Arquivo da tag: Revolução

A ‘regra dos 3,5%’: como uma pequena minoria pode mudar o mundo (BBC)

Por David Robson, 13 de maio de 2019; traduzido por Google Translator e revisado por Renzo Taddei em 3 de junho de 2020

BBC Future

Protestos não-violentos têm duas vezes mais chances de sucesso do que conflitos armados – e aqueles que atingem um limiar de 3,5% da população nunca falharam em provocar mudanças.

Em 1986, milhões de filipinos tomaram as ruas de Manila em protesto pacífico e oração no movimento People Power. O regime de Marcos caiu no quarto dia.

Em 2003, o povo da Geórgia expulsou Eduard Shevardnadze através da Revolução das Rosas, sem derramamento de sangue, na qual manifestantes invadiram o prédio do parlamento segurando flores.

No início deste ano, os presidentes do Sudão e da Argélia anunciaram que se afastariam depois de décadas no cargo, graças a campanhas pacíficas de protesto.

Em cada caso, a resistência civil de membros comuns do público superou a elite política na obtenção de mudanças radicais.

Obviamente, existem muitas razões éticas para usar estratégias não violentas. Mas uma pesquisa convincente de Erica Chenoweth, cientista política da Universidade de Harvard, confirma que a desobediência civil não é apenas a escolha moral; é também a maneira mais poderosa de moldar a política mundial – por larga vantagem.

Olhando para centenas de campanhas no século passado, Chenoweth descobriu que as campanhas não-violentas têm duas vezes mais chances de atingir seus objetivos do que as campanhas violentas. E embora a dinâmica exata dependa de muitos fatores, ela demonstrou que são necessários cerca de 3,5% da população participando ativamente dos protestos para a garantia de mudanças políticas efetivas.

A influência de Chenoweth pode ser vista nos protestos recentes do movimento Extinction Rebellion, cujos fundadores dizem terem sido diretamente inspirados por suas descobertas. Como ela chegou a essas conclusões?

The organisers of Extinction Rebellion have stated that Chenoweth's work inspired their campaign (Credit: Getty Images)
Os organizadores da Extinction Rebellion declararam que o trabalho de Chenoweth inspirou sua campanha (Crédito: Getty Images)

É desnecessário dizer que a pesquisa de Chenoweth se baseia nas filosofias de muitas figuras influentes ao longo da história. O abolicionista afro-americano Sojourner Truth, a sufragista Susan B Anthony, o ativista da independência indiana Mahatma Gandhi e o defensor dos direitos civis dos EUA Martin Luther King, todos defenderam, de forma convincente, o poder dos protestos pacíficos.

No entanto, Chenoweth admite que, quando começou sua pesquisa em meados dos anos 2000, ela era inicialmente bastante cética a respeito da ideia de que ações não violentas poderiam ser mais poderosas que conflitos armados, na maioria das situações. Como estudante de doutorado na Universidade do Colorado, ela passou anos estudando os fatores que contribuem para o aumento do terrorismo quando foi convidada a participar de um workshop acadêmico organizado pelo Centro Internacional de Conflitos Não-Violentos (ICNC), uma organização sem fins lucrativos sediada em Washington, D.C. O workshop apresentou muitos exemplos convincentes de protestos pacíficos que provocam mudanças políticas duradouras – incluindo, por exemplo, os protestos do Poder Popular, nas Filipinas.

Chenoweth, porém, ficou surpresa ao descobrir que ninguém havia comparado de maneira abrangente as taxas de sucesso de protestos não-violentos com o dos violentos; talvez os estudos de caso tenham sido simplesmente escolhidos por algum tipo de viés de confirmação. “O ceticismo frente à ideia de que a resistência não-violenta poderia ser um método eficaz para alcançar grandes transformações na sociedade serviu de motivação para a pesquisa”, diz ela.

Trabalhando com Maria Stephan, pesquisadora do ICNC, Chenoweth realizou uma extensa revisão da literatura sobre resistência civil e movimentos sociais de 1900 a 2006 – uma base de dados que foi corroborada por outros especialistas da área. Elas consideraram principalmente tentativas de provocar mudanças de regime. Um movimento era considerado como tendo obtido sucesso se atingisse plenamente suas metas, no prazo de um ano após o pico de engajamento e como resultado direto de suas atividades. Uma mudança de regime resultante de intervenção militar estrangeira não seria considerada um sucesso, por exemplo. Enquanto isso, uma campanha era considerada violenta se envolvesse bombardeios, sequestros, destruição de infraestrutura – ou qualquer outro dano físico a pessoas ou propriedades.

“Estávamos tentando aplicar um teste bastante difícil à resistência não-violenta como estratégia”, diz Chenoweth. (Os critérios eram tão rigorosos que o movimento de independência da Índia não foi considerado evidência a favor de protestos não-violentos, nas análises de Chenoweth e Stephan – uma vez que os recursos militares em decadência da Grã-Bretanha foram considerados um fator decisivo, mesmo que os próprios protestos também tenham tido enorme influência).

Ao final desse processo, eles coletaram dados de 323 campanhas violentas e não violentas. E seus resultados – que foram publicados em seu livro Por que a resistência civil funciona: a lógica estratégica do conflito não-violento – foram impressionantes.

A força está nos números

No geral, as campanhas não violentas tiveram duas vezes mais chances de sucesso do que as campanhas violentas: elas provocaram mudanças políticas em 53% das vezes, em comparação com 26% nos protestos violentos.

Isso foi em parte resultado do fator demográfico. Chenoweth argumenta que as campanhas não-violentas têm maior probabilidade de sucesso porque podem recrutar mais participantes, de uma população muito mais ampla, aumentando a possibilidade de que os protestos causem a paralisia da vida urbana normal e no funcionamento da sociedade.

De fato, das 25 maiores campanhas que elas analisaram, 20 foram não-violentas, e destas 14 obtiveram sucesso estrondoso. No geral, as campanhas não violentas atraíram cerca de quatro vezes mais participantes (200 mil pessoas em média) do que as campanha violentas (média de 50 mil pessoas).

A campanha do Poder Popular contra o regime de Marcos, nas Filipinas, por exemplo, atraiu dois milhões de participantes no seu auge, enquanto os protestos brasileiros em 1984 e 1985 atraíram um milhão, e a Revolução de Veludo, na Tchecoslováquia, em 1989, atraiu 500 mil participantes.

Having attracted millions of supporters, the People Power demonstrations removed the Marcos regime in the Phillipines (Credit: Getty Images)
Tendo atraído milhões de apoiadores, as manifestações do Poder Popular removeram o regime de Marcos nas Filipinas (Crédito: Getty Images)

“Os números realmente fazem a diferença para a construção da força dos movimentos que efetivamente representam ameaça para autoridades ou ocupações entrincheiradas”, diz Chenoweth – e protestos não-violentos parecem ser a melhor maneira de obter esse amplo apoio.

Uma vez que cerca de 3,5% de toda a população começa a participar ativamente, o sucesso parece ser inevitável.

Além do movimento Poder Popular, a Revolução do Canto na Estônia e a Revolução das Rosas na Geórgia atingiram a participação de 3,5% da população

“Não houve campanhas que fracassaram depois de atingirem 3,5% de participação durante um evento de pico”, diz Chenoweth – um fenômeno que ela chamou de “regra dos 3,5%”. Além do movimento Poder Popular, o mesmo foi observado na Revolução do Canto na Estônia, no final dos anos 80, e na Revolução das Rosas, na Geórgia, no início de 2003.

Chenoweth admite que inicialmente ficou surpresa com seus resultados. Mas ela agora cita diversas razões pelas quais protestos não-violentos podem obter níveis tão altos de apoio. Talvez, obviamente, os protestos violentos excluam necessariamente as pessoas que têm aversão ou medo ao derramamento de sangue, enquanto manifestantes pacíficos mantêm o movimento com alto nível moral.

Chenoweth ressalta que os protestos não-violentos também têm menos barreiras físicas à participação. Você não precisa estar em forma e saudável para se envolver em uma greve, enquanto campanhas violentas tendem depender do apoio de homens jovens e em boa forma física. E embora muitas formas de protestos não-violentos também apresentem sérios riscos – basta lembrar da Praça da Paz Celestial, na China, em 1989 – Chenoweth argumenta que as campanhas não-violentas são geralmente mais fáceis de discutir abertamente, o que significa que as notícias de sua ocorrência podem atingir um público mais amplo. Movimentos violentos, por outro lado, exigem um suprimento de armas e tendem a depender de operações subterrâneas mais secretas, e podem ter dificuldades em conectar-se à população em geral.

