27/09/2013 – 05h07
RAFAEL GARCIA, ENVIADO ESPECIAL A ESTOCOLMO
Atualizado às 09h47.
Quem esperava ver o IPCC (Painel Intergovernamental de Mudança Climática) emitir um relatório mais enfraquecido em razão da recente desaceleração no aquecimento global, testemunhou os cientistas da entidade subirem o tom de alerta, destacando uma subida acelerada no nível do mar e no derretimento do Ártico.
Além de manter que a mudança climática é “inequívoca”, o documento mostra projeções para o futuro com um grau de certeza melhorado. “A atmosfera e o oceano se aqueceram, a quantidade de neve e gelo diminuiu, o nível do mar subiu, e as concentrações de gases-estufa aumentaram”, diz o Sumário para Formuladores de Política, a seção do documento divulgada nesta manhã.
Mensageiro Sideral: Que diabos acontece com nosso planeta?
No final deste século, a temperatura média da superfície terrestre provavelmente vai exceder um aumento médio de 1,5°C até 2100, em relação à média de 1850 a 1900. Isso vale para todos os cenários considerados exceto o mais otimista, no qual emissões de gases estufa sofrem cortes drásticos, atingindo um pico daqui a dez anos e caindo para zero 50 anos depois.
Em um cenário intermediário, no qual as emissões dobram até 2060 e recuam a um nível maior que o atual antes de 2100, a temperatura provavelmente excederá um aumento de 2°C, limite considerado perigoso por cientistas.
Manifestantes gritam em protesto em Estocolmo, onde foi divulgado o novo relatório do painel do clima da ONU
No pior cenário, um no qual a humanidade triplica a emissão de gases do efeito estufa até 2100, a temperatura média provavelmente subiria até 4,8°C.
A palavra “provavelmente”, na linguagem do painel, significa uma propensão acima de 66%, a melhor confiabilidade possível para projeções futuras, baseadas em modelos matemáticos de simulação do clima.
Ao avaliar o efeito das emissões de gases estufa no clima passado, o relatório é bem mais contundente. O texto afirma ser “extremamente provável” (95% de certeza) que o aquecimento observado desde o meio do século 20 seja resultado da influência humana no clima. O último relatório, de 2007, dizia que o mesmo era “muito provável” (90%).
OCEANOS
O relatório também afirma com “alta confiabilidade” que o aquecimento dos oceanos domina o aumento da energia armazenada no sistema climático. Mais de 90% da energia acumulada pela Terra desde 1971 foi armazenada nos mares, diz o relatório.
“À medida que os oceanos se aquecem e as geleiras e plataformas de gelo se reduzem, o nível do mar continuará a aumentar, mas a uma taxa mais rápida do que aquela que experimentamos ao longo dos últimos 40 anos”, afirmou Qin-Dahe, co-presidente do Grupo 1 do IPCC.
O aumento do nível do mar entre 1900 e 2012 foi de 19 cm. Mesmo dentro do melhor cenário, com uma queda brusca de emissões, esse número pode quase triplicar, em razão de os oceanos já terem absorvindo muita temperatura. A hipótese mais pessimista dentro do pior cenário vê um aumento de 82 cm, que impactaria uma população de um tamanho da ordem de dezenas de milhões.
Uma das razões para a revisão dos números é que os modelos lidam melhor agora com o derretimento da Groenlândia e do oeste da Antártida. Antes, os números eram basicamente uma projeção da expansão térmica da água oceânica, que continua sendo a maior causa do aumento do nível do mar.
HIATO
A questão da desaceleração do aquecimento global nos últimos 15, o “hiato” da mudança climática, tomou grande parte do tempo de discussão dos delegados do IPCC que se reuniram nesta semana. O texto final do relatório lidou com o fenômeno afirmando que a tempereatura média global de superfície “exibe substancial variabilidade interanual e decadal” apesar de um “robusto aquecimento multi-decadal” verificado.
“Como exemplo, a taxa de aquecimento ao longo dos últimos 15 anos (1998-2012); 0,05°C por década), que começa com um forte El Niño, é menor do que a taxa calculada desde de 1951 (1951-2012; 0,12°C por década)”, afirma o relatório.
Apesar de haverem estudos recentes indicando que o calor da atmosfera está sendo roubado por águas oceânicas profundas, o relatório não menciona esse fenômeno. “É preciso colher mais evidências disso”, diz Thomas Stocker, o outro co-presidente do Grupo 1 do IPCC.
Editoria de Arte/Folhapress | ||
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Manifestantes do grupo Avaaz usam gangorra gigante para demonstrar os 95% de certeza sobre a culpa do homem nas mudanças climáticas; de um lado fica a maioria dos cientitas e, de outro, um homem com uma maleta de dinheiro

Faixa em protesto em Estocolmo diz: “o debate acabou”, em referência ao novo relatório do painel do clima, que aumenta o grau de certeza sobre a responsabilidade do homem na mudança climática

Protesto em Estocolmo, na Suécia, pede ação imediata para conter efeitos da mudança climática
Previsão de aumento do nível do mar piora
RAFAEL GARCIA
ENVIADO ESPECIAL A ESTOCOLMO
Quando o quarto relatório, que projetava um aumento de 18 cm a 59 cm, saiu em 2007, muitos cientistas o consideraram conservador. O esboço do novo texto fala agora de uma margem entre 28 cm e 89 cm de aumento até 2100.
