Arquivo da tag: Teatro

Crise climática é crise de classes, diz ator britânico que aponta racismo no debate (Folha de S.Paulo)

www1.folha.uol.com.br

Na peça ‘Can I Live?’, Fehinti Balogun, com rap, animação e poesia, apresenta a colonização e a exploração de países africanos como temas centrais na discussão

Cristiane Fontes

2 de novembro de 2022


Foi em 2017, durante a preparação para a peça “Myth”, uma parábola climática da Royal Shakespeare Company, que o artista Fehinti Balogun acabou se dando conta da gravidade da crise do clima.

“Após ter feito muitas coisas, consegui meu primeiro papel principal numa peça no West End em Londres. Era o ano mais quente da história”, lembra o ator e dramaturgo britânico. “E, pela primeira vez, percebi que as plantações estavam morrendo, os campos estavam secos. Comecei a desenvolver uma espécie de ansiedade que nunca tive antes”, completa.

Com isso, veio o choque: “Eu tinha o trabalho que eu sempre sonhei, algo que eu tinha estudado para fazer, e, de repente, isso não significava nada”.

Balogun se juntou ao grupo ativista Extinction Rebellion, participou de diversos protestos e organizou uma palestra sobre o tema. Essa jornada o levou à produção de uma peça teatral que, durante a pandemia, foi transformada em um filme.

O ator britânico Fehinti Balogun, que criou a peça ‘Can I live?’, sobre mudanças climáticas. Fonte: New York Times/Tom Jamieson, 29.out.2021

Intitulada “Can I Live?” (posso viver?), a produção explica as mudanças climáticas a partir da perspectiva de uma pessoa negra, usando diversas performances musicais.

A mãe de Balogun, imigrante nigeriana, é quem guia a história. Fora da tela, também foi ela quem inspirou a criação do texto, a partir de questionamentos ao filho —que ele gravou secretamente para escutar de novo e pensar a respeito.

“Por que você está sacrificando sua carreira para fazer parte desses grupos?”, ela perguntava.

Mesmo discordando, o filho reconheceu na indignação da mãe um ponto muito importante: a discussão climática ficou elitizada e branca e ainda não foi capaz de incluir os segmentos mais pobres da população.

“Can I Live?”, pelo contrário, se propõe a não só trazer os dilemas pessoais do autor, que se misturam aos problemas mundiais e aos dados científicos, como é didática e criativa ao explicar, por exemplo, o efeito estufa em forma de rap. Criado com a companhia de teatro britânica Complicité, o filme mescla linguagens como animação, poesia e música.

“O objetivo é criticar descaradamente o sistema, sem culpar uma pessoa específica. Não se trata de envergonhar as pessoas, mas, sim, de educá-las e conectar-se com elas”, define Balogun.

Depois de uma turnê online, o filme foi exibido em eventos como a COP26 (conferência da ONU sobre mudanças climáticas realizada em 2021 na Escócia) e a London Climate Action Week.

A ideia, diz Balogun, é fazer “Can I Live?”, que ainda não foi lançado no Brasil, chegar a movimentos de base, para estimular conversas sobre a crise climática entre aqueles que não costumam se conectar com o assunto.

Quando perguntado sobre a agenda climática no Reino Unido, o autor é categórico: “Temos um governo que não está levando isso tão a sério quanto deveria e que nunca levou o racismo tão a sério quanto deveria. Temos toda uma economia baseada num histórico de escravidão que não é debatida. Então, dentro das escolas, apagamos essa história. O que aprendemos neste país não está nem perto do que deveria ser”.

Quando e por que você se envolveu com a agenda da crise climática?

Após ter feito muitas coisas, consegui meu primeiro papel principal numa peça no West End em Londres. Era o ano mais quente da história, depois de outro ano ter sido o ano mais quente da história, depois de o último antes disso ter sido o mais quente… E, pela primeira vez, eu percebi que as plantações estavam morrendo, os campos estavam secos. Comecei a desenvolver uma espécie de ansiedade que nunca tive antes. Eu tinha o trabalho que eu sempre sonhei, algo que eu tinha estudado para fazer, e, de repente, isso não significava nada.

