cold and hot records evenly, but in the first decade of this century America set two hot records for every cold one, said Jerry Meehl, a climate extreme expert at the National Center for Atmospheric Research. This year the ratio is about 7 hot to 1 cold. Some computer models say that ratio will hit 20-to-1 by midcentury, Meehl said.

“In the future you would expect larger, longer more intense heat waves and we’ve seen that in the last few summers,” NOAA Climate Monitoring chief Derek Arndt said.

The 100-degree heat, drought, early snowpack melt and beetles waking from hibernation early to strip trees all combined to set the stage for the current unusual spread of wildfires in the West, said University of Montana ecosystems professor Steven Running, an expert on wildfires.

While at least 15 climate scientists told The Associated Press that this long hot U.S. summer is consistent with what is to be expected in global warming, history is full of such extremes, said John Christy at the University of Alabama in Huntsville. He’s a global warming skeptic who says, “The guilty party in my view is Mother Nature.”

But the vast majority of mainstream climate scientists, such as Meehl, disagree: “This is what global warming is like, and we’ll see more of this as we go into the future.”

Intergovernmental Panel on Climate Change report on extreme weather: http://ipcc-wg2.gov/SREX/

U.S. weather records:

http://www.ncdc.noaa.gov/extremes/records/

Seth Borenstein can be followed at http://twitter.com/borenbears

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July 3, 2012

To Predict Environmental Doom, Ignore the Past

http://www.realclearscience.com

By Todd Myers

The information presented here cannot be used directly to calculate Earth’s long-term carrying capacity for human beings because, among other things, carrying capacity depends on both the affluence of the population being supported and the technologies supporting it. – Paul Ehrlich, 1986

One would expect scientists to pause when they realize their argument about resource collapse makes the king of environmental catastrophe, Paul Ehrlich, look moderate by comparison. Ehrlich is best known for a 40-year series of wildly inaccurate predictions of looming environmental disaster. Yet he looks positively reasonable compared to a paper recently published in the scientific journal Nature titled “Approaching a state shift in Earth’s biosphere.”

The paper predicts we are rapidly approaching a moment of “planetary-scale critical transition,” due to overuse of resources, climate change and other human-caused environmental damage. As a result, the authors conclude, this will “require reducing world population growth and per-capita resource use; rapidly increasing the proportion of the world’s energy budget that is supplied by sources other than fossil fuels,” and a range of other drastic policies. If these sound much like the ideas proposed in the 1970s by Ehrlich and others, like The Club of Rome, it is not a coincidence. TheNature paper is built on Ehrlich’s assumptions and cites his work more than once.

The Nature article, however, suffers from numerous simple statistical errors and assumptions rather than evidence. Its authors do nothing to deal with the fundamental mistakes that led Ehrlich and others like him down the wrong path so many times. Instead, the paper simply argues that with improved data, this time their predictions of doom are correct.

Ultimately, the piece is a good example of the great philosopher of science Thomas Kuhn’s hypothesis, written 50 years ago, that scientists often attempt to fit the data to conform to their particular scientific paradigm, even when that paradigm is obviously flawed. When confronted with failure to explain real-world phenomena, the authors of the Nature piece have, as Kuhn described in The Structure of Scientific Revolutions, devised “numerous articulations and ad hoc modifications of their theory in order to eliminate any apparent conflict.” Like scientists blindly devoted to a failed paradigm, the Nature piece simply tries to force new data to fit a flawed concept.

“Assuming this does not change”

During the last half-century, the world has witnessed a dramatic increase in food production. According to the U.N.’s Food and Agriculture Organization, yields per acre of rice have more than doubled, corn yields are more than one-and-a-half times larger than 50 years ago, and wheat yields have almost tripled. As a result, even as human population has increased, worldwide hunger has declined.

Despite these well-known statistics, the authors of the Nature study assume not only no future technological improvements, but that none have occurred over the last 200 years. The authors simply choose one data point and then project it both into the past and into the future. The authors explain the assumption that underlies their thesis in the caption to a graphic showing the Earth approaching environmental saturation. They write:

“The percentages of such transformed lands… when divided by 7,000,000,000 (the present global human population) yield a value of approximately 2.27 acres (0.92 ha) of transformed land for each person. That value was used to estimate the amount of transformed land that probably existed in the years 1800, 1900 and 1950, and which would exist in 2025 and 2045 assuming conservative population growth and that resource use does not become any more efficient.” (emphasis added)

In other words, the basis for their argument ignores the easily accessible data from the last half century. They take a snapshot in time and mistake it for a historical trend. In contrast to their claim of no change in the efficient use of resources, it would be difficult to find a time period in the last millennium when resource use did not become more efficient.

Ironically, this is the very error Ehrlich warns against in his 1986 paper – a paper the authors themselves cite several times. Despite Ehrlich’s admonition that projections of future carrying capacity are dependent upon technological change, the authors of the Nature article ignore history to come to their desired conclusion.

A Paradigm of Catastrophe

What would lead scientists to make such simplistic assumptions and flat-line projections? Indeed, what would lead Nature editors to print an article whose statistical underpinnings are so flawed? The simple belief in the paradigm of inevitable environmental catastrophe: humans are doing irreparable damage to the Earth and every bit of resource use moves us closer to that catastrophe. The catastrophe paradigm argues a simple model that eventually we will run out of space and resources, and determining the date of ultimate doom is a simple matter of doing the math.

Believing in this paradigm also justifies exaggeration in order to stave off the serious consequences of collapse. Thus, they describe the United Nations’ likely population estimate for 2050 as “the most conservative,” without explaining why. They claim “rapid climate change shows no signs of slowing” without providing a source citation for the claim, and despite an actual slowing of climate change over the last decade.

The need to avoid perceived global catastrophe also encourages the authors to blow past warning signs that their analysis is not built on solid foundations – as if the poor history of such projections were not already warning enough. Even as they admit the interactions “between overlapping complex systems, however, are providing difficult to characterize mathematically,” they base their conclusions on the simplest linear mathematical estimate that assumes nothing will change except population over the next 40 years. They then draw a straight line, literally, from today to the environmental tipping point.

Why is such an unscientific approach allowed to pass for science in a respected international journal? Because whatever the argument does not supply, the paradigm conveniently fills in. Even if the math isn’t reliable and there are obvious counterarguments, “everyone” understands and believes in the underlying truth – we are nearing the limits of the planet’s ability to support life. In this way the conclusion is not proven but assumed, making the supporting argument an impenetrable tautology.

Such a circumstance creates the conditions of scientific revolutions, where the old paradigm fails to explain real-world phenomena and is replaced by an alternative. Given the record of failure of the paradigm of resource catastrophe, dating back to the 1970s, one would hope we are moving toward such a change. Unfortunately, Nature and the authors of the piece are clinging to the old resource-depletion model, simply trying to re-work the numbers.

Let us hope policymakers recognize the failure of that paradigm before they make costly and dangerous policy mistakes that impoverish billions in the name of false scientific assumptions.

Todd Myers is the Environmental Director of the Washington Policy Center and author of the book Eco-Fads.

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Washington Policy Center exposed: Todd Myers

The Washington Policy Center labels itself as a non-partisan think tank. It’s a mischaractization to say the least but that is their bread and butter. Based in Seattle, with a director in Spokane, the WPC’s mission is to “promote free-market solutions through research and education.” It makes sense they have an environmental director in the form of Todd Myers who has a new book called“Eco-Fads: How The Rise Of Trendy Environmentalism Is Harming The Environment.” You know, since polar bears love to swim.


From the WPC’s newsletter:

Wherever we turn, politicians, businesses and activists are promoting the latest fashionable “green” policy or product. Green buildings, biofuels, electric cars, compact fluorescent lightbulbs and a variety of other technologies are touted as the next key step in protecting the environment and promoting a sustainable future. Increasingly, however, scientific and economic information regarding environmental problems takes a back seat to the social and personal value of being seen and perceived as “green.”

As environmental consciousness has become socially popular, eco-fads supplant objective data. Politicians pick the latest environmental agenda in the same way we choose the fall fashions – looking for what will yield the largest benefit with our public and social circles.

