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População indígena no País cresceu 205% em duas décadas (Agência Brasil)

JC e-mail 4559, de 10 de Agosto de 2012.

No contexto do dia 9 de agosto, Dia Internacional dos Povos Indígenas, lideranças realizaram um protesto na sede da Advocacia Geral da União (AGU) para apelar pela suspensão da portaria 303, que autoriza a intervenção em terras indígenas sem a necessidade de consultar os índios.

Hoje (10), Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) divulgou os dados do Censo 2010 que mostram que os índios no Brasil somam 896,9 mil pessoas, de 305 etnias, que falam 274 línguas indígenas. É a primeira vez que o órgão coleta informações sobre a etnia dos povos. O levantamento marca também a retomada da investigação sobre as línguas indígenas, parada por 60 anos.

Com base nos dados do Censo 2010, o IBGE revela que a população indígena no País cresceu 205% desde 1991, quando foi feito o primeiro levantamento no modelo atual. À época, os índios somavam 294 mil. O número chegou a 734 mil no Censo de 2000, 150% de aumento na comparação com 1991.

A pesquisa mostra que, dos 896,9 mil índios do País, mais da metade (63,8%) vivem em área rural. A situação é o inverso da de 2000, quando mais da metade estavam em área urbana (52%).

Na avaliação do IBGE, a explicação para o crescimento da população indígena pode estar na queda da taxa de fecundidade das mulheres em áreas rurais, apesar de o índice de 2010 não estar fechado ainda. Entre 1991 e 2000, essa taxa passou de 6,4 filhos por mulher para 5,8.

Outro fator que pode explicar o aumento do número de índios é o processo de etnogênese, quando há “reconstrução das comunidades indígenas”, que supostamente não existiam mais, explica o professor de antropologia da Universidade de Campinas (Unicamp), José Maurício Arruti.

Os dados do IBGE indicam que a maioria dos índios (57,7%) vive em 505 terras indígenas reconhecidas pelo governo até o dia 31 de dezembro de 2010, período de avaliação da pesquisa. Essas áreas equivalem a 12,5% do território nacional, sendo que maior parte fica na Região Norte – a mais populosa em indígenas (342 mil). Já na Região Sudeste, 84% dos 99,1 mil índios estão fora das terras originárias. Em seguida vem o Nordeste (54%).

Para chegar ao número total de índios, o IBGE somou aqueles que se autodeclararam indígenas (817,9 mil) com 78,9 mil que vivem em terras indígenas, mas não tinham optado por essa classificação ao responder à pergunta sobre cor ou raça. Para esse grupo, foi feita uma segunda pergunta, indagando se o entrevistado se considerava índio. O objetivo foi evitar distorções.

A responsável pela pesquisa, Nilza Pereira, explicou que a categoria índios foi inventada pela população não índia e, por isso, alguns se confundiram na autodeclaração e não se disseram indígenas em um primeiro momento. “Para o índio, ele é um xavante, um kaiapó, da cor parda, verde e até marrom”, justificou.

A terra indígena mais populosa no País é a Yanomami, com 25,7 mil habitantes (5% do total) distribuídos entre o Amazonas e Roraima. Já a etnia Tikúna (AM) é mais numerosa, com 46 mil indivíduos, sendo 39,3 mil na terra indígena e os demais fora. Em seguida, vem a etnia Guarani Kaiowá (MS), com 43 mil índios, dos quais 35 mil estão na terra indígena e 8,1 mil vivem fora.

O Censo 2010 também revelou que 37,4% índios com mais de 5 anos de idade falam línguas indígenas, apesar de anos de contato com não índios. Cerca de 120 mil não falam português. Os povos considerados índios isolados, pelas limitações da própria política de contato, com objetivo de preservá-los, não foram entrevistados e não estão contabilizados no Censo 2010.

Ensino público manda 45% dos alunos às universidades federais (Valor Econômico)

JC e-mail 4559, de 10 de Agosto de 2012.

De acordo com o estudo “Perfil Socioeconômico e Cultural dos Estudantes de Graduação das Universidades Federais Brasileiras”, concluído pelo Fórum Nacional de Pró-Reitores de Assuntos Comunitários e Estudantis (Fonaprace) em julho de 2011, 45% dos cerca de 900 mil alunos matriculados nas 59 instituições da rede de ensino superior do País vieram do ensino médio público.

No que se refere especificamente à obrigatoriedade de destinar 50% das vagas nas universidades federais a alunos que cursaram o ensino médio em escolas públicas, a lei de cotas aprovada na terça-feira (7) vai causar um impacto muito menor no atual sistema de matrículas do que a polêmica que tem gerado.

De acordo com o estudo “Perfil Socioeconômico e Cultural dos Estudantes de Graduação das Universidades Federais Brasileiras”, levantamento feito pelo Fórum Nacional de Pró-Reitores de Assuntos Comunitários e Estudantis (Fonaprace) entre outubro e novembro de 2010 e concluído em julho de 2011, 45% dos cerca de 900 mil alunos matriculados nas 59 instituições da rede de ensino superior do País vieram do ensino médio público.

A terceira edição do estudo – a primeira foi produzida em 1996-1997, mostra que os maiores percentuais de alunos oriundos das escolas públicas são nas regiões Norte, com 71,5%, e Sul (50,5%). Nordeste e Centro-Oeste vêm em seguida com, respectivamente, 41,5% e 40,5%. O Sudeste é a região com o menor índice: 37%.

O “Perfil Socioeconômico” é uma pesquisa amostral do Fonaprace baseado no conjunto dos estudantes das universidades federais matriculados nos cursos presenciais de graduação. Adotou-se um nível de confiabilidade de 95% e erro amostral de 5% por instituição. A base de dados do foi fornecida pela Secretaria de Ensino Superior do Ministério da Educação (Sesu-MEC) e passou por um processo de validação com cada universidade participante, que respondeu questionários quantitativos e qualitativos num sistema online.

Rosana Pereira Parente, pró-reitora de graduação da Universidade Federal do Amazonas (Ufam), integrante do Fonaprace, observa que uma política de Estado de ação afirmativa para equalizar o acesso ao ensino superior é importante por combater a desigualdade no País, mas um modelo único para realidades diferentes poder ser considerada “uma estratégia complicada”. “Algumas particularidades devem ser observadas, aqui na Região Norte o mercado privado da educação básica não é tão forte quanto nos grandes centros e temos mais índios que negros e pardos. Com a lei, ações afirmativas que temos aqui são prejudicadas”, pondera Rosana.

Na Ufam, a criação de novas políticas de cotas é discutida por um grupo específico dentro do conselho universitário. No momento, a instituição dá prioridade à entrada de 50% via Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) e o vestibular contínuo dá os outros 50% das vagas a alunos do ensino médio – eles fazem “minivestibulares” desde o primeiro ano do ensino médio. “Mas queremos instituir ações que beneficiem alunos de baixa renda”, acrescenta Rosana.

Uma das principais conclusões do estudo é que o número de estudantes negros, pardos e índios e pobres aumentou nos últimos anos, tópicos também contemplados na lei de cotas aprovada nesta semana. Os responsáveis pela pesquisa sugerem que, devido a esse resultado, é urgente ampliar os investimentos na política de assistência estudantil.

“Já existem pesquisas no Brasil que tentam monitorar o avanço das políticas afirmativas na educação. Agora, com uma lei nacional, o novo modelo tem de vir acompanhado de ações de assistência estudantil para garantir não só o acesso, mas a permanência desse ‘novo’ aluno”, avalia Dalila Andrade Oliveira, professora da Faculdade de Educação da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e presidente da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação (Anped).

De 2008 a 2012 o orçamento do MEC para o Programa Nacional de Assistência Estudantil (Pnaes), que garante bolsas mensais e auxílios financeiros para alimentação, moradia e compra de material didático, cresceu 300% em valores nominais, para R$ 500 milhões. Mas dirigentes federais falam que os recursos são insuficientes. “O Pnaes precisaria subir para R$ 1,5 bilhão para dar conta das atuais necessidades atuais. A nova lei, que fere a autonomia universitária, poderia vir acompanhada de um item para garantir a contrapartida orçamentária à universidade que receber estudantes mais pobres”, critica Gustavo Balduíno, da direção da Associação Nacional de Dirigentes de Instituições de Ensino Federais (Andifes).

Sobre o aspecto racial, o levantamento do Fonaprace mostra que em 2010 estudantes brancos eram maioria nas universidades federais: 54%. Na pesquisa anterior, em 2004, o percentual de brancos era de 59%. Os pretos aumentaram de 5,9% em 2004 para 8,7% em 2010, percentual que subiu em todas as regiões do País: com destaque para o Norte, que praticamente dobrou o seu percentual (13,4%, ante 6,8% em 2004), e Nordeste, cujas marcas passaram de 8,6% para 12,5%.

Perto de 45% dos estudantes das universidades federais pertencem às classes C, D e E. Os estudantes da classe A somam 15% do total de matrículas de 2010, com maior concentração na região Centro-Oeste (22%). Os universitários enquadrados na classe B representam 41% do total.

Pai de gêmeos, um negro e outro branco (Extra)

Bruno Cunha

Fonte Extra

Finalmente eles foram reconhecidos no futebol. Enquanto um é zagueiro, tem cabelos crespos e adora doce, o outro é atacante, tem fios louros e prefere salgado. Com as diferenças, ficava difícil perceber que David Evangelista de Oliveira, o branco, e Nícolas, o negro, são irmãos gêmeos.

— Os pais dos coleguinhas do futebol achavam que só um era meu filho e que o outro era um amiguinho dele. E olha que os dois já treinam há um ano e meio. Mas só agora descobriram que são irmãos gêmeos — conta o montador de peças de laboratório Luis Carlos de Oliveira Silva, de 42 anos, pai das crianças.

Fama no bairro

Morador de Campo Grande, Luis tomou um susto quando soube da dupla gravidez da mulher, Audicelia Evangelista, de 45 anos. E outro após o nascimento dos filhos, um negro, como o pai, e outro branco, como a mãe.

— Na época, os colegas brincavam: “ah, esse aí não é seu filho, não!”. Uma vez entrei numa maternidade e o David me chamou de pai. O segurança cochichou: “não é filho dele.” Mas eu penso: os dois puxaram ao pai e à mãe — afirma Luis.

Na porta do quarto, a frase “gêmeos em ação”
Na porta do quarto, a frase “gêmeos em ação” Foto: Nina Lima / Extra

Famosos no sub-bairro Santa Rosa, Nícolas e David, aos 9 anos, já começam a colher os frutos da fama que os levou a um programa de TV ainda recém-nascidos. Outro dia mesmo foram seguidos por duas meninas que descobriram onde moravam.

— Cheguei do trabalho umas 19h30m e peguei o Nícolas passando gel no cabelo e o Davi se arrumando. Logo em seguida, duas meninas gritaram o nome deles aqui no portão. Elas estavam tomando coragem para chamá-los para sair — explica o pai, que se diverte ao saber que os filhos já estão se interessando pelas meninas.

Os gêmeos
Os gêmeos Foto: Acervo pessoal / Divulgação

Estimativa: menos de 1% de chance de incidência

O nascimento de irmãos gêmeos, um negro e outro branco, ainda surpreende. Em 2006, por exemplo, o EXTRA mostrou o caso dos irmãos Pedro e Nathan Henrique Rodrigues, que intrigou Costa Barros.

Um ano depois, o cabeleireiro Carlos Henrique Fonseca, o pai, na época com 26 anos, contou que muitas pessoas ainda estranhavam quando viam Pedro, negro como ele, ao lado de Nathan, branco como mãe, a então frentista Valéria Gomes, de 22 anos.

Diferentes, mas torcem pelo mesmo time
Diferentes, mas torcem pelo mesmo time Foto: Nina Lima / Extra

Miscigenação

A cegonha também foi generosa, em Botafogo, onde vivem as gêmeas Beatriz e Maria Gaia Gerstner, hoje com 8 anos. Uma é morena como a mãe e a outra é branca como o pai, um alemão.

— Quando estou com a branca não acham que é minha filha. E quando o pai está com a morena é a mesma coisa — conta a mãe, Janaína Gaia, de 35 anos, hoje separada do pai delas.

A diretora do Centro Vida — Reprodução Humana Assistida, na Barra, na Zona Oeste, Maria Cecília Erthal, estima que há menos de 1% de chance do nascimento de gêmeos diferentes.

— É a miscigenação que faz com que os genes de pais negros e brancos se encontrem — explica.

*   *   *

Jemima Pompeu enviou o seguinte comentário:

Gêmeos com cores de pele diferentes surpreendem pais, mas não os cientistas. Veja alguns casos no link abaixo:

Anunciado no Facebook, tênis da Adidas é considerado “racista” (Revista Cult)

Com correntes de borracha, calçado teve a venda suspensa

Junho 2012

No mês de junho, a fabricante de materiais esportivos Adidas anunciou em sua página do Facebook o lançamento de um novo tênis na linha outono-inverno 2012, segundo informou o jornal “Le Monde”. Desenhado pelo estilista Jeremy Scott Roundhouse, o calçado traz pulseiras de borracha simulando correntes, que muitos internautas viram como uma referência à escravidão.

Segundo a CNN, a empresa rapidamente removeu a postagem na página do Facebook, mas o assunto já havia rodado o globo gerando revolta entre internautas.

“Aparentemente não havia pessoas de cor no departamento de marketing que o aprovou”, brinca Rodwell em comentário no site “Nice Kicks”, portal destinado aos lançamentos de tênis.

A empresa, inicialmente, defendeu o designer, descrevendo seu estilo como “original” e alegre, mas o fabricante alemão emitiu um comunicado onde pede desculpas aos ofendidos com o caso e afirma que o modelo não será comercializado.

Ações afirmativas e sistema de cotas nas universidades brasileiras

Mais um passo na luta pela democratização efetiva do Ensino Superior

dhescbrasil.org.br

10 de agosto de 2012

Em 07 de agosto de 2012 o Senado Federal aprovou um projeto que tramitava a cerca de  uma década no Congresso, instituindo a reserva de 50% das vagas das universidades e institutos tecnológicos federais para estudantes que cursaram o ensino médio em escola pública.

Além disso, a lei prevê que, destas vagas, metade serão destinadas a estudantes com renda familiar per capita até um salário mínimo e meio. Também prevê que em cada estado serão destinadas vagas para pretos, pardos e indígenas, respeitando o percentual destes grupos nos estados, de acordo com os dados do IBGE.

Tais medidas visam atender a demandas históricas de ativistas que lutam pelo direito à educação e também pela democratização efetiva do ensino superior no país. Como sabemos historicamente o sistema universitário brasileiro se desenvolveu de forma restrita em termos de número de vagas e também de grupos atendidos. O ensino superior foi pensado durante muito tempo como um sistema para poucos e, com frequência, para aqueles que conseguiram se preparar para competir por uma vaga num quadro altamente competitivo.

Ao longo dos anos 1990 e principalmente dos anos 2000 ampliou-se o consenso entre diferentes setores da sociedade brasileira sobre a enorme desigualdade no acesso ao ensino superior no Brasil, expresso no paradoxo conhecido de que entre os estudantes das universidades públicas predominam os estudantes que freqüentaram escolas particulares no ensino básico, sendo o inverso também verdadeiro.

Observou-se também que os jovens brasileiros que chegavam ao ensino superior eram predominantemente de classe média e de classe alta e em sua maioria brancos, deixando de fora desta possibilidade, portanto, um grande contingente de jovens pobres, pretos, pardos e indígenas.

Em face de esta exclusão educacional, entidades não governamentais e movimentos sociais se mobilizaram para oferecer oportunidades de formação complementar para os jovens pobres, pretos, pardos e indígenas aumentarem suas chances de ingresso. Universidades, prefeituras, empresas e igrejas também se engajaram nestas iniciativas, levando a resultados relevantes em termos de aprovação destes estudantes em exames de seleção.

Também órgãos governamentais passaram a desenvolver políticas para ampliar o acesso ao ensino superior de grupos historicamente excluídos, tais como a reserva de vagas em  universidades públicas, a criação do Programa Universidade para Todos (PROUNI), destinado a fornecer bolsas de estudo em instituições privadas de ensino superior e a  ampliação do investimento em universidades federais visando o aumento da oferta de cursos e vagas.

Em 2012 é possível afirmar que estas medidas produziram efeitos positivos no que diz respeito à ampliação do acesso ao ensino superior de jovens de grupos excluídos. Entretanto, ainda permanece uma distância entre o número de jovens que concluem o ensino médio em escola pública e os que conseguem ingressar em instituição pública de ensino superior. Também ainda é desproporcional o número de estudantes negros e indígenas que chegam ao ensino superior, em comparação com sua proporção na população.

A lei aprovada pelo Senado vem justamente ampliar de forma substantiva estas oportunidades, levando a um compromisso das instituições federais de ensino superior e técnico com esta expansão. A lei também traz um importante compromisso com a igualdade racial, através da formalização do compromisso de ampliação do ingresso de estudantes negros e indígenas em proporções definidas segundo sua representação na população de cada estado da federação.

Num país que, até recentemente, tinha dificuldades em aceitar a desigualdade racial presente na sociedade, a aprovação desta lei reveste-se de grande importância, pois permite que se avance na efetiva democratização de oportunidades de ingresso no ensino superior.

Cabe-nos, agora, perguntar? Todos os problemas se resolvem com esta medida? Obviamente não. Na verdade a aprovação desta lei traz desafios importantes, como a ampliação e consolidação de permanência de estudantes de menor renda no ensino superior, através de um efetivo e eficaz programa de assistência estudantil. Também traz o desafio de continuar ampliando as oportunidades para que milhões de jovens pobres, negros e indígenas possam ter acesso e completar com sucesso o ensino médio, a fim de que possam participar da seleção de ingresso ao ensino superior.

Medidas de democratização com as que estão contidas nesta nova lei são marcos importantes no longo caminho da realização do direito à educação no Brasil. Esperamos que, após a sanção desta lei pela presidência, possamos inaugurar um novo momento nas políticas educacionais no país, com ampliação do acesso, oportunidades mais democráticas de permanência no ensino superior e pela busca de maior igualdade em todos os níveis. O caminho é longo, mas, com esta lei, será dado um grande passo.

Rosana Heringer
Relatora do Direito Humano à Educação

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INCLUSÃO NO ENSINO SUPERIOR: RAÇA OU RENDA?

João Feres Júnior*

Grupo Estratégico de Análise da Educação Superior no Brasil – FLACSO Brasil

A decisão por unanimidade do Supremo Tribunal Federal, no dia 26 de abril de 2012, que declarou a constitucionalidade do sistema de cotas étnico-raciais para admissão de alunos ao ensino superior, teve, entre várias consequências positivas, a virtude de abrir a possibilidade para que o debate acerca da inclusão por meio do acesso à educação superior se aprofunde. Mudamos, portanto, de um contexto no qual o debate era dominantemente normativo, preocupado principalmente com a questão da legalidade e constitucionalidade da ação afirmativa étnico-racial, para um novo contexto, no qual passa a importar a discussão concreta acerca dos mecanismos e critérios adotados pelas políticas de inclusão.

Além de sua pertinência moral, a decisão do Supremo é consonante com várias análises a partir de dados estatísticos sólidos, feitas a partir do final dos anos 1970 até o presente, que mostram a relevância da variável classe e da variável raça na reprodução da desigualdade no Brasil. Esse fato nos leva a intuir que o uso de ambas as variáveis em políticas de inclusão é recomendável. Tal intuição é em geral correta, mas não podemos nos esquecer de que da análise sociológica de dados populacionais ao desenho de políticas públicas a distância é grande e não pode ser percorrida sem mediações: identificação de públicos, adoção de categorias, criação de regras, estabelecimento de objetivos, avaliação de resultados etc.