Então comecei a tentar me envolver em diferentes projetos e me juntei ao [grupo ativista] Extinction Rebellion. E comecei a discutir tudo com minha mãe, que perguntava: “Por que você está sacrificando sua carreira para fazer parte desses grupos?”. E eu pensava: “Não, essa é a única coisa importante que estou fazendo”. E nós continuamos discutindo muito isso tudo.

Eu gravei secretamente tudo o que ela me disse, peguei os pontos importantes dela e transformei numa apresentação sobre o clima, porque percebi que meu papel era poder usar meu privilégio de ser um ator e ter essa formação.

Eu não sou de uma família particularmente rica. Cresci sem muito dinheiro, morando em habitação social, e o que eu tenho agora é devido ao meu trabalho como ator, aos meus contatos e a todas essas perspectivas diferentes. Então eu montei essa palestra, que é como um TED Talk, usando as mensagens de voz da minha mãe.

Esse trabalho decolou, uma coisa levou à outra e começamos a trabalhar em uma peça, que depois virou um filme, “Can I Live?”. Foi assim que essa jornada climática de repente tomou conta da minha vida.

Sua mãe é a verdadeira estrela do filme. Quais foram as coisas importantes que ela levantou sobre o assunto?

Muitas. Uma delas é exatamente o que significa resistir quando você é uma minoria, e o que significa para a sua criação. Isso afeta não apenas o seu futuro, mas também a ideia que foi passada a pessoas como minha mãe, minhas tias, meus tios sobre o que é o “bom imigrante”.

Não é algo que ela tenha me dito explicitamente, mas que eu intuí de tudo o que ela estava me dizendo. Você não é capaz de reagir porque tem sorte de ter o que tem, entende? Ela dizia: “Há pessoas que estão esperando para entrar no país. Há pessoas que estão esperando conseguir a cidadania. E você acha que eles vão criticar aquele país que diz que eles não deveriam estar lá?”.

Para o público no Brasil que ainda não teve a chance de assistir ao filme, como você o descreveria?

Basicamente, o filme é uma explicação das mudanças climáticas a partir da perspectiva de uma pessoa negra. O objetivo é criticar descaradamente o sistema, sem culpar uma pessoa específica. Não se trata de envergonhar as pessoas, mas, sim, de educá-las e conectar-se com elas.

Eu quero que as pessoas assistam e vejam a si mesmas no filme todo ou em algumas partes, ou que vejam sua mãe ou sua avó ou seus amigos nas conversas. O filme tinha como objetivo levar as pessoas por essa jornada histórica até onde estamos agora e descobrirem o que podem fazer.

Colocamos o filme para distribuição online durante a pandemia. As pessoas pagavam o que podiam. A ideia era tentar torná-lo o mais acessível possível. Não foi algo como: “Ei, nós fizemos uma obra de arte!”, mas ela é exibida num teatro muito metido onde as pessoas se sentem desconfortáveis e têm dificuldades para acessar.

A ideia foi descentralizar esta obra e distribuí-la para o maior número de pessoas possível, e oferecê-la a movimentos de base, para que pudessem exibi-lo e conversar a partir disso e incluir nessas conversas pessoas que não costumavam se conectar.

A propósito, como envolver nas questões climáticas pessoas que estão lutando para sobreviver?

Acho que a coisa mais importante que aprendi sobre me comunicar com as pessoas é que você precisa ir ao encontro delas. Você não pode chegar em alguém esperando que essa pessoa tenha o seu mesmo nível de entusiasmo ou raiva, ou desgosto, ou desdém, porque todo mundo tem algo acontecendo em suas vidas.

O que temos no sistema é que constantemente nos dizem que temos que consertar algo individualmente, e que é nossa culpa individual. O fato de você estar passando por tanta insegurança alimentar é porque você não trabalhou duro o suficiente, ou porque 20 anos atrás você não economizou isso, ou fez aquilo. E se você tivesse feito todas essas coisas, você estaria bem e a culpa é sua e blá, blá, blá.

Você tem de olhar para essa questão de um ponto de vista estrutural. Estrutural e espiritual. Eu posso despejar todas as minhas ideias sobre estrutura e coisas de ativismo em cima de você, mas, no final das contas, se seu prato está cheio, seu prato está cheio; você já chegou no seu limite. A questão é muito mais profunda, e é muito solitário e difícil saber que você tem muitos problemas que precisa consertar. No final, o que está mesmo no centro disso é ter uma comunidade.