Eco-Fads exposes the pressures that cause politicians, businesses, the media and even scientists to fall for trendy environmental fads. It examines why we fall for such fads, even when we should know better. The desire to “be green” can cloud our judgment, causing us to place things that make us appear green ahead of actions that may be socially invisible yet environmentally responsible.

By recognizing the range of forces that have taken us in the wrong direction, Eco-Fads shows how we can begin to get back on track, creating a prosperous and sustainable legacy for our planet’s future. Order Eco-Fads today for $26.95 (tax and shipping included).

This is what the newsletter doesn’t tell you about Todd Myers.

Myers has spoken at the Heartland Institute’s International Conference on Climate Change. In case you didn’t know, the Heartland Institute has received significant funding from ExxonMobil, Phillip Morris and numerous other corporations and conservative foundations with vested interest in the so-called debate around climate change. That conference was co-sponsored by numerous prominent climate change denier groups, think tanks and lobby groups, almost all of which have received money from the oil industry.

Why not just call it the Washington Fallacy Center? For a litte more background, including ties back to the Koch Brothers, go HERE. In fact, Jack Kemp calls it “The Heritage Foundation of the Northwest.”

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Did climate change ’cause’ the Colorado wildfires?

By David Roberts

29 Jun 2012 1:50 PM

http://grist.org

Photo by USAF.

The wildfires raging through Colorado and the West are unbelievable. As of yesterday there were 242 fires burning, according to the National Interagency Fire Center. Almost 350 homes have been destroyed in Colorado Springs, where 36,000 people have been evacuated from their homes. President Obama is visiting today to assess the devastation for himself.

Obviously the priority is containing the fires and protecting people. But inevitably the question is going to come up: Did climate change “cause” the fires? Regular readers know that this question drives me a little nuts. Pardon the long post, but I want to try to tackle this causation question once and for all.

What caused the Colorado Springs fire? Well, it was probably a careless toss of a cigarette butt, or someone burning leaves in their backyard, or a campfire that wasn’t properly doused. [UPDATE:Turns out it was lightning.] That spark, wherever it came from, is what triggered the cascading series of events we call “a fire.” It was what philosophers call the proximate cause, the most immediate, the closest.

All the other factors being discussed — the intense drought covering the state, the dead trees left behind by bark beetles, the high winds — are distal causes. Distal causes are less tightly connected to their effects. The dead trees didn’t make any particular fire inevitable; there can be no fire without a spark. What they did is make it more likelythat a fire would occur. Distal causes are like that: probabilistic. Nonetheless, our intuitions tell us that distal causes are in many ways more satisfactory explanations. They tell us something about themeaning of events, not just the mechanisms, which is why they’re also called “ultimate” causes. It’s meaning we usually want.

When we say, “the fires in Colorado were caused by unusually dry conditions, high winds, and diseased trees,” no one accuses us of error or imprecision because it was “really” the matches or campfires that caused them. We are not expected to say, “no individual fire can be definitively attributed to hot, windy conditions, but these are the kinds of fires we would expect to see in those conditions.” Why waste the words? We are understood to be talking about distal causes.

When we talk about, not fires themselves, but the economic and socialimpacts of fires, the range of distal causes grows even broader. For a given level of damages, it’s not enough to have dry conditions and dead trees, not even enough to have fire — you also have to take into account the density of development, the responsiveness of emergency services, and the preparedness of communities for prevention or evacuation.

So if we say, “the limited human toll of the Colorado fires is the result of the bravery and skill of Western firefighters,” no one accuses us of error or imprecision because good firefighting was only one of many contributors to the final level of damages. Everything from evacuation plans to the quality of the roads to the vagaries of the weather contributed in some way to that state of affairs. But we are understood to be identifying a distal cause, not giving a comprehensive account of causation.

What I’m trying to say is, we are perfectly comfortable discussing distal causes in ordinary language. We don’t require scientistic literalism in our everyday talk.

The reason I’m going through all this, you won’t be surprised, is to tie it back to climate change. We know, of course, that climate change was not the proximate cause of the fires. It was a distal cause; it made the fires more likely. That much we know with a high degree of confidence, as this excellent review of the latest science by Climate Communication makes clear.

One can distinguish between distal causes by their proximity to effects. Say the drought made the fires 50 percent more likely than average June conditions in Colorado. (I’m just pulling these numbers out of my ass to illustrate a point.) Climate change maybe only made the fires 1 percent more likely. As a cause, it is more distal than the drought. And there are probably causes even more distal than climate change. Maybe the exact tilt of the earth’s axis this June made the fires 0.0001 percent more likely. Maybe the location of a particular proton during the Big Bang made them 0.000000000000000001 percent more likely. You get the point.

With this in mind, it’s clear that the question as it’s frequently asked — “did climate change cause the fires?” — is not going to get us the answer we want. If it’s yes or no, the answer is “yes.” But that doesn’t tell us much. What people really want to know when they ask that question is, “how proximate a cause is climate change?”

When we ask the question like that, we start to see why climate is such a wicked problem. Human beings, by virtue of their evolution, physiology, and socialization, are designed to heed causes within a particular range between proximate and distal. If I find my kid next to an overturned glass and a puddle of milk and ask him why the milk is spilled, I don’t care about the neurons firing and the muscles contracting. That’s too proximate. I don’t care about humans evolving with poor peripheral vision. That’s too distal. I care about my kid reaching for it and knocking it over. That’s not the only level of causal explanation that is correct, but it’s the level of causal explanation that is most meaningful to me.

For a given effect — a fire, a flood, a dead forest — climate change is almost always too distal a cause to make a visceral impression on us. We’re just not built to pay heed to those 1 percent margins. It’s too abstract. The problem is, wildfires being 1 percent more likely averaged over the whole globe actually means a lot more fires, a lot more damage, loss, and human suffering. Part of managing the Anthropocene is finding ways of making distal causes visceral, giving them a bigger role in our thinking and institutions.

That’s what the “did climate change cause XYZ?” questions are always really about: how proximate a cause climate change is, how immediate its effects are in our lives, how close it is.

There is, of course, a constant temptation among climate hawks to exaggerate how proximate it is, since, all things being equal, proximity = salience. But I don’t think that simply saying “climate change caused the fires” is necessarily false or exaggerated, any more than saying “drought caused the fires” is. The fact that the former strikes many people as suspect while the latter is immediately understood mostly just means that we’re not used to thinking of climate change as a distal cause among others.

That’s why we reach for awkward language like, “fires like this are consonant with what we would expect from climate change.” Not because that’s the way we discuss all distal causes — it’s clearly not — but simply because we’re unaccustomed to counting climate change among those causes. It’s an unfamiliar habit. As it grows more familiar, I suspect we’ll quit having so many of these tedious semantic disputes.

And I’m afraid that, in coming years, it will become all-too familiar.

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Perspective On The Hot and Dry Continental USA For 2012 Based On The Research Of Judy Curry and Of McCabe Et Al 2004

http://pielkeclimatesci.wordpress.com

Photo is from June 26 2012 showing start of the June 26 Flagstaff firenear Boulder Colorado

I was alerted to an excellent presentation by Judy Curry [h/t to Don Bishop] which provides an informative explanation of the current hot and dry weather in the USA. The presentation is titled

Climate Dimensions of the Water Cycle by Judy Curry

First, there is an insightful statement by Judy where she writes in slide 5

CMIP century scale simulations are designed for assessing sensitivity to greenhouse gases using emissions scenarios They are not fit for the purpose of inferring decadal scale or regional climate variability, or assessing variations associated with natural forcing and internal variability. Downscaling does not help.

We need a much broader range of scenarios for regions (historical data, simple models, statistical models, paleoclimate analyses, etc). Permit creatively constructed scenarios as long as they can’t be falsified as incompatible with background knowledge.