Uma mulher idosa fala às forças de segurança da Argélia durante protestos recentes (Crédito: Getty Images)

Ao envolver amplo apoio em toda a população, as campanhas não-violentas também têm maior probabilidade de obter apoio entre a polícia e as forças armadas – os mesmos grupos em que os governo se apoiam para promover a ordem.

Durante um protesto pacífico de milhões de pessoas nas ruas, os membros das forças de segurança também podem ter mais medo de que seus familiares ou amigos estejam na multidão – o que os induz a não reprimir o movimento. “Ou quando estão olhando para o grande número de pessoas envolvidas, podem chegar à conclusão de que o navio está afundando e não querem afundar com ele”, diz Chenoweth.

Em termos das estratégias específicas usadas, as greves gerais “provavelmente são um dos métodos mais poderosos, se não o mais poderoso, de resistência não-violenta”, diz Chenoweth. Mas eles têm um custo pessoal, enquanto outras formas de protesto podem ser completamente anônimas. Ela aponta os boicotes dos consumidores na África do Sul na era do apartheid, nos quais muitos cidadãos negros se recusavam a comprar produtos de empresas de proprietários brancos. O resultado foi uma crise econômica que afetou a elite branca do país e que contribuiu para o fim da segregação, no início dos anos 90.

Nonviolent protests are more likely to attract support from across society. Here a pro-reform protestor faces security forces in Morocco in 2011 (Credit: Getty Images)
Protestos não-violentos têm mais probabilidade de atrair apoio de toda a sociedade. Aqui, uma manifestante pró-reforma frente às forças de segurança no Marrocos, em 2011 (Crédito: Getty Images)

“Existem mais opções de resistência não-violenta que não colocam as pessoas em perigo físico, principalmente à medida que o número aumenta, em comparação à atividade armada”, diz Chenoweth. “E as técnicas de resistência não-violenta costumam ser mais visíveis, de modo que é mais fácil para as pessoas descobrir como participar diretamente e como coordenar suas atividades para a interrupção máxima”.

Número mágico?

Esses são padrões muito genéricos, naturalmente, e apesar de serem duas vezes mais bem-sucedidos do que os conflitos violentos, a resistência pacífica ainda falha 47% das vezes. Como Chenoweth e Stephan apontaram em seu livro, isso ocorre em alguns casos porque os movimentos nunca obtiveram apoio ou impulso suficientes para “erodir a base de poder do adversário e manter a resiliência diante da repressão”. Mas alguns protestos não-violentos relativamente grandes também falharam, como os protestos contra o partido comunista na Alemanha Oriental, na década de 1950, que atraíram 400 mil membros (cerca de 2% da população) no seu auge, e ainda assim não atingiram seus objetivos.

A base de dados de Chenoweth demonstra que é apenas quando os protestos não-violentos atingem o limiar de 3,5% de engajamento ativo que o sucesso está garantido – e chegar a esse nível de apoio não é uma tarefa fácil. No Reino Unido, isso representaria 2,3 milhões de pessoas ativamente envolvidas em um movimento (aproximadamente o dobro do tamanho de Birmingham, a segunda maior cidade do Reino Unido); nos EUA, envolveria 11 milhões de cidadãos – mais do que a população total da cidade de Nova York.

Contudo, permanece o fato de que campanhas não violentas são a única maneira confiável de manter esse tipo de envolvimento.

A couple commemorate the Velvet Revolution of 1989, which helped bring down Communist rule in Czechoslovakia - another example of Chenoweth's "3.5% rule" (Credit: Getty Images)
Um casal comemora a Revolução de Veludo de 1989, que ajudou a derrubar o regime comunista na Tchecoslováquia – outro exemplo da “regras dos 3,5%” de Chenoweth (Crédito: Getty Images)

O estudo inicial de Chenoweth e Stephan foi publicado pela primeira vez em 2011 e suas descobertas atraíram muita atenção desde então. “A influência delas sobre esse campo de pesquisa têm sido imensa”, diz Matthew Chandler, que pesquisa resistência civil na Universidade de Notre Dame, em Indiana.

Isabel Bramsen, estudiosa de conflitos internacionais na Universidade de Copenhague, concorda que os resultados de Chenoweth e Stephan são convincentes. “[Agora] é uma verdade estabelecida dentro do campo de analise que as abordagens não-violentas têm muito mais chances de sucesso do que as violentas”, diz ela.

Com relação à “regra dos 3,5%”, ela ressalta que, enquanto 3,5% é uma pequena minoria, esse nível de participação ativa provavelmente significa que muito mais pessoas concordam tacitamente com a causa.

Estes pesquisadores estão agora tentando desvendar os fatores que podem levar ao sucesso ou fracasso de um movimento. Bramsen e Chandler, por exemplo, enfatizam a importância da unidade entre os manifestantes.

Como exemplo, Bramsen aponta para o levante fracassado no Bahrein, em 2011. A campanha inicialmente envolveu muitos manifestantes, mas rapidamente se dividiu em facções concorrentes. A perda de coesão resultante, pensa Bramsen, impediu o movimento de ganhar impulso suficiente para provocar mudanças.

O interesse de Chenoweth recentemente se concentrou em protestos mais próximos de casa – como o movimento Black Lives Matter e a Marcha das Mulheres em 2017. Ela também está interessada na Extinction Rebellion, recentemente popularizada pelo envolvimento da ativista sueca Greta Thunberg. “Eles confrontam-se com muita inércia”, diz ela. “Mas acho que eles têm um grupo central incrivelmente inteligente e estratégico. E eles parecem ter todos os instintos certos sobre como se desenvolver e ensinar por meio de campanhas de resistência não violentas”.

Por fim, ela gostaria que nossos livros de história prestassem mais atenção às campanhas não violentas, em vez de se concentrarem tanto nas guerras. “Muitas das histórias que contamos uns aos outros se concentram na violência – e mesmo que se trate de desastres horríveis, ainda encontramos uma maneira de encontrar vitórias nela”, diz ela. No entanto, tendemos a ignorar o sucesso dos protestos pacíficos.

“Há pessoas comuns que o tempo todo estão envolvidas em atividades heroicas que estão realmente mudando o mundo – e elas também merecem atenção e comemoração”.

David Robson é jornalista sênior da BBC Future.

Mujica, teórico da transição pós-capitalista? (Blog da Redação)

Publicado em 6 de janeiro de 2014 por 

140106-Mujica

Em entrevista inédita no Brasil, ele debate causas do fracasso do “socialismo real” e afirma: para superar sistema, é preciso começar pelo choque de valores

Cada vez mais popular tanto nas redes sociais como na mídia tradicional, o presidente do Uruguai, Pepe Mujica, arrisca-se a sofrer um processo de diluição de imagem semelhante ao que atingiu Nelson Mandela. Aos poucos, cultua-se o mito, esvaziado de sentidos — e se esquecem suas ideias e batalhas. Por isso, vale ler o diálogo que Pepe manteve, no final do ano passado, com o jornalista catalão Antoni Traveria. Publicada no site argentino El Puercoespínentrevista revela um presidente que vai muito além do simpático bonachão que despreza cerimônias e luxos.

Mujica, que viveu a luta armada e compartilhou os projetos da esquerda leninista, parece um crítico arguto das experiências socialistas do século XX. Coloca em xeque, em especial, uma crença trágica que marcou a União Soviética e os países que nela se inspiraram: a ideia de que o essencial, para construir uma nova sociedade, era alterar as bases materiais da produção de riquezas. ”Não se constrói socialismo com pedreiros, capatazes e mestres de obra capitalistas”, ironiza o presidente. Não se trata de uma constatação lastimosa sobre o passado ou de um desalento. Mujica mantém-se convicto de que o sistema em que estamos mergulhados precisa e pode ser superado. Mas será um processo lento, como toda a mudança de mentalidades, e precisa priorizar o choque de valores: tornar cada vez mais clara a mediocridade da vida burguesa e apontar modos alternativos de convívio e produção. Leia a seguir, alguns dos trechos centrais da entrevista:

“A batalha agora é muito mais longa. As mudanças materiais, as relações de propriedade, nem sequer são o mais importante. O fundamental são as mudanças culturais e estas transformações exigem muitíssimo tempo. Mesmo nós, que não podemos aceitar filosoficamente o capitalismo, estamos cercados de capitalismo em todos os usos e costumes de nossas vidas, de nossas sociedades. Ninguém escapa à densa malha do mercado, a sua tirania. Estamos em luta pela igualdade e para amortecer por todos os meios as vergonhas sociais. Temos que aplicar políticas fiscais que ajudem a repartir — ainda que seja uma parte do excedente — em favor dos desfavorecidos. Os setores proprietários dizem que não se deve dar o peixe, mas ensinar as pessoas a pescar; mas quando destroçamos seu barco, roubamos sua vara e tiramos seus anzóis, é preciso começar dando-lhes o peixe”.