E como você descreveria o debate sobre mudanças climáticas no Reino Unido no momento?

Essa é uma pergunta difícil! Agora no Reino Unido temos um governo que não está levando isso tão a sério quanto deveria e que nunca levou o racismo tão a sério quanto deveria.

Temos toda uma economia baseada num histórico de escravidão que não é debatida. Então, dentro das escolas, apagamos essa história. O que aprendemos neste país não está nem perto do que deveria ser, na verdade. Mas, se estivermos falando de pensamentos e sentimentos em relação às mudanças climáticas, as pessoas sabem disso, embora não saibam o que fazer.

Na COP26, no ano passado, você participou de eventos com artistas e ativistas indígenas brasileiros. Como o discurso deles ecoou com você e no Reino Unido?

A COP é um evento decepcionante, via de regra. Não me inspirou nem um pouco. O que foi inspirador foram todos os ativistas que estavam lá e pessoas diferentes de muitos países diferentes, fazendo coisas incríveis e falando sobre tantas coisas. É uma comunidade muito forte.

Mas é muito difícil no Reino Unido. O patriotismo está apenas conectado a um ponto de vista ideológico e imperialista do mundo, que diz: “Eu sou superior a você”. Então por que aprender com aquele ativista brasileiro diferente? Já os indígenas eram o oposto disso. A mensagem deles era: “Estes somos nós! E vamos compartilhar isso com vocês! Vamos proteger isso para as gerações futuras!”.

Na sua visão, como fortalecer o movimento global de justiça climática, considerando o atual contexto político?

Parte do movimento dos direitos civis estava ligado à educação, à educação em massa e para certas comunidades. A ideia não é trabalhar com o medo, mas sim trabalhar através do medo para chegar a soluções.

Então, para fortalecer o movimento, [precisamos de] educação em massa, especificamente em certas zonas; e precisamos que diferentes movimentos de base se unam.

Em termos de mudança na narrativa, quais são as estratégias que você considera mais importantes?

Precisamos mudar a narrativa sobre riqueza e propriedade. Nós realmente precisamos entender que a crise climática é uma crise de classes, e dentro dessa crise de classes, há uma interseccionalidade muito racista.

Simplesmente entender essas coisas eu acho que vai ajudar muito; e é muito difícil, porque dentro do ideal capitalista, [a economia] só funciona se você sentir falta de alguma coisa. Eles só podem vender maquiagem para você se você acreditar que precisa de maquiagem. Eu não estou dizendo que as pessoas não devem usar maquiagem, mas, sim, que você só vai comprar algo se achar que precisa daquilo.

São essas mudanças de narrativas sobre o que achamos que é necessário e o que é, na verdade, necessário.

E precisamos de bondade radical. Radical no sentido de que não somos uma cultura muito indulgente.

O debate político anda muito polarizado, inclusive no Brasil, como você deve saber. Você poderia descrever melhor a ideia de bondade radical?

O que quero dizer com bondade radical não é apenas ser radicalmente gentil com a pessoa com opiniões opostas, mas também ser radicalmente gentil consigo mesmo.

Por que estou tentando fazer com que alguém que, fundamentalmente, me odeia goste de mim? Como isso me ajuda ou ajuda a outra pessoa? No final das contas, independentemente de eles terem dito que gostavam ou não de mim, eles vão embora e eu fico com esse sentimento. A única maneira de lidar com isso é ter uma comunidade atrás de você que esteja disposta a compartilhar isso com você.

Você sabe o que isso significa? Significa se afastar da postura individual de “eu vou consertar o mundo” para algo como “estas são as pessoas que eu preciso para poder fazer isso”.

Eu sempre falo, você tem que fazer uma escolha quando você fala com alguém, especialmente com alguém com uma opinião oposta a você que não tem interesse direto no assunto, como por exemplo, racismo, sexismo, ou mesmo mudanças climáticas.