Ao abordar a questão dos critérios de seleção, primeiro cabe fazer uma ressalva de caráter histórico. O debate midiático sobre ação afirmativa foca quase exclusivamente sobre a ação afirmativa étnico-racial. Contudo, a modalidade mais frequente de ação afirmativa adotada pelas universidades públicas brasileiras hoje tem como beneficiários alunos oriundos da escola pública: 61 de um total de 98 instituições, enquanto que apenas 40 têm políticas para negros (ou pretos e pardos).

Mas isso não é só: o processo de criação dessas políticas de inclusão no ensino superior brasileiro – hoje 72% das universidades públicas brasileira têm algum tipo de ação afirmativa – não pode ser narrado sem falarmos do protagonismo do Movimento Negro e de seus simpatizantes ao articular a demanda por inclusão frente às universidades por todo o Brasil. Ao serem pressionadas por esses setores da sociedade civil organizada, as universidades reagiram, cada uma a seu modo, pouquíssimas vezes criando cotas somente para negros (4 casos), muitas vezes criando cotas para
negros e alunos de escola pública (31), e majoritariamente criando cotas para alunos de escola pública. Não houve, por outro lado, nenhum movimento independente para a inclusão de alunos pobres no ensino superior. Em suma, se não fosse pela demanda por inclusão para negros, o debate sobre o papel da universidade no Brasil democrático certamente estaria bem mais atrasado.

O ponto mais importante, contudo, é entender que as mediações entre o conhecimento sociológico e a política pública têm de ser regidas por um espírito pragmatista que segue o seguinte método: a partir de uma concordância básica acerca da situação e dos objetivos, estabelecemos ações mediadoras para a implantação de uma política e então passamos a observar seus resultados. A observação sistemática (e não impressionista) dos resultados é fundamental para que possamos regular as ações mediadoras a fim de atingir nossos objetivos, ou mesmo mudar os objetivos ou a leitura da situação. Sem esse espírito é difícil proceder de maneira progressista na abordagem de qualquer assunto que diga respeito a uma intervenção concreta na realidade.

Assim, ainda que saibamos que ambas as variáveis, classe e raça, devam ser objeto de políticas de inclusão, não existe um plano ideal para aplicá-las. Será que deveriam ser separadas (cotas para negros e cotas para escola pública) ou combinadas (cotas que somente aceitem candidatos com as duas qualificações)? Fato é que pouquíssimas universidades adotam a primeira opção, enquanto 36 das 40 universidades públicas com ação afirmativa para negros têm algum critério de classe combinado, seja ele escola pública ou renda.

Há também outra questão importante: a variável classe deve ser operacionalizada pelo critério de renda ou escola pública? No agregado, as universidades escolheram preferencialmente “escola pública”, 30 das 40, pois ele é mais eficaz do que “declaração de renda” para se auferir a classe social do ingressante – pessoas com renda informal facilmente burlariam o procedimento. Contudo, 6 universidades, entre elas as universidades estaduais do Rio de Janeiro, exemplos pioneiros de adoção de ação afirmativa no país, adotam o critério de renda. No caso das universidades fluminenses, os programas que começaram em 2003 tinham cotas para escola pública separadas de cotas para “negros e pardos” (sic), mas em 2005 a lei foi alterada passando a sobrepor um limite de renda à cota racial.

Informações advindas de pessoas que participaram do debate que levou a tal mudança apontam para o fato de que a exposição do assunto à mídia, fortemente enviesada contra tais políticas, fez com que os tomadores de decisão tentassem se proteger do argumento de que a ação afirmativa beneficiaria somente a classe média negra. A despeito da causa que levou a tal mudança, o método sugerido acima nos leva a olhar para as consequências. Dados da UENF (Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro) mostram que nos anos em que vigorou o sistema antigo, 2003 e 2004, entraram respectivamente 40 e 60 alunos não-brancos – aproximadamente 11% do total de ingressantes. A sobreposição de critérios que passou a operar no ano seguinte derrubou esse número para 19. A média de alunos não-brancos que ingressaram sob o novo regime de 2005 a 2009 é ainda menor – 13 –, o que representa parcos 3% do total de ingressantes.

Conclusão: uma política que produzia resultados foi tornada praticamente irrelevante devido à adoção de critérios que no papel parecem justos, ou adequados, ou politicamente estratégicos. Contudo, o resultado deveria ser a parte fundamental. O exemplo comprova nosso ponto de vista de que não há receitas mágicas. Se isso é verdade, então a experimentação faz-se necessária. Mas fica faltando ainda um elemento crucial nessa equação. Para avaliarmos os resultados da experimentação é preciso que as universidades com programas de inclusão tornem públicos seus dados, e isso não tem acontecido, com raríssimas exceções. Sem avaliações sólidas das políticas, corremos o risco de ficarmos eternamente no plano da conjectura e da anedota e assim não conseguir atingir o objetivo maior dessas iniciativas, que é o de democratizar o acesso à educação superior no Brasil.

Rio de Janeiro, junho de 2012

Este texto é uma contribuição do autor ao projeto Grupo Estratégico de Análise da Educação Superior
(GEA-ES), realizado pela FLACSO-Brasil com apoio da Fundação Ford.

14 Wacky “Facts” Kids Will Learn in Louisiana’s Voucher Schools (Mother Jones)

—By Deanna Pan | Tue Aug. 7, 2012 3:00 AM PDT

God Bless Our SchoolSeparation of church and what? Currier & Ives/Library of Congress

Thanks to a new law privatizing public education in Louisiana, Bible-based curriculum can now indoctrinate young, pliant minds with the good news of the Lord—all on the state taxpayers’ dime.

Under Gov. Bobby Jindal’s voucher program, considered the most sweeping in the country, Louisiana is poised to spend tens of millions of dollars to help poor and middle-class students from the state’s notoriously terrible public schools receive a private education. While the governor’s plan sounds great in the glittery parlance of the state’s PR machine, the program is rife with accountability problems that actually haven’t been solved by the new standards the Louisiana Department of Education adopted two weeks ago.

For one, of the 119 (mostly Christian) participating schools, Zack Kopplin, a gutsy college sophomore who’s taken to Change.org to stonewall the program, has identified at least 19that teach or champion creationist nonscience and will rake in nearly $4 million in public funding from the initial round of voucher designations.

Many of these schools, Kopplin notes, rely on Pensacola-based A Beka Book curriculum or Bob Jones University Press textbooks to teach their pupils Bible-based “facts,” such as the existence ofNessie the Loch Ness Monster and all sorts of pseudoscience that researcher Rachel Tabachnick and writer Thomas Vinciguerra have thankfully pored over so the rest of world doesn’t have to.

Here are some of my favorite lessons:

1. Dinosaurs and humans probably hung out: “Bible-believing Christians cannot accept any evolutionary interpretation. Dinosaurs and humans were definitely on the earth at the same time and may have even lived side by side within the past few thousand years.”—Life Science, 3rd ed., Bob Jones University Press, 2007

Much like Whoopi and Teddy in the cinematic classic Theodore Rex. Screenshot: YouTube

Much like tough cop Katie Coltrane and Teddy the T-rex in the direct-to-video hit Theodore Rex Screenshot: YouTube

2. Dragons were totally real: “[Is] it possible that a fire-breathing animal really existed? Today some scientists are saying yes. They have found large chambers in certain dinosaur skulls…The large skull chambers could have contained special chemical-producing glands. When the animal forced the chemicals out of its mouth or nose, these substances may have combined and produced fire and smoke.”—Life Science, 3rd ed., Bob Jones University Press, 2007

3“God used the Trail of Tears to bring many Indians to Christ.”—America: Land That I Love, Teacher ed., A Beka Book, 1994

4. Africa needs religion: “Africa is a continent with many needs. It is still in need of the gospel…Only about ten percent of Africans can read and write. In some areas the mission schools have been shut down by Communists who have taken over the government.”—Old World History and Geography in Christian Perspective, 3rd ed., A Beka Book, 2004

The literacy rate in Africa is "only about 10 percent"--give or take a few dozen percentage points. residentevil_stars2001/Flickr

The literacy rate in Africa is “only about 10 percent”…give or take a few dozen percentage pointsresidentevil_stars2001/Flickr

5. Slave masters were nice guys: “A few slave holders were undeniably cruel. Examples of slaves beaten to death were not common, neither were they unknown. The majority of slave holders treated their slaves well.”—United States History for Christian Schools, 2nd ed., Bob Jones University Press, 1991

Slaves and their masters: BFF 4lyfe!  Edward Williams Clay/Library of Congress

Doesn’t everyone look happy?! Edward Williams Clay/Library of Congress

6. The KKK was A-OK: “[The Ku Klux] Klan in some areas of the country tried to be a means of reform, fighting the decline in morality and using the symbol of the cross. Klan targets were bootleggers, wife-beaters, and immoral movies. In some communities it achieved a certain respectability as it worked with politicians.”—United States History for Christian Schools, 3rd ed., Bob Jones University Press, 2001

Just your friendly neighborhood Imperial Wizard! Unknown/Library of Congress

Just your friendly neighborhood Imperial Wizard Unknown/Library of Congress

7. The Great Depression wasn’t as bad as the liberals made it sound: “Perhaps the best known work of propaganda to come from the Depression was John Steinbeck’s The Grapes of Wrath…Other forms of propaganda included rumors of mortgage foreclosures, mass evictions, and hunger riots and exaggerated statistics representing the number of unemployed and homeless people in America.”—United States History: Heritage of Freedom, 2nd ed., A Beka Book, 1996

Definitely Photoshopped.  U.S. National Archives and Records Administration/Wikipedia

Definitely Photoshopped. U.S. National Archives and Records Administration/Wikipedia

8. SCOTUS enslaved fetuses: “Ignoring 3,500 years of Judeo-Christian civilization, religion, morality, and law, the Burger Court held that an unborn child was not a living person but rather the “property” of the mother (much like slaves were considered property in the 1857 case of Dred Scott v. Sandford).”—American Government in Christian Perspective, 2nd ed., A Beka Book, 1997

9. The Red Scare isn’t over yet: “It is no wonder that Satan hates the family and has hurled his venom against it in the form of Communism.”— American Government in Christian Perspective, 2nd ed., A Beka Book, 1997

Meanwhile, God sneezes glitter snot in the form of Capitalism. Catechetical Guild/Wikipedia

Catechetical Guild/Wikipedia

10. Mark Twain and Emily Dickinson were a couple of hacks: “[Mark] Twain’s outlook was both self-centered and ultimately hopeless…Twain’s skepticism was clearly not the honest questioning of a seeker of truth but the deliberate defiance of a confessed rebel.”—Elements of Literature for Christian Schools, Bob Jones University, 2001

“Several of [Emily Dickinson’s] poems show a presumptuous attitude concerning her eternal destiny and a veiled disrespect for authority in general. Throughout her life she viewed salvation as a gamble, not a certainty. Although she did view the Bible as a source of poetic inspiration, she never accepted it as an inerrant guide to life.”—Elements of Literature for Christian Schools, Bob Jones University, 2001

And her grammar was just despicable! Ugh! Todd-Bingham picture collection, 1837-1966 (inclusive)/ Manuscripts & Archives, Yale University

To say nothing of her poetry’s Syntax and Punctuation—how odious it is.Todd-Bingham picture collection, 1837-1966 (inclusive)/ Manuscripts & Archives, Yale University

11. Abstract algebra is too dang complicated: “Unlike the ‘modern math’ theorists, who believe that mathematics is a creation of man and thus arbitrary and relative, A Beka Bookteaches that the laws of mathematics are a creation of God and thus absolute…A Beka Bookprovides attractive, legible, and workable traditional mathematics texts that are not burdened with modern theories such as set theory.”—ABeka.com

Maths is hard! Screenshot: MittRomney.com

MATHS: Y U SO HARD? Screenshot: MittRomney.com

12Gay people “have no more claims to special rights than child molesters or rapists.”—Teacher’s Resource Guide to Current Events for Christian Schools, 1998-1999, Bob Jones University Press, 1998

13. “Global environmentalists have said and written enough to leave no doubt that their goal is to destroy the prosperous economies of the world’s richest nations.”Economics: Work and Prosperity in Christian Perspective, 2nd ed., A Beka Book, 1999

Plotting world destruction, BRB.  Lynn Freeny, Department of Energy/Flickr

Plotting economic apocalypse, BRB Lynn Freeny, Department of Energy/Flickr

14. Globalization is a precursor to rapture: “But instead of this world unification ushering in an age of prosperity and peace, as most globalists believe it will, it will be a time of unimaginable human suffering as recorded in God’s Word. The Anti-christ will tightly regulate who may buy and sell.”—Economics: Work and Prosperity in Christian Perspective, 2nd ed., A Beka Book, 1999

He'll probably be in cahoots with the global environmentalists. Luca Signorelli/Wikipedia

Swapping insider-trading secrets is the devil’s favorite pastime. Luca Signorelli/WikipediaWhew! Seems extreme. But perhaps we shouldn’t be too surprised. Gov. Jindal, you remember,once tried to perform an exorcism on a college gal pal.

Racismo faz surgir identidade explosiva, forjada na dor e na raiva (UNEafro Brasil)

12/02/2013 – 00h12 – Atualizado em 12/02/2013 – 00h30

Fonte: UNEafro Brasil – União de Núcleos de Educação Popular para Negras/os e Classe Trabalhadora

ENTREVISTA – Dr. Jaime Amparo Alves

Morte negra é necropolítica

Por Jorge Américo

Militante da UNEafro Brasil recebe título de Doutor em Antropologia pela Universidade do Texas/Austin,nos EUA. Entrevista com Jaime Amparo Alves, Doutor em Antropologia e Pesquisador do Departamento de Estudos Africanos e Afro-Americanos da Universidade do Texas, em Austin (EUA) e militante da UNEafro Brasil

No início de maio, pelo menos 40 organizações populares se reuniram na cidade de São Paulo para lançar a Frente Pró-Cotas Raciais. O encontro ocorreu duas semanas após o Supremo Tribunal Federal (STF) declarar a constitucionalidade da reserva de vagas para negros em instituições públicas de ensino superior. A mobilização se deu quando os reitores das três universidades estaduais paulistas (USP, UNESP e Unicamp) anunciaram que a decisão dos ministros não provocará nenhuma alteração em seus processos seletivos. O primeiro ato político da Frente foi a realização de uma Aula Pública, na semana da Abolição, no interior da Faculdade de Direito do Largo São Francisco. Anteriormente, muitas dessas organizações formaram o Comitê contra o Genocídio da Juventude Negra, para denunciar a violência policial e a ausência de políticas públicas voltadas para essa parcela da população.

Em entrevista à Radioagência NP, do grupo Brasil de Fato, Jaime Amparo Alves, doutor em Antropologia e Pesquisador do Departamento de Estudos Africanos e Afro-Americanos da Universidade do Texas (EUA), interpreta as recentes mobilizações como um indicativo de que é possível uma reaproximação das entidades do movimento negro, fragmentado com a aprovação de um Estatuto da Igualdade Racial “esvaziado”.

“A esquerda brasileira é esquizofrênica ão esperar que se resolva o problema de classe para que um dia a questão racial seja, enfim, posta na mesa de debates”, analisa o antropólogo. “Eu descobri isso quando vi minha mãe envelhecendo na cozinha dos companheiros revolucionários”. Entre outras análises, ele vê São Paulo “como uma necrópole que ambienta nas relações sociais e nas políticas governamentais as práticas genocidas antinegro”.

O que configura o genocídio? 

Esta é uma pergunta imprescíndivel. O movimento negro tem caracterizado como genocídio todas as políticas estatais que sistematicamente têm impactado negativamente na qualidade de vida da populacão negra. Se levarmos em conta o conceito de genocídio tal qual definido pela resolução de 9 de dezembro de 1948, da Assembléia Geral das Nações Unidas, o termo diz respito a  todo o ato que visa, destruir, matar, limitar a reprodução fisica, cultural e  social de um determinado grupo etnico-racial ou nacional. A resolução vai ainda mais longe e configura como genoídio as políticas que visam infrigir condições de vida que põem o grupo em desvantagem social em relação a outros grupos em determinada sociedade.  Na discussão que se seguiu ão conceito da ONU, o foco saiu do resultado das acões  para a intencionalidade, ou seja, ão se caracterizar um ato como genocidio haveria que se provar se o estado teve intenção de levar a cabo tais politicas ou não. A intelectualidade negra – João Costa Vargas por exemplo –  tem feito a seguinte pergunta: do ponto de vista das vítimas importa provar a intencionalidade de um estado genocida? O que dizer das politicas estatais que resultam em morte generalizada de um grupo social mesmo quando o estado não prescreve tais politicas de eliminação no seu estatuto juridico? Na era dos direitos humanos, seria quase impossivel provar a existencia do genocidio contra determinados grupos sociais se tivermos que provar a intenção estatal. Agora, dizer que porque não há politicas oficiais de eliminação fisica baseadas em raca e etnicidade não haja praticas genocidas é uma outra história.

No caso do Brasil, que ações evidenciam que há um projeto genocida em curso, como o movimento negro vem denunciando? Não seria genocidio, então, as politicas de matanca de jovens negros?

O genocidio contra a população negra é tão evidente que somente o cinismo cruel da nossa elite intellectual poderia negar a sua existência. Não é apenas a violência homicida, com vitimizacão juvenil negra 1900% superior `a branca em estados como Paraíba e Alagoas, que caracteriza o genocídio brasileiro. É também as más condicões de vida, as políticas de limpeza urbana com os novos desabrigados como nos casos de Pinheirinho e a Favela do Moinho em São Paulo, ou ainda a hedionda acão na chamada ‘cracolândia’, para não falar do sistemático assassinato de pessoas em situacão de rua e a política de encarceramento em massa. Como os/as pesquisadores/as do genocídio negro têm mostrado, a morte negra é morte produzida políticamente, não é o resultado do processo natural de nascer, crescer e morrer. É “necropolitica”. É o resultado de processos conscientes que desqualificam, desumanizam e dizimam. Quantas pessoas negras precisam morrer para que o massacre seja considerado genocídio? Como fazer legivel aos olhos internacionais a economia do massacre que transforma as cidades brasileiras em campos de guerra e a experiencia negra urbana em tragedia programada. Ainda assim, esbarramos nas dificuldades legais de levar o Estado brasileiro ao banco dos réus. É preciso que se diga, no entanto, que essa não é uma dificuldade apenas nossa. Ainda em 1950 um grupo de intelectuais negros estadunidenses protocolou uma petição na ONU denunciando os Estados Unidos pelo genocídio da população negra daquele país. Você pode advinhar qual o resultado da peticão certo? Se a ONU é um organismo internacional em que quem tem poder de voto e de veto são os super-poderes implicados eles mesmos na ordem genocida, quem vai condená-los?

Qual o significado político da ocupação do Shopping Higienópolis, visto que cerca de 30 organizações participaram do ato?

A ocupação do Shopping Higienópolis tem um simbolismo muito importante. Primeiro pelo próprio significado que a palavra higienópolis encerra. Essa area onde o shopping está plantado tem tambem um peso histórico muito grande porque ela nasceu como parte da Cidade Nova, um projeto urbanistico que visava reestruturar o espaco urbano no final do século XIX, quando a elite cafeicultora dividiu a cidade em duas, varrendo os bairros predominantemente negros. A nova cidade não poderia comportar os territorios negros das áreas adjacentes do centro porque o corpo negro representava um obstáculo ão projeto de modernidade capitalista que São Paulo copiava da Europa. Eu sei, eu possso estar cançando o leitor do Brasil de Fato com essa revisão historica pobre. Mas aí é que está o problema e a solucão: ao ocupar o Shopping Higienópolis, estamos deixando a elite paulistana nua, assim como deixamos com o churrasco da “gente diferenciada”. Nossas elites têm uma capacidade impressionante de reescrever a história e se configurar como progressista nas colunas dos jornalões  de maneira tal que famílias tradicionais como a Matarazzo, ou a Mesquita, para lembrar de duas, aparecem como vanguarda política na boca de alguns. O que esse sujeito [Andrea Matarazzo] fez como sub-prefeito da Sé eo que Kassab fez na cidade foi apenas reatualizar esse modelo de higienização social que está no nascedouro de São Paulo. Eu tenho sugerido o termo “espacialidade macabra” para descrever a cidade de São Paulo. Sugiro que a gente leia/entenda a cidade como uma necropolis que ambienta nas relacões  sociais e nas politicas governamentais as praticas genocidas anti-negro. Ão ocupar o Shopping Higienópolis, denunciamos as políticas programadas da morte negra, exigimos o nosso direito `a cidade e mandamos um recado bem direto `a elite paulistana:vocês estão construindo uma cidade muito perigosa. Um dia a miseria cansa, cuidado! Fica então a pergunta: qual a estrategia de luta para aqueles deserdados da cidade neoliberal?