“A vida é muito bela e é preciso procurar fazer as coisas enquanto a sociedade real funciona, ainda que seja capitalista. Tenho que cobrar impostos para mitigar as enormes dificuldades sociais; ao mesmo tempo, não posso cair no conformismo crônico de pensar que reformando o capitalismo vou a algum lado. Não podemos substituir as forças produtivas da noite para o dia, nem em dez anos. São processos que precisam de coparticipação e inteligência. Ao mesmo tempo em que lutamos para transformar o futuro, é preciso fazer funcionar o velho, porque as pessoas têm de viver. É uma equação difícil. O desafio é bravo. Há quem siga com o mesmo que dizíamos nos anos 1950. Não se deram conta do que ocorreu no mundo e por quê ocorreu. Sinto como minhas as derrotas do movimento socialista. Me ensinam o que não devo fazer. Mas isso não significa que vá engolir a pastilha do capitalismo, nesta altura de minha vida”.

“Não sei se vão me dar bola, mas digo aos jovens de hoje que aprendemos mais com o fracasso e a dor que com a bonança. Na vida pessoal e na coletiva pode-se cair uma, duas, muitas vezes, mas a questão é voltar a começar. E é preciso criar mundos de felicidade com poucas coisas, com sobriedade. Refiro-me a viver com bagagem leve, a não viver escravizado pela renovação consumista permanente que é uma febre e obriga a trabalhar, trabalhar e trabalhar para pagar contas que nunca terminam. Não se trata de uma apologia da pobreza, mas de um elogio à sobriedade — não quero usar a palavra austeridade, porque na Europa está sendo muito prostituída, quando se deixa as pessoas sem trabalho em nome do ‘austero’”.

“Em toda a história do Uruguai, o presidente repartia as licenças de rádio e TV com o dedo. Tivemos a ideia de abrir consultas e processos democráticos baseados em méritos. Pensamos e realizamos! O que certa imprensa diga não me preocupa. Já os conheço. O problema que o diário [uruguaio] El País pode me criticar e se, algum dia, estiver de acordo e me elogiar. Seria sinal de que ando mal”.

 

Uruguay: Mujica básico, o cómo convivir con todo aquello que se detesta, por Antoni Traveria (El Puercoespín, Argentina)

30 diciembre, 2013

Fue detenido hasta en cuatro ocasiones y privado de libertad durante casi 15 años en total, hasta 1985. En su condición de rehén de la dictadura cívico-militar, sufrió largos periodos de aislamiento en la cárcel de Punta Carretas –desde 1994, convertida en centro comercial– de la que se fugó en dos ocasiones.

José Alberto Mujica Cordano, al que sus compatriotas llaman el Pepe, es el presidente de la República del Uruguay desde hace tres años. La vida le llenó de cicatrices, de las que habla sin rencor, sin queja alguna.

Opina que «el odio no construye un carajo», pero que no hay que olvidar el pasado. Necesita acariciar la tierra todos los días, estar cerca de sus raíces. Su perra mestiza, con una pata amputada, de nombre Manuela, no se separa de él cuando está en casa. Vive en el campo, en una austera chacra en la zona rural de Rincón del Cerro, a 20 kilómetros de su lugar de trabajo en Montevideo. Una granja humilde donde cultivan flores y hortalizas junto a su compañera –como gusta llamarla él–, la senadora Lucía Topolansky. Compartieron militancia guerrillera tupamara y también ella estuvo en la cárcel, 13 años. Los razonamientos transgresores de este atípico presidente, su filosofía de vida, su sencillez, le hacen distinto a cualquier otro en su posición.

Tal vez sean esas las cualidades que le han convertido, a sus 78 años, en todo un fenómeno universal en las redes sociales. El sol ya se ha levantado hace poco más de un par de horas. Pepe Mujica recibe a Más Periódico en exclusiva, en su chacra, con su inseparable mate.

–Sus palabras acostumbran a tener repercusión; mucha gente, de todas las edades, le elogian a través de las redes sociales.

–Europa fue durante mucho tiempo el epicentro de todas las ideas de renovación, de cambio, de sociedades más justas, de respeto a los derechos humanos. Todo en el marco de un gigantesco cataclismo, porque nada cayó del cielo. También está la otra Europa. Como decía Antonio Machado, una España de charanga y pandereta con el contraste de otra España, la de las ideas y la cultura. Hay una parte de juventud que trata de cultivar esperanza y caminos de cambio. Ven una América Latina generosa. Da la impresión de que el pensamiento de izquierdas se está refugiando en América Latina. No tenemos mucho para teorizar, pero estamos realizando formidables experimentos de carácter social. Ya no nos creemos que podemos tocar el cielo con la mano, ni que construir una sociedad más justa y más libre es cosa de una sola generación.

–Tal vez haya ahora menos utopías que cuando usted era joven.

–El partido es ahora muchísimo más largo. Los cambios materiales, las relaciones de propiedad ni siquiera son lo más importante. Lo fundamental son los cambios culturales y esas transformaciones conllevan muchísimo tiempo. Aun aquellos que no podemos comulgar filosóficamente con el capitalismo estamos rodeados, cercados de capitalismo en todos los usos y costumbres de nuestras vidas, de nuestras sociedades. Nadie escapa a la tupida malla del mercado, a su tiranía. Estamos en lucha por la equidad y para amortiguar por todos los medios las vergüenzas sociales. No nos olvidamos que tenemos que aplicar políticas fiscales que ayuden a repartir, aunque sea parte del excedente que se produce en la sociedad, a favor de los más desfavorecidos. Los sectores propietarios dicen que no hay que regalar pescado a la gente, que hay que enseñarles a pescar; pero cuando les destrozamos la barca, les robamos la caña y les sacamos los anzuelos, hay que empezar por darles. Si queremos incorporarles a la sociedad no tiene vuelta.

–Hay una parte importante de esas nuevas generaciones que están buscando su futuro, pero cuesta mucho encontrarlo.

–No tengo certidumbre de que me vayan a dar un poco de pelota, pero a los jóvenes de hoy quiero decirles que las personas aprendemos mucho más del fracaso y del dolor que de la bonanza. La Europa rica se va a tensar inevitablemente. En la vida personal y en la vida colectiva se puede caer una, dos o muchas veces, pero la cuestión es volver a empezar. Aquel que no logre crearse su mundillo de felicidad con pocas cosas, con sobriedad –no quiero usar la palabra austeridad porque en Europa la prostituyeron dejando a la gente sin trabajo en nombre de lo austero–, me refiero a vivir liviano de equipaje, a no vivir esclavizado por esa renovación permanente consumista que es una fiebre y nos obliga a trabajar, a trabajar y a trabajar para poder pagar cuentas que nunca terminan. No es una apología de la pobreza, es una apología de la sobriedad, de los límites que uno tiene que fijarse para pelear por la libertad.

–No es fácil conseguir esa libertad.

–Ser libre es tener tiempo para hacer aquellas cosas que a uno lo motivan. Esto que aparentemente parece tan sencillo, tan brutalmente sencillo, es lo que con más frecuencia olvidamos. La vida esclavizada para comprar, comprar y comprar elimina la libertad de la persona para estar con los amigos, para el amor, para pescar si uno tiene esa afición, ¿qué sé yo? Para estar bajo un árbol. Usamos el concepto libertad en un sentido francés de revolución, muy grandilocuente. La libertad hay que bajarla a la tierra.

–Su intervención en la última Asamblea General de Naciones Unidas removió conciencias.