Quando a pessoa não é afetada emocional, física e praticamente pela coisa e argumenta contra você, você tem que se perguntar: “Eu tenho condições de me envolver nisso hoje? Até onde quero ir? Vou ter alguém cuidando de mim quando a conversa terminar?”. Então a bondade radical não é apenas ter um espaço para a outra pessoa: é para você mesmo.


Raio-X

Fehinti Balogun

Ator, dramaturgo, escritor e pintor britânico de origem nigeriana, nascido em Greenwich, em Londres. Além de “Can I Live?”, participou de peças como “Myth” (mito), “The Importance of Being Earnest” (a importância de ser prudente) e “Whose Planet Are You On?” (você está no planeta de quem?). No cinema, fez trabalhos como “Juliet, Nua e Crua”, “Duna” e “Walden”. Na TV, participou das séries “I May Destroy You” (posso te destruir), “Informer” (informante) e “O Filho Bastardo do Diabo”, cuja primeira temporada estreia no fim de outubro na Netflix no Brasil.

Ethnography as Improv (How to Anthropology)

NOVEMBER 02, 2015

By Cheryl Deutsch

“Anthropology is not a social science tout court, but something else. What that something else is has been notoriously difficult to name, precisely because it involves less a subject matter … than a sensibility.”

— Liisa Malkki, Improvising Theory (2007: 63)

 

In this post, I take inspiration from the book Improvising Theory to articulate three aspects of ethnographic practice that often go unnamed in anthropology.  I also follow up with the book’s authors, Allaine Cerwoncka and Liisa Malkki, to share their thoughts on doing ethnography today.

Most of the book consists of email exchanges from the year Cerwoncka spent in fieldwork as a graduate student and Malkki was her faculty mentor.  The conceit is that Malkki, an anthropologist, must explain to Cerwoncka, a political scientist, what “goes without saying” in anthropology; the customs and quirks that make up the discipline’s sensibility.  But as Malkki writes, “the ‘common sense’ of anthropology is a complicated matter,” and she struggles to articulate its nuances (2007: 163).

Through this exchange and the authors’ reflections, the book offers an intimate view of what ethnographic fieldwork is, in practice, as well as what it amounts to in theory.  Cerwoncka and Malkki conclude that it is ethnography’s improvisational nature that makes it challenging to teach but also special in its theoretical power.

Here are three insights I drew from the book and my subsequent exchange with them:

trumpet.jpg

1. Ethnography is Improvised

Improv comedy is a form of collaborative story-telling whose humor derives from the uncertainty of its own story line. Improv actors must say yes to whatever comes their way, trusting their training and adrenaline to make a story out of surprise.  The result is comedy.

Improvisational jazz is likewise a form of story-telling whose energy derives from its unrehearsed riffs on popular melodies and classic standards.  Jazz musicians construct improvised melodies out of notes that are spontaneous but not random: they have to make sense with the original song or melody.  Just playing fast, for example, is no guarantee that an improvised solo will succeed: the notes have to make emotional sense.

Both improv comedy and jazz employ skills that can be taught and practiced.  They benefit from excellent technique.  But in all forms of improvisation, training and expertise only go so far.  The rest requires a certain sensibility.

In their book, Improvising Theory: Process and Temporality in Ethnographic Fieldwork, Allaine Cerwoncka and Liisa Malkki make the case for ethnography as a form of improvisation.

As Cerwoncka reflected in an email exchange with me: “choices made about a research project are shaped out of intellectual, practical and professional considerations… [They] are inevitably made without full information and require constant adjustment and courage to follow one’s rational and intuitive best judgment.”

Courage is a key word here.  All forms of improv involve risk.  But it’s the vulnerability of such creative acts that give them heart and soul.

As recounted in the book, Cerwoncka scheduled a formal interview with a sergeant in the police station where she was conducting her fieldwork.  Before the interview, he talked openly about the groups that they, as cops, hated having to deal with.  “I acted casual about all this information,” she wrote to Malkki, “not jotting any of it down in front of him…  When I went back for the ‘real’ interview, he was much more formal and immediately asked if I wanted to tape the conversation” (2007: 85).  The formal interview had a different tone; he talked about “safe” topics like his family background, and then he was called away.