With respect to the current hot and dry weather, the paper referenced by Judy in her Powerpoint talk

Gregory J. McCabe, Michael A. Palecki, and Julio L. Betancourt, 2004: Pacific and Atlantic Ocean influences on multidecadal drought frequency in the United States. PNAS 2004 101 (12) 4136-4141; published ahead of print March 11, 2004, doi:10.1073/pnas.0306738101

has the abstract [highlight added]

More than half (52%) of the spatial and temporal variance in multidecadal drought frequency over the conterminous United States is attributable to the Pacific Decadal Oscillation (PDO) and the Atlantic Multidecadal Oscillation (AMO). An additional 22% of the variance in drought frequency is related to a complex spatial pattern of positive and negative trends in drought occurrence possibly related to increasing Northern Hemisphere temperatures or some other unidirectional climate trend. Recent droughts with broad impacts over the conterminous U.S. (1996, 1999–2002) were associated with North Atlantic warming (positive AMO) and northeastern and tropical Pacific cooling (negative PDO). Much of the long-term predictability of drought frequency may reside in the multidecadal behavior of the North Atlantic Ocean. Should the current positive AMO (warm North Atlantic) conditions persist into the upcoming decade, we suggest two possible drought scenarios that resemble the continental-scale patterns of the 1930s (positive PDO) and 1950s (negative PDO) drought.

They also present the figure below with the title “Impact of AMO, PDO on 20-yr drought frequency (1900-1999)”.   The figures correspond to A: Warm PDO, cool AMO; B: Cool PDO, cool AMO; C: Warm PDO, warm AMO and D:  Cool PDO, warm AMO

The current Drought Monitor analysis shows a remarkable agreement with D, as shown below

As Judy shows in her talk (slide 8) since 1995 we have been in a warm phase of the AMO and have entered a cool phase of the PDO. This corresponds to D in the above figure.  Thus the current drought and heat is not an unprecedented event but part of the variations in atmospheric-ocean circulation features that we have seen in the past.  This reinforces what Judy wrote that

[w]e need a much broader range of scenarios for regions (historical data, simple models, statistical models, paleoclimate analyses

in our assessment of risks to key resources due to climate. Insightful discussions of the importance of these circulation features are also presented, as just a few excellent examples, by Joe Daleo  and Joe Bistardi on ICECAP, by Bob Tisdale at Bob Tisdale – Climate Observations, and in posts on Anthony Watts’s weblog Watts Up With That.

 

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Hotter summers could be a part of Washington’s future

http://www.washingtonpost.com

By  and , Published: July 5

As relentless heat continues to pulverize Washington, the conversation has evolved from when will it end to what if it never does?

Are unbroken weeks of sweltering weather becoming the norm rather than the exception?

The answer to the first question is simple: Yes, it will end. Probably by Monday.

The answer to the second, however, is a little more complicated.

Call it a qualified yes.

“Trying to wrap an analysis around it in real time is like trying to diagnose a car wreck as the cars are still spinning,” said Deke Arndt, chief of climate monitoring at the National Climatic Data Center in Asheville, N.C. “But we had record heat for the summer season on the Eastern Seaboard in 2010. We had not just record heat, but all-time record heat, in the summer season in 2011. And then you throw that on top of this [mild] winter and spring and the year to date so far, it’s very consistent with what we’d expect in a warming world.”

Nothing dreadfully dramatic is taking place — the seasons are not about to give way to an endless summer.

Heat-trapping greenhouse gases pumped into the atmosphere may be contributing to unusually hot and long heat waves — the kind of events climate scientists have long warned will become more common. Many anticipate a steady trend of ever-hotter average temperatures as human activity generates more and more carbon pollution.

To some, the numbers recorded this month and in recent years fit together to suggest a balmy future.

“We had a warm winter, a cold spring and now a real hot summer,” said Jessica Miller, 21, a visitor from Ohio, as she sat on a bench beneath the trees in Lafayette Square. “I think the overall weather patterns are changing.”

Another visitor, who sat nearby just across from the White House, shared a similar view.

“I think it’s a natural changing of the Earth’s average temperatures,” said Joe Kaufman, a Pennsylvanian who had just walked over from Georgetown.

Arndt said he expects data for the first half of this year will show that it was the warmest six months on record. Experts predict that average temperatures will rise by 3 to 5 degrees by mid-century and by 6 to 10 degrees by the end of the century.

If that worst prediction comes true, 98 degrees will become the new normal at this time of year in Washington 88 years from now.

Will every passing year till then break records?

“Not so much record-breaking every year,” Arndt said. “But we’ll break records on the warm end more often than on the cold end, that’s for sure. As we continue to warm, we will be flirting with warm records much more than with cold records, and that’s what’s played out over much of the last few years.”

If the present is our future, it may be sizzling. The current heat wave has had eight consecutive days of 95-degree weather. The temperature may reach 106 on Saturday, and the first break will come Monday, when a few days of more seasonable highs in the upper 80s are expected.

The hot streak began June 28 and peaked the next day with a 104-degree record-breaker, the hottest temperature ever recorded here in June. That broke a record of 102 set in 1874 and matched in June 2011.

 

 

The top five things voters need to know about conservatives and climate change (Grist.org)

By David Roberts4 Jun 2012 3:46 PM

Five! (Photo by woodleywonderworks)I’ve seen a recent surge of stories about conservatives and climate change. None of them, oddly, tell voters what they most need to know on the subject. In fact, one of them does the opposite. (Grrrr …)I respond in accordance with internet tradition: a listicle!
5. Conservatives have a long history of advancing environmental progress. In a column directed to Mitt Romney, Thomas Friedman reels off(one suspects from memory) “the G.O.P.’s long tradition of environmental stewardship that some Republicans are still proud of: Teddy Roosevelt bequeathed us national parks, Richard Nixon the Clean Air Act and the Environmental Protection Agency, Ronald Reagan the Montreal Protocol to protect the ozone layer and George H. W. Bush cap-and-trade that reduced acid rain.” This familiar litany is slightly misleading, attributing to presidents what is mostly the work of Congresses, but the basic point is valid enough: In the 20th century, Republicans have frequently played a constructive role on the environment.
4. There is a conservative approach to addressing climate change. Law professor Jonathan Adler has laid it out in the past and does so again in a much-discussed post over at The Atlantic. He suggests prizes for innovation, reduced regulatory barriers to alternative energy, a revenue-neutral carbon tax, and some measure of adaptation.It’ll be no surprise to Adler or anyone else that I believe the problem is more severe than he does; solving it — as opposed to just “doing something” — will involve a far more vigorous government role than he envisions. But he makes an eloquent, principled case for the simple notion that “embrace of limited government principles need not entail the denial of environmental claims.” Conservatives could, if they wanted, spend their time arguing for their preferred solutions rather than denying scientific results.
3. There are conservatives who believe in taking action on climate change. Even thosedismal polls we’re always talking about find 30 or 40 percent of Republicans acknowledging the threat of climate change. And support for clean air and clean energy policies remains high across the board. Heck, some — OK, a tiny handful of — conservatives are even brave enough to say so in public! It’s really only the hard nut of the GOP, anywhere from 15 to 30 percent, depending on how you measure, that is intensely and ideologically opposed to climate science and solutions alike. Oh, and almost all Republicans in Congress.
2. Mitt Romney used to say and do moderate things on green issues when he was governor of Massachusetts. He spoke in favor of the Regional Greenhouse Gas Initiative, a cap-and-trade system for Northeastern states, and introduced the Massachusetts Climate Protection Plan. He wasn’t afraid to crack down on coal plants — I never get tired of thisremarkable video:Romney also directed considerable state funding to renewable energy companies and waged open war on sprawl. It’s almost like he was running a state where that kind of stuff was popular.
1. The Republican establishment has gone nuts on climate change and the environment.This, more than anything, is what American voters need to know about the Republican Party — not what Republicans used to do, or what one or two outliers say, but what the party as an extant political force is devoted to today. The actually existing GOP wants todismantle the EPA, open more public land to coal mining and oil drilling, remove what regulatory constraints remain on fossil-fuel companies, slash the budget for clean-energy research and deployment, scrap CAFE and efficiency standards, protect inefficient light bulbs, withdraw from all international negotiations or efforts on climate, and stop the military from using less oil.
Which brings me to the piece that drives me crazy, from National Journal‘s customarily excellent Amy Harder: “Campaign Energy Messages Differ; Policies Not So Much.”Seriously?No … seriously?I know journalists don’t headline their own pieces. But the piece itself isn’t much better. Take this bit:

Whether the data is inflated or not, the message that may be coming across most to voters is that there really isn’t much difference between Obama’s policies and those likely to be pursued in a Romney administration.