Uma mudança da escala de dezenas de centímetros na projeção não é pequena. A margem de erro para o cenário mais pessimista chega a quase um metro de altura, o que afetaria áreas habitadas por algumas dezenas de milhares de pessoas.
Editoria de Arte/Folhapress | ||
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O principal fenômeno por trás do aumento do nível do mar é o fato de que a água aumenta de volume quando está mais quente –e os oceanos absorvem boa parte do calor aprisionado na atmosfera.
“A expansão termal é a maior contribuição para o aumento futuro do nível do mar, sendo responsável por 30% a 55% do total, com a segunda maior contribuição vindo das geleiras”, afirma a versão preliminar do sumário político do documento.
“Há alta confiabilidade em que o aumento do derretimento da superfície da Groenlândia vai exceder a elevação da queda de neve, levando à contribuição positiva [aumentando o nível do mar].”
INCERTEZAS
Se o novo relatório do IPCC será mais contundente ao dizer que o impacto do aquecimento sobre o nível do mar será maior, ele ainda tem limitações quando tenta especificar quão maior.
Um dos problemas por trás das projeções do painel do clima é que o balanço do derretimento e da formação de gelo na Antártida ainda é difícil de prever.
Apesar de a maioria das observações e dos modelos de computador alertar para o derretimento da parte ocidental do continente gelado, o aumento de precipitação na Antártida oriental deixa o cenário incerto.
Divulgação/Nasa/France Presse |
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Imagem capturada por satélite da Nasa mostra uma rachadura (ao centro) em geleira |
“Há uma cofiabilidade média de que nevascas na Antártida vão aumentar, enquanto o derretimento de superfície continuará pequeno, resultando numa contribuição negativa [de redução do nível do mar]”, diz o texto.
Um avanço do novo relatório é a tentativa de lidar melhor com as incertezas regionais. Por exemplo, apesar de a Groenlândia ter a massa de gelo terrestre que mais vai contribuir para a elevação do mar, lá ele não deve subir.
Como a massa de gelo da região vai diminuir, ela perde força de gravidade que puxa água na direção da costa. E o mesmo deve ocorrer com a Península Antártica.
“O efeito gravitacional do derretimento da Antártida, combinado com o efeito da dinâmica de correntes e a temperatura abaixo da média, deve deixar o nível do mar abaixo da média na ponta da América do Sul”, diz Aimée Slangen, da Universidade de Utrecht, na Holanda.
“Indo para o Equador, o efeito gravitacional se reverte, deixando o nível do mar acima da média.”
Slangen publicou no ano passado um estudo sobre diferenças regionais na subida da linha d’água, mas diz que ainda é difícil fazer um mapa preciso. “Precisamos entender o papel das plataformas de gelo, das geleiras, o efeito térmico e saber como a crosta vai se mover”, diz.
O último esboço do relatório afirma que, em 95% das áreas oceânicas do mundo, o nível do mar vai subir, e que 70% das áreas costeiras terão um aumento com desvio de menos de 20% da média.
Para os cientistas, porém, é preciso aprimorar o mapeamento. “Para uma cidade ou um país, a média mundial não importa, é preciso saber o que está acontecendo logo à porta de casa”, diz Slangen.
Relatório eleva o tom de alerta sobre o aquecimento global
RAFAEL GARCIA, ENVIADO ESPECIAL A ESTOCOLMO
O IPCC (painel do clima da ONU) divulgará na manhã desta sexta-feira (27) um relatório que eleva o nível de alerta para o aquecimento global. Apesar de a desaceleração na subida de temperaturas nos últimos 15 anos ter tomado bom tempo da discussão, a nova versão do “Sumário para Formuladores de Política” do documento deve indicar que as alterações climáticas têm sido mais acentuadas e mais rápidas do que se esperava, não o inverso.
As discussões finais sobre o conteúdo do documento ainda ocorrem a portas fechadas nesta madrugada em Estocolmo, mas algumas questões cruciais já foram resolvidas. A versão final do texto do Grupo 1 do IPCC –responsável pela física do clima– deve ganhar então um tom acima do que a daquela enviada aos governos para comentários em junho.
Algumas nações, incluindo o Brasil, haviam pedido que o documento excluísse a menção ao “hiato” de 15 anos, mas ela será mantida, acompanhada de explicação.
“Está escrito que esta descontinuidade decorre de um fenômeno atípico em águas no Pacífico e que um período tão curto não pode ser usado para projeções de longo prazo”, disse à Folha um dos cientistas brasileiros presentes na discussão.