Reflecting on this experience in her email to Malkki, Cerwoncka decided not to tape further conversations with the police officers.  “It strikes me that they are in the position of taping people (in the interrogation room),” she wrote, “and their context for that is to use the information people give them against the people they arrest.  So I think the recorder will color the interviews too much” (2007: 85).

Later in her fieldwork, however, she found that one sergeant was particularly eager to set up taped interviews for her, so she continued with them.  She began to see that they helped those in the station feel more comfortable with her. “They don’t even seem to mind when I drift and ask them questions about their taste in music or whether they garden,” she wrote (2007: 120).  Hers is a lesson in improvised field practice.

Formal recorded interviews are an important tool in the ethnographer’s toolbox.  But in this exchange, we see that the ethnographer often has to make decisions about when and where, as well as how, to employ such tools in the field.  Ethnographers are also engaged in a form of collaborative story-telling with the people they interact with.  It takes attention and care for ethnography – as improvisation – to make sense.

 

two_hourglasses_big.jpg

2. Ethnography Takes Time

Improvising Theory’s greatest strength is its portrayal – in real time – of the year-long process of ethnographic fieldwork.  It illustrates not only the tempo of fieldwork but its many temporalities.  As Malkki writes in her concluding chapter to the book, “ethnography as process demands a critical awareness of the invisible social fact that multiple, different temporalities might be at play simultaneously… [There are] quotidian routines, events that become Events (see Malkki 1997), the panic time of deadlines, the elongated time of boredom, the cyclical time of the return of the expected, the spiral time of returns to the recognizable or the remembered, and so on” (2007: 177).

In their email exchange, we read about Cerwoncka’s uncertainties, her successes, as well as her false starts and trails gone cold.  It’s a messy process through which Malkki’s advice offers perspective and rhythm: some situations require action and attention, others call for patience and meditation.

Before she began her interviews at the police station, for example, Cerwoncka was unsure exactly where she would locate her research exploring Australian national identity.  So she made inroads with a gardening club and with officers at the police station, as well as with the pastor of a church.

In an early email to Malkki, Cerwoncka worried that she was contacting people from too many organizations at once and that she’d be overwhelmed with all their necessary follow-up.  Malkki responded: “Anthropological fieldwork is what you are doing, and therefore regular contact with informants should not just be a goal, but should be built into your everyday schedule.  It’s taxing, embarrassing, etc., but you need the material… Strike while the iron is hot” (2007: 54).  She encouraged her to choose the organizations she wanted to work with thoughtfully and then to make a schedule that would allow her to follow up on interactions and opportunities when they arose.

Later, Cerwoncka dropped the church as a site.  Then, when she was deep in fieldwork with the gardening club and the police officers, one of her political science advisers recommended she add a third site.  So she spent time talking to landscape architects.

At this point, Malkki advised her: “It’s important not to let the third site become something that allows you to escape the pressures of the sites in which you have deep investments already… Another related issue (related to the question of what’s the best use of your time): sometimes downtime is best, taking a week away from the fieldwork.  Then you return to things fresh” (2007: 126).

In this case, the right temporal strategy was patience and perserverance.

When I asked Malkki for her thoughts on ethnography today, she reiterated the importance of time: “If I were to add something… One point would be a warning against the overprofessionalization of graduate students in Anthropology.  Easy for me to say since I’ve got a job!  But anthropology does take time, and I think one has to have the time to ‘grow into it’ somehow without having career milestones always hovering at the edges of one’s attention.  One grows into fieldwork according to one’s temperament and in deep relation with people.  That is transformative.  And then, after fieldwork, one grows into writing.  That too is transformative.  It takes time (and simple grit).  This is very much a mind game.  There are many brilliant people – everyone knows they’re brilliant and their work truly original – but they just can’t let it go, or, sometimes, can’t get over writing blocks.  More time.  One should always be humane toward oneself (and everyone, of course).”

It seems that ethnography not only takes time but many different times: striking while the iron is hot, having patience when fieldwork gets tedious, and time for transformation in the writing phase.

3. Improvisation + Time = Theoretical Insight

Cerwoncka started grad school with the goal of becoming a “theorist,” and this book reflects that ambition.  As helpful as it is in illustrating ethnographic practice, it is equally effective in articulating ethnography’s theoretical power.