A última mobilização nacional do movimento negro foi em torno do Estatuto da Igualdade Racial. Porque houve fragmentação depois da “aprovação”?

Olha, o Estatuto da Igualdade Racial já nasceu morto. Se tem algo no Brasil que exemplifica o impasse político para uma agenda negra revolucionária, é o Estatuto. Ele serviu como esvaziamento politico-ideológico e colocou em lados opostos liderancas negras com contribuicões  históricas contra o racismo. De um lado aqueles vislumbrados com a migalhas políticas acenadas pelo Petismo, de outro aqueles que entendem a luta negra para além das concessões estatais. O Estatuto mostrou mais uma vez as artimanhas do racismo brasileiro: ele opera a partir da despolitização da categoria ‘raca’ e da falsa ideia de que é preciso substituir as ruas pelos gabinetes em Brasília. Eu não gostaria de dar nomes, mas perguntar não ofende: por que entidades outrora combativas como a Educafro e a Unegro se prestam ão triste papel de marionetes nas mãos dos companheiros do PT? O que se viu foram liderancas com pires nas mãos negociando cada exigência ão ponto de, no fim, o lema da Educafro por exemplo passar de “Zumbi, deixe que continuamos tua luta” para “mas vale um estatuto vazio na mão do que um perfeito engavetado”. As dificuldades em torno de uma unidade programática na militância põe um desafio `a construção da agenda radical negra. Eu acho que um dos impasses é reconhecer ou não a natureza anti-negro do Estado brasileiro em particular e do modelo capitalista em geral. Se para as organizacões  negras radicais os terrenos estão bem demarcados, me parece que falta rumo a outras, e olha que estou consciente das implicacões  políticas de uma crítica pública `as organizacões  negras no contexto do racism anti-negro brasileiro. Se negras e negros são ‘os últimos da fila depois de ninguém’, é deste lugar social que pode nascer um projeto radical em tempos de dystopia.  A pergunta é se a aprovação do Estatuto e a constitucionalidade das cotas pelo STF vão esfriar ou dar novo gás á agenda negra. Mais do que nunca, a gente precisa de uma radicalidade negra que recupere a crítica ão capitalismo racial e ão Estado como disposicões anti-negras, das quais não podem surgir transformacões  sociais. Onde o movimento negro se posiciona no dilemma revolução vesus reforma?

Considerando as composições políticas, ainda há possibilidades de unidade nas bandeiras do movimento negro?

Acredito que há possibilidade de unidade e acredito que esta unidade se forja nas ruas. Aqui está o que eu penso: o racismo antinegro cria as condicões materiais para a luta negra. Veja o exemplo da campanha contra o genocídio negro, emcampada por dezenas de organizacões  negras em São Paulo. A morte negra aparece aqui como o ‘lugar’ histórico, permanente, estrutural de onde forjamos uma identidade em movimento. Não foi a morte de Robson Silveira da Luz, em 1978, e os atos contínuos de discriminação sofrida por jovens negros na cidade o que deu origem ão MNU? Com isso quero dizer que, ironica e paradoxicamente, o sofrimento social negro traz consigo as sementes revolucionária porque não nos resta outra opcão a não ser resistir enquanto grupo organizado. Se a dominação racial no Brasil opera a partir do esvaziamento politico da categoria ‘raca’, os encontros diários de negras e negros com as tecnologias de dominação racial faz surgir uma identidade explosiva, forjada na dor e na raiva. Ai está a experiência comum que ultrapassa as diferencas politicas entre as organizacões  negras e cria o combustível para a batalha política.

Por que há tanta resistência em enxergar o racismo como problema estrutural, mesmo dentro da esquerda?

Sua pergunta nos obriga a voltar `a questão anterior porque de certa forma o Estatuto visibiliza bem esssa esquizofrenia da esquerda em entender a especificidade da condição negra. Eu acho que o debate empobrece quando as respostas que recebemos `as nossas criticas `a esquerda é a de que nós negros e negras fragmentamos a luta, como se fóssemos partidários do DEM ou do PSDB. Nós pedimos ãos companheiros e companheiras das esquerdas: se quiserem ser radical/revolucionários/as, não nos peçam para ter paciência porque no contexto da luta pela sobrevivencia negra, ter paciência é um privilégio branco. Não podemos esperar que se resolva o problema de classe para que um dia a questão racial seja enfim posta na mesa de debates. Não! Não ha negociação se a esquerda ‘progressista’ se recusa a entender como raça informa a maneira como a opressão de classe é experienciada. É a condição negra, o lugar do não-lugar, que sintetiza o que o feminismo radical negro tem chamado de ‘matriz da dominação’ no mundo contemporâneo. Eu acho que a dificuldade da esquerda em entender o racismo reside na recusa em entender o que representou o trauma histórico da travessia do Atlantico negro. O militante radical/revolucionário branco encontra os limites da praxis revolucionária exatamente quando confrontado com a sua propria identidade. Eu descobri isso quando vi minha mae envelhecendo na cozinha dos companheiros revolucionarios. Estamos falando de um trauma histórico que tem na cor da pele negra as marcas de todos os horrores de um passado que se mantem entre nos. As feridas abertas com a travessia do atlântico ainda não cicatrizaram e não cicatrizarão tão cedo. Só quem é negro entende o que estou falando em termos de dor física e psíquica. Ou a esquerda brasileira entende isso ou continuará recolhendo os cacos do que sobrou do seu percurso de classe media branca, universitária. O conceito abstrato e universalista de ‘classe’ não convence nem a mim nem ãos meus amigos da quebrada. Convence a você?

Faça uma consideração sobre o potencial de mobilização da juventude negra nos cursinhos comunitários. Eles podem ser espaços de resistência ão genocídio?

Aí reside a esperanca, Jorge. O que em outra oportunidade o Douglas Belchior chamou de ‘identidade explosiva’ nasce aí na quebrada. Os cursinhos comunitários estão forjando uma nova subjetividade negra. São jovens que se sabem excluídos da cidade neoliberal, sabem quem são os seus algozes e se reconhecem como agentes de sua propria historia. O que me chama atenção nos núcleos da Uneafro-Brasil, por exemplo, é a criatividade em fazer tanto com tão pouco e a  perspicácia política dos seus membros. Estamos falando de uma juventude que cresceu nos anos 90, sob a égede de uma política neoliberal sanguinária. Encarceramento em massa, violência policial, desemprego, todos os tipos de vulnerabilidade social que configuram o genocídio negro tiveram nos governos do PSDB dos últimos vinte anos em São Paulo sua expressão maxima. Este foi o contexto em que surgiram as experiências dos pre-vestibulares comunitários em SP e é essa a reaalidade que orienta a luta de organizacões  como a Uneafro-Brasil em sua luta. O fato de serem estas organizacões  as principais articuladoras da campanha contra o genocídio negro e pelas acões  afirmativas nas universidades estaduais paulistas mostra bem o potencial revolucionário de uma juventude excluida para quem não resta outra opção mas resistir.

Os autos de “resistência seguida de morte” significam “licença para matar”?

Os autos de resistência ou ‘resistencia seguidas de morte’ são não apenas licenca para matar, mas elas tambem sintetizam o que temos chamado de antropofagia racial brasileira. Darcy Ribeiro já chamava a atenção para a “máquina de triturar gente” que foi a empreiteira da escravidão e do genocídio indígena. Na perspectiva do genocídio negro, Abdias Nascimento e Marcelo Paixão também elucidam esta equação: se no mito fundacional da nação, os indios devoraram os primeiros colonizadores, aqui temos o inverso, esta é uma nação que devora o corpo negro. O corpo negro, tenho dito, representa um excesso de significados – criminoso, feio, perverso, malvado, sujo – que não lhe basta matar, é preciso negar qualquer possibilidade de humanidade. Quando a polícia aperta o gatilho ela está “apenas” traduzindo os significados da subalternidade negra historicamente produzidos. A polícia mata em conformidade com um modelo de sociedade que em sua essencia é anti-negra, afinal o policial não é um extra-terrestre. Ele é parte de uma sociedade inerentemente racista. A licenca para matar reitera o modelo de relacões  raciais em que não basta tirar a vida. É preciso submeter o corpo negro a multiplas mortes; morte simbolica, fisica, social. Percebo isso por exemplo no fato de que a polícia não apenas tem licença para matar, mas o morto também é indiciado pelo Estado por resistir a prisão, o que o leitor pode muito bem chamar de morte dupla. Explico: a polícia mata, o delegado lavra um boletim de ocorrências baseado nos depoimentos dos políciais, o morto é caracterizado como ‘bandido’ e indiciado.  Isso nos remete, então, mais uma vez `a especificidade da condição negra. A esquerda acha que o problema da violencia policial é um ‘defeito’ da democracia brasileira, ou seja, melhorando a democracia, depurando as instituicões  e punindo os policiais haveria uma saída para o genocidio negro. O que afirmamos é precisamente  o contrário: qual o lugar do corpo negro em um regime de cidadania racializado em que a morte negra não é excessão, mas a regra? Quais os limites de negociação com um estado democrático de direitos inerentemente anti-negro? Parece contradição, mas não é. Direitos humanos e morte negra caminham de mãos dadas no Brasil da democracia racial.

Qual o significado da decisão dos ministros do STF, que declararam constitucionais as cotas?

A decisão foi o fruto da luta do movimento negro que todos estes anos pautou a questão racial mesmo com uma campanha  da midia contra as acões  afirmativas. O STF apenas confirmou o que ativistas negros tem dito ão longo dos anos: a democracia racial e’ uma promessa, não uma realidade. Depois de mais de 120 anos da abolição da escravidão, onde estão os negros na hierarquia social brasileira? Continuam com o mesmo status  subalterno do seculo XIX. A decisão do STF, como lembrou Aires Britto, abre caminho para o Brasil finalmente se reencontrar consigo mesmo. Acho que pela primeira vez uma intelectualidade branca que tem construido suas carreiras academicas negando a existencia do racismo vai ter que aceitar o peso social que a categoria raca tem na produção de desigualdades. Mas tem algo mais aqui: um desafio e’ que a militancia negra não se dê por satisfeita e tome o momento presente como um novo impulso `a luta pela emancipação negra plena. As cotas racias são ponto de partida, não ponto de chegada.

Como se explica a postura das universidades paulistas (USP, UNESP e UNICAMP) , que imediatamente anunciaram que não promoverão mudanças em seus processos seletivos?

O fato das universidades estaduais paulistas USP, Unesp e Unicamp decidirem não adotar programas de acões  afirmativas não nos surpreende. Estas institiuicões  são disposições anti-negro em sua essência. Veja o que aconteceu recentemente no campus da Unesp/Araraquara onde inscrições nas paredes associavam alunos africanos com animais. Na USP eu mesmo tive meus encontros racializados não apenas nas tentativas de ingresso na pos-graduação da instituição, como tambem quando da minha tentativa de visita a um certo nucleo de estudos da violencia, agora como pesquisador visitante e inexplicavelmente o professor branco se recusou a me receber. Estas experiências cotidianas não são fatos isolados. Elas mostram como o sentimento anti-negro esta enraizado na burocracia e nas praticas cotidianas que desqualificam nossa gente para o ingresso na universidade. O agravante aqui e’ que a universidade publica e’ financiada com o dinheiro dos impostos da coletividade. Ironicamente, são os mais pobres – aqueles sob os quais ha uma disproporcional taxação dos impostos haja vista que o ICMS  e’ a fonte de recursos das estaduais paulistas – quem paga para os filhos da elite estudar. O menino pobre do Capão Redondo paga pelo curso de Medicina do playboy morador de Itaim Bibi. As universidades estaduais paulistas não irão adotar as cotas raciais porque elas representam projetos politico-ideologicos muito bem definidos. Mas isso não quer dizer que elas serão imbativeis em seu cinismo cruel. A campanha do movimento negro em São Paulo pelas acões  afirmativas tem agora na decisão do STF um combustivel a mais. A USP não pode continuar sendo um instrumento perverso de reprodução das desigualdades raciais no país. Sua comunidade acadêmica precisa e dever ser envergonhada não apenas no país, mas tambem no exterior. Uma estrategia e’ mapearmos todas as universidades internacionais com as quais USP, Unesp e Unicamp possuem convenio e acionar os seus parceiros para que não celebrem acordos com as universidades enquanto elas insistirem em investir na supremacia branca.

Jaime Amparo Alves – Doutor em Antropologia e Pesquisador do Departamento de Estudos Africanos e Afro-Americanos  da Universidade do Texas, em Austin amparoalves@gmail.com

Jorge Américo – Mestrando em Ciências Sociais, Universidade Federal do ABC

Faculdade de Direito recomenda cotas na USP (OESP)

01 de junho de 2012 | 10h 00

AE – Agência Estado

A Faculdade de Direito do Largo São Francisco, a unidade mais tradicional da Universidade de São Paulo (USP), aprovou ontem, por “aclamação” (unanimidade), recomendação para que a USP adote cotas raciais. A declaração, que deve seguir para o Conselho Universitário, pode ser o primeiro passo para que a instituição comece a discutir esse tipo de ação afirmativa.

A recomendação foi votada na Congregação da faculdade, que reúne professores e alunos. A reunião teve a participação de representantes do movimento negro, que defenderam as cotas. “Esse é um passo muito importante porque reconhece que o debate sobre cotas está amadurecido e que os programas da USP não alteram a desigualdade entre brancos e negros”, afirma Clyton Borges, do movimento Uneafro Brasil. A Uneafro faz parte da Frente Pró-Cotas, que reúne 70 organizações do movimento negro e fomentou a discussão.

A USP não adota sistema de cotas ou mesmo bonificação para negros no vestibular. A universidade mantém apenas um programa de inclusão para estudantes da rede pública e o considera satisfatório. Mesmo após o Supremo Tribunal Federal (STF) decidir pela legalidade das cotas, fortalecendo o debate do tema, a USP não cogitou discutir o tema.

Para o professor de Direito Marcus Orione, é simbólico que a primeira declaração oficial pelas cotas na USP tenha saído do Largo São Francisco. “A decisão nos faz resgatar a história da faculdade em defesa da democracia. Temos uma unidade onde não há negros.” As informações são do jornal O Estado de S.Paulo.

University of Tennessee anthropologists find American heads are getting larger (University of Tennessee)

University of Tennessee at Knoxville

White Americans’ heads are getting bigger — that’s according to research by forensic anthropologists at the University of Tennessee, Knoxville

White Americans’ heads are getting bigger. That’s according to research by forensic anthropologists at the University of Tennessee, Knoxville.

Lee Jantz, coordinator of UT’s Forensic Anthropology Center (FAC); Richard Jantz, professor emeritus and former director of the FAC; and Joanne Devlin, adjunct assistant professor, examined 1,500 skulls dating back to the mid-1800s through the mid-1980s. They noticed U.S. skulls have become larger, taller and narrower as seen from the front and faces have become significantly narrower and higher.

The researchers cannot pinpoint a reason as to why American head shapes are changing and whether it is primarily due to evolution or lifestyle changes.

“The varieties of changes that have swept American life make determining an exact cause an endlessly complicated proposition,” said Lee Jantz. “It likely results from modified growth patterns because of better nutrition, lower infant and maternal mortality, less physical work, and a breakdown of former ethnic barriers to marriage. Which of these is paramount we do not know.”

The researchers found that the average height from the base to the top of the skull in men has increased by eight millimeters (0.3 inches). The skull size has grown by 200 cubic centimeters, a space equivalent to a tennis ball. In women, the corresponding increases are seven millimeters and 180 cubic centimeters.

Skull height has increased 6.8 percent since the late 1800s, while body height has increased 5.6 percent and femur length has only increased about 2 percent. Also, skull-height has continued to change whereas the overall heightening has recently slowed or stopped.

The scientists also noted changes that illustrate our population is maturing sooner. This is reflected in the earlier closing of a separation in the bone structure of the skull called the spheno-occipital synchondrosis, which in the past was thought to fuse at about age twenty. Richard Jantz and Natalie Shirley, an adjunct assistant professor in the FAC, have found the bone is fusing much earlier — 14 for girls and 16 for boys.

America’s obesity epidemic is the latest development that could affect skeletal shape but its precise effects are unclear.

“This might affect skull shape by changing the hormonal environment, which in turn could affect timing of growth and maturation,” said Richard Jantz. “We know it has an effect on the long bones by increasing muscle attachment areas, increasing arthritis at certain joints, especially the knee, and increasing the weight bearing capacity.”

The research only assessed Americans of European ancestry because they provided the largest sample sizes to work with. Richard Jantz said changes in skeletal structure are taking place in many parts of the world, but tend to be less studied. He said research has uncovered shifts in skull shape in Europe though it is not as dramatic as seen in the U.S.

The findings were presented on April 14 in Portland, Ore. at the annual meeting of the American Association of Physical Anthropologists

Healthy Marriage Interventions: A Boom or a Bust? (Science Daily)

ScienceDaily (May 22, 2012) — Conventional wisdom, backed by years of research, suggests that healthy marriages equals a healthy society. And politicians and government officials have taken note, investing hundreds of millions of dollars each year in education programs designed to promote healthy marriages, focusing specifically on poor couples and couples of color. Is it working? No, says a Binghamton University researcher in a new study published in the current issue ofAmerican Psychologist, the flagship journal of the American Psychological Association. And it’s because many of these programs were based on research data gathered from White and middle-class marriages, and when applied to poor couples or couples of color, just don’t work.

“Initially, the rationale for these programs came from policy makers and scholars, who honed in on the association between unmarried parents and poverty that is plainly obvious in the data,” said Matthew D. Johnson, associate professor of psychology at Binghamton University. “This association led George W. Bush to make the promotion of healthy marriages a central plank of his domestic policy agenda, resulting in the implementation of the Healthy Marriage Initiatives. Barack Obama endorsed these initiatives, both as presidential candidate and as president. Now that the data on the success of these programs has started to roll in, the results have been very disappointing.”

According to Johnson, the problem lies in the fact that many of these programs lack grounding in solid science and are allowed to run unchecked. He cites research from two recent multisite studies as evidence that many of the federal programs that promote healthy marriage need to be suspended — or at the very least, overhauled. One of these studies, which was focused on over 5,000 couples in eight cities, examined the benefits of interventions designed to improve the relationships of low-income, unmarried couples who were either pregnant or recently had their first child.

The results indicated that the interventions had no effect in six of the cities, small beneficial effects in one city, and small detrimental effects in another city. The results of the other outcome study focused on 5,395 low-income married couples and found that those who received the intervention experienced very small improvements in relationship satisfaction, communication, and psychological health but no significant changes in relationship dissolution or cooperative parenting. And to add to it, the interventions didn’t come cheap, costing on average around $9,100 per couple.

So why the disconnect between a seemingly good idea and disappointing program outcomes? Johnson says there are several possible explanations. The best of these programs — the ones based on scientific findings — were initially studied with middle-class couples while the federal initiatives target poor couples. And even if the research that formed the basis of these interventions does apply, relationship improvement just doesn’t seem to be a priority for poor couples.