Ah, so the problem is not that Obama and Romney would have similar energy policies. That’s just the message “coming across to most voters.
”Now, if you’re a journalist, and you determine that voters are receiving a wildly incorrect message, what do you do? Do you write a story about their receipt of the incorrect message? Or do you correct the message?
The fact is, Romney would not pursue the same energy policies that Obama is pursuing. At all. Not even a little bit. It’s interesting, I suppose, that Romney used to run a state (and a state party) where moderate energy policy was demanded by voters. But what matters now is that Mitt Romney serves the present-day Republican Party, which has gone crazy.
The notion that Mitt Romney will rediscover some hidden internal moderate and buck the party on this stuff is just a VSP fantasy. Ever since he started running for president (this time around, anyway), he’s been frantically trying to please the right-wing base. Friedman says Romney’s “biggest challenge in attracting independent swing voters will be overcoming a well-earned reputation for saying whatever the Republican base wants to hear.” But self-styled centrists like Friedman have been saying this kind of thing forever and there remains very little indication that any Republican politician faces a tangible cost for pandering to the right.
Romney will not be elected to follow his heart. He’ll be elected to ratify the GOP agenda. Grover Norquist, a man with as much claim to leadership of the GOP as anyone, made his feelings on the matter extremely clear at CPAC:

All we have to do is replace Obama. … We are not auditioning for fearless leader. We don’t need a president to tell us in what direction to go. We know what direction to go. … We just need a president to sign this stuff. We don’t need someone to think it up or design it. The leadership now for the modern conservative movement for the next 20 years will be coming out of the House and the Senate.…Pick a Republican with enough working digits to handle a pen to become president of the United States. This is a change for Republicans: the House and Senate doing the work with the president signing bills. His job is to be captain of the team, to sign the legislation that has already been prepared. [my emphasis]

Mitt Romney is well-aware — and if he wasn’t before, the primary taught him — that his job is to “sign the legislation that has already been prepared.” The leadership of the party is in Congress. It has declared skepticism of climate science the de facto party position. It has declared open war on clean energy, efficiency, and environmental protections. It has made clear that it will support fossil-fuel companies at every juncture.
That’s conservatives and climate for you. It’s interesting, intellectually, that there’s a history of green moderation in the party; that there’s a conceptual space where titular conservative principles overlap with climate protection; that many self-identified Republicans aren’t as crazy as their leaders; and that Romney used to pander in a different direction. But what’s relevant to voters who value climate and environmental protection is that they won’t get any under a GOP administration or a GOP Congress.

Tomgram: Bill McKibben, Climate-Change Deniers Have Done Their Job Well (TomDispatch.com)

Posted by Bill McKibben at 4:40pm, June 3, 2012.

Here’s the thing about climate-change deniers: these days before they sit down to write their blog posts, they have to turn on the AC.  After all, it might as well be July in New York (where I’m writing this), August in Chicago (where a century-old heat record was broken in late May), and hellat the Indy 500.  Infernos have been raging from New Mexico and Colorado, where the fire season started early, to the shores of Lake Superior, where dry conditions and high temperatures led to Michigan’s third largest wildfire in its history.  After a March heat wave for the record books, we now have summer in late spring, the second-named tropical storm of the season earlier than ever recorded, and significant drought conditions, especially in the South and Southwest.  In the meantime, carbon dioxide (and other greenhouse gases) continue to head for the atmosphere inrecord quantities.  And in case anyone living in a big city doesn’t know it, heat can kill.

It’s true that no single event can be pinned on climate change with absolute certainty.  But anyone who doesn’t think we’re in a fierce new world of weather extremes — and as TomDispatch regularBill McKibben has suggested, on an increasingly less hospitable planet that he calls Eaarth — is likely to learn the realities firsthand soon enough.  Not so long ago, if you really wanted to notice the effects of climate change around you, you had to be an Inuit, an Aleut, or some other native of the far north where rising temperatures and melting ice were visibly changing the landscape and wrecking ways of life — or maybe an inhabitant of Kiribati.  Now, it seems, we are all Inuit or Pacific islanders.  And the latest polling numbers indicate that Americans are finally beginning to notice in their own lives, and in numbers that may matter.

With that in mind, we really do need a new term for the people who insist that climate change is a figment of some left-wing conspiracy or a cabal of miscreant scientists.  “Denial” (or the more active “deniers”) seems an increasingly pallid designation in our new world.  Consider, for instance, that in low-lying North Carolina, a leading candidate for disaster from globally rising sea levels, coastal governments and Republicans in the state legislature are taking action: they are passing resolutions against policies meant to mitigate the damage from rising waters and insisting that official state sea-level calculations be made only on the basis of “historic trends,” with no global warming input.  That should really stop the waters!

In the meantime, this spring greenhouse-gas monitoring sites in the Arctic have recorded a startling first: 400 parts per million of carbon dioxide in the atmosphere.  It’s an ominous line to cross (and so quickly).  As in the name of McKibben’s remarkable organization, 350.org, it’s well above the safety line for what this planet and many of the species on it, including us, can take in the long term, and heat-trapping gases in the atmosphere are still on the rise.  All of this is going to get ever harder to “deny,” no matter what resolutions are passed or how measurements are restricted.  In the meantime, the climate-change deniers, McKibben reports, are finally starting to have troubles of their own. Tom

The Planet Wreckers
Climate-Change Deniers Are On the Ropes — But So Is the Planet

By Bill McKibben

It’s been a tough few weeks for the forces of climate-change denial.

First came the giant billboard with Unabomber Ted Kacynzki’s face plastered across it: “I Still Believe in Global Warming. Do You?” Sponsored by the Heartland Institute, the nerve-center of climate-change denial, it was supposed to draw attention to the fact that “the most prominent advocates of global warming aren’t scientists. They are murderers, tyrants, and madmen.” Instead it drew attention to the fact that these guys had over-reached, and with predictable consequences.

A hard-hitting campaign from a new group called Forecast the Facts persuaded many of the corporations backing Heartland to withdraw $825,000 in funding; an entire wing of the Institute, devoted to helping the insurance industry, calved off to form its own nonprofit. Normally friendly politicians like Wisconsin Republican Congressman Jim Sensenbrenner announced that they would boycott the group’s annual conference unless the billboard campaign was ended.

Which it was, before the billboards with Charles Manson and Osama bin Laden could be unveiled, but not before the damage was done: Sensenbrenner spoke at last month’s conclave, but attendance was way down at the annual gathering, and Heartland leaders announced that there were no plans for another of the yearly fests. Heartland’s head, Joe Bast, complained that his side had been subjected to the most “uncivil name-calling and disparagement you can possibly imagine from climate alarmists,” which was both a little rich — after all, he was the guy with the mass-murderer billboards — but also a little pathetic.  A whimper had replaced the characteristically confident snarl of the American right.

That pugnaciousness may return: Mr. Bast said last week that he was finding new corporate sponsors, that he was building a new small-donor base that was “Greenpeace-proof,” and that in any event the billboard had been a fine idea anyway because it had “generated more than $5 million in earned media so far.” (That’s a bit like saying that for a successful White House bid John Edwards should have had more mistresses and babies because look at all the publicity!) Whatever the final outcome, it’s worth noting that, in a larger sense, Bast is correct: this tiny collection of deniers has actually been incredibly effective over the past years.

The best of them — and that would be Marc Morano, proprietor of the website Climate Depot, and Anthony Watts, of the website Watts Up With That — have fought with remarkable tenacity to stall and delay the inevitable recognition that we’re in serious trouble. They’ve never had much to work with.  Only one even remotely serious scientist remains in the denialist camp.  That’s MIT’s Richard Lindzen, who has been arguing for years that while global warming is real it won’t be as severe as almost all his colleagues believe. But as a long article in the New York Times detailed last month, the credibility of that sole dissenter is basically shot.  Even the peer reviewers he approved for his last paper told the National Academy of Sciences that it didn’t merit publication. (It ended up in a “little-known Korean journal.”)

Deprived of actual publishing scientists to work with, they’ve relied on a small troupe of vaudeville performers, featuring them endlessly on their websites. Lord Christopher Monckton, for instance, an English peer (who has been officially warned by the House of Lords to stop saying he’s a member) began his speech at Heartland’s annual conference by boasting that he had “no scientific qualification” to challenge the science of climate change.