–Estoy seguro de que un presidente africano que estaba en la mesa me entendió todo lo que expresé. Creo que muchos entendieron mis palabras. Entender no quiere decir poder salir de la telaraña. Es otra historia. No creo que la presa que está atrapada esté contenta con estar ahí, pero el caso es que lo está. Esa es la cuestión. Por eso este fenómeno del capitalismo no es sencillo de resolver. La renovación necesita escuela de pensamiento, pero también escuela de vida. Los intentos de crear sociedades socialistas con la idea de poder hacer desaparecer la explotación del hombre por el hombre han adolecido de un defecto que no podíamos saber. No se pueden construir edificios socialistas con albañiles capitalistas. Sobre todo con capataces, con directores de obra que sean capitalistas. No se puede. De aquí el valor que tiene la cultura.

–El gran problema en América Latina siguen siendo las desigualdades sociales.

–La vida es demasiado hermosa y hay que procurar hacer las cosas mientras la sociedad real funciona, aunque sea capitalista. Tengo que cobrar impuestos para mitigar las enormes desigualdades sociales; y al mismo tiempo no puedo caer en el conformismo crónico de que reformando el capitalismo voy a alguna parte. Debo intentar otra cosa distinta; pero evitar la colisión, porque el choque es sacrificio humano. No se puede estar 30 o 40 años planteando la palabra revolución y que la gente tenga dificultades para comer. No podemos sustituir las fuerzas productivas de un día para otro, de la noche a la mañana ni en 10 años. Son procesos que necesitan la coparticipación de la inteligencia. Hay que dar batalla en el seno de las universidades para la multiplicación del talento humano. Pero, al mismo tiempo que peleamos por transformar el futuro, hay que hacer funcionar lo viejo porque la gente tiene que vivir. Es una ecuación difícil. El desafío es bravo. Hay quienes todavía siguen con lo mismo que decíamos en los años 50 del siglo pasado. No se han hecho cargo de lo que pasó en el mundo y por qué pasó. Siento como mías las derrotas que tuvo el movimiento socialista. Me enseñan lo que no debo de hacer. Pero eso no significa venirme a tragar la pastilla del capitalismo a estas alturas de mi vida.

–Hay quienes se refieren a usted calificándolo como «el Presidente pobre».

–Les respondo con la definición de Séneca: «Pobres son los que precisan mucho». Es al revés, pobres son ellos. Coincido con el concepto liviano de equipaje de Machado, no estar esclavizado por las cuestiones materiales, y además tengo 78 años. ¿Qué sentido tendría que me pusiera a juntar plata a estas alturas del partido? Sería un viejo demencial, estúpido e idiota. Lo que recibo trato de compartirlo todo lo que puedo porque, además, la vida se me está escapando. Si pudiera amortizar algunos años de vida tal vez otro gallo cantaría, podría ser distinto, pero pasé casi 15 años con ciertas incomodidades por querer cambiar el mundo.

–Después de ese largo periodo de aislamiento en la cárcel, entiendo que habrá coincidido con funcionarios, militares e incluso con alguno de los verdugos que le infligieron torturas.

–Muchos. Cantidades. ¡Me los banco [me los trago]! De no ser ellos habrían sido otros. Eran producto de un sistema. Yo no estoy para cobrar cuentas personales. Esto no quiere decir perdonar u olvidar; esas son cosas del fuero interno de cada uno. Cada ser humano es como un solecito del sistema planetario, están los hijos, los familiares. En una visión global del país tengo que tratar de amortiguar en lo posible la resaca que ha quedado como consecuencia del pasado. La mochila de los recuerdos se carga atrás y se camina hacia delante, porque de lo contrario no se puede vivir. Hay deudas que no se cobran en este mundo y, por tanto, trato de convivir con cada cual por su vereda. No hay que olvidar el pasado porque el hombre es el único animal capaz de tropezar varias veces con la misma piedra, pero la vida siempre es porvenir. La dictadura dejó cuentas dolorosas pero el odio no construye un carajo.

–El rey de Holanda les ha dicho a sus conciudadanos que el Estado del bienestar se ha terminado.

–¡Está loco! Se está mintiendo a sí mismo. ¡Qué bárbaro! Uno va por Europa y sabe que hay problemas, pero yo quisiera que nuestros países americanos pudieran vivir en el estado de crisis que tienen ustedes. Tienen sociedades desarrolladas con una masificación de cosas. ¡Miren a África, miren al sur del Sáhara! Hay que agrandar un poco más el alma al medir las cosas. ¡No sean hipócritas!

–En la última década se han producido cambios muy significativos en el ejercicio del poder político en mu-chos países de América Latina.

–Ya nunca más Brasil volverá a ser lo mismo que fue antes de Lula. Aún con versiones más de izquierdas y otras más centristas; en América Latina en estos momentos vamos todos juntos, incluso con las derechas, por primera vez en nuestra historia. Si tiramos demasiado con la mano izquierda corremos el riesgo de alejarnos de la mano derecha, y eso nos debilita como continente. No llega más rápido el que anda más apurado, sino el que camina más firme. Los más débiles no tenemos otra alternativa que juntarnos y más cuando tenemos tantas cosas en común. El portugués es un castellano más dulce. Si te lo hablan despacio, se entiende. Así que tenemos un parentesco muy hondo. Tenemos una lengua en común y tenemos lo que fue la influencia de la iglesia católica en todo el continente. Soy ateo, lo debo reconocer, pero la Iglesia católica ha matrizado [moldeado] toda América Latina. Tenemos nexos mucho más fuertes que los que pueda tener Europa, dividida en sus viejas repúblicas y naciones. Para terciar en ese mundo de gran dotes hay que construir sus homólogos.

–A la cumbre iberoamericana en Panamá excusaron su asistencia hasta 12 presidentes y tampoco pudieron alcanzar un acuerdo para elegir a un nuevo secretario general al finalizar su gestión el uruguayo Enrique Iglesias.

–Es un uruguayo español. Un hombre excelente. Estuve a punto de ir, pero decidí no acudir porque no había consenso para alcanzar un acuerdo sobre el nombre del sustituto. Es ridículo que no nos podamos poner de acuerdo en estas cosas. ¡El chovinismo nos hace un mal terrible! El nacionalismo de los débiles es una herramienta progresista, pero el ultranacionalismo de los fuertes es un peligro.

–¿Está en crisis el sistema de cumbres?

–Hemos caído en una hemorragia de encuentros presidenciales. Las cumbres están bien pero deberían tener una jerarquía y un producto final. De lo contrario, lo único que hacemos es dar trabajo a las cadenas hoteleras y a las agencias de viaje, pero perdemos el tiempo maravillosamente. Hay que cuidar un poco más los recursos públicos. Ha habido un cierto abuso de encuentros, cumbres y cumbrecitas. Más si tenemos en cuenta las herramientas de comunicación de que disponemos hoy.

–Dice el tópico que cuando al otro lado del río de La Plata se resfrían, ustedes tienen pulmonía. Las relaciones con Argentina andan revueltas.

–Las relaciones son complejas porque nos queremos mucho, y fundamentalmente nos quieren ellos. Más ellos que nosotros a ellos. No es mi caso personal. Soy un aficionado a la historia y, tal vez por eso, soy un francotirador contracorriente en mi país. Siempre defendí a muerte la relación con Argentina. Deben de haber unos 300.000 uruguayos por lo menos en Argentina, y no son dis-criminados. Pasan desapercibidos, como si fueran argentinos. Desde el punto de vista de la economía, la sociedad argentina es enormemente gravitante con Uruguay. No es solo por el comercio, es mucho más importante la inversión inmobiliaria que hacen a lo largo de toda la costa porque les encanta venir al Uruguay. Entre el 70 y el 80% del turismo que viene aquí es de origen argentino, y les retribuimos. Para nosotros ir a Buenos Aires es como ir a la gran ciudad, es como ir a París o a Barcelona.

–Los últimos años tienen ustedes el frente abierto con la industria papelera. Y da la impresión que el problema está enquistado.

–Siempre tenemos algún que otro conflicto. Argentina está en un modelo que le impuso la crisis del 2001 y las consecuencias que le comportó. Es muy proteccionista, muy cerrada, muy poco previsible. Eso nos crea problemas. No es que los finlandeses sean santos, vienen a ganar mucha plata y esta planta de acá es la que produce más barato, mucho más que las que tienen en Finlandia. Pero son inteligentes, cuidan y protegen el medio ambiente mucho más que nosotros porque son conscientes de que si pudren el río, están condenados. Son capitalistas desarrollados sin ser benefactores. Tampoco lo somos nosotros, siempre les mascamos algo. No damos puntada sin hilo.