“There is evidence that suggests poor women want to be married and understand the benefits of healthy marriages,” said Johnson. “But earning enough for basic household expenses, keeping their children safe and working with their children’s overburdened schools are much more urgent concerns, making the idea of focusing on marriage seem self-indulgent if not irrelevant to many poor parents. When faced with a myriad of social issues, building intimate relationships is just not high on their priority lists.”

Johnson explains that this doesn’t mean the federal government shouldn’t be funding intimate relationship research. Instead, the government needs to adopt a more multifaceted approach: focus on programs that will ease the stress of poor families and at the same time, fund more rigorous basic research.

“We just don’t have solid predictors for relationship satisfaction for poor couple and couple of color, let alone whether the current marriage models apply,” said Johnson. He points to the National Institutes of Health as being the perfect place to coordinate and sponsor the research, noting “It has a long history of using scientific rigor in decision-making and it would certainly help in achieving the type of results that we’re looking for from these initiatives.”

Johnson also suggests that every community-based program funded by the Health Marriage Initiative should be required to gather standardized quantitative data in order to clearly demonstrate outcomes. And if the data shows programs aren’t working, Johnson recommends that the federal government get tough and either defund or filter out those that do not demonstrate effectiveness.

“If we are going to continue these initiatives, let’s at least make certain that we are assessing the effectiveness of the programs and learning from our mistakes,” said Johnson. “Improving marriages is a worthy goal and one shared by Democrat and Republican administrations alike. The key now is to get that same bipartisan support for improving the research and programs that target poor couples. With the renewed focus on the federal budget, the timing is just right.”

José Goldemberg: Cotas raciais – quem ganha, quem perde? (OESP)

JC e-mail 4501, de 21 de Maio de 2012.

José Goldemberg é professor emérito da Universidade de São Paulo. Artigo publicado no jornal O Estado de São Paulo de hoje (21).

O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu recentemente, por unanimidade, que a introdução de cotas raciais no acesso às universidades públicas federais não viola a Constituição da República, seguindo a linha adotada nos Estados Unidos há algumas décadas de introduzir “ações afirmativas” para corrigir injustiças feitas no passado. A decisão flexibiliza a ideia básica de que todos são iguais perante a lei, um dos grandes objetivos da Revolução Francesa.

Ela se origina na visão de que é preciso aceitar a “responsabilidade histórica” dos malefícios causados pela escravidão e compensar, em parte, as vítimas e seus descendentes. A mesma ideia permeia negociações entre países, entre ex-colônias e as nações industrializadas, na área comercial e até nas negociações sobre o clima.

Sucede que, de modo geral, “compensar” povos ou grupos sociais por violências, discriminações e até crimes cometidos no passado raramente ocorreu ao longo da História. Um bom exemplo é o verdadeiro “holocausto” resultante da destruição dos Impérios Inca e Asteca, na América Latina, ou até da destruição de Cartago pelos romanos, que nunca foram objeto de compensações. Se o fossem, a Espanha deveria estar compensando até hoje o que Hernán Cortez fez ao conquistar o México e destruir o Império Asteca.

É perfeitamente aceitável e desejável que grupos discriminados, excluídos ou perseguidos devam ser objeto de tratamento especial pelos setores mais privilegiados da sociedade e do próprio Estado, por meio de assistência social, educação, saúde e criação de oportunidades. Contudo, simplificar a gravidade dos problemas econômicos e sociais que afligem parte da população brasileira, sobretudo os descendentes de escravos, estabelecendo cotas raciais para acesso às universidades públicas do País, parece-nos injustificado e contraprodutivo, porque revela uma falta de compreensão completa do papel que essas instituições de ensino representam.

Universidades públicas e gratuitas atendem apenas a um terço dos estudantes que fazem curso superior no Brasil, que é uma rota importantíssima para a progressão social e o sucesso profissional. As demais universidades são pagas, o que prejudica a parte mais pobre da população estudantil. Essa é uma distorção evidente do sistema universitário do País. Mas o custo do ensino superior é tão elevado que apenas países ricos como a França, a Suécia ou a Alemanha podem oferecer ensino superior gratuito para todos. Não é o nosso caso. Essa é a razão por que existem vestibulares nas universidades públicas, onde a seleção era feita exclusivamente pelo mérito até recentemente.

A decisão recente do Supremo Tribunal Federal deixa de reconhecer o mérito como único critério para admissão em universidades públicas. E abre caminho para a adoção de outras cotas, além das raciais, talvez, no futuro.

Acontece que o sistema universitário tem sérios problemas de qualidade e desempenho, como bem o demonstra o resultado dos exames da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) – garantia da qualidade dos profissionais dessa área -, que reprova sistematicamente a maioria dos que se submetem a ele, o mesmo ocorrendo com os exames na área médica.

Órgãos do governo como a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), do Ministério da Educação, ou o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), do Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovação, têm feito esforços para melhorar o desempenho das universidades brasileiras por meio de complexos processos de avaliação, que têm ajudado, mas não se mostraram suficientes.

Esses são mecanismos externos às universidades. Na grande maioria delas, os esforços internos são precários em razão da falta de critérios e de empenho do Ministério da Educação, que escolhe os reitores, alguns dos quais, como os da Universidade de Brasília, iniciaram o processo de criação de cotas raciais como se esse fosse o principal problema das universidades e do ensino superior no Brasil.

O populismo que domina muitas dessas universidades, há décadas, é a principal razão do baixo desempenho das universidades brasileiras na classificação mundial. Somente a Universidade de São Paulo (USP) conseguiu colocar-se entre as melhores 50 nesse ranking.

O problema urgente das universidades brasileiras é, portanto, melhorar de nível, e não resolver problemas de discriminação racial ou corrigir “responsabilidades históricas”, que só poderão ser solucionadas por meio do progresso econômico e educacional básico.

O governo federal parece ter tomado consciência desse problema ao lançar o programa Ciência sem Fronteiras, que se propõe a enviar ao exterior, anualmente, milhares de estudantes universitários, imitando o que o Japão fez no século 19 ou a China no século 20 e foi a base da modernização e do rápido progresso desses países.

Daí o desapontamento com a decisão da Suprema Corte não só por ter sido unânime, mas também por não ter sido objeto de uma tomada de posição de muitos intelectuais formadores de opinião, exceto notáveis exceções, como Eunice R. Durham, Simon Schwartzman, Demétrio Magnoli e poucos outros que se manifestaram sobre a inconveniência da decisão.

O único aspecto positivo na decisão do Supremo Tribunal Federal foi o de que simplesmente aceitou a constitucionalidade das cotas raciais, cabendo aos reitores, em cada universidade, adotá-las e implementá-las.

Há aqui uma oportunidade para que os professores mais esclarecidos assumam a liderança e se esforcem para manter elevado o nível de suas universidades sem descuidar de tornar o acesso pelo mérito mais democrático, e sem a adoção de cotas raciais, como algumas universidades estaduais de São Paulo estão fazendo.

* A equipe do Jornal da Ciência esclarece que o conteúdo e opiniões expressas nos artigos assinados são de responsabilidade do autor e não refletem necessariamente a opinião do jornal.

The Beginning of the End of the Census? (N.Y.Times)

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Published: May 19, 2012

THE American Community Survey may be the most important government function you’ve never heard of, and it’s in trouble.

This survey of American households has been around in some form since 1850, either as a longer version of or a richer supplement to the basic decennial census. It tells Americans how poor we are, how rich we are, who is suffering, who is thriving, where people work, what kind of training people need to get jobs, what languages people speak, who uses food stamps, who has access to health care, and so on.

It is, more or less, the country’s primary check for determining how well the government is doing — and in fact what the government will be doing. The survey’s findings help determine how over $400 billion in government funds is distributed each year.

But last week, the Republican-led House voted to eliminate the survey altogether, on the grounds that the government should not be butting its nose into Americans’ homes.

“This is a program that intrudes on people’s lives, just like the Environmental Protection Agency or the bank regulators,” said Daniel Webster, a first-term Republican congressman from Florida who sponsored the relevant legislation.

“We’re spending $70 per person to fill this out. That’s just not cost effective,” he continued, “especially since in the end this is not a scientific survey. It’s a random survey.”

In fact, the randomness of the survey is precisely what makes the survey scientific, statistical experts say.

Each year the Census Bureau polls a representative, randomized sample of about three million American households about demographics, habits, languages spoken, occupation, housing and various other categories. The resulting numbers are released without identifying individuals, and offer current demographic portraits of even the country’s tiniest communities.

It is the largest (and only) data set of its kind and is used across the federal government in formulas that determine how much funding states and communities get for things like education and public health.

For example, a question on flush toilets — one that some politicians like to cite as being especially invasive — is used to help assess groundwater contamination for rural parts of the country that do not have modern waste disposal systems, according to the Census Bureau.

Law enforcement agencies have likewise used the data to predict criminal activities like methamphetamine production.

Their recent vote aside, members of Congress do seem to realize how useful these numbers are. After all, they use the data themselves.

A number of questions on the survey have been added because Congress specifically demanded their inclusion. In 2008, for example, Congress passed a lawrequiring the American Community Survey to add questions about computer and Internet use. Additionally, recent survey data are featured on the Web sites of many representatives who voted to kill the program — including Mr. Webster’s own home page.

The legislation is expected to go to the Senate this week, and all sorts of stakeholders are coming out of the woodwork.

“Knowing what’s happening in our economy is so desperately important to keeping our economy functioning smoothly,” said Maurine Haver, the chief executive and founder of Haver Analytics, a data analysis company. “The reason the Great Recession did not become another Great Depression is because of the more current economic data we have today that we didn’t have in the 1930s.”

She added that having good data about the state of the economy was one of America’s primary competitive advantages. “The Chinese are probably watching all this with glee,” she said, noting that the Chinese government has also opted not to publish economic data on occasion, generally when the news wasn’t good.

Other private companies and industry groups — including the United States Chamber of Commerce, the National Retail Federation and the National Association of Home Builders — are up in arms.

Target recently released a video explaining how it used these census data to determine where to locate new stores. Economic development organizations and otherbusiness groups say they use the numbers to figure out where potential workers are.

Mr. Webster says that businesses should instead be thanking House Republicans for reducing the government’s reach.

“What really promotes business in this country is liberty,” he said, “not demand for information.”

Mr. Webster and other critics have gone so far as to say the American Community Survey is unconstitutional. Of course, the basic decennial census is specifically enumerated in the United States Constitution, and courts have ruled that this longer form of the census survey is constitutional as well.

Some census watchers — like Andrew Reamer, a research professor at the George Washington University Institute of Public Policy — say they do not expect the Senate to agree on fully eliminating the American Community Survey (as well as the Economic Census, which would also be effectively destroyed by the House bill).

Rather, Mr. Reamer suspects, Republicans may hope that when the Senate and House bills go to a conference committee, a final compromise will keep the survey, but make participation in it voluntary. Under current law, participation is mandatory.

If the American Community Survey were made voluntary, experts say, the census would have to spend significantly more money on follow-up phone calls and in-person visits to get enough households to answer.

But Congress also plans to cut the census budget, making such follow-ups prohibitively expensive.

“If it’s voluntary, then we’ll just get bad data,” saidKenneth Prewitt, a former director of the census who is now at Columbia University’s School of International and Public Affairs. “That means businesses will make bad decisions, and government will make bad decisions, which means we won’t even know where we actually are wasting our tax dollars.”

Catherine Rampell is an economics reporter for The New York Times.

Soldiers Who Desecrate the Dead See Themselves as Hunters (Science Daily)

ScienceDaily (May 20, 2012) — Modern day soldiers who mutilate enemy corpses or take body-parts as trophies are usually thought to be suffering from the extreme stresses of battle. But, research funded by the Economic and Social Research Council (ESRC) shows that this sort of misconduct has most often been carried out by fighters who viewed the enemy as racially different from themselves and used images of the hunt to describe their actions.

“The roots of this behaviour lie not in individual psychological disorders,” says Professor Simon Harrison who carried out the study, “but in a social history of racism and in military traditions that use hunting metaphors for war. Although this misconduct is very rare, it has persisted in predictable patterns since the European Enlightenment. This was the period when the first ideologies of race began to appear, classifying some human populations as closer to animals than others.”

European and North American soldiers who have mutilated enemy corpses appear to have drawn racial distinctions of this sort between close and distant enemies. They ‘fought’ their close enemies, and bodies remained untouched after death, but they ‘hunted’ their distant enemies and such bodies became the trophies that demonstrate masculine skill.

Almost always, only enemies viewed as belonging to other ‘races’ have been treated in this way. “This is a specifically racialised form of violence,” suggest Professor Harrison, “and could be considered a type of racially-motivated hate crime specific to military personnel in wartime.”

People tend to associate head-hunting and other trophy-taking with ‘primitive’ warfare. They consider wars fought by professional militaries as rational and humane. However, such contrasts are misleading. The study shows that the symbolic associations between hunting and war that can give rise to abnormal behaviour such as trophy-taking in modern military organisations are remarkably close to those in certain indigenous societies where practices such as head-hunting were a recognised part of the culture.

In both cases, mutilation of the enemy dead occurs when enemies are represented as animals or prey. Parts of the corpse are removed like trophies at ‘the kill’. Metaphors of ‘war-as-hunting’ that lie at the root of such behaviour are still strong in some armed forces in Europe and North America — not only in military training but in the media and in soldiers’ own self-perception.

Professor Harrison gives the example of the Second World War and shows that trophy-taking was rare on the European battlefields but was relatively common in the war in the Pacific, where some Allied soldiers kept skulls of Japanese combatants as mementos or made gifts of their remains to friends back home.

The study also gives a more recent comparison: there have been incidents in Afghanistan in which NATO personnel have desecrated the dead bodies of Taliban combatants but there is no evidence of such misconduct occurring in the conflicts of the former Yugoslavia where NATO forces were much less likely to have considered their opponents racially ‘distant’.

But, it would be wrong to suggest that such behaviour amounts to a tradition. These practices are usually not explicitly taught. Indeed, they seem to be quickly forgotten after the end of wars and veterans often remain unaware of the extent to which they occurred.

Furthermore, attitudes towards the trophies themselves change as the enemy ceases to be the enemy. The study shows how human remains kept by Allied soldiers after the Pacific War became unwanted memory objects over time, which ex-servicemen or their families often donated to museums. In some cases, veterans have made great efforts to seek out the families of Japanese soldiers in order to return their remains and to disconnect themselves from a disturbing past.

Professor Harrison concludes that human trophy-taking is evidence of the power of metaphor in structuring and motivating human behaviour. “It will probably occur, in some form or other, whenever war, hunting and masculinity are conceptually linked,” he says. “Prohibition is clearly not enough to prevent it. We need to recognise the dangers of portraying war in terms of hunting imagery.”

Walter Neves: o pai de Luzia (Fapesp)

Arqueólogo e antropólogo da USP conta como formulou uma teoria sobre a chegada do homem às Américas

MARCOS PIVETTA e RICARDO ZORZETTO | Edição 195 – Maio de 2012

© LEO RAMOS

Ele é o pai de Luzia, um crânio humano de 11 mil anos, o mais antigo até agora encontrado nas Américas, que pertenceu a um extinto povo de caçadores-coletores da região de Lagoa Santa, nos arredores de Belo Horizonte. O arqueólogo e antropólogo Walter Neves, coordenador do Laboratório de Estudos Evolutivos Humanos do Instituto de Biociências da Universidade de São Paulo (USP), não foi o responsável por ter resgatado esse antigo esqueleto de um sítio pré-histórico, mas foi graças a seus estudos que Luzia, assim batizada por ele, tornou-se o símbolo de sua polêmica teo-ria de povoamento das Américas: o modelo dos dois componentes biológicos.Formulada há mais de duas décadas, a teoria advoga que nosso continente foi colonizado por duas levas de Homo sapiensvindas da Ásia. A primeira onda migratória teria ocorrido há uns 14 mil anos e fora composta por indivíduos parecidos com Luzia, com morfologia não mongoloide, semelhante à dos atuais australianos e africanos, mas que não deixaram descendentes. A segunda leva teria entrado aqui há uns 12 mil anos e seus membros apresentavam o tipo físico característico dos asiáticos, dos quais os índios modernos derivam.

Nesta entrevista, Neves, um cientista tão aguerrido como popular, que gosta de uma boa briga acadêmica, fala de Luzia e de sua carreira.

Como surgiu seu interesse por ciência?
Venho de uma família pobre, de Três Pontas, Minas Gerais. Por alguma razão, aos 8 anos, eu já sabia que queria ser cientista. As 12 anos, que queria trabalhar com evolução humana. Não tenho explicação para isso.

Quando você veio para São Paulo?
Foi em 1970, depois da Copa. Migramos para São Bernardo, onde morei grande parte da minha vida.

Como era sua vida?
Todo mundo em casa tinha que trabalhar. A família era pequena. Era meu pai, minha mãe, eu e meu irmão, três anos mais velho. Quando chegamos a São Paulo, meu pai era pedreiro e minha mãe vendia Yakult na rua. Eu tinha de 12 para 13 anos. Um ano depois de chegar aqui, comecei a trabalhar. Vendia massas uma vez por semana numa barraca de feirantes do meu bairro. Meu primeiro emprego fixo foi de ajudante-geral na Malas Primicia, para fazer fechadura de mala. E eu odiava. Era chato, não exigia qualificação. Durou pouco. Um mês depois fui contratado na fábrica de turbinas de avião da Rolls-Royce, em São Bernardo. Eu me beneficiei muito desse ambiente, que era refinado, cheio de regras e de valorização da hierarquia. Acho que desenvolvi minha excelente capacidade administrativa nos anos que passei na Rolls-Royce. Tive uma formação burocrática de primeira. Todos os dias, quando a gente chegava à fábrica, tinha um quadro da rainha da Inglaterra e a gente tinha que fazer mesura. Eu achava o máximo. Para quem vivia no mato, era um upgrade de glamour na vida. Tinha de 13 para 14 anos.

O que fazia?
Comecei como office-boy e quando saí era assistente da diretoria técnica. A Rolls-Royce no Brasil recebia as turbinas para fazer reparos e revisão geral. Meu chefe era diretor dessa parte e eu o ajudava em tudo. Trabalhava oito horas por dia e estudava à noite. Estudei em escola pública e entrei na USP, em biologia, em 1976. Tínhamos um ensino médio público de excelente nível.

Por que escolheu biologia?
Sempre achei que o caminho para estudar evolução humana era estudar história. Numa visita à USP no colegial, conheci o Instituto de Pré-história, que não existe mais. O instituto fora fundado por Paulo Duarte e funcionava no prédio da Zoo-logia, onde hoje fica a Ecologia. Nessa visita, fui ao prédio da História atrás de informação sobre o curso e me disseram que, se eu fizesse história, não aprenderia nada sobre evolução humana. Descendo a rua do Matão, vi numa plaquinha escrito Instituto de Pré-história, onde conheci a arqueó-loga Dorath Uchôa. Lá vi as réplicas de hominídeos fósseis e esqueletos pré-históricos escavados nos sambaquis da costa brasileira. Então disse para Dorath: “Quero fazer arqueologia e estudar esqueleto”. E ela disse: “Não faça história. Ou você faz biologia ou medicina”. Medicina não dava porque era em tempo integral. Optei por biologia. Foi um bom negócio. Em 1978 fui contratado, ainda na graduação, pelo Instituto de Pré-história como técnico.

Você estava em que ano da faculdade?
Do segundo para o terceiro, acho. Quando concluí a licenciatura em 1980, fui contratado como pesquisador e professor. Não tinha concurso. Era indicação.

Era um instituto independente?
Sim. Depois foi anexado ao Museu de Arqueologia e Etnologia, o MAE. Na época se fazia arqueologia em três lugares na USP: no Instituto de Pré-história, o mais antigo, no MAE e no setor de arqueologia do Museu Paulista, no Ipiranga. No final dos anos 1980, os três foram unidos em um só. Trabalhei no Instituto de Pré-história como pesquisador de 1980 a 1985. Em 1982 fui fazer doutorado sanduíche na Universidade Stanford. Eu era autodidata, porque não havia no Brasil especialista nessa área. No Instituto de Pré-história, o material estava lá, a biblioteca estava lá, mas não havia quem me orientasse.