He’s proved the truth of that claim many times, beginning in his pre-climate-change career when he explained to readers of the American Spectator that “there is only one way to stop AIDS. That is to screen the entire population regularly and to quarantine all carriers of the disease for life.” His personal contribution to the genre of climate-change mass-murderer analogies has been to explain that a group of young climate-change activists who tried to take over a stage where he was speaking were “Hitler Youth.”

Or consider Lubos Motl, a Czech theoretical physicist who has never published on climate change but nonetheless keeps up a steady stream of web assaults on scientists he calls “fringe kibitzers who want to become universal dictators” who should “be thinking how to undo your inexcusable behavior so that you will spend as little time in prison as possible.” On the crazed killer front, Motl said that, while he supported many of Norwegian gunman Anders Breivik’s ideas, it was hard to justify gunning down all those children — still, it did demonstrate that “right-wing people… may even be more efficient while killing — and the probable reason is that Breivik may have a higher IQ than your garden variety left-wing or Islamic terrorist.”

If your urge is to laugh at this kind of clown show, the joke’s on you — because it’s worked. I mean, James Inhofe, the Oklahoma Republican who has emerged victorious in every Senate fight on climate change, cites Motl regularly; Monckton has testified four times before the U.S. Congress.

Morano, one of the most skilled political operatives of the age — he “broke the story” that became the Swiftboat attack on John Kerry — plays rough: he regularly publishes the email addresses of those he pillories, for instance, so his readers can pile on the abuse. But he plays smart, too. He’s a favorite of Fox News and of Rush Limbaugh, and he and his colleagues have used those platforms to make it anathema for any Republican politician to publicly express a belief in the reality of climate change.

Take Newt Gingrich, for instance.  Only four years ago he was willing to sit on a love seat with Nancy Pelosi and film a commercial for a campaign headed by Al Gore.  In it he explained that he agreed with the California Congresswoman and then-Speaker of the House that the time had come for action on climate. This fall, hounded by Morano, he was forced to recant again and again.  His dalliance with the truth about carbon dioxide hurt him more among the Republican faithful than any other single “failing.”  Even Mitt Romney, who as governor of Massachusetts actually took some action on global warming, has now been reduced to claiming that scientists may tell us “in fifty years” if we have anything to fear.

In other words, a small cadre of fervent climate-change deniers took control of the Republican party on the issue.  This, in turn, has meant control of Congress, and since the president can’t sign a treaty by himself, it’s effectively meant stifling any significant international progress on global warming.  Put another way, the variousright wing billionaires and energy companies who have bankrolled this stuff have gotten their money’s worth many times over.

One reason the denialists’ campaign has been so successful, of course, is that they’ve also managed to intimidate the other side. There aren’t many senators who rise with the passion or frequency of James Inhofe but to warn of the dangers of ignoring what’s really happening on our embattled planet.

It’s a striking barometer of intimidation that Barack Obama, who has a clear enough understanding of climate change and its dangers, has barely mentioned the subject for four years.  He did show a little leg to his liberal base in Rolling Stoneearlier this spring by hinting that climate change could become a campaign issue.  Last week, however, he passed on his best chance to make good on that promise when he gave a long speech on energy at an Iowa wind turbine factory without even mentioning global warming. Because the GOP has been so unreasonable, the President clearly feels he can take the environmental vote by staying silent, which means the odds that he’ll do anything dramatic in the next four years grow steadily smaller.

On the brighter side, not everyone has been intimidated.  In fact, a spirited counter-movement has arisen in recent years.  The very same weekend that Heartland tried to put the Unabomber’s face on global warming, 350.org conducted thousands of rallies around the globe to show who climate change really affects. In a year of mobilization, we also managed to block — at least temporarily — the Keystone pipeline that would have brought the dirtiest of dirty energy, tar-sands oil, from the Canadian province of Alberta to the Gulf Coast.  In the meantime, our Canadian allies are fighting hard to block a similar pipeline that would bring those tar sands to the Pacific for export.

Similarly, in just the last few weeks, hundreds of thousands have signed on to demand an end to fossil-fuel subsidies. And new polling data already show more Americans worried about our changing climate, because they’ve noticed the freakish weather of the last few years and drawn the obvious conclusion.

But damn, it’s a hard fight, up against a ton of money and a ton of inertia. Eventually, climate denial will “lose,” because physics and chemistry are not intimidated even by Lord Monckton. But timing is everything — if he and his ilk, a crew of certified planet wreckers, delay action past the point where it can do much good, they’ll be able to claim one of the epic victories in political history — one that will last for geological epochs.

Bill McKibben is Schumann Distinguished Scholar at Middlebury College, founder of the global climate campaign 350.org, a TomDispatch regular, and the author, most recently, of Eaarth: Making a Life on a Tough New Planet.

Copyright 2012 Bill McKibben

Cientistas da USP continuam fiéis ao IPCC (Jornal do Campus-USP) + carta de Ricardo Felício

por   e 

Especialistas defendem a credibilidade do painel climático mundial e opinam sobre o aquecimento global

Desde novembro do ano passado, o IPCC passa por uma crise de credibilidade. Na ocasião foram encontrados erros no relatório que deu ao painel o Prêmio Nobel da Paz em 2007. O mais grave deles era uma previsão sobre o degelo do Himalaia até 2035. Na mesma época vieram a público trocas de e-mails entre seus cientistas insinuando que pesquisas que negam o aquecimento global não seriam avaliadas pelo IPCC. O caso ficou conhecido como Climategate.

Os acontecimentos serviram de argumento para os céticos, aqueles que defendem que o aquecimento global é um fenômeno natural com precedentes ao longo da história e não tem relação com as ações do homem no planeta.

A polêmica ganhou novamente os holofotes da mídia em fevereiro, quando o secretário executivo do painel pediu demissão do cargo. Imediatamente o presidente da instituição, Rajendra Pachauri, anunciou que não mediria esforços para propor um conjunto de medidas que assegurem mais rigor científico nos relatórios e maior controle sobre os especialistas que os produzem.

Sem crise

Tércio Ambrizzi acredita que mais cuidado pode evitar dados incorretos. No entanto, “quando olhado no geral, o relatório do IPCC é muito sólido”, acredita. Segundo ele, mais de mil páginas são analisadas e esse volume dá margem para que algum erro escape. Quanto aos emails publicados, Ambrizzi diz que a invasão da privacidade é algo extremamente perigoso. “Em ciência não é assim que você prova que um resultado científico está errado. Você prova com a ciência”.

Paulo Artaxo compartilha dessa visão, também enfatizando o esforço que os cientistas têm com o relatório: “Ter duas citações que merecem ser corrigidas não invalida o trabalho intenso de milhares de cientistas ao longo de muitos anos”.

A professora Ilana Wainer, presidente da Comissão de Pesquisa do Instituto de Oceanografia (IO), vai além na defesa da credibilidade do IPCC. A professora diz que não vê crise “no que diz respeito à ciência, que é irrefutável e determinística”.

A cientista do IO é enfática ao afirmar que o Climategate foi baseado num verdadeiro roubo de emails de pesquisadores do centro de pesquisa do clima em East Anglia (Reino Unido). “Foram mais de 1000 emails e os ‘céticos’ tentaram desacreditar a ciência das mudanças climáticas baseados nisso e só conseguiram achar um ou outro email pessoal. Existe uma base científica sólida que sustenta a afirmação de que o aquecimento global das últimas quatro, cinco décadas vem da ação do homem”.

(ilustração: Hugo Neto)

Aquecimento global

Para Artaxo, o homem está alterando de modo significativo vários aspectos do planeta. Ele cita como exemplo a queima de combustíveis fósseis nos últimos 150 anos e as alterações no uso do solo, como a troca intensiva de florestas por plantações: “A acumulação adicional de gases de efeito estufa na atmosfera aumentou a temperatura média de nosso planeta em 0.7 graus centígrados nos últimos 150 anos”.

Ambrizzi e Ilana também são categóricos na defesa do aquecimento global e da interferência do homem. “O aquecimento global está ocorrendo e é inequívoca a participação do homem nisso”, afirma a professora do IO.

Já Aretha Sanchez, advogada e autora de pesquisa sobre mudanças climático-ambientais desenvolvida pelo Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (Ipen), afirma que mudanças climáticas são comprovadas por registros através do tempo.  “Essas alterações ocorrem por fatores externos ou internos à Terra – dentre os internos, temos a presença humana”, diz Aretha.