–Calificó usted de «terca» a la presidenta Cristina Fernández…

–Si Cristina no fuera terca y dura, en Argentina se la llevan puesta. Pelea y pelea. La entiendo perfectamente. Menos mal que tiene ese carácter. ¡Es brava la Argentina!

–¿Cómo conoció a su esposa, la senadora Lucía Topolansky?

–¡Disparando! ¡Disparando! Andábamos disparando por el monte. (Sonríe) Lo que supera la realidad de lo que pueda pensar cualquier novelista es que Lucía fuera la encargada de ponerme la banda presidencial. Cuando fui senador me tocó investir al primer presidente de izquierdas del Uruguay y después, mi compañera Lucía, al ser la senadora más votada, tuvo que investirme a mí. Ahora empezamos a estar ya un poco pasaditos de años…

–Le queda prácticamente un año de mandato. ¿Qué no ha podido cumplir de lo que había comprometido ante los ciudadanos?

–Uno no sabe dónde está exactamente el poder. Si es un señor que está en un banco o el que maneja la tasa de interés. Hemos contribuido a fundar una universidad en el interior, teníamos otra idea mucho más grande pero no la pudimos concretar. Queríamos mucho más para la educación, aunque vamos a seguir en la lucha hasta el último día de mandato, que nadie tenga dudas.

–Uruguay será el primer país latinoamericano que permitirá el consumo de marihuana y dejará por tanto de ser delito. La controversia está servida.

–En alguna ocasión he dicho que la única adicción sana es la del amor. Las otras son como una especie de plaga: el tabaco, el juego, el alcohol… Todas ellas son legales pero son puro veneno. Blanquear el consumo de 30 gramos de marihuana por persona, como expresa la ley, permite eliminar las redes clandestinas del narcotráfico con este producto. Si criminalizamos la marihuana les estamos entregando el negocio a los narcotraficantes. La ley conllevará el control de la producción y de la venta de cannabis. Piense que un tercio de los presos que tenemos en Uruguay lo son por cuestiones relacionadas con las drogas. La violencia se da por el mercado negro y lo que pretendemos con esta ley es combatir el narcotráfico, que nadie piense que esto va a ser un viva la Pepa. Queremos regular su venta en farmacias y, por tanto, tener control sobre el consumo. Sabemos que lo que se ha hecho hasta hoy no ha dado resultado. Entiendo a quienes se muestran contrarios a nuestra propuesta, pero veamos los resultados de esta experiencia.

–¿Cuál es su definición de lo que conlleva gobernar, ahora que ha tenido oportunidad de vivirlo?

–En el sentido más profundo es posible que gobernar sea luchar por hacer evidente lo pre-evidente, mirar muy lejos. Eso tiene un precio: no ser entendido, no ser acompañado, no ser comprendido. Es natural que la gente esté preocupada por su hoy inmediato. La gente quiere ganar más, quiere vivir mejor, es parte del modelo y de esta etapa de la civilización. Hay otra discusión que tiene que ver con el despilfarro, porque así como vamos no hay para todos. Convengamos ese sentimiento real de que la gente quiere ganar más y gastar más, lo que comporta que hay que tensar y desarrollar más a este sistema. Ahí aparecen los fantasmas, las contradicciones. Muchos quieren vivir mejor de lo que ya viven, pero sin contribuir en nada.

–Han tenido también ustedes problemas con algunos medios de comunicación tradicionales, como les ha ocurrido a otros presidentes de la izquierda latinoamericana.

–Toda la vida en Uruguay el presidente repartía las licencias de radio y televisión con el dedo. A nosotros se nos ocurrió consultar y abrir un proceso democrático de méritos. ¡Lo que hicimos! Lo cierto es que lo que digan determinados medios no me preocupa. Ya les conozco. El problema que me puede crear a mí el diario El País (el de Uruguay) es si algún día está de acuerdo y me elogia; sería señal de que ando mal.

–¿Está usted siguiendo el debate soberanista planteado en Catalunya?

–La cuestión de la unidad ibérica nunca estuvo resuelta del todo. En el pasado fue la bota militar de Castilla y claro, eso no resolvió el encaje de todas las comunidades. Hay que acentuar en todo lo que se pueda la autonomía pero no en la pulverización, que creo que es para peor. Estuve el año pasado en Galicia y en el País Vasco, tengo pendiente visitar Catalunya.

Bem-vindos ao mundo dos adultos. Ou não? (Canal Ibase)

http://www.canalibase.org.br/bem-vindos-ao-mundo-dos-adultos-ou-nao/

11/03/2013

Renzo Taddei
Colunista do Canal Ibase

O texto abaixo é uma reflexão sobre o que significa hoje, em face às crises globais –  política, econômica e ambiental -, atravessar a fronteira que separa o mundo dos jovens do dos adultos. Foi escrito por ocasião de minha indicação a paraninfo da turma de formandos do curso de Comunicação Social da Universidade Federal do Rio de Janeiro, e lido em cerimônia de colação de grau, no dia 2 de março de 2013. O texto, no entanto, fala não apenas aos graduandos da referida turma, mas a todos os jovens que se acham de alguma forma interpelados pelas exigências do mundo adulto, interpelação esta que se dá na forma de pressão para que tais jovens se conformem e se adequem às estruturas e formas de organização social existentes. Por essa razão, decidi reproduzi-lo nesta coluna. O texto foi mantido tal qual foi apresentado.

 

Foto: adam.declercq/Flickr

Inicialmente não posso deixar de agradecer a minha indicação a paraninfo da turma, coisa que verdadeiramente me emocionou. Essa é a primeira vez que isso me acontece. E como seria de se esperar de um paraninfo de primeira viagem, fui pesquisar do que se trata. A rigor, o paraninfo é um padrinho ligado à identidade profissional dos formandos, alguém de quem se espera que diga algo no rito de passagem da formatura que seja ao mesmo tempo uma última aula – mas não exatamente, porque nesse momento vocês não são mais estudantes -, e que seja também o primeiro conselho profissional – mas não exatamente, porque nesse momento vocês ainda não estão formados. Vocês estão, nesse exato instante, em processo de transformação. Entraram nesse auditório como estudantes, e vão sair como bacharéis. Por isso a colação de grau é um rito de passagem: vocês saem diferentes do que entram, alguma coisa se transforma no processo. Nesse meu discurso, quero falar um pouco sobre isso que muda, que se transforma. E como isso se transforma, em que direção, pra onde vai.

Alguns de vocês certamente devem estar se perguntado se eu não vou simplesmente congratular os formandos e dizer que o Brasil precisa deles, que se esforcem para fazer desse um país melhor, que agora eles tem uma responsabilidade para com a sociedade, etc.– o discurso padrão, pré-formatado, disponível na Internet. Pois é, não vou. Isso seria perder o tempo de vocês e o meu. Se vocês me elegeram paraninfo – eu, que não sou jornalista, publicitário, editor, produtor, diretor, apresentador ou locutor; eu, que nem sequer sou professor das habilitações profissionais da Escola de Comunicação, mas ao invés disso sou um humilde professor de disciplina do ciclo básico, antropologia -, alguma razão deve haver. Nem que ela seja apenas certo gosto por viver perigosamente (dado que quem teve aula comigo sabe que eu tenho certa tendência a ser provocador e subversivo).

De qualquer forma, não posso evitar certo ponto de vista antropológico. Então, gostaria inicialmente de dizer que vocês são privilegiados. Já foram mais longe do que o Bill Gates e o Steve Jobs – ambos abandonaram os estudos universitários, e, portanto, não viveram esse rito de passagem que vocês vivem aqui hoje. Mas obviamente não é disso que quero falar. De certa forma, se há uma equivalência ou continuidade entre esse rito de passagem, a graduação universitária, e os ritos de passagem vividos por outras coletividades e grupos sociais, essa equivalência existe nos rituais nos quais um indivíduo passa a desempenhar, de forma integral, papéis de adulto. Esses são tradicionalmente chamados ritos de puberdade. “Mas a puberdade já passou faz tempo!”, vocês me dirão. Pois é aí mesmo onde reside o privilégio: entre deixar de ser criança e passar à condição de adulto, de forma integral, nossa civilização criou a adolescência, esse período que não acaba nunca, e onde tudo é mal definido, esquisito, tudo está de alguma forma fora do lugar, sem que se saiba exatamente o porquê. Em geral, a adolescência não existe nas culturas não ocidentais, e não existia no mundo ocidental até por volta da década de 1880. Na visão de muitos povos não ocidentais, o que nós ocidentais fazemos é infantilizar os indivíduos por quase uma década, e depois exigimos maturidade, como se ela surgisse num passe de mágica. Mas sabemos que as coisas entre nós não se dão exatamente dessa forma.