Eles não trabalhavam com evolução humana?
O instituto era muito pequeno, tinha dois pesquisadores, que se achavam donos daquilo. Quando fui contratado, outra arqueóloga, a Solange Caldarelli, também foi contratada. Formamos um par muito produtivo. Trabalhamos no interior de São Paulo com grupos de caçadores-coletores, na faixa cronológica dos 3 mil aos 5 mil anos. Foi com ela que me tornei um arqueólogo. Minha transformação de biólogo para antropólogo físico foi autodidata. O crescimento do nosso grupo de pesquisa começou a expor a mediocridade do trabalho feito no Instituto de Pré-história e no Brasil. Isso levou a uma guerra entre nós e o establishment. Em 1985 fomos expulsos da universidade.

Como assim?
Expulsos. Demitidos sumariamente.

O que alegavam?
Nada. Não tínhamos estabilidade. A maior parte dos docentes era contratada a título precário e fomos chutados do Instituto de Pré-história pelo pessoal mais velho.

Qual a diferença do antropólogo físico e do arqueólogo? Você se considera o que hoje?
Me considero antropólogo e arqueólogo. Na verdade me considero uma categoria que tem nos Estados Unidos e se chama evolutionary anthopologyst, antropólogo evolutivo. Mesmo entre os antropólogos evolutivos são raros os que têm uma trajetória em antropologia física, arqueologia e antropologia sociocultural. Nesse sentido tenho uma carreira única, que os meus colegas no exterior não entendiam. Eu fazia antropologia física e antropologia biológica e tinha projetos de arqueologia. Quando fui para a Amazônia, trabalhei com antropologia ecológica. Sou uma das únicas pessoas no mundo que passou por todas as antropologias possíveis. Se por um lado não sou bom em nenhuma delas, por outro eu tenho uma compreensão do humano muito mais multifacetada do que meus colegas.

O arqueólogo faz o trabalho de campo e o antropólogo físico espera o material?
O antropólogo físico pode ir a campo, mas não vai. Espera os arqueólogos entregarem o material para ele estudar. Me rebelei contra isso no Brasil. Falei: quero ser arqueólogo também. Nos Estados Unidos, no final dos anos 1980, se definiu uma área chamada bioarqueologia, composta por antropólogos físicos que não aguentavam mais ficar na dependência dos arqueólogos. Aqui de maneira independente me rebelei contra essa situação. E a demissão do instituto em 1985 foi traumática porque tínhamos sete anos de pesquisa de campo e perdemos tudo. De uma hora para outra minha carreira foi zerada. A sorte é que àquela altura eu tinha defendido meu doutorado.

Aqui?
Aqui na Biologia, mas sobre paleogenética. Fui para Stanford por meio de uma bolsa sanduíche de seis meses do CNPq. Para me manter em Stanford e em Berkeley, eu contava com meu salário daqui, na época dava US$ 250, e o [Luigi Luca] Cavalli-Sforza, com quem trabalhei, me pagava no laboratório mais US$ 250.

Ele é um grande pesquisador, mas da genética de populações.
Me perguntam por que não fui trabalhar com um antropólogo físico, se eu era autodidata na parte osteológica. Não fui porque o que o Cavalli-Sforza faz é fascinante. Ele une várias áreas do conhecimento. Na época eu estava matriculado no mestrado na Biologia, quem me orientava aqui era o [Oswaldo] Frota-Pessoa.

Que também é da genética.
Da genética, mas com uma visão muito abrangente do ser humano. Se o Frota não existisse, eu não teria conseguido fazer o mestrado. Ele percebeu minha situação e foi muito generoso. Quando eu estava terminando o trabalho em Stanford, o Cavalli-Sforza descobriu que eu estava fazendo mestrado, e não doutorado. Ele olhava para mim e dizia: “Como você pode estar fazendo mestrado se já tem diversas publicações, coordena dois projetos de arqueologia e tem sete estudantes? Não tem sentido. Vou mandar uma correspondência para o Frota-Pessoa sugerindo que você faça direto o doutorado”. Hoje isso é comum. Foi o que me salvou. Defendi o doutorado em dezembro de 1984 e, meses depois, fui demitido. A Solange Caldarelli saiu tão enojada com a academia que nunca mais quis saber de carreira universitária. Eu queria voltar para a academia. Aí surgiram três possibilidades. Uma era fazer um pós-doc em Harvard; outra um pós-doc na Universidade Estadual da Pensilvânia e uma terceira coisa, inesperada. Quando eu fui demitido disse para o Frota que ia para o exterior. Sabia que a minha condição ia ser sempre conflituosa com a arqueologia brasileira. Nessa época existia o programa integrado de genética, do CNPq, importante para o desenvolvimento da genética no Brasil, e o Frota coordenava alguns cursos itinerantes. Aí o Frota disse: “Agora que a gente ia ter um especialista em evolução humana você vai embora. Eu entendo, mas eu vou te convidar para, antes de ir para o exterior, você dar um curso itinerante pelo Brasil sobre evolução humana”. Dei o curso na Universidade Federal da Bahia, na Federal do Rio Grande do Norte, no Museu Goeldi e na Universidade de Brasília. Fiquei muito bem impressionado com o Goeldi. No último dia de curso no Goeldi, o diretor quis me conhecer. Falei da minha trajetória e que estava indo para os Estados Unidos. Ele me perguntou: “Não tem nada que possa demover você dessa ideia?” Eu disse: “Olha, Guilherme”, o nome dele é Guilherme de La Penha, “a única coisa que me faria ficar no Brasil seria ter a oportunidade de criar meu próprio centro de estudos, que pudesse ser interdisciplinar e não estivesse ligado nem à antropologia, nem à arqueologia”. E ele me convidou para criar lá o que na época se chamou de núcleo de biologia e ecologia humana. Aconteceu também uma coisa no nível pessoal que me levou a optar por Belém.

Isso em 1985?
Ainda em 1985. Um pouco antes de eu dar esse curso pelo Brasil, eu me apaixonei profundamente pela primeira vez. Me apaixonei pelo Wagner, a melhor coisa que aconteceu na minha vida. Se fosse para os Estados Unidos, dificilmente conseguiria levá-lo. Em Belém, seria mais fácil arrumar um emprego para ele e continuar o relacionamento. Por isso aceitei a ida para o Goeldi. Só que tive de me afastar dos esqueletos. Na Amazônia a última coisa do mundo que se pode fazer é trabalhar com esqueletos, porque eles não se preservam.

O que você fazia?
Comecei a me dedicar à antropologia ecológica.

E o que é antropologia ecológica?
Ela estuda as adaptações de sociedades tradicionais ao ambiente. Até então, era uma linha que os americanos trabalhavam muito na Amazônia. Como a nossa antropologia aqui é eminentemente estruturalista, e tem urticária de alguma coisa que seja biológica, essa linha nunca progrediu no Brasil. Aí pensei: “Bárbaro, vou comprar outra briga. Vou formar uma primeira geração em antropologia ecológica”. Grande parte das pesquisas sobre antropologia ecológica na Amazônia era feita com indígenas. Então decidi estudar as populações caboclas tradicionais.

Vocês publicaram um livro, não?
Publicamos a primeira grande síntese sobre a adaptação cabocla na Amazônia, que saiu aqui e no exterior. Coloquei alunos que trabalharam comigo na Amazônia para fazer doutorado no exterior.

Quais conclusões você destaca dessa síntese?
Estudando essas populações amazônicas tradicionais, ficou claro que todo mundo que chega lá, as ONGs principalmente, acha que eles têm problema de nutrição. De fato, eles têm um déficit de crescimento em relação aos padrões internacionais. Mas nosso trabalho mostrou que na verdade eles não têm deficiência de ingestão de carboidratos e de proteínas. O problema é parasitose.

Como você retornou para a USP?
Em 1988, pouco depois de mudar para a Amazônia, o Wagner foi diagnosticado  com Aids, e fizemos um trato. Quando ele chegasse na fase terminal, voltaríamos para São Paulo. Vim fazer um pós-doc na antropologia. Quando o Wagner morreu, em 1992, eu não queria mais voltar para a Amazônia e prestei dois concursos.

Você fazia pós-doc em antropologia na USP?
Sim, na Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas. Aí prestei dois concursos. Um na Federal de Santa Catarina, na área de antropologia ecológica, mas eu queria ficar em São Paulo. Como eu já tinha feito em 1989 a primeira descoberta do que se tornou o meu modelo de ocupação das Américas, pensei: “Tenho que ir para um lugar em que possa me dedicar a isso e voltar a me concentrar em esqueletos humanos”. Aí surgiu uma vaga aqui no departamento, na área de evolução. Passei em ambos os lugares, mas optei por aqui. Sabia que poderia criar um centro de estudos evolutivos humanos que tivesse arqueologia, antropologia física, antropologia ecológica.

Como teve a ideia de criar  um modelo alternativo de colonização das Américas?
Um dia, o Guilherme de La Penha, diretor do Goeldi, me chamou e disse: “Olha, Walter, daqui a uma semana tenho de ir a um congresso em Estocolmo sobre arqueologia de salvamento. Preciso que você me substitua”. Eu disse: “Mas assim, em cima da bucha?” Então lembrei que Copenhague fica na rota de Estocolmo. Negociei com ele a permissão para passar uns cinco dias em Copenhague e conhecer a coleção Lund. Fiz a viagem e não só conheci como medi os crânios de Lagoa Santa da coleção Lund. Quando voltei, falei com um pesquisador da Argentina que passava um tempo no Goeldi, o Hector Pucciarelli, meu maior parceiro de pesquisa e o mais importante bioantropólogo da América do Sul. Propus que fizéssemos um trabalhinho com esse material. Na época estavam surgindo os trabalhos de Niède Guidon com conclusões que me pareciam loucura, como dizer que o homem estava nas Américas havia 30 mil anos. Minha ideia no trabalho sobre os crânios de Lund era mostrar que os primeiros americanos não eram diferentes dos índios atuais. Bom, imagina nossa cara quando vimos que os crânios de Lagoa Santa eram mais parecidos com os australianos e os africanos do que com os asiáticos. Entramos em pânico. Vimos que precisávamos de um modelo para explicar isso.

O que vocês fizeram então?
Alguns autores clássicos, dos anos 1940 e 1950, como o antropólogo francês Paul Rivet, já haviam reconhecido uma similaridade entre o material de Lagoa Santa e o da Austrália. Só que o Rivet propôs uma migração direta da Austrália para a América do Sul para explicar a semelhança. Mais tarde, com o avanço dos estudos de genética indígena, principalmente com o trabalho do (Francisco) Salzano, ficou claro que todos os marcadores genéticos daqui apontavam para a Ásia. Não havia similaridade com os australianos. Pensamos então em criar um modelo que explorasse essa dualidade morfológica. Não queríamos cair em desgraça como o Rivet e começamos a estudar a ocupação da Ásia. Descobrimos que lá, no final do Pleistoceno, também havia uma dualidade morfológica. Havia os pré-mongoloides e os mongoloides. Nossas populações de Lagoa Santa eram parecidas com os pré-mongoloides. Os índios atuais são parecidos com os mongoloides. Foi daí que surgiu a ideia de que a América foi ocupada por duas levas distintas: uma com morfologia generalizada, parecida com os africanos e os australianos; e outra parecida com os asiáticos. Nosso primeiro trabalho foi publicado na revista Ciência e Cultura, em 1989. A partir de 1991 começamos a publicar no exterior.

Você então formulou esse modelo antes de examinar o crânio da Luzia.
Dez anos antes. No Brasil vários museus tinham acervos da região de Lagoa Santa. Mas, como eu era o enfant gâté da arqueologia brasileira, não me davam acesso às coleções. Por isso fui estudar a coleção Lund. Só passei a ter acesso às coleções no Brasil a partir de 1995, quando algumas das pessoas que colocavam barreiras morreram. Um dos crânios que eu tinha mais curiosidade de estudar era o da Luzia.

Já tinha esse nome?
Não. Eu é que dei. A gente conhecia como esqueleto da Lapa Vermelha IV, nome do sítio em que foi encontrado. O sítio foi escavado pela missão franco-brasileira, coordenada pela madame Annette Emperaire. O esqueleto da Luzia foi achado nas etapas de 1974 e 1975. Mas a madame Emperaire morreu inesperadamente. Com exceção de um artigo que ela publicou, não tinha mais nada escrito sobre a Lapa Vermelha.

No artigo ela falava que o crânio era antigo?
Madame Emperaire achava que havia dois esqueletos na Lapa Vermelha: um mais recente e outro mais antigo, datado de mais de 12 mil anos, antes da cultura Clovis, ao qual pertenceria o crânio da Luzia. Só que o André Prous (arqueólogo francês que participou da missão e hoje é professor da UFMG) revisou as anotações dela e percebeu que o crânio era do esqueleto mais recente, que estava cerca de um metro acima. Luzia não foi sepultada, foi depositada no chão do abrigo, numa fenda. Prous demonstrou que o crânio tinha rolado e caído num buraco de uma raiz de gameleira que tinha apodrecido. Portanto, o crânio pertencia a esses restos que estavam na faixa dos 11 mil anos de idade. Madame Emperaire morreu acreditando que tinha encontrado uma evidência pré-Clovis na América do Sul, o crânio que apelidei de Luzia.

Onde estava o crânio da Luzia quando você o examinou?
Sempre esteve no Museu Nacional do Rio de Janeiro, mas as informações não. O museu era a instituição parceira da missão francesa.

O povo de Luzia era restrito a Lagoa Santa?
Lagoa Santa é uma situação excepcional. No artigo síntese do meu trabalho, que publiquei em 2005 na revista PNAS, usamos 81 crânios da região. Para se ter uma ideia de como são raros os esqueletos com mais de 7 mil anos no nosso continente, os Estados Unidos e o Canadá, juntos, têm cinco. Temos o que chamamos de fossil powerno que se refere à questão da origem do homem americano. Estudei também algum material de outras partes do Brasil, do Chile, do México e da Flórida e demonstrei que a morfologia pré-mongoloide não era uma peculiaridade de Lagoa Santa. Acredito que os não mongoloides devem ter entrado lá em cima por volta de uns 14 mil anos e os mongoloides por volta de 10 ou 12 mil anos. Na verdade, a morfologia mongoloide na Ásia é muito recente. Imagino que, entre uma e outra, não deve ter mais do que 2 ou 3 mil anos de diferença. Mas é puro chute.

Dois ou 3 mil anos são o suficiente para mudar o fenótipo?
Foram o suficiente para mudar na Ásia. Hoje está mais ou menos claro que a morfologia mongoloide é resultado da exposição das populações que saíram da África, com uma morfologia tipicamente africana, e se submeteram ao frio extremo da Sibéria. Meu modelo não é totalmente aceito por alguns colegas, inclusive argentinos. Eles acham que o processo de mongolização ocorreu na Ásia e na América de forma paralela e independente. Não vamos resolver o assunto por falta de amostras. Mas, em evolução, a gente sempre opta pela lei da parcimônia. Você escolhe o modelo que envolve o menor número de passos evolutivos para explicar o que encontrou. Pela regra da parcimônia, meu modelo é melhor do que outros, que dependem de ter havido dois eventos evolutivos paralelos e independentes. Mas há oposição ao meu modelo.

De quem?
Dos geneticistas. Mas acho que não dá para enterrar o meu modelo com esse tipo de dado. Não há razão para o DNA mitocondrial, por exemplo, se comportar evolutivamente do mesmo jeito que a morfologia craniana. Onde geneticistas veem certa homogeneidade do ponto de vista do DNA, posso encontrar fenótipos diferentes.

Também tem o argumento de que teria havido uma só leva migratória para as Américas, já composta por uma população com tipos mongoloides e não mongoloides como Luzia.
Existe essa terceira possibilidade. Mas teria que ter havido uma taxa de deriva genética assombrosa para explicar a colonização dessa forma. Por que teria desaparecido um fenótipo e ficado apenas o outro? Das opções ao meu modelo, acho essa a mais fraca.

Mas como você explica o desaparecimento da morfologia de Luzia?
Na verdade, descobrimos nos últimos anos que ela não desapareceu. Quando propusemos o modelo, achávamos que uma população tinha substituído a outra. Mas em 2003 ou 2004 um colega argentino mostrou que uma tribo mexicana que viveu isolada do resto dos índios, num território hoje pertencente à Califórnia, manteve a morfologia não mongoloide até o século XVI, quando os europeus chegaram pelo mar. Estamos descobrindo também que os índios botocudos, do Brasil Central, mantiveram essa morfologia até o século XIX. Quando se estuda a etnografia dos botocudos, vê-se que eles se mantiveram como caçadores-coletores até o fim do século XIX. Estavam cercados por outros grupos indígenas, com os quais tinham relação belicosa. O cenário foi esse. Sobrou um pouquinho da morfologia não mongoloide até recentemente.

O que você acha do trabalho da arqueóloga Niède Guidon no Parque Nacional Serra da Capivara? Para ela, o homem chegou ao Piauí há 50 mil, talvez 100 mil anos.
Mas cadê as publicações? Ela publicou uma nota na Nature nos anos 1990 e estamos esperando as publicações. Eu e a Niède fomos inimigos mortais por 20 anos. Uns anos atrás, a gente fumou o cachimbo da paz. Já estive no Piauí algumas vezes e até publicamos trabalhos sobre esqueletos de lá. No parque havia as duas morfologias de crânio. É muito interessante. Tive uma boa formação em análise de indústria da pedra lascada. A Niède abriu toda a coleção lítica para mim e o Astolfo Araujo (hoje no MAE). Saí 99,9% convencido do fato de que houve ali uma ocupação humana com mais de 30 mil anos. Mas tenho esse 0,1% de dúvida, que é muito significativo.

O que seria preciso para acabar com a dúvida?
A Niède deveria convidar os melhores especialistas internacionais em tecnologia lítica para ver o material e publicar os resultados das análises. Se ela estiver certa, teremos de jogar tudo que sabemos fora. Meu trabalho não terá servido para nada. Mas, graças a Deus, não só o meu, o de todo mundo.

Jews Are a ‘Race,’ Genes Reveal (The Jewish Daily Forward)

MONTAGE KURT HOFFMAN

By Jon Entine

Published May 04, 2012, issue of May 11, 2012.

In his new book, “Legacy: A Genetic History of the Jewish People,” Harry Ostrer, a medical geneticist and professor at Albert Einstein College of Medicine in New York, claims that Jews are different, and the differences are not just skin deep. Jews exhibit, he writes, a distinctive genetic signature. Considering that the Nazis tried to exterminate Jews based on their supposed racial distinctiveness, such a conclusion might be a cause for concern. But Ostrer sees it as central to Jewish identity.

“Who is a Jew?” has been a poignant question for Jews throughout our history. It evokes a complex tapestry of Jewish identity made up of different strains of religious beliefs, cultural practices and blood ties to ancient Palestine and modern Israel. But the question, with its echoes of genetic determinism, also has a dark side.

Geneticists have long been aware that certain diseases, from breast cancer to Tay-Sachs, disproportionately affect Jews. Ostrer, who is also director of genetic and genomic testing at Montefiore Medical Center, goes further, maintaining that Jews are a homogeneous group with all the scientific trappings of what we used to call a “race.”

For most of the 3,000-year history of the Jewish people, the notion of what came to be known as “Jewish exceptionalism” was hardly controversial. Because of our history of inmarriage and cultural isolation, imposed or self-selected, Jews were considered by gentiles (and usually referred to themselves) as a “race.” Scholars from Josephus to Disraeli proudly proclaimed their membership in “the tribe.”