Christian Åslund/Greenpeace | ||
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Protesto do Greenpeace em frente ao local de reuniões do IPCC, em Estocolmo |
O debate sobre esse problema tomou tanto tempo que, no início do terceiro dos quatro dias de trabalho, o painel só tinha avançado 30% da pauta. “Entendo a frustração dos cientistas em gastar tanto tempo nisso, mas eles não tinham a opção evitar essa discussão, que se tornou pública”, afirmou a observadora de uma ONG presente à reunião.
“O que vemos é que níveis não tão altos de aquecimento estão causando impactos maiores do que aqueles que esperávamos, como no derretimento do gelo do Ártico e da Groenlândia ou no aumento do nível do mar.”
Em relação ao relatório anterior do IPCC, publicado em 2007, muitas das novidades têm a ver com o grau de confiabilidade de fenômenos conhecidos. A certeza de que o aquecimento global é causado pelos humanos, por exemplo, aumentou de 90% para 95%. Houve até uma proposta derrubada de aumentar o número para 99%, relata um delagado holandês.
Algumas tentativas de aguar o esboço inicial também falharam. Ao descrever as principais fontes de gases do efeito estufa, delegados sauditas queriam que o texto equiparasse em gravidade o desmatamento e a agricultura à queima de combustíveis fósseis, mas foram derrotados. Apesar de não ter grandes mudanças de conteúdo, a versão final do texto sairá com “palavras mais fortes”, disse outro observador.
A divulgação da versão definitiva do “Sumário para Formuladores de Políticas” do Grupo 1 do IPCC está marcada para as 5h00 desta sexta-feira. A versão completa do relatório, incluindo o “Sumário Técnico” destinado a cientistas, ocorre na segunda-feira.
Veja dez perguntas para entender as discussões sobre clima na ONU
DA BBC BRASIL
O Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) divulga na sexta-feira em Estocolmo, na Suécia, um novo relatório no qual pretende estabelecer, com o maior grau de certeza já obtido, o papel das atividades humanas nas mudanças climáticas.
Para ajudar a entender melhor o tema, a BBC preparou uma lista com dez perguntas e respostas sobre a questão:
O que é mudança climática?
O clima do planeta está mudando constantemente ao longo do tempo geológico. A temperatura média global hoje é de cerca de 15ºC, mas as evidências geológicas sugerem que ela já foi muito maior ou muito menor em outras épocas no passado.
Entretanto, o atual período de aquecimento está ocorrendo de maneira mais rápida do que em muitas ocasiões no passado. Os cientistas estão preocupados de que a flutuação natural, ou variabilidade, está dando lugar a um aquecimento rápido induzido pela ação humana, com sérias consequências para a estabilidade do clima no planeta.
O que é ‘efeito estufa’?
O efeito estufa se refere à maneira como a atmosfera da Terra “prende” parte da energia do Sol. A energia solar irradiada de volta da superfície da Terra para o espaço é absorvida por gases atmosféricos e reemitida em todas as direções.
A energia que irradia de volta para o planeta aquece tanto a baixa atmosfera quanto a superfície da Terra. Sem esse efeito, a Terra seria 30ºC mais fria, deixando as condições no planeta hostis para a vida.
Os cientistas acreditam que estamos contribuindo para o efeito natural de estufa com gases emitidos pela indústria e pela agricultura, absorvendo mais energia e aumentando a temperatura.
O mais importante desses gases no efeito estufa natural é o vapor de água, mas suas concentrações mostram pouca mudança. Outros gases do efeito estufa incluem dióxido de carbono, metano e óxido nitroso, que são liberados pela queima de combustíveis fósseis. O desmatamento contribui para seu aumento ao eliminar florestas que absorvem carbono.
Desde o início da revolução industrial, em 1750, os níveis de dióxido de carbono (CO2) aumentaram mais de 30%, e os níveis de metano cresceram mais de 140%. A concentração de CO2 na atmosfera é agora maior do que em qualquer momento nos últimos 800 mil anos.
Qual é a evidência sobre o aquecimento?
Os registros de temperatura, a partir do fim do século 19, mostram que a temperatura média da superfície da Terra aumentou cerca de 0,8ºC nos últimos cem anos. Cerca de 0,6ºC desse aquecimento ocorreu nas últimas três décadas.
Dados de satélites mostram um aumento médio nos níveis do mar de cerca de 3 milímetros por ano nas últimas décadas. Uma grande proporção da mudança nos níveis do mar se deve à expansão dos oceanos pelo aquecimento. Mas o derretimento das geleiras de montanhas e das camadas de gelo polar também contribuem para isso.
A maioria das geleiras nas regiões temperadas do mundo e na Península Antártica estão encolhendo. Desde 1979, registros de satélites mostram um declínio dramático na extensão do gelo no Ártico, a uma taxa anual de 4% por década. Em 2012, a extensão de gelo alcançou o menor nível já registrado, cerca de 50% menor do que a média do período entre 1979 e 2000.
O manto de gelo da Groenlândia verificou um derretimento recorde nos últimos anos. Se a camada inteira, de 2,8 milhões de quilômetros cúbicos, derretesse, haveria um aumento de 6 metros nos níveis dos mares.