Ou seja, se vocês fossem índios – isto é, se não forem; quem sabe alguém aqui seja – já teriam passado pelo ritual que faz de alguém um adulto há muito tempo. Como vocês podem ver, não há qualquer relação entre ser adulto, no sentido que estou usando aqui, e uma determinada idade cronológica. Em algumas sociedades pode-se ganhar o status de adulto aos 7 anos; em outras,  como no mundo acadêmico em que eu vivo, por exemplo, a cidadania integral só se consegue com a obtenção do título de doutor, e a vida adulta raramente começa antes dos 30 anos. Tomemos então o conceito de adulto como equivalente a estar integrado de forma plena à ordem social vigente, às instituições centrais do meio social em que o indivíduo vive.

Voltando ao rito de passagem, um rito que funcione como tal não é apenas uma formalidade. Ele opera uma certa mágica, algo que efetivamente transforma quem por ele passa. A famosa frase “eu vos declaro marido e mulher”, ou a temida “eu declaro o réu culpado”, tem o poder de operar uma transformação real na identidade do sujeito; transformação que não ocorreria sem a existência do rito. Infelizmente, grande parte dos nossos ritos se burocratizou. O que os exemplos antropológicos mostram é que os ritos de passagem mais eficazes são aqueles em que o simbolismo associado à transformação da identidade é vivido materialmente, através de objetos capazes de grande mobilização emocional – como a hóstia, as alianças, o anel de formatura, o diploma, os trajes especiais -, e mais ainda quando essa materialidade é vivida no corpo – como as distintas formas de circuncisão, as escarificações (a produção de cicatrizes), tatuagens específicas, o corte dos cabelos, os estados de transe e outras práticas que envolvem alguma forma de dor. Numa conhecida prática que é parte do ritual de puberdade dos índios Maués e de outras tribos amazônicas, por exemplo, os jovens são levados a inserir uma das mãos em uma luva cheia de formigas tucandeiras, e devem suportar, por 15 minutos, a dor das ferroadas. Em nossa sociedade há muitos rituais que deixam marcas no corpo e que envolvem sofrimento: sem mencionar o “pede pra sair” do Capitão Nascimento, outro exemplo talvez igualmente chocante – pra quem não é da nossa tribo, obviamente – é o fato de que muita gente acha que antes de aparecer nas fotos de celebrações como essa, é preciso deformar o corpo de alguma forma: suando muito nas academias, submetendo-se a dietas alimentares agressivas, e até a cirurgias plásticas. Perto disso tudo, a monografia de graduação parece moleza.

Mas qual a necessidade disso tudo? Por que a transição à vida adulta não ocorre de forma gradual, sem que um ritual marque o momento, produzindo uma singularidade no transcorrer da vida que desordena e reordena as coisas? Num texto publicado há alguns anos no Brasil, Levi-Strauss narra e analisa um fato ocorrido na cidade de Dijon, França, no ano de 1951, que pode nos ajudar a entender essa questão. Mais precisamente no dia 24 de dezembro daquele ano, padres promoveram o enforcamento da figura do Papai Noel, que posteriormente foi queimado, em frente à catedral da cidade. A acusação: paganizar o Natal. No dia seguinte, o velhinho foi ressuscitado pela prefeitura da cidade, e apareceu no topo do prédio do governo municipal, falando às crianças, como fazia tradicionalmente. Essa sequência de eventos naturalmente gerou um intenso debate, que se espalhou por toda a França. Na opinião de Levi-Strauss, no entanto, mais importante do que discutir se se deve dar cabo ou não do Papai Noel, ou porque as crianças gostam tanto dele, é tentar entender por que é que os adultos o criaram, em primeiro lugar. Afinal, o Papai Noel não é invenção das crianças; estas são levadas a acreditar nele, por influência direta dos adultos. A resposta é bastante óbvia: o Papai Noel é um instrumento através do qual os adultos exercem controle sobre as crianças. “Só ganha presente quem se comportar bem, deitar-se quando mandado, comer tudo”. Levi-Strauss segue adiante para mostrar que os dados antropológicos são abundantes em relação ao fato de que os adultos temem as crianças, ou os não-ainda-plenamente-adultos.

E por que é que os adultos temem as crianças e os jovens, os não-ainda-plenamente-adultos? Porque esses têm o poder de bagunçar a vida adulta, desorganizar a ordem estabelecida, são subversivos por natureza – e, em muitas tradições, inclusive a nossa, isso literalmente é entendido como uma questão de natureza, em oposição à sociedade: as crianças são parte do mundo da natureza, mundo esse que é ao mesmo tempo uma ameaça ao mundo social, essencialmente dos adultos (e, frequentemente, dos homens), e precisa ser conquistado por este. Esse medo resulta na criação de personagens como o Papai Noel e o bicho papão, apenas para mencionar dois exemplos mais familiares; resulta também na necessidade de submeter os ainda-não-adultos a ritos de passagem psicologicamente intensos, de modo a construir, através do rito, um novo adulto, desnaturalizado e socializado.

E aqui estamos chegando ao que interessa. O que eu acabo de dizer é que todo ritual tem um duplo efeito: por um lado, transforma a identidade de quem passa por ele, de modo que o indivíduo interiorize os valores da sociedade e localize-se, de forma produtiva, nela; por outro, o ritual promove a ratificação dos poderes instituídos, o reforço das estruturas de poder, do status quo. Nesse mesmo ritual que vivemos aqui, no momento em que cada um de vocês ganha a credencial de bacharel, renova-se a sacralidade da universidade enquanto poder instituído legitimamente, com autoridade para traçar a linha dos que têm e dos que não têm acesso aos privilégios trazidos por tal credencial. Renova-se também a sacralidade da autoridade dos professores – vejam só como estamos em posições espaciais diferentes aqui hoje, vocês mais embaixo, os professores mais acima, vocês aqui para receber algo, os professores para dar algo. O mesmo ocorre num tribunal, em uma cerimônia de casamento ou em um batismo: ao mesmo tempo em que alguém é condenado ou absolvido, ou casado, ou batizado, é reforçado o poder do Estado ou da instituição religiosa.

Até aqui, tudo certo: não é difícil encontrar livro de introdução à antropologia que diga, ou pelo menos dê a entender, que as sociedades sempre se organizaram dessa forma, de modo que esse é um fato da realidade. O problema é que, na minha visão, isso existe em contradição com a ideia, tão repetida em discursos de paraninfo mundo afora, de que os formandos devem contribuir na construção de um mundo melhor. Trata-se de um problema de incompatibilidade entre forma e conteúdo: falar em mudanças, ou seja, na construção de um mundo melhor, num ritual que promove a reprodução das coisas como elas são, que coopta mentes e corações jovens e os coloca no centro das estruturas sociais que criaram e mantém em funcionamento o mundo que se pretende mudar. Talvez, se vivêssemos em um mundo com problemas menores, precisando de pequenas reformas aqui e ali, mas no qual o estado geral da vida fosse o de plenitude e alegria, esse fosse o caso.