Legacy: A Genetic History of the Jewish People
By Harry Ostrer
Oxford University Press, 288 Pages, $24.95

Ostrer explains how this concept took on special meaning in the 20th century, as genetics emerged as a viable scientific enterprise. Jewish distinctiveness might actually be measurable empirically. In “Legacy,” he first introduces us to Maurice Fishberg, an upwardly mobile Russian-Jewish immigrant to New York at the fin de siècle. Fishberg fervently embraced the anthropological fashion of the era, measuring skull sizes to explain why Jews seemed to be afflicted with more diseases than other groups — what he called the “peculiarities of the comparative pathology of the Jews.” It turns out that Fishberg and his contemporary phrenologists were wrong: Skull shape provides limited information about human differences. But his studies ushered in a century of research linking Jews to genetics.

Ostrer divides his book into six chapters representing the various aspects of Jewishness: Looking Jewish, Founders, Genealogies, Tribes, Traits and Identity. Each chapter features a prominent scientist or historical figure who dramatically advanced our understanding of Jewishness. The snippets of biography lighten a dense forest of sometimes-obscure science. The narrative, which consists of a lot of potboiler history, is a slog at times. But for the specialist and anyone touched by the enduring debate over Jewish identity, this book is indispensable.

“Legacy” may cause its readers discomfort. To some Jews, the notion of a genetically related people is an embarrassing remnant of early Zionism that came into vogue at the height of the Western obsession with race, in the late 19th century. Celebrating blood ancestry is divisive, they claim: The authors of “The Bell Curve” were vilified 15 years ago for suggesting that genes play a major role in IQ differences among racial groups.

Furthermore, sociologists and cultural anthropologists, a disproportionate number of whom are Jewish, ridicule the term “race,” claiming there are no meaningful differences between ethnic groups. For Jews, the word still carries the especially odious historical association with Nazism and the Nuremberg Laws. They argue that Judaism has morphed from a tribal cult into a worldwide religion enhanced by thousands of years of cultural traditions.

Is Judaism a people or a religion? Or both? The belief that Jews may be psychologically or physically distinct remains a controversial fixture in the gentile and Jewish consciousness, and Ostrer places himself directly in the line of fire. Yes, he writes, the term “race” carries nefarious associations of inferiority and ranking of people. Anything that marks Jews as essentially different runs the risk of stirring either anti- or philo-Semitism. But that doesn’t mean we can ignore the factual reality of what he calls the “biological basis of Jewishness” and “Jewish genetics.” Acknowledging the distinctiveness of Jews is “fraught with peril,” but we must grapple with the hard evidence of “human differences” if we seek to understand the new age of genetics.

Although he readily acknowledges the formative role of culture and environment, Ostrer believes that Jewish identity has multiple threads, including DNA. He offers a cogent, scientifically based review of the evidence, which serves as a model of scientific restraint.

“On the one hand, the study of Jewish genetics might be viewed as an elitist effort, promoting a certain genetic view of Jewish superiority,” he writes. “On the other, it might provide fodder for anti-Semitism by providing evidence of a genetic basis for undesirable traits that are present among some Jews. These issues will newly challenge the liberal view that humans are created equal but with genetic liabilities.”

Jews, he notes, are one of the most distinctive population groups in the world because of our history of endogamy. Jews — Ashkenazim in particular — are relatively homogeneous despite the fact that they are spread throughout Europe and have since immigrated to the Americas and back to Israel. The Inquisition shattered Sephardi Jewry, leading to far more incidences of intermarriage and to a less distinctive DNA.

In traversing this minefield of the genetics of human differences, Ostrer bolsters his analysis with volumes of genetic data, which are both the book’s greatest strength and its weakness. Two complementary books on this subject — my own “Abraham’s Children: Race, Identity, and the DNA of the Chosen People” and “Jacob’s Legacy: A Genetic View of Jewish History” by Duke University geneticist David Goldstein, who is well quoted in both “Abraham’s Children” and “Legacy” — are more narrative driven, weaving history and genetics, and are consequently much more congenial reads.

The concept of the “Jewish people” remains controversial. The Law of Return, which establishes the right of Jews to come to Israel, is a central tenet of Zionism and a founding legal principle of the State of Israel. The DNA that tightly links Ashkenazi, Sephardi and Mizrahi, three prominent culturally and geographically distinct Jewish groups, could be used to support Zionist territorial claims — except, as Ostrer points out, some of the same markers can be found in Palestinians, our distant genetic cousins, as well. Palestinians, understandably, want their own right of return.

That disagreement over the meaning of DNA also pits Jewish traditionalists against a particular strain of secular Jewish liberals that has joined with Arabs and many non-Jews to argue for an end to Israel as a Jewish nation. Their hero is Shlomo Sand, an Austrian-born Israeli historian who reignited this complex controversy with the 2008 publication of “The Invention of the Jewish People.”

Sand contends that Zionists who claim an ancestral link to ancient Palestine are manipulating history. But he has taken his thesis from novelist Arthur Koestler’s 1976 book, “The Thirteenth Tribe,” which was part of an attempt by post-World War II Jewish liberals to reconfigure Jews not as a biological group, but as a religious ideology and ethnic identity.

The majority of the Ashkenazi Jewish population, as Koestler, and now Sand, writes, are not the children of Abraham but descendants of pagan Eastern Europeans and Eurasians, concentrated mostly in the ancient Kingdom of Khazaria in what is now Ukraine and Western Russia. The Khazarian nobility converted during the early Middle Ages, when European Jewry was forming.

Although scholars challenged Koestler’s and now Sand’s selective manipulation of the facts — the conversion was almost certainly limited to the tiny ruling class and not to the vast pagan population — the historical record has been just fragmentary enough to titillate determined critics of Israel, who turned both Koestler’s and Sand’s books into roaring best-sellers.

Fortunately, re-creating history now depends not only on pottery shards, flaking manuscripts and faded coins, but on something far less ambiguous: DNA. Ostrer’s book is an impressive counterpoint to the dubious historical methodology of Sand and his admirers. And, as a co-founder of the Jewish HapMap — the study of haplotypes, or blocks of genetic markers, that are common to Jews around the world — he is well positioned to write the definitive response.

In accord with most geneticists, Ostrer firmly rejects the fashionable postmodernist dismissal of the concept of race as genetically naive, opting for a more nuanced perspective.

When the human genome was first mapped a decade ago, Francis Collins, then head of the National Genome Human Research Institute, said: “Americans, regardless of ethnic group, are 99.9% genetically identical.” Added J. Craig Venter, who at the time was chief scientist at the private firm that helped sequenced the genome, Celera Genomics, “Race has no genetic or scientific basis.” Those declarations appeared to suggest that “race,” or the notion of distinct but overlapping genetic groups, is “meaningless.”

But Collins and Venter have issued clarifications of their much-misrepresented comments. Almost every minority group has faced, at one time or another, being branded as racially inferior based on a superficial understanding of how genes peculiar to its population work. The inclination by politicians, educators and even some scientists to underplay our separateness is certainly understandable. But it’s also misleading. DNA ensures that we differ not only as individuals, but also as groups.

However slight the differences (and geneticists now believe that they are significantly greater than 0.1%), they are defining. That 0.1% contains some 3 million nucleotide pairs in the human genome, and these determine such things as skin or hair color and susceptibility to certain diseases. They contain the map of our family trees back to the first modern humans.

Both the human genome project and disease research rest on the premise of finding distinguishable differences between individuals and often among populations. Scientists have ditched the term “race,” with all its normative baggage, and adopted more neutral terms, such as “population” and “clime,” which have much of the same meaning. Boiled down to its essence, race equates to “region of ancestral origin.”

Ostrer has devoted his career to investigating these extended family trees, which help explain the genetic basis of common and rare disorders. Today, Jews remain identifiable in large measure by the 40 or so diseases we disproportionately carry, the inescapable consequence of inbreeding. He traces the fascinating history of numerous “Jewish diseases,” such as Tay-Sachs, Gaucher, Niemann-Pick, Mucolipidosis IV, as well as breast and ovarian cancer. Indeed, 10 years ago I was diagnosed as carrying one of the three genetic mutations for breast and ovarian cancer that mark my family and me as indelibly Jewish, prompting me to write “Abraham’s Children.”

Like East Asians, the Amish, Icelanders, Aboriginals, the Basque people, African tribes and other groups, Jews have remained isolated for centuries because of geography, religion or cultural practices. It’s stamped on our DNA. As Ostrer explains in fascinating detail, threads of Jewish ancestry link the sizable Jewish communities of North America and Europe to Yemenite and other Middle Eastern Jews who have relocated to Israel, as well as to the black Lemba of southern Africa and to India’s Cochin Jews. But, in a twist, the links include neither the Bene Israel of India nor Ethiopian Jews. Genetic tests show that both groups are converts, contradicting their founding myths.

Why, then, are Jews so different looking, usually sharing the characteristics of the surrounding populations? Think of red-haired Jews, Jews with blue eyes or the black Jews of Africa. Like any cluster — a genetic term Ostrer uses in place of the more inflammatory “race” — Jews throughout history moved around and fooled around, although mixing occurred comparatively infrequently until recent decades. Although there are identifiable gene variations that are common among Jews, we are not a “pure” race. The time machine of our genes may show that most Jews have a shared ancestry that traces back to ancient Palestine but, like all of humanity, Jews are mutts.

About 80% of Jewish males and 50% of Jewish females trace their ancestry back to the Middle East. The rest entered the “Jewish gene pool” through conversion or intermarriage. Those who did intermarry often left the faith in a generation or two, in effect pruning the Jewish genetic tree. But many converts became interwoven into the Jewish genealogical line. Reflect on the iconic convert, the biblical Ruth, who married Boaz and became the great-grandmother of King David. She began as an outsider, but you don’t get much more Jewish than the bloodline of King David!

To his credit, Ostrer also addresses the third rail of discussions about Jewishness and race: the issue of intelligence. Jews were latecomers to the age of freethinking. While the Enlightenment swept through Christian Europe in the 17th century, the Haskalah did not gather strength until the early 19th century. By the beginning of the new millennium, however, Jews were thought of as among the smartest people on earth. The trend is most prominent in America, which has the largest concentration of Jews outside Israel and a history of tolerance.

Although Jews make up less than 3% of the population, they have won more than 25% of the Nobel Prizes awarded to American scientists since 1950. Jews also account for 20% of this country’s chief executives and make up 22% of Ivy League students. Psychologists and educational researchers have pegged their average IQ at 107.5 to 115, with their verbal IQ at more than 120, a stunning standard deviation above the average of 100 found in those of European ancestry. Like it or not, the IQ debate will become an increasingly important issue going forward, as medical geneticists focus on unlocking the mysteries of the brain.

Many liberal Jews maintain, at least in public, that the plethora of Jewish lawyers, doctors and comedians is the product of our cultural heritage, but the science tells a more complex story. Jewish success is a product of Jewish genes as much as of Jewish moms.

Is it “good for the Jews” to be exploring such controversial subjects? We can’t avoid engaging the most challenging questions in the age of genetics. Because of our history of endogamy, Jews are a goldmine for geneticists studying human differences in the quest to cure disease. Because of our cultural commitment to education, Jews are among the top genetic researchers in the world.

As humankind becomes more genetically sophisticated, identity becomes both more fluid and more fixed. Jews in particular can find threads of our ancestry literally anywhere, muddying traditional categories of nationhood, ethnicity, religious belief and “race.” But such discussions, ultimately, are subsumed by the reality of the common shared ancestry of humankind. Ostrer’s “Legacy” points out that — regardless of the pros and cons of being Jewish — we are all, genetically, in it together. And, in doing so, he gets it just right.

Jon Entine is the founder and director of the Genetic Literacy Project at George Mason University, where he is senior research fellow at the Center for Health and Risk Communication. His website is www.jonentine.com.

Read more: http://www.forward.com/articles/155742/jews-are-a-race-genes-reveal/?p=all#ixzz1uJ67qPdJ

Novelas brasileiras passam imagem de país branco, critica escritora moçambicana (Agência Brasil)

17/04/2012 – 15h35

Alex Rodrigues
Repórter da Agência Brasil

 Brasília – “Temos medo do Brasil.” Foi com um desabafo inesperado que a romancista moçambicana Paulina Chiziane chamou a atenção do público do seminário A Literatura Africana Contemporânea, que integra a programação da 1ª Bienal do Livro e da Leitura, em Brasília (DF). Ela se referia aos efeitos da presença, em Moçambique, de igrejas e templos brasileiros e de produtos culturais como as telenovelas que transmitem, na opinião dela, uma falsa imagem do país.

“Para nós, moçambicanos, a imagem do Brasil é a de um país branco ou, no máximo, mestiço. O único negro brasileiro bem-sucedido que reconhecemos como tal é o Pelé. Nas telenovelas, que são as responsáveis por definir a imagem que temos do Brasil, só vemos negros como carregadores ou como empregados domésticos. No topo [da representação social] estão os brancos. Esta é a imagem que o Brasil está vendendo ao mundo”, criticou a autora, destacando que essas representações contribuem para perpetuar as desigualdades raciais e sociais existentes em seu país.

“De tanto ver nas novelas o branco mandando e o negro varrendo e carregando, o moçambicano passa a ver tal situação como aparentemente normal”, sustenta Paulina, apontando para a mesma organização social em seu país.

A presença de igrejas brasileiras em território moçambicano também tem impactos negativos na cultura do país, na avaliação da escritora. “Quando uma ou várias igrejas chegam e nos dizem que nossa maneira de crer não é correta, que a melhor crença é a que elas trazem, isso significa destruir uma identidade cultural. Não há o respeito às crenças locais. Na cultura africana, um curandeiro é não apenas o médico tradicional, mas também o detentor de parte da história e da cultura popular”, detacou Paulina, criticando os governos dos dois países que permitem a intervenção dessas instituições.

Primeira mulher a publicar um livro em Moçambique, Paulina procura fugir de estereótipos em sua obra, principalmente, os que limitam a mulher ao papel de dependente, incapaz de pensar por si só, condicionada a apenas servir.

“Gosto muito dos poetas de meu país, mas nunca encontrei na literatura que os homens escrevem o perfil de uma mulher inteira. É sempre a boca, as pernas, um único aspecto. Nunca a sabedoria infinita que provém das mulheres”, disse Paulina, lembrando que, até a colonização europeia, cabia às mulheres desempenhar a função narrativa e de transmitir o conhecimento.

“Antes do colonialismo, a arte e a literatura eram femininas. Cabia às mulheres contar as histórias e, assim, socializar as crianças. Com o sistema colonial e o emprego do sistema de educação imperial, os homens passam a aprender a escrever e a contar as histórias. Por isso mesmo, ainda hoje, em Moçambique, há poucas mulheres escritoras”, disse Paulina.

“Mesmo independentes [a partir de 1975], passamos a escrever a partir da educação europeia que havíamos recebido, levando os estereótipos e preconceitos que nos foram transmitidos. A sabedoria africana propriamente dita, a que é conhecida pelas mulheres, continua excluída. Isso para não dizer que mais da metade da população moçambicana não fala português e poucos são os autores que escrevem em outras línguas moçambicanas”, disse Paulina.

Durante a bienal, foi relançado o livro Niketche, uma história de poligamia, de autoria da escritora moçambicana.

Exterminate a species or two, save the planet (RT)

Published: 26 January, 2011, 14:43

Edited: 15 April, 2011, 05:18

 Biologists have suggested a mathematical model, which will hopefully predict which species need to be eliminated from an unstable ecosystem, and in which order, to help it recover.

The counterintuitive idea to kill living things for the sake of biodiversity conservation comes from the complex connections presented in ecosystems. Eliminate a predator, and its prey thrives and shrinks the amount of whatever it has for its own food. Such “cascading” impacts along the “food webs” can be unpredictable and sometimes catastrophic.

Sagar Sahasrabudhe and Adilson Motter of Northwestern University in the US have shown that in some food web models, the timely removal or suppression of one or several species can do quite the opposite and mitigate the damage caused by local extinction. The paper is described in Nature magazine.

The trick is not an easy one, since the timing of removal is just as important as the targeted species. A live example Sahasrabudhe and Motter use is that of island foxes on the Channel Islands off the coast of California. When feral pigs were introduced in the ecosystem, they attracted golden eagles, which preyed on foxes as well. Simply reversing the situation by removing the pigs would make the birds switch solely to foxes, which would eventually make them extinct. Instead, conservation activists captured and relocated the eagles before eradicating the pigs, saving the fox population.

Of course conservation scientists are not going to start taking decisions based on the models straight away. Real ecosystems are not limited to predator and prey relationships, and things like parasitism, pollination and nutrient dynamics have to be taken into account as well. On the other hand, ecosystems were thought to be too complex to be modeled at all some eight years ago, Martinez says. Their work gives more confidence that it will have practical uses in nearest future.

Fraud Case Seen as a Red Flag for Psychology Research (N.Y. Times)

By BENEDICT CAREY

Published: November 2, 2011

A well-known psychologist in the Netherlands whose work has been published widely in professional journals falsified data and made up entire experiments, an investigating committee has found. Experts say the case exposes deep flaws in the way science is done in a field,psychology, that has only recently earned a fragile respectability.

Joris Buijs/Pve

The psychologist Diederik Stapel in an undated photograph. “I have failed as a scientist and researcher,” he said in a statement after a committee found problems in dozens of his papers.

The psychologist, Diederik Stapel, of Tilburg University, committed academic fraud in “several dozen” published papers, many accepted in respected journals and reported in the news media, according to a report released on Monday by the three Dutch institutions where he has worked: the University of Groningen, the University of Amsterdam, and Tilburg. The journal Science, which published one of Dr. Stapel’s papers in April, posted an “editorial expression of concern” about the research online on Tuesday.

The scandal, involving about a decade of work, is the latest in a string of embarrassments in a field that critics and statisticians say badly needs to overhaul how it treats research results. In recent years, psychologists have reported a raft of findings on race biases, brain imaging and even extrasensory perception that have not stood up to scrutiny. Outright fraud may be rare, these experts say, but they contend that Dr. Stapel took advantage of a system that allows researchers to operate in near secrecy and massage data to find what they want to find, without much fear of being challenged.

“The big problem is that the culture is such that researchers spin their work in a way that tells a prettier story than what they really found,” said Jonathan Schooler, a psychologist at the University of California, Santa Barbara. “It’s almost like everyone is on steroids, and to compete you have to take steroids as well.”

In a prolific career, Dr. Stapel published papers on the effect of power on hypocrisy, on racial stereotyping and on how advertisements affect how people view themselves. Many of his findings appeared in newspapers around the world, including The New York Times, which reported in December on his study about advertising and identity.

In a statement posted Monday on Tilburg University’s Web site, Dr. Stapel apologized to his colleagues. “I have failed as a scientist and researcher,” it read, in part. “I feel ashamed for it and have great regret.”

More than a dozen doctoral theses that he oversaw are also questionable, the investigators concluded, after interviewing former students, co-authors and colleagues. Dr. Stapel has published about 150 papers, many of which, like the advertising study, seem devised to make a splash in the media. The study published in Science this year claimed that white people became more likely to “stereotype and discriminate” against black people when they were in a messy environment, versus an organized one. Another study, published in 2009, claimed that people judged job applicants as more competent if they had a male voice. The investigating committee did not post a list of papers that it had found fraudulent.

Dr. Stapel was able to operate for so long, the committee said, in large measure because he was “lord of the data,” the only person who saw the experimental evidence that had been gathered (or fabricated). This is a widespread problem in psychology, said Jelte M. Wicherts, a psychologist at the University of Amsterdam. In a recent survey, two-thirds of Dutch research psychologists said they did not make their raw data available for other researchers to see. “This is in violation of ethical rules established in the field,” Dr. Wicherts said.

In a survey of more than 2,000 American psychologists scheduled to be published this year, Leslie John of Harvard Business School and two colleagues found that 70 percent had acknowledged, anonymously, to cutting some corners in reporting data. About a third said they had reported an unexpected finding as predicted from the start, and about 1 percent admitted to falsifying data.