Dados de satélites mostram que a capa de gelo do oeste da Antártica também está perdendo massa, e um estudo recente indicou que o leste da Antártica, que não havia mostrado tendências claras de aquecimento ou resfriamento, também pode ter começado a perder massa nos últimos anos. Mas os cientistas não esperam mudanças dramáticas. Em alguns lugares, a massa de gelo pode aumentar, na verdade, com as temperaturas em alta provocando mais tempestades de neve.
Os efeitos de uma mudança climática também podem ser vistos na vegetação e nos animais terrestres. Isso inclui também o florescimento e frutificação precoces em plantas e mudanças nas áreas ocupadas pelos animais terrestres.
Há uma pausa no aquecimento?
Alguns especialistas argumentam que desde 1998 não houve um aquecimento global significativo, apesar do aumento contínuo nos níveis de emissão de CO2. Os cientistas tentam explicar isso de várias formas.
Isso inclui: variações na emissão de energia pelo Sol, um declínio no vapor de água atmosférico e uma maior absorção de calor pelos oceanos. Mas até agora, não há um consenso geral sobre o mecanismo preciso por trás dessa pausa.
Céticos destacam essa pausa como um exemplo da falibilidade das previsões baseadas em modelos climáticos computadorizados. Por outro lado, os cientistas do clima observam que o hiato no aquecimento ocorre em apenas um dos componentes do sistema climático – a média global da temperatura da superfície -, e que outros indicadores, como o derretimento do gelo e as mudanças na fauna e na flora demonstram que a Terra continua a se aquecer.
Quanto as temperaturas vão aumentar no futuro?
Em seu relatório de 2007, o IPCC previu um aumento da temperatura global entre 1,8ºC e 4ºC até 2100.
Mesmo que as emissões de gases do efeito estufa caiam dramaticamente, os cientistas dizem que os efeitos continuarão, porque partes do sistema climático, particularmente os grandes corpos de água e gelo, podem levar centenas de anos para responder a mudanças na temperatura. Também leva décadas para que os gases do efeito estufa sejam removidos da atmosfera.
Quais serão os impactos disso?
A escala do impacto potencial é incerto. As mudanças podem levar à escassez de água potável, trazer mudanças grandes nas condições para a produção de alimentos e aumentar o número de mortes por inundações, tempestades, ondas de calor e secas.
Os cientistas preveem mais chuvas em geral, mas dizem que o risco de seca em áreas não costeiras deverá aumentar durante os verões mais quentes. Mais inundações são esperadas por causa de tempestades e do aumento do nível do mar. Deverá haver, porém, muitas variações regionais nesse padrão.
Os países mais pobres, que estão menos capacitados para lidar com a mudança rápida, deverão sofrer mais.
A extinção de plantas e animais está prevista, por conta de mudanças nos habitats mais rápidas do que a capacidade de adaptação das espécies à estas. A Organização Mundial da Saúde (OMS) advertiu que a saúde de milhões de pessoas pode ser ameaçada por aumentos nos casos de malária, doenças transmitidas pela água e malnutrição.
O aumento na absorção de CO2 pelos oceanos pode levá-los a se tornar mais ácidos. Esse processo de acidificação em andamento poderia provocar grandes problemas para os recifes de corais, já que as mudanças químicas impedem os corais de formar um esqueleto calcificado, que é essencial para sua sobrevivência.
O que não sabemos?
Os modelos computadorizados são usados para estudar a dinâmica do clima na Terra e fazer projeções sobre futuras mudanças de temperatura. Mas esses modelos climáticos diferem sobre a “sensibilidade climática” – a quantidade de aquecimento ou esfriamento que ocorre por conta de um fator específico, como a elevação ou a queda na concentração de CO2.
Os modelos também diferem na forma como expressam “feedback climático”.
O aquecimento global deverá provocar algumas mudanças com probabilidade de criar mais aquecimento, como a emissão de grandes quantidades de gases do efeito estufa com o derretimento do permafrost (gelo eterno da superfície da Terra). Isso é conhecido como feedback climático positivo (no sentido de adicionar calor).
Mas também existem os feedbacks negativos, que compensam o aquecimento. Por exemplo, os oceanos e a terra absorvem CO2 como parte do ciclo do carbono.
A questão é saber qual o resultado final da soma dessas variáveis.
As inundações vão me atingir?
Detalhes vazados do relatório a ser apresentado nesta semana indicam que no pior cenário traçado pelo IPCC, com o maior nível de emissões de dióxido de carbono, os níveis dos mares no ano 2100 poderiam subir até 97 centímetros.
Alguns cientistas criticam os modelos usados pelo IPCC para calcular esse aumento. Usando o que é chamado de modelo semiempírico, as projeções para o aumento do nível do mar podem chegar a 2 metros. Nessas condições, 187 milhões de pessoas a mais no mundo sofreriam com inundações.