In our email exchange, Cerwoncka wrote, “Social analysts need more than description of phenomena, and this thing we call theory helps us try to identify patterns and associations.  However, ethnographic fieldwork and life has reinforced for me the conviction that theory serves us intellectually best when it is in dialogue with activity, data, and a variety of possible material.”

The email exchange with Malkki that documents her fieldwork experience bears this out: theoretical concepts help guide her research questions and observations.  It was Benedict Anderson’s concept of imagined communities that inspired her to look for national identity in the ordinary lives of Australian gardeners and police officers.  But these interlocutors – and Cerwoncka’s improvised engagements with them – also gave shape to the project.  Finally, time and distance add their own maturing effects. What results are the project’s theoretical insights.

Cerwoncka writes about this process of conceptual development in Native to the Nation, based on her dissertation research.  Writing about the police sergeant who eagerly arranged her formal interviews, she writes:  “These arrangements developed into a strange kind of ritual where each interview began with the sergeant ‘joking’ that the junior officer about to be interviewed ‘mustn’t give away the shop secrets’ before I was left alone with him or her” (cited in Cerwoncka and Malkki 2007: 90-1).  Such jests caused her quite a bit of anxiety: uncovering police brutality or corruption would put her and her research in a uncomfortable ethical position.  Only much later, in writing, did she conclude that the sergeant’s comments pointed to in-group boundary policing more so than any real “heart of darkness” within the station (2007: 91).  And it was much longer into writing that she came to believe “that there was another story one could write about the police besides a journalistic-type exposé or a romantic narrative about un-sung heroes” (2007: 92).

The theoretical insights of ethnographic fieldwork take time.  Improvisation in the field is what shakes up one’s orientation to theoretical concepts, but it can take time for that orientation to mature into new conceptualizations.

Postscript: Ethnography and Professionalization

In addition to producing theoretical insights, Cerwoncka also stressed to me the ways in which ethnography has served her as a faculty member and university administrator:

Cerwoncka: “Every time I move to a different institution, role and, or discipline, I find myself doing a version of ethnographic fieldwork!  Fieldwork taught me the techniques and instilled confidence in me to map and analyze patterns of community, be it a police station or a School of Social Sciences.  I think the professional skills I learned through ethnographic fieldwork … are as useful to me as a Dean of Social Sciences at University of East London as they were to my dissertation.”

These thoughts neatly illustrate the challenge and promise of ethnography: that one has to let go and accept in order to reap its creative potential.  Much of the advice embodied in the book revolves around the need for both confidence and acceptance.  One can’t seek out theory but can trust that it will result.  One can’t seek out professionalization but can trust that it will happen.  Just as in improv comedy there is no magic formula for making something funny, so the ethnographer that tells a compelling story can let the scene do its magic.

Thank you to Nikhil Anand for first suggesting Improvising Theory to me.  Thank you, as well, to Allaine Cerwoncka and Liisa Malkki for taking the time to share their thoughts.  And a final thanks to Ethan Hein for his explanation of improvisational jazz.

Antropofagia em cena (Fapesp)

Com mais de 50 anos de atuação, Teatro Oficina agora faz pesquisa voltada para a intervenção urbana

GUSTAVO FIORATTI | Edição 199 – Setembro de 2012

Zé Celso em cena de “A terra”, de 2001, trilogia de “Os sertões”: fundador do Oficina continua sempre presente. © MARILIA HALLA

A fachada do Teatro Oficina na rua Jaceguai – uma estreita via de acesso 
à 9 de Julho no bairro do Bixiga, em São Paulo – tem a simplicidade de uma garagem. Quando a pesada porta da entrada se abre, revela-se então uma estrutura que em nada lembra a de um teatro convencional: lá dentro, uma espécie de passarela, comprida, corre por entre duas arquibancadas de aço e madeira.

Nada de cortinas, nada de palco, nada de poltronas. Quem percorre esse corredor nota um leve declive em direção aos fundos. À esquerda, ao lado de uma das arquibancadas e já no meio do percurso, uma imensa janela 
de vidro tem vista para os edifícios do bairro.