Also common is a self-serving statistical sloppiness. In an analysis published this year, Dr. Wicherts and Marjan Bakker, also at the University of Amsterdam, searched a random sample of 281 psychology papers for statistical errors. They found that about half of the papers in high-end journals contained some statistical error, and that about 15 percent of all papers had at least one error that changed a reported finding — almost always in opposition to the authors’ hypothesis.

The American Psychological Association, the field’s largest and most influential publisher of results, “is very concerned about scientific ethics and having only reliable and valid research findings within the literature,” said Kim I. Mills, a spokeswoman. “We will move to retract any invalid research as such articles are clearly identified.”

Researchers in psychology are certainly aware of the issue. In recent years, some have mocked studies showing correlations between activity on brain images and personality measures as “voodoo” science, and a controversy over statistics erupted in January after The Journal of Personality and Social Psychology accepted a paper purporting to show evidence of extrasensory perception. In cases like these, the authors being challenged are often reluctant to share their raw data. But an analysis of 49 studies appearing Wednesday in the journal PLoS One, by Dr. Wicherts, Dr. Bakker and Dylan Molenaar, found that the more reluctant that scientists were to share their data, the more likely that evidence contradicted their reported findings.

“We know the general tendency of humans to draw the conclusions they want to draw — there’s a different threshold,” said Joseph P. Simmons, a psychologist at the University of Pennsylvania’s Wharton School. “With findings we want to see, we ask, ‘Can I believe this?’ With those we don’t, we ask, ‘Must I believe this?’ ”

But reviewers working for psychology journals rarely take this into account in any rigorous way. Neither do they typically ask to see the original data. While many psychologists shade and spin, Dr. Stapel went ahead and drew any conclusion he wanted.

“We have the technology to share data and publish our initial hypotheses, and now’s the time,” Dr. Schooler said. “It would clean up the field’s act in a very big way.”

Questioning Privacy Protections in Research (New York Times)

Dr. John Cutler, center, during the Tuskegee syphilis experiment. Abuses in that study led to ethics rules for researchers. Coto Report

By PATRICIA COHEN
Published: October 23, 2011

Hoping to protect privacy in an age when a fingernail clipping can reveal a person’s identity, federal officials are planning to overhaul the rules that regulate research involving human subjects. But critics outside the biomedical arena warn that the proposed revisions may unintentionally create a more serious problem: sealing off vast collections of publicly available information from inspection, including census data, market research, oral histories and labor statistics.

Organizations that represent tens of thousands of scholars in the humanities and social sciences are scrambling to register their concerns before the Wednesday deadline for public comment on the proposals.

The rules were initially created in the 1970s after shocking revelations that poor African-American men infected with syphilis in Tuskegee, Ala., were left untreated by the United States Public Health Service so that doctors could study the course of the disease. Now every institution that receives money from any one of 18 federal agencies must create an ethics panel, called an institutional review board, or I.R.B.

More than 5,875 boards have to sign off on research involving human participants to ensure that subjects are fully informed, that their physical and emotional health is protected, and that their privacy is respected. Although only projects with federal financing are covered by what is known as the Common Rule, many institutions routinely subject all research with a human factor to review.

The changes in the ethical guidelines — the first comprehensive revisions in more than 30 years — were prompted by a surge of health-related research and technological advances.

Researchers in the humanities and social sciences are pleased that the reforms would address repeated complaints that medically oriented regulations have choked off research in their fields with irrelevant and cumbersome requirements. But they were dismayed to discover that the desire to protect individuals’ privacy in the genomics age resulted in rules that they say could also restrict access to basic data, like public-opinion polls.

Jerry Menikoff, director of the federal Office for Human Research Protections, which oversees the Common Rule, cautions that any alarm is premature, saying that federal officials do not intend to pose tougher restrictions on information that is already public. “If the technical rules end up doing that, we’ll try to come up with a result that’s appropriate,” he said.

Critics welcomed the assurance but remained skeptical. Zachary Schrag, a historian at George Mason University who wrote a book about the review process, said, “For decades, scholars in the social sciences and humanities have suffered because of rules that were well intended but poorly considered and drafted and whose unintended consequences restricted research.”

The American Historical Association, with 15,000 members, and the Oral History Association, with 900 members, warn that under the proposed revisions, for example, new revelations that Public Health Service doctors deliberately infected Guatemalan prisoners, soldiers and mental patients with syphilis in the 1940s might never have come to light. The abuses were uncovered by a historian who by chance came across notes in the archives of the University of Pittsburgh. That kind of undirected research could be forbidden under guidelines designed to prevent “data collected for one purpose” from being “used for a new purpose to which the subjects never consented,” said Linda Shopes, who helped draft the historians’ statement.

The suggested changes, she said, “really threaten access to information in a democratic society.”

Numerous organizations including the Consortium of Social Science Associations, which represents dozens of colleges, universities and research centers, expressed particular concern that the new standards might be modeled on federal privacy rules relating to health insurance and restrict use of the broadest of identifying information, like a person’s ZIP code, county or city.

The 11,000-member American Anthropological Association declared in a statement that any process that is based on the health insurance act’s privacy protections “would be disastrous for social and humanities research.” The 45,000-member American Association of University Professors warned that such restrictions “threaten mayhem” and “render impossible a great deal of social-science research, ranging from ethnographic community studies to demographic analysis that relies on census tracts to traffic models based on ZIP code to political polls that report by precinct.”

Dr. Menikoff said references to the statutes governing health insurance information were meant to serve as a starting point, not a blueprint. “Nothing is ruled out,” he said, though he wondered how the review system could be severed from the issue of privacy protection, as the consortium has discussed, “if the major risk for most of these studies is that you’re going to disclose information inadvertently.” If there is confidential information on a laptop, he said, requiring a password may be a reasonable requirement.

Ms. Shopes, Mr. Schrag and other critics emphasized that despite their worries they were happy with the broader effort to fix some longstanding problems with institutional review boards that held, say, an undergraduate interviewing Grandma for an oral history project to the same guidelines as a doctor doing experimental research on cancer patients.

“The system has been sliding into chaos in recent years,” said Alice Kessler-Harris, president of the 9,000-member Organization of American Historians. “No one can even agree on what is supposed to be covered in the humanities and social sciences.”

Vague rules designed to give the thousands of review boards flexibility when dealing with nonmedical subjects have instead resulted in higgledy-piggledy enforcement and layers of red tape even when no one is at risk, she said.

For example Columbia University, where Ms. Kessler-Harris teaches, exempts oral history projects from review, while boards at the University of Illinois in Urbana-Champaign and the University of California, San Diego, have raised lengthy objections to similar interview projects proposed by undergraduate and master’s students, according to professors there.

Brown University has been sued by an associate professor of education who said the institutional review board overstepped its powers by barring her from using three years’ worth of research on how the parents of Chinese-American children made use of educational testing.

Ms. Shopes said board members at one university had suggested at one point that even using recorded interviews deposited at the Ronald Reagan Presidential Foundation and Library would have needed Reagan’s specific approval when he was alive.

Many nonmedical researchers praised the idea that scholars in fields like history, literature, journalism, languages and classics who use traditional methods of research should not have to submit to board review. They would like the office of human protections to go further and lift restrictions on research that may cause participants embarrassment or emotional distress. “Our job is to hold people accountable,” Ms. Kessler-Harris said.

Dr. Menikoff said, “We want to hear all these comments.” But he maintained that when the final language is published, critics may find themselves saying, “Wow, this is reasonable stuff.”

 

This article has been revised to reflect the following correction:

Correction: October 26, 2011

An article on Monday about federal officials’ plans to overhaul privacy rules that regulate research involving human subjects, and concerns raised by scholars, paraphrased incorrectly from comments by Linda Shopes, who helped draft a statement by historians about possible changes. She said that board members at a university (which she did not name) — not board members at the University of Chicago — suggested at one point that using recorded interviews deposited at the Ronald Reagan Presidential Foundation and Library would have needed Reagan’s specific approval when he was alive.

20 mil escravos no País (Correio Braziliense)

JC e-mail 4372, de 26 de Outubro de 2011.

A Organização Internacional do Trabalho (OIT) divulgou ontem (25) um perfil do trabalho escravo rural no Brasil, indicando que 81% das pessoas que vivem em condições análogas à escravidão são negras, jovens e com baixa escolaridade.

O estudo foi feito a partir de entrevistas com pessoas libertadas, aliciadores e empregadores em fazendas do Pará, Mato Grosso, Bahia e Goiás entre 2006 e 2007.

Além da predominância da raça negra, o documento aponta que cerca de 93% dessas pessoas iniciaram a vida profissional antes dos 16 anos, o que configura trabalho infantil, e que quase 75% delas são analfabetas. O estudo identificou que a maioria dos empregadores e dos aliciadores, os chamados “gatos”, é branca.

Para o coordenador da área de combate ao trabalho escravo da OIT, Luiz Machado, o dado reflete a condição de vulnerabilidade da população mais pobre ao trabalho escravo, composta maioritariamente por negros. “Isso é um resquício da exploração colonial”, atestou. O fato de não terem frequentado escolas na infância também é destacado pelo coordenador como um indutor do problema. “O trabalho infantil tira as possibilidades futuras e facilita o caminho ao trabalho escravo. Pessoas sem escolaridade não têm oportunidades.”

O Ministério Público do Trabalho (MPT) estima que cerca de 20 mil pessoas estejam submetidas ao trabalho forçado ou degradante no Brasil hoje. Desde 1995, mais de 40 mil trabalhadores foram libertados no país, que assumiu um compromisso internacional para erradicar a prática até 2015. A coordenadora nacional de Combate ao Trabalho Escravo do MPT, Débora Tito, relata que as políticas sobre o tema têm se concentrado no que ela chama “pedagogia do bolso”.

A ideia é enfrentar o problema por meio de multas altas e da inserção de nomes de empregadores em cadastros negativos para que deixem de conseguir financiamentos de bancos. “Temos que tornar essa prática economicamente inviável, para que os fazendeiros parem de economizar à custa da dignidade do trabalhador”, disse a procuradora. Segundo ela, a pena para punir o empregador de trabalho análogo ao escravo é de dois a oito anos de prisão, mas existem poucas condenações no país.

Convenção – As centrais sindicais que representam os servidores públicos das três esferas do governo estão se debatendo para definir o projeto de lei que tratará de temas como direito de greve, negociação coletiva e liberação de dirigentes sindicais de bater o ponto para se dedicar aos assuntos das categorias, itens da Convenção 151 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que deverá ser regulamentada até o fim do ano. Em audiência pública na Câmara ontem, a queda de braço girou em torno da cobrança do imposto sindical, um desconto no contracheque de um dia de salário ao ano, a exemplo do que ocorre com os trabalhadores da iniciativa privada.

Infanticídio indígena: traços de uma cultura em transformação (I.H. Unisinos)

15/8/2011 –  Instituto Humanitas Unisinos
Infanticídio indígena: traços de uma cultura em transformação. Entrevista especial com Saulo Feitosa
“Se as pessoas querem defender a vida das crianças indígenas, devem aderir a outros projetos de lei”, como o Estatuto dos Povos Indígenas, diz Saulo Feitosa à IHU On-Line, ao criticar oProjeto de Lei 1057/2007, que criminaliza os povos que praticam infanticídio.

Em entrevista concedida por telefone, ele explica que todos os indígenas que vivem no Brasil estão submetidos à legislação brasileira e que, portanto, não há necessidade de sancionar o Projeto de Lei 1057/2007, de autoria do deputado Henrique Afonso (PT/AC). Na avaliação do secretário doCimi, o Projeto tem uma carga preconceituosa, racista e serve “para ampliar o grau de preconceito da sociedade contra os povos indígenas, e para justificar interesses colonialistas que se mantêm nos dias de hoje”.

De acordo com Feitosa, o infanticídio era praticado no período colonial e desde o início da década de 1990 não se têm informações de casos de infanticídio em tribos indígenas. “Todos os registros históricos, dos quais tenho conhecimento, acenam que, entre os indígenas, o índice de infanticídio é baixíssimo. Inclusive viajantes como Fernão Cardim, que escreveu um livro sobre os hábitos do Brasil, faziam referência à maneira carinhosa como as mulheres indígenas cuidavam de seus filhos em comparação às mulheres de Lisboa. (…) Causa-nos estranheza que, 500 anos depois, apareçam grupos fundamentalistas acusando indígenas de matanças generalizadas de suas crianças”.

Feitosa explica ainda que o infanticídio era regido por uma cosmologia indígena e que fazia parte da cultura de alguns povos. “O fato de existir uma narrativa cosmológica não significa que a cultura se mantém atualizada”, enfatiza. E dispara: “A questão do infanticídio, na prática, é residual porque os povos mudam suas culturas”.

Confira a entrevista.

IHU On-Line – Como avalia a polêmica acerca da prática do infanticídio e o projeto de lei que criminaliza indígenas e profissionais de órgãos governamentais por tais práticas? ONGs e deputados evangélicos acusam o governo de cruzar os braços diante da morte de crianças e defendem que o Estado é obrigado por lei a protegê-las.

Saulo Feitosa – Por trás desse projeto de lei e desse debate existe uma questão fundamentalista religiosa e uma questão política. Os povos indígenas estão submetidos à mesma legislação brasileira. Portanto, se vierem a cometer qualquer crime, serão julgados e punidos como todos os cidadãos deste país. Hoje, aproximadamente 750 indígenas estão cumprindo pena no sistema penitenciário nacional. Desse modo, não há razão para existir uma lei específica para falar de infanticídio indígena. No entendimento do Cimi, na medida em que se cria uma lei, os índios seriam, duas vezes, julgados e condenados por um mesmo crime.

Todos sabemos que os indígenas defendem a vida, a natureza. Portanto, existe uma campanha nacional e internacional negativa contra os povos indígenas e isso gera um descrédito da população em relação a essas comunidades. É nesse contexto ofensivo contra os direitos indígenas que surge a questão do infanticídio indígena. Os propositores do Projeto de Lei 1057/2007 afirmam que há, entre os povos indígenas do Brasil, a prática do sacrifício de crianças e que esta prática não é combatida pelo Estado e pelos órgãos que atuam junto dos povos indígenas. Sendo assim, eles querem obrigar as pessoas que trabalham com a questão indígena a denunciarem os índios caso suspeitassem da possibilidade de alguma mulher, em processo de gestação, abandonar o filho. Se os profissionais não denunciarem os indígenas, serão julgados pelo crime de omissão. Essa medida mostra novamente a carga preconceituosa e racista do projeto.

IHU On-Line – Qual é a origem e o sentido do infanticídio para as comunidades indígenas? Ele ainda é praticado no Brasil? Quais são as etnias indígenas que praticam o infanticídio?

Saulo Feitosa – Segundo os parlamentares que querem aprovar o Projeto de Lei, o infanticídio seria uma prática regular dos povos indígenas. Temos conhecimento de experiências isoladas, da mesma forma que identificamos casos de abandono infantil na sociedade brasileira. Semanalmente, assisto, no noticiário, informações de crianças abandonadas em grandes cidades: recém-nascidos jogados em lixeiras, abandonados nas ruas, etc. Essa questão do abandono e, mesmo do assassinato de crianças, é uma questão que aflige a toda a humanidade.

Todos os registros históricos dos quais tenho conhecimento acenam que, entre os indígenas, o índice de infanticídio é baixíssimo. Inclusive viajantes como Fernão Cardim, que escreveu um livro sobre os hábitos do Brasil, faziam referência à maneira carinhosa como as mulheres indígenas cuidavam de seus filhos em comparação às mulheres de Lisboa. Muitos historiadores afirmam que a prática de infanticídio era comum no período colonial, especialmente em comunidades que viviam no Rio de JaneiroSalvador e Recife. Há relatos históricos de uma quantidade enorme de recém-nascidos que eram abandonados nas calçadas, nas ruas, mortos e comidos por porcos e cachorros. Os historiadores que relatam esses fatos sempre os comparam com a questão indígena, e afirmam que, entre os índios, essa prática era muito diminuta.

Causa-nos estranheza que, 500 anos depois, apareçam grupos fundamentalistas acusando indígenas de matanças generalizadas de suas crianças. Nós, do Cimi, temos conhecimentos de casos isolados. Alguns missionários já presenciaram atos de abandono de crianças nas florestas. Entretanto, não temos relatos recentes de missionários sobre esses casos. Por isso, não podemos afirmar que há prática de infanticídio nas comunidades indígenas e, tampouco, que acontecem em grandes proporções.

Infanticídio

Vi, em matéria recente de um jornal de grande circulação, que, de um total de 250 povos, cerca de 20 praticam o infanticídio. Não sei como eles chegaram a esse número, considerando que os últimos registros do Cimi datam de 1990. Sabemos que oito povos ainda praticam o infanticídio, os quais têm pouquíssimo contato com a sociedade nacional.

Antigamente alguns povos abandonavam recém-nascidos por não ter informações sobre o que significa, por exemplo, uma criança nascer com retardamento psicomotor. Não tendo condições de sobreviver na floresta, essas crianças eram abandonadas. Há outros relatos de crianças que nascem sem um “pai social”. Para os indígenas, uma criança que nasce sem um pai para poder caçar e garantir a sua sobrevivência não tem condições de sobreviver. Nesses casos, os recém-nascidos eram abandonados por questões práticas, pois, na percepção da comunidade, não teriam condições de sobreviver na selva. Outros relatos referem-se às narrativas cosmológicas do nascimento de gêmeos. Pesquisadores registraram, através da história oral, que não se aceitava, em determinadas culturas, o nascimento de gêmeos. Então, em função da cosmologia e dos mitos de origem do povo, se acreditava que os gêmeos deveriam ser sacrificados.

Campanha contra o infanticídio

Hoje, essas campanhas contra o chamado infanticídio indígena se fundamentam nesta narrativa cosmológica, o que, para nós, é um absurdo. O fato de existir uma narrativa cosmológica não significa que a cultura se mantém atualizada. A prática dos processos de cultura é dinâmica. Então, deve haver, em povos que têm pouco contato com outras culturas, essa referência cosmológica, que justificaria o abandono de uma criança gêmea, por exemplo. Mas em muitos povos onde essa narrativa estava presente, a prática deixou de existir. É muito fácil compreender isso: muitas práticas do Antigo Testamento são condenáveis na sociedade de hoje. Apesar de elas permanecerem na Bíblia, não são praticadas pelos cristãos do século XXI. Então, não podemos olhar para o nosso universo religioso e olhar para os demais povos de outra forma. Embora subsista, nas narrativas cosmológicas, informações a respeito da gravidez de gêmeos, na prática, as ações têm se alterado. Por isso, costumamos dizer que a questão do infanticídio, na prática, é residual porque os povos mudam suas culturas. O pluralismo histórico acontece em todas as culturas, as quais adquirem, com o tempo, novas formas.

Quando o Cimi foi fundado, os povos indígenas não tinham acesso à saúde e, portanto, os missionários eram treinados para suprir essa carência. Hoje, existe a assistência à saúde, ao médico, por mais precária que seja. Isso também contribui para alterar a cultura dos povos.

No Mato Grosso tem um povo formado por aproximadamente 100 pessoas. Eles foram combatidos em 1978. Na época, sobreviveram 27 pessoas. Desde então acompanhamos essa comunidade. Daquele número de 27 pessoas, eram poucas as mulheres em idade fértil. Logo após a inserção da nossa equipe na comunidade, nasceu uma criança doente. Para os indígenas, o recém-nascido era vítima de feitiço e, portanto, deveria ser sacrificado. Os missionários que estavam no local explicaram que, na nossa sociedade, havia uma espécie de pajé que conseguia realizar um tratamento e sanar aquela deficiência. A comunidade aceitou e a criança foi levada a um hospital em Goiânia, onde foi submetida a uma cirurgia de reparação. O bebê retornou um tempo depois e foi aceito pela comunidade. Para resolver essa questão, não foi preciso uma lei, mas, sim, diálogo. É lógico que depois daquele acontecimento, a cultura da comunidade sofreu mudanças. Então, nada justifica que agora se insista na aprovação de um projeto de lei para criminalizar um povo. Projetos como esse servem para ampliar o grau de preconceito da sociedade contra os povos indígenas e para justificar interesses colonialistas que se mantêm nos dias de hoje.