Mas o IPCC deve dizer que não há consenso sobre o enfoque semiempírico e manterá o dado pouco inferior a 1 metro.
O que vai acontecer com os ursos polares?
O estado dos polos Norte e Sul tem sido uma preocupação crescente para a ciência, conforme os efeitos do aquecimento global se tornam mais intensos nessas regiões.
Em 2007, o IPCC disse que as temperaturas no Ártico aumentaram quase duas vezes mais que a média global nos últimos cem anos. O relatório destacou que a região pode ter uma grande variação, com um período quente observado entre 1925 e 1945.
Nos rascunhos do relatório desta semana, os cientistas dizem que há uma evidência maior de que as camadas de gelo e as geleiras estão perdendo massa e que a camada de gelo está diminuindo no Ártico.
Em relação à Groenlândia, que por si só tem a capacidade de aumentar os níveis globais dos mares em 6 metros, o painel diz estar 90% certo de que a velocidade da perda de gelo entre 1992 e 2001 aumentou seis vezes no período entre 2002 e 2011.
Enquanto a extensão média do gelo no Ártico caiu cerca de 4% por década desde 1979, o gelo na Antártica aumentou até 1,8% por década no mesmo período.
Para o futuro, as previsões são bastante dramáticas. No pior cenário traçado pelo IPCC, um Ártico sem gelo no verão é provável até o meio deste século.
E a perspectiva para os ursos polares e para outras espécies que vivem nesse ambiente não é bom, segundo disse à BBC o professor Shang-Ping Xie, do Instituto de Oceanografia da Universidade da Califórnia em San Diego.
“Haverá bolsões de gelo marítimo em alguns mares marginais. Esperamos que os ursos polares sejam capazes de sobreviver no verão nesses bolsões de gelo remanescentes”, disse.
Qual a credibilidade do IPCC?
A escala global do envolvimento científico com o IPCC dá uma ideia do peso dado ao painel.
Dividido em três grupos de trabalho que analisam a ciência física, os impactos e as opções para limitar as mudanças climáticas, o painel envolve milhares de cientistas de todo o mundo.
O relatório a ser apresentado em Estocolmo tem 209 autores coordenadores e 50 revisões de editores de 39 países diferentes.
O documento é baseado em cerca de 9.000 estudos científicos e 50 mil comentários de especialistas.
Mas em meio a esse conjunto enorme de dados, as coisas podem não sair como o esperado.
No último relatório, publicado em 2007, houve um punhado de erros que ganharam grande projeção, entre eles a afirmação de que as geleiras do Himalaia desapareceriam até 2035. Também houve erro na projeção da porcentagem do território da Holanda que ficaria sob o nível do mar.
O IPCC admitiu os erros e explicou que em um relatório de 3 mil páginas é sempre possível que haja alguns pequenos erros. A afirmação sobre o Himalaia veio da inclusão de uma entrevista que havia sido publicada pela revista New Scientist.
Em 2009, uma revisão da forma como o IPCC analisa as informações sugeriu que o painel seja mais claro no futuro sobre as fontes de informação usadas.
O painel também teve a reputação manchada pela associação com o escândalo provocado pelo vazamento de e-mails trocados entre cientistas que trabalhavam para o IPCC, em 2009.
As mensagens pareciam mostrar algum grau de conluio entre os pesquisadores para fazer com que os dados climáticos se encaixassem mais claramente na teoria das mudanças climáticas induzidas pelo homem.
Porém ao menos três pesquisas não encontraram evidências para apoiar essa conclusão.
Mas o efeito final desses eventos sobre o painel foi o de torná-lo mais cauteloso.
Apesar de o novo relatório possivelmente enfatizar uma certeza maior entre os cientistas de que as atividades humanas estão provocando o aquecimento climático, em termos de escala, níveis e impactos a palavra “incerteza” deverá aparecer com bastante frequência.
Análise: Com IPCC na defensiva, novo relatório ainda tem combustível para polêmica
MARCELO LEITE
DE SÃO PAULO
Seis anos e sete meses atrás, quando lançou o documento “Mudança Climática 2007: A Base da Ciência Física”, a reputação do IPCC estava no auge. Naquele mesmo ano viria o Prêmio Nobel da Paz, como reconhecimento pela façanha de impor o tema da mudança do clima à agenda política mundial.
A autoridade do grupo formado pela ONU 18 anos antes era tamanha que a climatologista americana Susan Solomon, coordenadora do texto de 21 páginas, deu o passo arriscado: na entrevista coletiva em Paris, repetiu com ênfase a avaliação de que o aquecimento global era “inequívoco”.
Brasil ataca hiato do aquecimento global
Foi a resposta retórica e política daqueles cientistas à repercussão então alcançada pelo grupo dos chamados “céticos” (ou negacionistas). Depois disso, o IPCC nunca mais seria o mesmo.
Em novembro de 2009, um mês antes da Conferência do Clima de Copenhague, hackers invadiram computadores de uma universidade britânica e surrupiaram mensagens eletrônicas entre climatologistas do IPCC que permitia a impressão de que houvera manipulação de dados.