Iceberg gigante

Perguntada se o desprendimento do iceberg gigante na Antártida tem relação com o aquecimento global, Ilana explica que “do lado continental há acúmulo de neve/gelo; do lado oceânico ocorre um processo conhecido como calving, que é a liberação repentina e o rompimento de uma massa de gelo de uma geleira. O gelo que rompe pode ser classificado como um iceberg. O desprendimento desse grande iceberg pode ocorrer normalmente como parte do balanço de massa da geleira. O aquecimento global favorece, sim, a intensificação do calving e maior frequência de icebergs, mas não necessariamente está associado ao tamanho deles”.

*   *   *

Carta aberta de Ricardo Augusto Felicio, professor de climatologia do Departamento de Geografia da FFLCH, endereçada ao Jornal do Campus (JC) da USP

Lamentável e repugnante a matéria deste jornal da primeira quinzena de março de 2010, informando que os cientistas da USP permanecem fiéis ao
IPCC <http://www.jornaldocampus.usp.br/index.php/2010/03/cientistas-da-usp-continuam-fieis-ao-ipcc/>.

Vocês deveriam se retratar em público por tamanho absurdo. Somos muitos os pesquisadores desta instituição que negam as imbecilidades pregadas, em
forma de dogma, da patifaria imposta por ONGs, ONU e interesses de governos internacionais.

Cientista não pode ser fiel, muito menos a um órgão político da ONU que nada tem de científico. O jornal ainda peca ao falar dos 2000 cientistas. Eles não devem passar atualmente de 100 ou 200. Só em 2008, mais de 600 caíram fora, alegando que não mais participariam deste conluio. O número real expressa um avolumando contingente de membros de ONGs, políticos e burocratas que nada tem a ver com ciência. Esta é a realidade que custa a ser demonstrada aqui no Brasil.

Enquanto a briga lá fora está acirrada devido aos diversos escândalos, quase semanais, encontrados nos afazeres do IPCC e seus asseclas, a nossa
imprensa se cala, não trazendo as grandes discussões diárias sobre o assunto que vemos em outros países.

Só mesmo pseudocientistas, engajados em interesses econômicos, é que se curvam ao IPCC. E pelo que vemos, temos muitos aqui dentro.

Então lançamos o desafio, exatamente como é feito no exterior: *mostrem a evidência! *Já adiantamos que não aceitamos: “eu acho” ou “eu creio”; saída
de modelos de computador e nem dogmas.

A grande prova de que eles não tem nada é sua fuga das discussões e seus ridículos planos, atrelados ao uso do “princípio da precaução, porque na falta de plena certeza científica, devem-se tomar medidas de mitigação imediatas”.

Qual a finalidade da pesquisa científica séria e dedicada, se no final das contas a resposta já está dada de antemão – se o aquecimento global fosse verdadeiro, deveríamos tomar medidas mitigatórias, mas se ele não for comprovado (como não o é) devemos tomar *exatamente as mesmas medidas*, apenas por precaução?

Que futuro resta para a ciência climática, se ela não é mais ouvida, pois todas as decisões em nome dela já foram tomadas? Sem falar da idéia de consenso, pois todos já admitiram que o homem causa “aquecimento global”, também confundido com “mudanças climáticas”. Oras, só nestas afirmações nós
percebemos como eles são totalmente contraditórios.

Sem falar que ainda dizem que os debates já se encerraram. Como as discussões estão encerradas se elas nunca aconteceram?

Querem trocar todo o cotidiano das atividades humanas baseados em mentiras?! Isto é completamente absurdo! A patifaria tomou vida própria. Está mais do que na hora de ser devidamente neutralizada.

Gastar verbas com o Painel Brasileiro de Mudanças Climáticas – PBMC será uma fabulosa forma de sumir com dinheiro público que poderia ser muito bem empregado para fazer melhorias contra um real problema: saneamento básico no Brasil!

Quanto à imparcialidade do jornal, esta ficou muito a desejar.

Ricardo Augusto Felicio é graduado em Ciências Atmosféricas – Meteorologia pela USP, tem mestrado em Meteorologia pelo Instituto Nacional de Pesquisas
Espaciais e doutorado em Geografia (Geografia Física) pela USP

O liberalismo de jabuticaba (Carta Capital)

Artigo
29/5/2012 – 11h21

por Luis Nassif*

c617 O liberalismo de jabuticaba

Luis Nassif. Foto: Divulgação

Há anos, por seu alcance, o sistema Globo tornou-se a principal influência na opinião pública, inclusive em questões econômicas. TV GloboGlobonewsCBN, jornal O Globo, portal G1, constituem-se na mais formidável caixa de irradiação de opiniões no país.

Por isso mesmo, é um bom laboratório para se analisar como se formam consensos, especialmente em temas ligados ao mercado e à economia.

Em geral, o discurso assenta-se em bordões de fácil assimilação  que, pela repetição, vulgarizam-se, podendo ser repetidos desde executivos com pouca formação econômica até papos de boteco. Paradoxalmente, essa banalização de conceitos responde pela extrema superficialidade da análise e, ao mesmo tempo, por sua enorme eficácia.

Até agosto do ano passado, esse discurso mercadista era facilitado pelo sofisma da prioridade única. Todas as análises tinham como mote a inflação. Justificava-se qualquer nível de taxa de juros porque era anti-inflação. Criticava-se qualquer redução da Selic, por mínima que fosse, por acirrar a inflação.

Não havia a menor necessidade de pensar. Baixou a taxa, imediatamente rebimbava o coro anti-inflação. Aumentou em percentuais ínfimos gastos sociais, acordava o coro contra a gastança.

Quando, em fins de agosto passado, o Banco Central reduziu a Selic e a inflação continuou caindo, o discurso desmoronou. Seria preciso refazer o discurso, recriar bordões.  E aí o sistema deu tilt.

Por exemplo, a boa análise econômica sabe que não é possível desenvolvimento sustentável sem dois eixos bem azeitados: consumo e investimento.

Primeiro, trata-se de montar o mercado – o interno, através da ampliação da base de consumo, e o externo, através de instrumentos de apoio à exportação.

Dado o mercado, garantir o investimento, através de ferramentas fiscais, financeiras e cambiais.

Cria-se o mercado interno. Estimula-se o investimento na produção. Amplia-se a capacidade produtiva do país, geram-se empregos mais qualificados e, por conseguinte, mais consumidores, completando o ciclo virtuoso do crescimento.

Sem o investimento, esse crescimento será apropriado pelo produto importado até o limite do estrangulamento externo. Não se completaria o ciclo. Mas não se investe sem dispor de um mercado de consumo em expansão.

No entanto, anos de defesa de juros altos criaram um pensamento anti-crescimento irracional – que é repetido de cabo a cabo por todo aparato midiático das Organizações Globo.

Ontem, as medidas de redução do custo do financiamento foram taxadas de temerárias por induzir o consumidor ao “endividamento irresponsável”.

Ora, o discurso econômico das Organizações é fundamentalmente neoliberal.

É princípio elementar do liberalismo o pleno direito de opção ao consumidor, ao investidor, à empresa. Ao Estado compete apenas criar condições adequadas, sem pretender tutelar os agentes econômicos.

Na hora de criar o bordão, esquece-se o livre arbítrio do consumidor, as ferramentas de análise de crédito dos bancos, o monitoramento da inadimplência pelo Banco Central, o fato do financiamento de automóvel ser garantido pelo próprio veículo, aspectos técnicos e conceituais.

Em Wall Street – onde esse pessoal se espelha -, seria motivo de chacota.

* Luis Nassif é jornalista econômico e editor do site www.advivo.com.br/luisnassif – lnassif2011@bol.com.br.

** Publicado originalmente no site da revista Carta Capital.

Segurança da Rio+20, entre a crítica e o temor (IPS)

Envolverde Rio + 20
31/5/2012 – 09h32

por Fabíola Ortiz, da IPS

IPS2b Segurança da Rio+20, entre a crítica e o temorRio de Janeiro, Brasil, 31/5/2012 – Fortes críticas da sociedade civil, cujos líderes não querem que “se militarize a Cúpula dos Povos”, foram provocadas pelo anúncio da operação de segurança que o governo brasileiro colocará em ação por ocasião da Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável (Rio+20), de 20 a 22 de junho no Rio de Janeiro, e dos encontros paralelos. O governo se mostrou preocupado, ao mesmo tempo em que acredita poder garantir a segurança do encontro contra ataques cibernéticos ou terroristas.