A arquiteta italiana Lina Bo Bardi projetou o espaço nos anos 1980 para que o diretor José Celso Martinez Corrêa, hoje com 75 anos, pudesse desenvolver uma linha de trabalho que tem um pé na arena grega e outro no Carnaval. Os espetáculos apresentados ali ocupam não só a passarela; costumam espalhar-se por todos os cantos. Não raro, o lugar da plateia é também o lugar da cena, e o público entra na dança.

José Celso está sempre presente, muitas vezes em cena, com cabelos brancos 
e roupas claras. “O ‘Teato’ é uma feitiçaria que engole o enfeitiçamento geral 
com que a sociedade de espetáculos, com o fetiche da mercadoria, escraviza a humanidade. Nós queremos nos ‘desvoduzar’. Trazer sopros que invertam as equações abstratas dominantes”, diz ele.

O rei da vela, de 1967: pesquisa voltada para o teatro épico. © DIVULGAÇÃO / ARQUIVO TEATRO OFICINA

O diretor grafa a palavra teatro sempre sem o “r” – ou com o “r” entre parênteses – para conjugar a sílaba “te” à palavra “ato”. Diz que ato 
e representação não são coisas iguais, ampliando o sentido da mimese, do texto decorado, para um trabalho performático com ares de celebração dionisíaca. 
A última peça do Teatro  Oficina, Macumba antropófaga, tem esse perfil: o espetáculo começava dentro do teatro e partia para a rua. Descia a rua Jaceguai e, por entre becos, casas, ruelas da vizinhança, prosseguia com atores conduzindo performancesao som de bumbos, pandeiros e declamações.

É um momento atual do grupo, que José Celso considera fazer parte “da descoberta do teatro como intervenção urbana”. 
O que não muda é a diretriz estabelecida por uma referência fundamental: 
a obra do escritor Oswald de Andrade (1890-1954), especialmente seu Manifesto antropófago.

A redescoberta de Oswald “foi a revolução cultural mais importante da segunda metade do século XX”, diz o diretor, em referência ao movimento Tropicalista. “Ninguém o conhecida, nem Glauber [Rocha, cineasta], nem Caetano [Veloso], nem Gil [Gilberto Gil] nem o Hélio Oiticica [artista plástico]; a antena de Oswald nos ligou neste movimento definitivo de descolonização da língua, do corpo, da arte”, prossegue.

O Oficina foi fundado em 1958 por José Celso, Renato Borghi e Etti Fraser, entre outros atores. Teve uma primeira fase realista, com pesquisa fundamentada na metodologia do russo Constantin Stanislavski. Após um incêndio que destruiu o teatro por completo, o grupo encenou em 1967 O rei da vela, de Oswald. A peça marca a nova pesquisa, voltada para o teatro épico do alemão Bertolt Brecht.

“As bacantes”, de 1996, em reapresentação de 2010. © ARTHUR MAX

O grupo se desfez em parte por conta da situação política – a ditadura militar leva José Celso para o exílio, após 20 dias de prisão por conta de manifestos contra o regime – e em parte por desacordos entre os integrantes. O diretor retornou ao Brasil em 1978 e se seguiu o período da retomada de seu trabalho. Retomada lenta e gradual, agora sim articulada à parceria com a arquiteta Lina Bo Bardi.

A reabertura do repertório do Oficina ocorreu em 1991, com o espetáculo As boas, com texto de Jean Genet e com Raul Cortez no elenco. Ham-let (1993), baseado na obra de Shakespeare, e As bacantes (1996), de Eurípedes, aprofundam a inspiração na mitologia grega de Dionísio, deus dos prazeres, da loucura, do vinho, do sexo. O Oficina firma seu terreno na celebração da nudez, do corpo e da carne como ponte para um gozo espiritual.

É uma linha de pesquisa que resulta em espetáculos longos, muitas vezes com até quatro horas de duração. Assim era Cacilda!, de 1998, baseada na vida e no trabalho da atriz Cacilda Becker, e a trilogia de Os sertões, adaptação da obra de Euclides da Cunha, de modo que o original era dividido em três partes: A terra, 
O homem e A luta. Houve sessões que reuniam esses três espetáculos, com mais 
de 10 horas de duração. Uma delas foi apresentada no mesmo município da Bahia onde houve o massacre de Canudos, narrado no livro de Euclides da Cunha.