Os autores foram inocentados, mas uma brecha se abrira no prestígio do painel. Ela se agravou dois meses depois, quando veio à tona que o relatório continha erro grosseiro sobre derretimento de geleiras no Himalaia.
Desde então, o IPCC se manteve na defensiva. Criou critérios mais rígidos sobre o tipo de dados científicos que poderiam fundamentar suas previsões. O resultado desse retraimento transparecerá no “Quinto Relatório de Avaliação” (AR5), cujo “Sumário para Formuladores de Políticas” entra agora em sua fase final de redação.
POLÊMICAS
Parece pouco provável que o sumário repita juízos de valor como o contido no adjetivo “inequívoco”. Ainda assim, o documento contém combustível para polêmica.
A primeira coisa a prestar atenção no relatório, além da aparente redução na taxa de aquecimento, é a maneira pela qual lidará com a situação da calota de gelo sobre o oceano Ártico. O IPCC deve reafirmar como muito alta a probabilidade de que ela continue a encolher a cada verão do hemisfério Norte.
O problema é que, neste final do verão setentrional, o gelo no polo Norte se estende por uma área 50% maior (5,1 milhões de km2) do que há um ano. Em 2012, ela caíra para 3,4 milhões de km².
Editoria de Arte/Folhapress |
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Como se pode ver no gráfico, porém, todos os cinco últimos anos viram a área ficar muito abaixo da média de 1981 a 2010. É dessa escala temporal de transformações (décadas) que se ocupam as projeções do IPCC, não da variação de ano para ano.
O segundo ponto a atentar é a elevação do nível do mar. vAssim como ocorre com a atmosfera, o efeito estufa também esquenta o oceano. Isso expande seu volume, que também aumenta com o derretimento de geleiras sobre terra firme (como as da Groenlândia).
No caso do “Quarto Relatório de Avaliação”, de 2007, o IPCC terminou acusado de ser conservador demais na projeção de que o mar se elevaria entre 18 cm e 59 cm até o ano 2100, pois alguns estudos já indicavam mudanças de até mais de 1 m.
Tudo indica que o limite superior da nova previsão do painel deve chegar perto disso (versões preliminares apontam até 97 cm). Seria o suficiente para inundar as moradias de dezenas de milhões de pessoas no mundo.
O número, sozinho, parecerá alarmante para muitas pessoas. Pode ou não vir acompanhado, na sua divulgação, de ponderações sóbrias– como assinalar o prazo de 86 anos (de 2014 a 2100) disponível para adaptação.
Se não contornarem com muita habilidade essas armadilhas, os cientistas e porta-vozes do IPCC se arriscam a desperdiçar a oportunidade de recompor sua credibilidade como corpo científico e vê-lo, mais uma vez, desqualificado como militante da causa alarmista.
IPCC promete relatório sem viés e com revisão mais rigorosa
RAFAEL GARCIA
ENVIADO ESPECIAL A ESTOCOLMO
O chefe do conjunto de climatologistas que escreveu a mais nova atualização do IPCC sobre a física do clima, o Grupo de Trabalho 1, prometeu ontem entregar um relatório com uma visão “sem precedentes e não enviesada sobre o estado do sistema climático”.
Abrindo a primeira sessão de trabalhos que vai finalizar a primeira das três partes do AR5, o quinto relatório de avaliação do painel do clima da ONU, Thomas Stocker diz ter levado em consideração os mais de 50 mil comentários que o documento recebeu das delegações de governos, que já tiveram acesso ao “sumário para formuladores de políticas” do relatório. “Não conheço nenhum outro documento que tenha passado por um escrutínio assim”.
Após uma última rodada de discussões, a versão final do relatório sai nesta sexta-feira, e a versão provisória do documento indica que a certeza probabilística sobre a culpa das atividades humanas pelo aquecimento global deve subir de 90% para 95%, em relação ao que o IPCC concluíra em 2007.
Qin Dahe, co-chefe do Grupo 1 do IPCC, ressaltou, porém, que apesar de incertezas permanecerem em alguns aspectos do relatório, o papel humano no clima não está sendo revisado. “A evidência científica da mudança climática antropogênica se fortaleceu ano a ano, deixando poucas incertezas sobre as consequências da inação.”
Uma versão vazada do relatório técnico do Grupo 1 do IPCC, documento mais completo que o sumário para políticos, indica que há espaço para os cientistas explicarem a recente pausa no aquecimento global: o período dos últimos 15 anos em que a subida de temperaturas se desacelerou. Uma versão do documento obtida pela agência de notícias Reuters indica que “períodos de hiato de 15 anos são comuns” no registro climático. A menção ao hiato é um dos pontos criticados pelo governo brasileiro no relatório.
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Para painel do clima, nuvens devem elevar aquecimento
RAFAEL GARCIA
ENVIADO ESPECIAL A ESTOCOLMO
O papel das nuvens na mudança climática ainda é um assunto cheio de incertezas, mas o próximo relatório do IPCC (painel do clima da ONU) dá um passo na direção de um veredito.