Esses povos têm muitos valores e nós precisamos aprender com eles. Então, não aceitamos, em hipótese alguma, essa leviandade que está sendo veiculada na mídia, inclusive com a produção de um pseudodocumentário mentiroso que fala do enterramento de crianças junto dos povos Suruwahá. Não se trata de um documentário e, sim, de uma ficção gerada pela mente colonizadora.

O povo Suruwahá pratica o suicídio coletivo. Eles são conhecidos como o povo do veneno. A população deles é diminuta, algo em torno de 100 pessoas. Com a morte dos adultos, muitas crianças ficam órfãs. Então, o problema do Suruwahá não é o infanticídio e, sim, o suicídio. Os membros de organizações que criticam o infanticídio dizem que os índios praticam o suicídio porque são obrigados a matar seus filhos e, para não matá-los, elas se suicidam. Isso é uma mentira, uma distorção de informações. Esse povo sofreu, há séculos, um grande ataque e os sobreviventes nunca mais conseguiram formar novos pajés. Então, eles adotaram a prática do suicídio ainda jovem para se encontrarem com os pajés em outra esfera. Este ano estive na Amazônia e a equipe que trabalha lá disse que houve redução de casos de suicídios entre esses índios dessa etnia.

IHU On-Line – Então a discriminação contra os indígenas tem um viés religioso? Que religiões manifestam essa posição e por quê?

Saulo Feitosa – Quem coordena e estimula essa campanha é a ONG Atini – Voz pela vida, e outros grupos religiosos fundamentalistas. O povo brasileiro tomou conhecimento do infanticídio a partir do ano de 2006, quando foi produzido um documentário chamado Hakani. A história de uma sobrevivente, que mostra o enterro de crianças vivas. Os atores indígenas que desempenharam esses papéis receberam 30 reais. Depois da veiculação do vídeo, o Ministério Público entrou com uma ação contra os produtores do documentário, porque as crianças que apareceram no filme pertenciam ao povo Karitiana, de Rondônia. O documentário foi exibido em um programa de televisão e as pessoas da comunidade assistiram. Pela cultura daquele povo, quem simula o enterramento perde a sua alma. Portanto, as imagens criaram um problema cultural grave para as crianças. Inclusive, no depoimento para o Ministério Público, os pais das crianças indígenas disseram que receberam 30 reais para as crianças serem fotografadas. Eles não sabiam que elas participariam de um documentário.

IHU On-Line – Quais são as razões da intolerância indígena hoje?

Saulo Feitosa – Uma das razões é a distribuição da terra. A grande função do projeto de Lei é criar, dentro do Congresso Nacional, um clima anti-indígena porque existem diversos projetos de leis a favor dos povos indígenas tramitando no Congresso. Há uma campanha internacional para demonstrar que os povos indígenas são selvagens. Essa imagem certamente irá repercutir em outros projetos de leis referentes à demarcação de terras indígenas, exploração de minérios em terras indígenas, etc., reforçando a imagem negativa que se tem desses povos.

Se as pessoas querem defender a vida das crianças indígenas, devem aderir a outros projetos de lei. Existe no Congresso uma proposta, que foi amplamente discutida com todos os povos indígenas do Brasil, sobre a criação do Estatuto dos Povos Indígenas, porque a legislação que está em vigor é de 1973, ou seja, é anterior à Constituição Federal e, portanto, não está adequada para a atual situação dessas comunidades. O novo texto tem, inclusive, um artigo especial de proteção à criança e ao adolescente indígena, o qual enfatiza que, caso uma criança seja rejeitada pelos pais, poderá ser adotada por pessoas do próprio povo ou povos próximos.

IHU On-Line – Nesta semana, o povo Kaingang bloqueou sete estradas federais no Rio Grande do Sul, reivindicando melhores condições na área da saúde. Eles argumentam que, embora tenham acesso ao SUS, as condições de atendimento são precárias. Como avalia essa questão? O acesso à saúde entre as comunidades indígenas é mais precário do que para a população em geral?

Saulo Feitosa – No final dos anos 1980, o Brasil instalou um sistema correlato de atenção à saúde indígena. Portanto, os índios têm um sistema próprio de saúde que se fundamenta nos distritos especiais indígenas. Esses distritos foram projetados com a perspectiva de serem autônomos do ponto de vista da gestão, assim, eles teriam quadros de funcionários para atender as comunidades. Esse projeto de assistência à saúde foi bem desenhado, mas, na prática, ocorreram privatizações e um esvaziamento da proposta original de se criar distritos para atender as comunidades. Os serviços foram terceirizados e essa terceirização foi agravada pelo alto índice de corrupção dentro daFundação Nacional da Saúde – Funasa: auditorias demonstram os desvios de verbas da saúde pública. Além disso, cargos foram loteados para políticos e os distritos não foram administrados por pessoas competentes. Nesse sentido, a saúde indígena é tão precária quanto à dos demais brasileiros. O governo deveria abrir concurso público para atender à saúde indígena. Enquanto isso não acontecer, continuaremos assistindo essa precariedade e a morte de crianças.

IHU On-Line – Como vê a política indigenista hoje? Quais os avanços e os limites?

Saulo Feitosa – O governo e a Fundação Nacional do Índio – Funai têm um discurso progressista de reconhecimento aos direitos indígenas, de valorização da cultura, mas, uma prática colonialista. O governo Lula criou a Comissão Nacional de Política Indigenista, a qual pensávamos ser um processo importante, mas percebemos que o governo inicialmente apenas sinalizou para uma discussão. Quando os índios passaram a exercer a sua autonomia, o governo começou a tomar atitudes autoritárias ao ponto de fazer uma reestruturação da Funai sem discutir com os povos indígenas. Esse era um processo para ser feito como uma construção coletiva, e não reproduzindo modelos autoritários do período militar.

Ainda este ano, o presidente da Funai, junto com o ministro da Justiça e o delegado geral da União, publicaram uma portaria para redefinir as bases para a demarcação de terras indígenas incluindo a participação dos municípios, que historicamente sempre foram contra à demarcação de terras por causa de interesses econômicos e políticos locais. Essa situação se agravou e, na última reunião daComissão Nacional de Política Indigenista – CNPI, em junho, os representantes indígenas dessa comissão, em protesto, disseram que não votariam e se retirariam da reunião. Eles só voltariam a se reunir se a presidenta Dilma estivesse presente porque, desde que foi eleita, ela não conversou com as representações indígenas do país.

As obras do PAC afetam as terras indígenas e os povos não são consultados, embora o país seja signatário da Organização Internacional do Trabalho – OIT, e embora a Constituição obrigue o Estado a fazer consultas em relação a temas polêmicos como Belo Monte, a transposição do rioSão Francisco, as hidrelétricas do rio Madeira etc. Diria que os documentos do governo não reproduzem mais o ranço da ditadura militar, mas, na prática, agem da mesma maneira.

Stuff white people like: denying climate change (Grist)

CLIMATE SKEPTICS

BY DAVID ROBERTS
2 AUG 2011 4:11 PM

There’s a study running soon in the journalGlobal Environmental Change called “Cool dudes: The denial of climate change among conservative white males in the United States.” It analyzes poll and survey data from the last 10 years and finds that … are you sitting down? … conservative white men are far more likely to deny the threat of climate change than other people.

OK, that’s no surprise to anyone who’s been awake over the last decade. But the paper goes beyond that to put forward some theories aboutwhy conservative white men (CWM) are so loathe to accept climate change. The explanation is some mix of the following, all of which overlap in various ways:

    • First there’s the “white male effect” — generally speaking, white males are less concerned with a variety of risks. This probably has to do with the fact that they are less exposed to risk than other demographics, what with running things and all.
    • Then, as Chris Mooney notes, there’s the “social dominance orientation” of conservatives, who see social life as following the law of the jungle. One’s choice is to dominate or be dominated; that is the natural order of things. Such folk are leery of climate change solutions premised on fairness or egalitarianism.
  • Then there are the well-understood “system-justifying tendencies” of conservatives. The authors explain that conservatives …

    … strongly display tendencies to justify and defend the current social and economic system. Conservatives dislike change and uncertainty and attempt to simplify complexity. Further, conservative white males have disproportionately occupied positions of power within our economic system. Given the expansive challenge that climate change poses to the industrial capitalist economic system, it should not be surprising that conservative white males’ strong system-justifying attitudes would be triggered to deny climate change.

  • Finally, there’s “identity-protective cognition,” a notion borrowed from Dan Kahan at Yale. (See this PDF.) Here’s how Kahan and colleagues sum it up:

    We propose that variance in risk perceptions — across persons generally, and across race and gender in particular — reflects a form of motivated cognition through which people seek to deflect threats to identities they hold, and roles they occupy, by virtue of contested cultural norms.

    “Motivated cognition” refers to reasoning done in service of justifying an already held belief or goal. It helps explain why the CWM who know the most about climate science are the most likely to reject it; they learn about it in order to reject it. See Chris Mooney’s great piece on that. Point being: when facts (or the implications of those facts) threaten people’s social identities, they tend to dismiss the facts rather than the identity.

To all these reasons, I’d add “epistemic closure,” the extraordinary way that the modern right has constructed a self-contained, hermetically sealed media environment in which conservatives can be protected from ever encountering a contrary view. It’s an accelerant to all the tendencies described above.

Anyway, as you can see, the rejection of climate science among CWM is basically overdetermined. Climate change threatens their values, their privileges, and their worldview. They are reacting as one would expect them to react.

Elite brasileira mostra sua cara (Brasil de Fato)

Essa burguesia nos mostra que as necessidades históricas do povo brasileiro somente serão conquistadas com luta, mobilização e unidade

27/07/2011 – Editorial da ed. 439 do Brasil de Fato

“Há casos folclóricos nos hangares do Campo de Marte. Como o da milionária que mandou o cão para o veterinário de helicóptero. Dona da aeronave, ela estava em Maresias (litoral norte) e viu o cãozinho comer a marmita de seu segurança. Ela mandou o piloto voltar imediatamente a São Paulo para fazer exames no pet”, relata um piloto, que pede para não ser identificado.

Acredite. O trecho acima foi extraída da coluna de Eliane Trindade, publicado na Folha de S. Paulo, sob o título: “Helicóptero é usado para ir à balada e ao pet shop”.

Esse fato mostra a absoluta falta de escrúpulos dos poucos privilegiados do nosso país e demonstra mais uma vez o caráter e a natureza da elite brasileira. “Pensei que a história da dona Vera Loyola, há uns quatro anos, ter enviado seu cãozinho para o cabeleireiro de helicóptero e, em seguida, explicado aos jornalistas que o fez “porque o Rio é uma cidade muito violenta” fosse o ‘top de linha’ do escárnio”, diz o jornalista Alipio Freire. No entanto, segundo ele, a cada dia, a elite brasileira – a burguesia no Brasil – mostra sua face de absoluto desprezo e de humilhação contra aqueles aos quais passou a se referir como PPPs (Pretos, Pobres e da Periferia).

Essa notícia só reforça uma característica de parte do Brasil e uma herança maldita: uma burguesia com a cabeça colonizada, saudosa dos tempos da nobreza, realeza. Nossa memória não precisa ser muito estimulada para recordarmos do cão com coleira de diamantes de uma tal socialite, seguido de afirmações de que tal animal era provido de tanta doçura que o feito era pouco. Essa elite, consumista, não se importa de passar o ridículo por algo desta natureza. É a reafirmação de que é uma elite ignorante, colonizada, subserviente, babona, que sonha com o dia em que o Brasil será uma mistura dos paraísos europeus e estadunidense. Dizem que essa mamãe do cão pediu ajuda gritando “help”. E uma coincidência: a opulência sempre combinada com segurança, mal pagos, mal tratados, a ponto de ter uma quentinha que poderia fazer mal para o pobre cão.

SOS burguesia

A segurança é o principal problema do pais, dirá essa “nobreza” deslocada no tempo e espaço. E claro, clamam por polícia, mais investimento em segurança, mais leis, mais rigor, repressão. Afinal, querem copiar o país que tem mais de 1% da sua população encarcerada (EUA). E claro, entre eles há quem bem explore esse clamor. A título de exemplo, a cidade de São Paulo é uma das três maiores consumidoras de carro blindado, a frente de países com guerra civil e conflitos abertos. Se somarmos o crescimento da frota de helicópteros, que na mesma comparação a capital paulista fica entre as cinco metrópoles do mundo em tamanho de frota e volume de voos diários, chegando ao absurdo de ter um bairro – Moema – com mais heliportos do que pontos de ônibus. Patrão por cima, empregados por baixo e filhos no cofre motorizado (blindados). Eis o Brasil desenhado por eles.

Outra imagem simbólica disso são as casas fortificadas, condomínios parecidos com fortalezas da idade média. E o resultado? Segue a insegurança. Propõem com seus meios de comunicação, parlamentares, prefeitos, etc. o aumento dos orçamentos para segurança. Querem o exército nas ruas, tropas, tropas! Recrutam milhares de jovens para trabalhar como seguranças privados, num trabalho de tamanho risco que um dos “benefícios” oferecidos por algumas empresas é auxilio funeral. Um atestado de crueldade. Trabalhadores mal remunerados, obrigados a ter outros bicos, com estímulos econômicos para o uso da “valentia” para evitar assaltos não raras vezes resultando em mortes ou ferimentos graves. Mas se sobrevive, ganha prêmio. Alguns bancos chegam a pagar extra para o segurança que reage e consegue conter um assalto.

Essa mesma elite, em pânico e bradando por mais segurança e mais rigor nas leis, é a mesma que luta contra qualquer mudança que garanta e amplie direitos sociais, mudanças que alterem a concentração de renda, que o povo tenha acesso a programas de combate à pobreza e à miséria, dentre outros. Sempre com um discurso pronto para qualquer intervenção do Estado (quando em benefício do povo): “dar o peixe não resolve”. Cínica, prefere a cadeia à moradia, o trabalho informal, e sempre usando o argumento de que chegou onde chegou por mérito, muito esforço e toda essa velha história do empreendedor. Só esquece de dizer que cresceu e se fez pagando injustamente, com mais da metade dos trabalhadores sem direitos e na informalidade, não aceitando sequer a igualdade de direitos dos trabalhadores domésticos com os demais trabalhadores.

Contradição ou coerência?

Nem mesmo os poucos avanços obtidos com a Constituição Federal depois de muita luta são respeitados, como demonstramos em edições anteriores do Brasil de Fato. As bandeiras do povo, tais como a redução da jornada de trabalho sem redução de salários, o fim do fator previdenciário, resgatar o direito de greve, são bandeiras que essa elite reage com veemência.

Portanto, conhecer melhor os inimigos do povo é um desafio para compreender que essa burguesia só se submete com luta, se forçada pela pressão das massas e do povo organizado. Nada virá de negociações ou concessão.

Essa postura das elites brasileiras, que gasta mais com a alimentação de um cão do que de um trabalhador, que usurpa os recursos públicos, que exige mais recursos do Estado para a (sua) segurança, é a mesma de sempre na defesa de seus privilégios. E, assim, age coerente na recusa dos direitos sociais, contrária à distribuição de renda, aos programas sociais, às políticas públicas e tudo o que pode democratizar o acesso à habitação para todos, como terra para quem trabalha, apoio aos pequenos (campo e cidade), o acesso à educação superior, dentre outros.

Essa é uma característica dessa burguesia. Que prefere integrar -se de forma subordinada à burguesia mundial a ter projeto próprio de nação. Por lucro, passam por cima de tudo, inclusive de qualquer democracia. Essa burguesia nos mostra que as necessidades históricas do povo brasileiro somente serão conquistadas com luta, mobilização e unidade. Assim, quiçá, avancemos rumo à construção de um projeto popular para o Brasil.

Noruega ensina que racismo não pode ser visto como folclore (Terra Magazine)

Marcelo Semer
De São Paulo
QUARTA, 27 DE JULHO DE 2011, 08H13

Se existe algo que o massacre na Noruega pode nos ensinar é que racismo, machismo e xenofobia não devem ser tratados como mero folclore.

Entre as palavras e as ações há um longo caminho, mas sempre pode existir alguém disposto a percorrê-lo.

Sarah Palin, candidata republicana a vice-presidente e musa do ultra-conservador Tea Party, dizia que a deputada democrata Gabrielle Giffords era um dos “alvos a serem abatidos” na política norte-americana.

Tratava-se de uma metáfora, mas um atirador em Arizona, a levou ao pé da letra. A tentativa de abater o alvo, uma das vozes contra a política hostil aos imigrantes, resultou em seis mortes em janeiro último, na cidade de Tucson.

Não há hoje quem não tema as possíveis consequências políticas de uma Europa economicamente em frangalhos -a lembrança da mistura depressão-fascismo do século XX ainda é suficientemente viva para suscitar este temor. Mas parece não ser o bastante para afastar a xenofobia, agora focada na repulsa ao Islã e a imigrantes que vem da África e Ásia.

A recente era da globalização só funcionou enquanto serviu como uma segunda colonização.

Os países periféricos foram instados a abrir seus mercados, homogeneizar suas normas, privatizar e internacionalizar suas empresas estratégicas, criando mercados alternativos ao já saturados no hemisfério norte.

Mas o mundo tornou-se global apenas em uma direção, pois as fronteiras voltaram a se fechar de forma ainda mais vigorosa, com a construção de grandes muros e o recrudescimento das leis de imigração – imigração esta que em outros tempos supriu com mão de obra barata, serviços que nacionais se recusavam a cumprir.

Pouco se pode fazer, é verdade, para impedir de todo ações repentinas de vingadores que se sentem representantes de uma nova cruzada, propondo salvar o mundo com toscas visões.

Mas estimular o discurso do ódio certamente não é uma delas.

O alarmismo com a fé diversa, o maltrato com o forasteiro e o diferente, o apego extremado a valores moralistas, são o caldo de cultura próprio para gerar ações excludentes, que tanto podem reverter em atentados quanto desembocar em políticas de Estado. Afinal, o que pode ser mais terrorista que o Holocausto?

Se a história se repete, como profetizava Marx, o receio é que nos abata mais uma vez como tragédia. Parafraseando Martin Luther King, parece ser o caso de nos preocuparmos tanto com o silêncio dos bons, quanto com o grito dos maus, este cada vez mais ensurdecedor.

O Brasil não vive o momento depressivo que se espalha pela Europa e Estados Unidos, fruto dos desvarios neoliberais, que maximizaram os mercados e o lucro e minimizaram as regulações.

Ao revés, vive anos de crescimento que resultaram em inesperada mobilidade social, mas isto também é motivo para cautela.

À incorporação de direitos civis a grupos minoritários, como homossexuais, instaurou-se uma brigada da moral, com forte apelo religioso. À incorporação ao mercado consumidor de uma classe emergente, recém-saída da linha de pobreza, levantou-se reação de quem se sente invadido em espaços até então exclusivos, entre faixas de automóveis e assentos de aviões. Ao pujante crescimento do Nordeste, esboça-se uma xenofobia de cunho separatista.

Aqui, como na Europa, devemos temer, sobretudo, aos que se propõe a nos higienizar ou recuperar valores tradicionais, que apenas remontam a mais exclusão.

O antídoto ao fascismo é o exercício da democracia e a preservação da dignidade humana como vetor de políticas sociais.

Só se abate o preconceito acreditando na igualdade.

Marcelo Semer é Juiz de Direito em São Paulo. Foi presidente da Associação Juízes para a Democracia. Coordenador de “Direitos Humanos: essência do Direito do Trabalho” (LTr) e autor de “Crime Impossível” (Malheiros) e do romance “Certas Canções” (7 Letras). Responsável pelo Blog Sem Juízo