Mas não há nada mais radicalmente oposto à realidade na qual nos encontramos. O mundo não precisa de pequenas reformas; os problemas da atualidade são estruturais e profundos. Aproveitando que estamos aqui, no Centro de Tecnologia, coração da engenharia da UFRJ, eu diria que, se perguntarmos a um engenheiro civil o que se deve fazer com um edifício com problemas estruturais profundos, ele diria: é preciso demolir o edifício, e fazer outro, sobre base mais sólida, com estrutura mais adequada. Mas quais são esses problemas, tão sérios, no mundo em que vivemos? Eu certamente não precisaria (nem conseguiria, se quisesse) listar os problemas que temos diante de nós, dado o fato de que vocês talvez estejam entre as pessoas mais bem informadas do planeta. Mas permitam-me citar apenas alguns, de modo a colocar recheio no argumento que estou construindo aqui. O mundo vive, já há cinco anos, uma crise econômica global sem precedentes, crise na qual ficou claro o quanto os Estados nacionais funcionam para manter o mercado mundial em funcionamento, atendendo a interesses das grandes corporações, e em detrimento de suas próprias populações (basta analisar a relação entre governos, bancos e a população, em países como os Estados Unidos, Inglaterra, Itália e Espanha, para se ver isso com clareza; ou a relação entre governos, empreiteiras, mineradoras e a população, no caso do Brasil).

Além disso, o mundo vive há pelo menos trinta anos uma crise ambiental sem precedentes, e continuamos ouvindo dos governos americano e chinês a mensagem de que sua produção econômica no curto prazo é mais importante do que a vida no planeta no futuro. Isso dá certo alívio ao governo brasileiro, que pode apenas entrar no vácuo dos gigantes americano e chinês, sem ter que declarar explicitamente que tem a mesma posição. Ao mesmo tempo, vemos grande parte da Europa trabalhando na transição de suas matrizes energéticas em direção a fontes de energia que não agridem os ecossistemas locais (como a energia solar; detalhe que não estou falando de energias supostamente “limpas”, mas das que não agridem os ecossistemas. As hidrelétricas, por exemplo, não apenas são grandes agressoras dos ecossistemas, como alimentam a perversão política que é o papel das grandes empreiteiras no financiamento das campanhas políticas nesse país); enquanto isso o Brasil trabalha para tornar-se o sexto maior produtor de petróleo do mundo! Nada como ser capaz de mobilizar um time excelente de publicitários para ser capaz de andar na contramão do bom senso e ainda ter apoio popular. E some-se a isso tudo o fato de que no Brasil, os 20% mais ricos detém 60% de toda a riqueza nacional; metade da população economicamente ativa, mais de 50 milhões de pessoas, trabalha de sol a sol para o enriquecimento de duas ou três centenas de famílias.

E eu nem mencionei a política. Alguém acha que as estruturas políticas brasileiras funcionam bem? Ninguém sabe, porque ninguém sabe como elas funcionam!

Enfim, esse é o mundo dos adultos em que vocês são, agora, admitidos de forma integral. Não é de se estranhar que um bocado de gente jovem resista a esse processo, muitas vezes entendido, literalmente, como um processo ilegítimo de cooptação. O mundo dos adultos – ou seja, do status quo, das instituições de poder que nos trouxeram até aqui – está moralmente falido. Construir um mundo melhor, em qualquer sentido que não seja apenas a reprodução de retórica vazia, é tarefa necessária, mas que não vai deixar os adultos felizes. Ou seja, para que os jovens efetivamente construam um mundo melhor, o que se vislumbra não é a paz entre adultos e jovens, paz supostamente produzida pelos ritos de passagem mencionados por mim anteriormente; ao invés disso, o que se pode esperar é a espada, para usar termos bíblicos.

E, vejam só, não estou falando de algo – jovens comprometidos com a criação de um mundo melhor – que não esteja, já, acontecendo: a única novidade política interessante, na última década, é a novidade produzida por movimentos jovens, em reação à falência moral e material do mundo dos adultos: estou me referindo aos muitos movimentos de ocupação, como o Occupy Wall Street, que se multiplicou e se espalhou pelo mundo todo; às manifestações juvenis contra os partidos do status quo no México (o PAN e o PRI), além do movimento zapatista no estado de Chiapas; ao movimento Idle no More no Canadá, que, como o movimento zapatista, uniu a juventude às lideranças indígenas locais; ao 15-M, na Espanha; à participação dos jovens nos eventos ligados à chamada Primavera Árabe; à importância da Cúpula dos Povos, na Rio+20, onde se articularam ações políticas mais interessantes que a prevista paralisia política dos diplomatas que participaram da reunião oficial. Ainda no Brasil, está claro que podemos, através de movimentos descentralizados, combinando manifestações públicas e petições pela Internet, forçar o governo a ações específicas, como ocorreu no movimento em apoio aos índios Guarani Kaiowá do Mato Grosso do Sul.

Ou seja, a boa novidade é que não é necessário inventar as soluções e ferramentas para um mundo melhor a partir do zero; muitas coisas interessantes já estão em movimento. Basta que vocês sejam conscientes e autônomos para decidir como vão se posicionar no mundo. Achar que as sociedades sempre se organizaram integrando os jovens às estruturas existentes, e que, portanto, não há nada a fazer a esse respeito, é discurso dos que tem interesse em manter os jovens sob controle, ou seja, é discurso de quem efetivamente tem medo dos jovens – porque tem algo a perder com qualquer mudança no status quo.

“Mas esses movimentos que você mencionou não foram capazes de se constituir como alternativa política efetiva!”, dirão alguns. Esse tipo de afirmação revela, por parte de quem a enuncia, a dificuldade em pensar um mundo efetivamente diferente; é como se a única política possível é aquela que toma o poder, e não aquela que transforma o próprio poder em alguma outra coisa. O que é radicalmente interessante nesses movimentos jovens é a recusa que têm em querer tomar as estruturas de poder existentes. O poder, da forma que este se constitui e manifesta no âmago das sociedades ocidentais, é herança do mundo adulto falido, que a juventude não quer. O que os movimentos juvenis querem é construir um outro mundo, um outro poder, um  mundo que, inclusive, não está predefinido, não existe ainda – e tais jovens não tem medo de viver em incerteza e ambiguidade, posto que estas são marcas de todo momento de transição. Isso, aliás, é uma das coisas que gera ansiedade no mundo dos adultos, porque pode desorganizar o processo através do qual Estados e corporações criam riscos, incutem nas pessoas níveis elevados de medo, e apresentam-se, então, como protetores. Como a história não cansa de mostrar, gente sem medo é um atentado à soberania de Estados fundados no medo.

Enfim, o que eu estou propondo aqui não é que todos rejeitem esse ritual, que desistam do título de bacharel, mas, ao invés disso, que vocês tomem controle sobre a mágica do ritual. Que o título de bacharel não seja uma forma de anular a sua capacidade de efetivamente transformar o mundo, mesmo que à revelia do que querem seus pais, professores, patrões, médicos, juízes, o Estado. Ao contrário, que vocês, ao invés de serem vítimas do título de bacharel, ou seja, de terem que se transformar para caber na persona social com direito oficialmente ratificado de usá-lo, tomem para si a missão de definir o que será ser bacharel, em suas vidas, e na sociedade que irão criar.

Ou seja, e para finalizar, o que eu quero propor de forma substantiva aqui são duas coisas, que considero fundamentais para que vocês estejam preparados para participar na criação de um mundo efetivamente, e não apenas retoricamente, melhor. A primeira é: não acreditem em identidades. Ou, pelo menos, não sejam vítimas delas. Nunca se deixem reduzir a uma ou a um número restrito de possibilidade de ser e estar no mundo: vocês nunca serão apenas jornalistas, publicitários, editores, produtores, diretores, apresentadores ou locutores. Vocês sempre serão muito mais do que isso. As identidades têm o potencial de se transformar em uma forma de tirania, de fascismo, mesmo quando isso se manifesta na forma de conflitos psicológicos internos ao indivíduo. Cada um de vocês não é um, são muitos. As possibilidades para o futuro são infinitas; nunca se deixem convencer, com ou sem rito de passagem, do contrário.

O segundo conselho: não vivam com medo. Do Papai Noel e bicho papão em diante, o mundo adulto administra quem pode efetivamente transformar a sociedade usando o medo. O medo é paralisante, algo que não convém quando o objetivo é mudar algo, e muito menos quando se quer mudar algo grande, como o mundo. A obra de construir um mundo melhor passa, necessariamente, pela desarticulação da grande burocracia do medo que nos controla a todos. Nesse sentido, o trabalho de vocês não será fácil, dado que tal burocracia tem na mídia uma de suas principais ferramentas.