Segundo uma versão preliminar do documento, o que a ciência mostra até agora é que a alteração que o aquecimento global provoca na dinâmica de formação de nuvens contribui para que o calor se amplifique.
A versão provisória do AR5, o quinto relatório do IPCC, a ser divulgado na sexta, reconhece que as nuvens têm efeitos paradoxais sobre o clima, algumas delas fazendo a Terra reter mais calor, outras fazendo o planeta refletir radiação solar.
O texto porém, afirma que “o sinal do balanço de feedback radiativo é provavelmente positivo”. Em outras palavras, os cientistas têm 66% de certeza de que a mudança climática cria um ciclo vicioso, no qual nuvens aquecem um planeta que cria mais nuvens causadoras de aquecimento.
Ainda não é um veredito com grau de certeza acachapante como o atribuído aos gases-estufa –a culpa do aquecimento global é da queima de combustíveis fósseis por ação humana com 95% de certeza, diz o relatório. Mas é uma grande evolução desde o último relatório, o AR4, em 2007, que se declarou incapaz de chegar a um consenso sobre a questão.
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“O fato de o AR4 ter botado o dedo na ferida e dito que a parte de aerossóis e nuvens era a mais crítica fez com que milhares de cientistas voltassem pesquisas para essa área”, diz Paulo Artaxo, climatologista da USP e coautor do capítulo dedicado ao tema no novo relatório.
O maior problema era –e ainda é– saber se as nuvens baixas têm efeito positivo ou negativo sobre o aquecimento. Por estarem sob mais pressão, elas ficam mais compactas e ajudam a refletir luz solar. Já o vapor comum ou as nuvens mais altas (rarefeitas) retêm calor.
O efeito das nuvens baixas era um dos aspectos mais explorados por grupos que negam o aquecimento global causado pelo homem.
Ainda que o grau de certeza da nova resposta esteja abaixo do máximo, a alegação de que as nuvens vão salvar o planeta não tem obtido sustentação.
O problema agora é projetar o futuro. Para isso, é preciso usar modelos matemáticos de previsão, que ainda não estão prontos para tal.
Uma das principais razões para essa limitação, segundo Artaxo, é que a resolução dos modelos ainda é grosseira demais para tratar de nuvens.
Uma célula do planeta em um modelo é como um pixel de 50 km de largura, mas nuvens são menores que isso, podendo ter 100 m ou menos. Os cientistas precisam então simplificar a representação das nuvens em seus modelos matemáticos do clima.
RAIOS CÓSMICOS
O novo relatório também descarta uma teoria que ganhou espaço entre críticos do IPCC: a de que a formação de nuvens pudesse estar sendo afetada por uma alteração sazonal na taxa de raios cósmicos. Defendida pelo físico dinamarquês Henrik Svensmark, a hipótese seria uma explicação alternativa para o aquecimento não relacionada aos combustíveis fósseis.
Segundo Artaxo, o texto fez o maior esforço possível para não deixar nenhum aspecto de fora. “Você pode até achar que uma ou outra coisa é bobagem, mas não importa. É preciso analisar as evidências experimentais para verificar se uma coisa que parece a maior loucura do mundo é verdadeira ou não.”
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Brasil ataca ‘hiato’ do aquecimento global
RAFAEL GARCIA
ENVIADO ESPECIAL A ESTOCOLMO
Nos últimos 15 anos, a temperatura média da Terra parou de subir tão rápido quanto antes, mas isso não significa que a mudança climática esteja freando. Essa é a posição do governo brasileiro, que defenderá retirar do mais importante documento internacional sobre clima a menção ao chamado “hiato” do aquecimento global.
O encontro que define o conteúdo final do quinto relatório do IPCC (Painel Intergovernamental de Mudança Climática) começa hoje em Estocolmo, na Suécia, quando se reúne o Grupo de Trabalho 1 da instituição –aquele encarregado de avaliar a ciência física do clima.
O relatório técnico do painel já está pronto, mas só será publicado após a edição final do “Sumário para Formuladores de Políticas”, único anexo do relatório sobre o qual governos podem opinar antes da divulgação, marcada para a próxima sexta (27).
Editoria de Arte/Folhapress | ||
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Em junho, um esboço final dessa parte do relatório foi enviado a delegações para comentários. O texto, que vazou para a imprensa, incluía uma frase com referência ao hiato: “A taxa de aquecimento ao longo dos últimos 15 anos (1998-2012; 0,05°C por década) é menor do que a tendência desde 1951 (1951-2012; 0,12°C por década)”.
Editoria de Arte/Folhapress | ||
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Explorada por negacionistas da mudança climática, essa flexão no gráfico de temperatura é descrita por alguns como mero ruído estatístico numa tendência clara de aquecimento no longo prazo.
Autores do sumário não deveriam ter incluído um recorte arbitrário de 15 anos num documento que avalia um trajeto só visível em escala maior, defende um dos representantes do governo brasileiro perante o IPCC.