O Plano Geral de Segurança da Rio+20 foi divulgado no dia 28 pelos chefes militares e pelo ministro da Defesa, Celso Amorim, os quais explicaram que haverá um centro para coordenar as operações em toda a área onde se desenvolverem as reuniões da cúpula oficial e também dos encontros paralelos.

Cerca de 15 mil agentes distribuídos em diversos pontos do Rio de Janeiro, onde está prevista a realização de, aproximadamente, 500 encontros e painéis, enquanto as principais avenidas, viadutos e túneis estarão controlados por veículos blindados. Além disso, está previsto o investimento de US$ 10 milhões para rastrear e evitar possíveis ameaças de hackers ao sistema de conexões pela internet.

“Foi preparado um plano muito detalhado com o objetivo de garantir que a Conferência transcorra com tranquilidade. Do total de agentes, as forças armadas fornecerão oito mil soldados”, informou Amorim em entrevista coletiva com jornalistas brasileiros e estrangeiros. A operação Rio+20 acontecerá entre 5 e 29 de junho, quando haverá atividades, seminários, encontros e manifestações ambientalistas, além das reuniões de alto nível, entre as quais o encontro de chefes de Estado e de governo.

O esquema especial de proteção nos locais de hospedagem, traslado e realização das reuniões contará com cerca de cinco mil efetivos de segurança diariamente nas ruas e acompanhando as delegações estrangeiras. As escoltas de autoridades e delegações dos países e dos funcionários da Organização das Nações Unidas (ONU) constarão de 52 equipes especializadas, com apoio de 29 helicópteros e mais de 400 motociclistas. Haverá cuidado especial com os espaços aéreo e marítimo, missão que estará a cargo da Força Aérea e dos fuzileiros navais.

Também estarão na mira dos corpos de segurança as manifestações e conferências paralelas ao encontro oficial, especialmente a mais importante delas, a Cúpula dos Povos sobre a Rio+20 pela Justiça Social e Ambiental, de 15 a 23 de junho. Precisamente, uma das mobilizações com maior número de pessoas deverá ser a marcha prevista pelos líderes da Cúpula dos Povos, na Avenida Rio Branco, no dia 20 de junho, data de abertura da Rio+20.

O general Adriano Pereira Júnior, um dos comandantes da operação, afirmou que os movimentos sociais não serão reprimidos sob nenhuma circunstância, acrescentando que espera-se que se manifestem em um clima de ordem e cordialidade. “Os organizadores da Cúpula dos Povos já nos procuraram solicitando apoio na segurança de seus eventos”, contou o militar.

Porém, Carlos Henrique Painel, do Fórum Brasileiro de ONGs e Movimentos Sociais para o Meio Ambiente e o Desenvolvimento Sustentável, alertou para a possibilidade de os militares não respeitarem a liberdade das mobilizações. “Não queremos soldados armados do exército fazendo a segurança, não queremos uma Cúpula dos Povos militarizada, pois nosso receio é quanto ao nível de tolerância com relação às manifestações que são espontâneas e não diretamente ligadas à Cúpula”, disse à IPS.

“A Guarda Municipal é capaz de garantir nossa segurança”, opinou Painel, um dos organizadores da Cúpula dos Povos, para a qual se espera a presença de 25 mil a 30 mil pessoas, segundo seus promotores. “De fato pedimos ajuda para nossos acampamentos no Aterro do Flamengo e nos locais de hospedagem previstos em duas escolas públicas e no sambódromo, que abrigarão cerca de 12 mil participantes, explicou Painel.

Embora o Brasil não figure entre os países-alvo de possíveis atentados, um encontro internacional da dimensão da Rio+20 obriga a criar um centro de inteligência e prevenção. O general José Carlos De Nardi, do centro de defesa cibernética, informou que é a primeira vez que se articula no Brasil um site integrado contra ataques cibernéticos. “A Polícia Federal já tem muita experiência neste aspecto devido a tantas invasões a páginas da internet de órgãos e agências reguladoras. Temos condições de chegar ao local exato e ao computador de onde possam partir os ataques”, admitiu o general.

As autoridades também disseram que, no caso de ataques cibernéticos interromperem o fornecimento de energia, os principais locais já estão preparados com geradores para iluminação, bem como as empresas de telecomunicações com redes sem fio. O Brasil não receberá nenhum apoio em seu trabalho de segurança, “somos capazes e temos meio para fazê-lo”, enfatizou o general Pereira Júnior. Porém, admitiu que terão apoio de inteligência dos corpos de segurança dos governantes que chegarem ao Rio de Janeiro.

Envolverde/IPS

Rio+20, somente semear para o futuro (IPS)

Envolverde Rio + 20
29/5/2012 – 09h52

por Stephen Leahy, da IPS

12 Rio+20, somente semear para o futuroUxbridge, Canadá, 29/5/2012 – A Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável (Rio+20) servirá apenas de terreno onde se tentará cultivar as ideias e os valores que a humanidade necessita para o Século 21. Contudo, ninguém espera, ou mesmo deseja, um grande tratado internacional sobre desenvolvimento sustentável, lamentou Manish Bapna, presidente interino da organização ambientalista internacional World Resources Institute, com sede em Washington.

“O importante acontecerá de forma paralela às negociações formais”, disse Bapna à IPS. Porém, “pode haver alguns esperançosos compromissos específicos” dos países na Rio+20, acrescentou. Talvez, seu resultado mais importante seja acabar com o errôneo conceito de que proteger o meio ambiente vai contra o crescimento econômico, quando, na realidade, ocorre o contrário, destacou Bapna. Sem um meio ambiente saudável e funcionando a humanidade perde os benefícios de “produtos gratuitos”: ar, água, terras de cultivo e clima estável.

Para Bapna, “um dos principais obstáculos para o futuro é que funcionários de muitos países acreditam que avançar em um caminho mais sustentável implica um custo demasiadamente alto”. Ele espera que a Rio+20 gere um “novo discurso”, com maior compreensão de que uma economia baixa em carbono e eficiente em termos de recursos pode também aliviar a pobreza e gerar empregos.

Espera-se que ao menos 50 mil pessoas participem de centenas de atividades na Rio+20, entre elas mais de 130 líderes mundiais, incluindo o presidente da Rússia, Vladimir Putin, e os primeiros-ministros Manmohan Singh, da Índia, e Wen Jiaboa, da China. O presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, não confirmou sua presença no encontro, que acontece 20 anos depois da Cúpula da Terra.

Aquela reunião, também no Rio de Janeiro, deu à luz três importantes tratados sobre meio ambiente, mudança climática, biodiversidade, degradação de terras e desertificação. Porém, em quase todas essas categorias a situação piorou desde 1992. Apenas poucos países, como a Alemanha, entendem a necessidade ambiental e econômica de optar por um caminho mais sustentável, afirmou Bapna. “Esse país realiza o esforço individual mais importante do mundo para combater a mudança climática e reduzir o carbono em sua economia”, ressaltou.

A Alemanha está comprometida em duplicar sua produtividade energética e de recursos até 2020, o que gerará novos empregos e fortalecerá sua competitividade em um mundo com cada vez menos e mais caros recursos. Aproximadamente 22% da energia da Alemanha procede de fontes renováveis, e sua meta é alcançar 35% até 2020, e 80% até 2050. Para isto, realiza grandes esforços na melhoria da eficiência energética

O consumo de água potável, petróleo e cobre caminha para ser triplicado até 2050, segundo informe da Organização das Nações Unidas (ONU) de 2001. O problema é que não restam recursos suficientes no planeta para sustentar este ritmo. A Rio+20 precisa atrair as pessoas com uma nova “história” sobre o imperativo de viver de forma sustentável, com exemplos de como podem ser criados novos mercados e empregos verdes, apontou Bapna.