Uma decorrência prática destes dois conselhos – não se deixar levar pela ilusão das identidades ou pelo discurso paralisante do medo -, é que vocês devem estar prontos para enfrentar resistência. Ou seja, não é possível querer mudar o mundo e, ainda assim, viver buscando aplausos; quem efetivamente mudou o mundo, no passado, enfrentou desafios homéricos. A boa notícia é que ninguém mais precisa ser um Ulisses ou um Aquiles; ninguém está sozinho, o movimento já está em curso, e, como diz um dos seus principais expoentes, “somos legião”. Basta a cada um escolher como irá participar: como agente, participante efetivo, ou como observador distante, alguém que, mais tarde, será inevitavelmente arrastado pela corrente.

Climate Change and the Next U.S. Revolution (ZNet)

Thursday, July 26, 2012

The U.S. heat wave is slowly shaking the foundations of American politics. It may take years for the deep rumble to evolve into an above ground, institution-shattering earthquake, but U.S. society has changed for good.

The heat wave has helped convince tens of millions of Americans that climate change is real, overpowering the fake science and right-wing media – funded by corporate cash – to convince Americans otherwise.

Republicans and Democrats alike also erect roadblocks to understanding climate change. By the politicians’ complete lack of action towards addressing the issue, the “climate change is fake” movement was strengthened, since Americans presumed that any sane government would be actively trying to address an issue that had the potential to destroy civilization.

But working people have finally made up their mind. A recent poll showed that 70 percent of Americans now believe that climate change is real, up from 52 percent in 2010. And a growing number of people are recognizing that the warming of the planet is caused by human activity.

Business Week explains: “A record heat wave, drought and catastrophic wildfires are accomplishing what climate scientists could not: convincing a wide swath of Americans that global temperatures are rising.”

This means that working class families throughout the Midwest and southern states simply don’t believe what their media and politicians are telling them.

It also implies that these millions of Americans are being further politicized in a deeper sense.

Believing that climate change exists implies that you are somewhat aware about the massive consequences to humanity if the global economy doesn’t drastically change, and fast.

This awareness has revolutionary implications. As millions of Americans watch the environment destroyed – for their grandchildren or themselves – while politicians do absolutely nothing in response, or make tiny token gestures – a growing number of Americans will demand political alternatives, and fight to see them created. The American political system as it exists today cannot cope with this inevitable happening.

The New York Times explains why: “…the American political system is not ready to agree to a [climate] treaty that would force the United States, over time, to accept profound changes in its energy [coal, oil], transport [trucking and airline industry] and manufacturing [corporate] sectors.”

In short, the U.S. government will not force corporations to make less profit by behaving more eco-friendly. This is the essence of the problem.

In order for humanity to survive climate change, the economy must be radically transformed; massive investments must be made in renewable energy, public transportation, and recycling, while dirty energy sources must be quickly swept into the dustbin of history.

But the economy is currently owned by giant, privately run corporations, that will continue destroying the earth if it earns them huge profits, and they make massive “contributions” to political parties to ensure this remains so. It’s becoming increasingly obvious that government inaction on climate change is directly linked to the “special interests” of corporations that dominate these governments.

This fact of U.S. politics is present in every other capitalist country as well, which means that international agreements on reducing greenhouse gasses will remain impossible, as each country’s corporations vie for market domination, reducing pollution simply puts them at a competitive disadvantage.

This dynamic has already caused massive delays in the UN’s already inadequate efforts at addressing climate change. The Kyoto climate agreement was the by-product of years of cooperation and planning between many nations that included legally binding agreements to reduce greenhouse gasses. The Bush and Obama administrations helped destroy these efforts.

For example, Instead of building upon the foundation of the Kyoto Protocol, the Obama administration demanded a whole new structure, something that would take years to achieve. The Kyoto framework (itself insufficient) was abandoned because it included legally binding agreements, and was based on multilateral, agreed-upon reductions of greenhouse gasses.

In an article by the Guardian entitled “US Planning to Weaken Copenhagen Climate Deal,” the Obama administration’s UN position is exposed, as he dismisses the Kyoto Protocol by proposing that “…each country set its own rules and to decide unilaterally how to meet its target.”
Obama’s proposal came straight from the mouth of U.S. corporations, who wanted to ensure that there was zero accountability, zero oversight, zero climate progress, and therefore no dent to their profits. Instead of using its massive international leverage for climate justice, the U.S. has used it to promote divisiveness and inaction, to the potential detriment of billions of people globally.

The stakes are too high to hold out any hope that governments will act boldly. The Business Week article below explains the profound changes happening to the climate:

“The average temperature for the U.S. during June was 71.2 degrees Fahrenheit (21.7 Celsius), which is 2 degrees higher than the average for the 20th century, according to the National Oceanic and Atmospheric Administration. The June temperatures made the preceding 12 months the warmest since record-keeping began in 1895, the government agency said.”

Activists who are radicalized by this global problem face a crisis of what to do about it. It is difficult to put forth a positive climate change demand, since the problem is global.  Demanding that governments “act boldly” to address climate change hasn’t worked, and lesser demands seem inadequate.

The environmental rights movement continues to go through a variety of phases: individual and small group eco-“terrorism,” causing property damage to environmentally damaging companies; corporate campaigns that target especially bad polluters with high-profile direct action; and massive education programs that have been highly successful, but fall short when it comes to winning change.

Ultimately, climate activists must come face to face with political and corporate power. Corporate-owned governments are the ones with the power to adequately address the climate change issue, and they will not be swayed by good science, common sense, basic decency, or even a torched planet.

Those in power only respond to power, and the only power capable of displacing corporate power is when people unite and act collectively, as was done in Egypt, Tunisia, and is still developing throughout Europe.

Climate groups cannot view their issue as separate from other groups that are organizing against corporate power. The social movements that have emerged to battle austerity measures are natural allies, as are anti-war and labor activists. The climate solution will inevitably require revolutionary measures, which first requires that alliances and demands are put forward that unite Labor, working people in general, community, and student groups towards collective action.

One possible immediate demand is for environmental activists to unite with Labor groups over a federal jobs program, paid for by taxing the rich, that makes massive investments in jobs that are climate related, such as solar panel production, transportation, building recycling centers, home retro-fitting, etc.

Another demand could be to insist that the government convene the most knowledgeable scientists in the area of clean energy. These scientists should be given all the resources they need in order to collectively create alternative sources of clean energy that would allow for a realistic alternative to the current polluting and toxic sources of energy.

However, any type of immediate demand will meet giant corporate resistance from both political parties. Fighting for a uniting demand will thus strengthen the movement, and for this reason it is important to link climate solutions to the creation of jobs, which are the number one concern of most Americans. This unity will in turn lead allies toward a deeper understanding of the problem, and therefore deeper solutions will emerge that challenge the whole economic structure that is deaf to the needs of humans and the climate and sacrifices everything to the private profit of a few.

Shamus Cooke is a social service worker, trade unionist, and writer for Workers Action (www.workerscompass.org). He can be reached at shamuscooke@gmail.com

http://www.businessweek.com/news/2012-07-18/record-heat-wave-pushes-u-dot-s-dot-belief-in-climate-change-to-70-percent

http://www.nytimes.com/2009/12/13/weekinreview/13broder.html

http://www.guardian.co.uk/environment/2009/sep/15/europe-us-copenhagen

Occupy Wall Street turns to pedal power (The Raw Story)

By Muriel Kane
Sunday, October 30, 2011

The Occupy Wall Street protesters who were left without power after their gas-fueled generators were confiscated by New York City authorities on Friday may have found the idea solution in the form of a stationary bicycle hooked up to charge batteries.

Stephan Keegan of the non-profit environmental group Time’s Up showed off one of the bikes to The Daily News, explaining that OWS’s General Assembly has already authorized payment for additional bikes and that “soon we’ll have ten of these set up and we’ll be powering the whole park with batteries.”

Protester Lauren Minis told CBS New York, “We’ve got five bike-powered generator systems that are coming from Boston and we’ve got five more plus other ones that are going to supplement as well so we’re completely, completely off the grid.”

According to CBS, “Insiders at Occupy Wall Street say they expect to have their media center and the food service area fully powered and illuminated by Monday.”

“We need some exercise,” Keegan explained enthusiastically, “and we’ve got a lot of volunteers, so we should be able to power these, no problem. … We did an energy survey of the whole park, found out how much energy we were using. …. Ten will give us twice as much power.”

Keegan also boasted that the system is “very clean” and is environmentally superior not only to fossil fuel but even to solar panels, because it uses almost entirely recycled materials.

[Click que image to watch video, or click here]