“Alguém escolheu para isso um determinado ano [1998] que foi um ano de El Niño e era mais quente que o padrão”, diz Gustavo Luedemann, coordenador de mudanças globais de clima do Ministério da Ciência. “Isso é obviamente um erro metodológico e deixa o documento um menos contundente.”
Luedeman, porém, considera a menção ao hiato apenas um equívoco pontual e diz crer que o relatório é incisivo ao culpar a humanidade pela mudança climática.
Ainda assim, cientistas tentam entender por que o gráfico de temperaturas se achatou. Segundo Ed Hawkins, climatólogo da Universidade de Reading (Inglaterra) que tem estudado o fenômeno, há vários motivos, incluindo queda de atividade solar e erupções vulcânicas recentes, que tem efeito resfriador sobre a Terra.
“O terceiro fator é a variabilidade natural do clima, com mudanças importantes no Pacífico tropical”, diz. “A energia extra entrando no sistema climático provavelmente está sendo armazenada no oceano profundo.”
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Oceano Ártico terá verão sem gelo em 2050, diz relatório da ONU
RAFAEL GARCIA
ENVIADO ESPECIAL A ESTOCOLMO
Quando o biólogo sueco Tom Arnbom desembarcou neste verão na costa do mar de Laptev, na Rússia, para coletar DNA de morsas, notou que os enormes mamíferos tinham um medo incomum de ursos-polares, animal que normalmente não os ataca.
Após alguns dias no local, o cientista percebeu que, sem terem gelo marinho como base de caça, os ursos não alcançavam focas e outras presas prediletas. A alternativa era tentar abocanhar filhotes de morsa, com alto risco de serem pegos pelos adultos.
Alex Argozino/Editoria de Arte/Folhapress | ||
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Esse é um dos impactos que o declínio do gelo marinho no Ártico provocou nos últimos anos. O aumento do ritmo de degelo na região é um dos principais pontos a serem revistos no próximo relatório do IPCC (painel do clima da ONU, formado por milhares de cientistas).
Amanhã, a primeira parte do texto, dedicada à física do clima, será divulgada.
“É muito provável que a cobertura de gelo marinho no Ártico continue a encolher e afinar”, afirma o texto preliminar do documento. “Sob o cenário RCP8.5 [hipótese mais pessimista do relatório], um oceano Ártico quase sem gelo provavelmente será visto antes do meio do século.”
O painel informa que é possível dizer com “alta confiabilidade” que o Ártico vai se aquecer mais rápido que outras regiões e revê para pior o seu prognóstico. Há menos de uma década, porém, o maior relatório sobre o tema, o “Arctic Climate Impact Assessment”, estimava que o temido “setembro sem gelo” só viria no fim do século.
O gelo marinho ajuda a refletir radiação solar. Com o degelo e mais área de águas escuras para absorver calor, a escassez de superfície branca vai retroalimentar a mudança climática, diz o IPCC.
A MARCHA DAS MORSAS
Arnbom, hoje um pesquisador a serviço da ONG ambientalista WWF, trabalhou por muitos anos na região para o governo da Suécia, país que tem 15% de seu território no círculo ártico.
“O que eu vi no Ártico 40 anos atrás não existe mais. É impressionante ver quão rápido se foi. Estava lá todos os anos. Alguns eram mais frios que outros, e a população de animais variava, mas em 2007 me dei conta de que os impactos eram bem visíveis.”
Naquele ano, todo o gelo em alto mar derreteu na região de Laptev, e morsas que costumavam se espalhar em pedaços de gelo marinho migraram para uma única praia, formando uma concentração de mais de 50 mil indivíduos.
Morsas amontoadas no Ártico; derretimento do gelo reduz área disponível para os bichos, o que pode causar a morte dos filhotes prensados pelos adultos em espaços pequenos
O local, afastado das áreas de alimentação ricas em moluscos, era pequeno demais para abrigar tantos animais, e muitos morriam esmagados. O fenômeno se repetiu depois, em 2011, com uma concentração estimada em 100 mil morsas.
RÚSSIA x AMBIENTE
Ursos e morsas, porém, não são os únicos animais da região a terem mudado de comportamento. Segundo a WWF, a região é habitada por 40 comunidades tradicionais, que enfrentam escassez na caça e pesca artesanal.
E outro grupo de humanos, vendo novas rotas de navegação se abrirem, enxerga agora o potencial econômico da região como rota de transporte marítimo, pesca industrial e fonte de petróleo –o benefício vem justamente para a indústria cujo produto é apontado como causa da mudança climática.
A gigante russa Gazprom, que estabeleceu a primeira plataforma de petróleo “offshore” da região, teve suas instalações no mar de Pechora invadidas por ativistas do Greenpeace na semana passada. Trinta ambientalistas, incluindo uma brasileira, estão presos.
A ONG WWF também intensificou sua atividade na região. O DNA de morsas coletado por Arnbom será usado para pesquisas em universidades dinamarquesas, mas ainda está parado na alfândega russa.
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