Enquanto isso, as negociações oficiais da Rio+20 vão tão mal que foram acrescentadas mais sessões. As delegações negociam o chamado “rascunho zero”, onde se procura estabelecer um mapa do caminho para o crescimento sustentável e no qual esteja previsto o estabelecimento de uma série de metas. Porém, como todos os acordos da ONU, cada palavra necessita de uma aprovação unânime de todas as nações, o que é extremamente difícil.

“Reconhecemos que não podemos continuar queimando e consumindo nossa forma de prosperidade. Entretanto, não adotamos a solução óbvia. A única solução possível, hoje como há 20 anos, é o desenvolvimento sustentável”, disse em uma declaração o secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon. Também admitiu que as negociações seguem “dolorosamente lentas”, e interveio pessoalmente para acrescentar outra semana de conversações, exortando os países a olharem além de seus interesses nacionais. Segundo Ban Ki-moon, o Rio de Janeiro “oferece uma oportunidade geracional para acionar o botão de reinício, para fixar um novo curso rumo ao futuro que equilibre as dimensões econômica, social e ambiental da prosperidade e do bem-estar humanos”.

Faltando menos de 30 dias para o encontro de alto nível, ainda não “há uma definição acordada do que é economia verde”, alertou Craig Hanson, diretor do Programa de População e Ecossistemas do Instituto de Recursos Mundiais. Há um crescente consenso sobre a necessidade de um crescimento e um desenvolvimento verdes, mas a população em geral não sabe exatamente o que isto significa.

A Alemanha oferece um exemplo com seus esforços de energia limpa, que criaram 370 mil empregos, indicou Hanson à IPS. Outro exemplo é o êxito de Níger em reverter a desertificação na zona do Sahel, acrescentou. As negociações sobre como obter economias mais verdes são uma batalha, pois muitos países colocam seus interesses nacionais acima dos interesses do planeta e das futuras gerações, observou.

Reduzir gradualmente os milhões de dólares que os governos investem em subsídios anuais para combustíveis fósseis seria um caminho ideal, mas não está claro se as nações estão dispostas a isso, opinou Bapna. “Repetirão suas antigas promessas ou assumirão firmes compromissos no Rio? Simplesmente não sabemos”, afirmou. O mundo mudou desde 1992. As coisas são muito menos previsíveis. Não há uma visão ecológica única para todos os países. “O que sabemos é que esta é uma década crítica. O mundo necessita de compromissos no curto prazo para atuar”, concluiu.

Envolverde/IPS

Empresariado promove agenda paralela à Rio+20 (Mercado Ético)

Envolverde Rio + 20
31/5/2012 – 10h44

por Sucena Shkrada Resk, do Mercado Ético

Capa4 Empresariado promove agenda paralela à Rio+20A Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável (Rio+20) não mobiliza somente os governos e a sociedade civil organizada, mas também o setor empresarial, que estará presente em eventos paralelos, no mês de junho, no Rio de Janeiro e em outras localidades do Brasil. Os temas centrais do evento – economia verde no contexto do desenvolvimento sustentável e da erradicação da pobreza, além da governança internacional da sustentabilidade – são o pano de fundo para a realização dos debates e propostas entre as organizações da iniciativa privada.

“Os eventos paralelos à conferência e à pré-conferência Rio+20 são uma forma de envolver a sociedade organizada, empresas e outras partes interessadas no processo de discussão dos rumos do acordo político que está sendo construído para fortalecer a inclusão dos princípios do desenvolvimento sustentável nas diversas instâncias de processos decisórios. Cada encontro lateral busca atingir algum público e algum ponto de vista”, explica Jorge Soto, diretor de Desenvolvimento Sustentável da Braskem, uma das corporações que terá atividades voltadas ao público presente na Rio+20.

Segundo ele, dessa forma, a soma de todos os encontros laterais cobrirá a diversidade, própria ao desenvolvimento sustentável. “Entendo que dessa ampla participação e discussão surgirão propostas que colocarão a energia e o apoio que os negociadores precisam para que o acordo político resultante seja contundente e à altura do desafio que a humanidade está enfrentando”, avalia.

Programação

A exemplo do evento oficial e da Cúpula dos Povos, a agenda ligada às corporações está bem diversificada. No período de 11 a 13 de junho, em São Paulo, será realizada a já tradicional Conferência Ethos 2012, cujo tema será A empresa e a nova economia: o que muda com a Rio + 20 (www.ethos.org.br/ci2012). Na ocasião também será lançada a versão em português da obra O Estado do Mundo 2012: Rumo à Prosperidade Sustentável, do World Watch Institute.

“Durante o evento, discutiremos e produziremos um documento em parceria com representantes de cerca de 40 organizações, com propostas em relação aos 10 temas (veja abaixo) que serão debatidos por representantes da sociedade civil nos Diálogos sobre Desenvolvimento Sustentável, que será organizados pelo governo brasileiro, de 16 a 19 de junho, na programação da Rio+20″, explica Paulo Itacarambi, vice-presidente executivo do Instituto Ethos.

Os temas são: Desenvolvimento Sustentável para o combate à pobreza; Como resposta às crises econômicas e financeiras; Desemprego, trabalho decente e migrações; A economia do Desenvolvimento Sustentável, incluindo padrões sustentáveis de produção e consumo; Florestas; Segurança alimentar e nutricional; Energia Sustentável para todos; Água; Cidades Sustentáveis e Inovação; Oceanos.

O material será entregue aos participantes dos Diálogos e ao comitê organizador da Rio+20, com o objetivo, segundo ele, de se propor alternativas a cenários futuros. “Durante a Conferência Ethos também avançaremos em um debate além da Rio+20, que refletirá sobre a construção de uma economia includente verde e responsável”. Para isso, será tratada a questão dos novos modelos de negócios, com a participação de John Elkington, criador do conceito do triple bottom line, entre outras personalidades.

No Forte de Copacabana, no Rio de Janeiro, ocorrerão mais eventos entre os dias 11 e 22 de junho. Ainda sem programa definido (a ser lançado no próximo dia 25), as atividades ali serão organizadas pela Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (FIESP) e pela Federação das Indústrias do Estado do Rio (Firjan), em parceria com a Fundação Roberto Marinho e a Prefeitura do Rio de Janeiro.

O Conselho Empresarial Brasileiro de Desenvolvimento Sustentável (CEBDS) manterá um espaço institucional no Parque dos Atletas, no Rio de Janeiro, de 13 a 23 de junho, e também manterá eventos paralelos, no Rio Centro e no Forte de Copacana, quando será apresentado o lançamento do documentoVisão Brasil 2050, uma iniciativa “tropicalizada” do documento produzido pelo World Business Council for Sustainable Development – WBCSD (Conselho Mundial de Gestão para o Desenvolvimento Sustentável).

“Esse documento é considerado um dos mais importantes já lançados sobre o futuro da sustentabilidade e tem inspirado o planejamento estratégico de inúmeras empresas em todo o mundo. Visão Brasil 2050 é uma agenda para o desenvolvimento sustentável e a transição para a economia verde nos próximos 40 anos”, explica Marina Grossi, presidente executiva do CEBDS.

Outro projeto a ser divulgado é “Rio Cidade Sustentável“. A iniciativa, lançada, neste ano, tem sete eixos: turismo comunitário, desenvolvimento de empreendedores locais, sustentabilidade nas escolas e lares, infraestrutura urbana verde, agricultura urbana orgânica, gestão comunitária de resíduos e melhoria habitacional sustentável.

“Trata de infraestrutura urbana e transformação social com foco em sustentabilidade, que articula poder público, empresas e moradores para melhorar a qualidade de vida das comunidades. Desde janeiro deste ano, duas comunidades pacificadas da Zona Sul carioca, Babilônia e Chapéu Mangueira, acolhem as sete frentes de atuação do programa.”, diz ela.

Por fim, o Rio+20 Corporate Sustainability Forum: Innovation & Collaboration for the Future We Want (Rio+20 Fórum de Sustentabilidade Corporativa: inovação e colaboração para o futuro que queremos) será promovido pelo Pacto Global da ONU, entre 15 e 18 de junho, também no Rio de Janeiro (http://csf.compact4rio.org/events/rio-20-corporate-sustainability-forum/event-summary-251b87a2deaa4e56a3e00ca1d66e5bfd.aspx).

* Publicado originalmente no site Mercado Ético.