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A necessária indomesticabilidade de termos como “Antropoceno”: desafios epistemológicos e ontologia relacional (Opinião Filosófica)

Opinião Filosófica Special Issuehttps://doi.org/10.36592/opiniaofilosofica.v11.1009


A necessária indomesticabilidade de termos como “Antropoceno”: desafios epistemológicos e ontologia relacional

The necessary untameability of terms as “the Anthropocene”: epistemological challenges and relational ontology


Renzo Taddei[1]
Davide Scarso[2]
Nuno Pereira Castanheira[3]

Resumo
Nesta entrevista, realizada por Davide Scarso e Nuno Pereira Castanheira entre os meses de novembro e dezembro de 2020 via e-mail, o Professor Renzo Taddei (Unifesp) discute o significado do termo Antropoceno e as suas implicações, com base nas contribuições teóricas de Deborah Danowski, Eduardo Viveiros de Castro, Donna Haraway, Isabelle Stengers e Bruno Latour, entre outros. O entrevistado enfatiza a necessidade de evitarmos a redução do Antropoceno ou termos similares a conceitos científicos, assim preservando a sua capacidade indutora de novas perspectivas e transformações existenciais e resistindo à tentação de objetivação dominadora de um mundo mais complexo e bagunçado do que a epistemologia clássica gostaria de admitir.

Palavras-chave: Ecologia. Sustentabilidade. Ontologia. Epistemologia. Política

Abstract
In this interview, conducted via e-mail by Davide Scarso and Nuno Pereira Castanheira between the months of November and December 2020, Professor Renzo Taddei (Unifesp) discusses the meaning of the term Anthropocene and its implications, based on the theoretical contributions of Deborah Danowski, Eduardo Viveiros de Castro, Donna Haraway, Isabelle Stengers and Bruno Latour, among others. The interviewee emphasizes the need of avoiding the reduction of the Anthropocene and similar terms to scientific concepts, thus preserving their ability to induce new perspectives and existential transformation, and resisting the temptation of objectifying domination of a world that is more complex and messier than classical epistemology would like to acknowledge.

Keywords: Ecology. Sustainability. Ontology. Epistemology. Politics


1)  O que exatamente é o Antropoceno: um conceito científico, uma proposição política, um alarme soando?

Esta questão é tema de amplos e acalorados debates. Uma coisa que parece estar clara, no entanto, é que não há lugar para o advérbio “exatamente” nas muitas formas como o Antropoceno é conceitualizado. De certa maneira, o contexto em que a questão é colocada define suas respostas potenciais. Sugerir um nome que aponte para os sintomas do problema é distinto de tentar circunscrever as suas causas, e ambas as coisas não são equivalentes ao intento de atribuir responsabilidades. O problema é que o Antropoceno pode ser lido como qualquer uma destas coisas, e isso causa desentendimentos. É neste contexto que surgem argumentos em defesa do uso dos termos Capitaloceno ou Plantationceno[4], dentre outros, como alternativas mais apropriadas. O anthropos do Antropoceno sugere uma humanidade tomada de forma geral, sem atentar para a quantidade de injustiça e racismo ambientais na conformação do contexto presente.

Todos estes nomes têm sua utilidade, mas devem ser usados com cuidado. Como mostraram, cada qual à sua maneira, Timothy Morton[5] e Deborah Danowski e Eduardo Viveiros de Castro[6] em colaboração, não somos capazes de abarcar o problema em sua totalidade. É um marco importante na história do pensamento social e filosófico que efetivamente exista certo consenso de que o problema é maior e mais complexo que nossos sistemas conceituais e nossas categorias de pensamento. O que nos resta é fazer uso produtivo, na forma de bricolagem, das ferramentas conceituais imperfeitas que possuímos. Como Donna Haraway afirmou repetidamente por toda a sua carreira, o mundo real é mais complexo e bagunçado (“messy”) do que tendemos a reconhecer. Todas as teorias científicas são modelos de arame, e isto inclui, obviamente, as das ciências sociais. Não seria diferente no que diz respeito ao Antropoceno.

No fundo, a busca sôfrega pelo termo “correto” é um sintoma do problema de como nossas mentes estão colonizadas por ideias positivistas sobre a realidade. Em geral, tendemos a cair muito rápido na armadilha de sentir que, quando temos um nome para algo, entendemos do que se trata. Via de regra, trata-se do oposto: nomes estão associados a formas de regimentação semiótica do mundo; são parte de nossos esforços em domesticação da realidade, em tentativa de reduzi-la a nossas expectativas sobre ela. Este é especialmente o caso de nomes “taxonômicos”, como o Antropoceno: são molduras totalizantes que direcionam nossa atenção a certas dimensões do mundo, produzidas pelas ideias hegemônicas do lugar e do tempo em que estão em voga. Há muitas maneiras de desarmar esse esquema; uma é apontando para o fato de que pensar um mundo feito de “objetos” ou mesmo “fenômenos” é causa e efeito, ao mesmo tempo, do fato de que as ciências buscam, em geral, causas unitárias para efeitos específicos no mundo. Isso funciona para a física newtoniana mas não funciona para o que chamamos de ecossistemas, por exemplo. A existência mesma do hábito de criar coisas como o termo Antropoceno nos impede de abordar de forma produtiva o problema que o termo tenta descrever.

O termo é, desta forma, uma tentativa de objetificação; o que ele acaba objetificando são alguns de nossos medos e ansiedades. Dado que temos muito a temer, e tememos de formas muito diversas, não é surpresa que inexista consenso a respeito do que é o Antropoceno.   

Se um nome se faz necessário, precisamos de um que faça coisas outras que reduzir nossa ansiedade cognitiva a níveis administráveis. Esta é a forma, lembremos, como Latour definiu a produção da “verdade” no âmbito das ciências[7]. Ou seja, o que estou dizendo é que o Antropoceno, ou qualquer outro termo que usemos em seu lugar, para ser útil de alguma forma, não deve ser um conceito científico. Necessitamos de um termo que desestabilize nossos esquemas conceituais e nos induza a novas perspectivas e à transformação de nossos modos de existência. Um conceito desta natureza deve ser, necessariamente, indomesticável. Deve, portanto, resistir ao próprio ímpeto definidor da cognição. Etimologicamente, definir é delimitar, colocar limites; trata-se, portanto, de uma forma de domesticação. Um conceito indomesticável será, necessariamente, desconfortável; será percebido como “confusão”.

Na minha percepção, essa é uma das dimensões do conceito de Chthuluceno, proposto por Donna Haraway[8]. Ele não nos fala sobre o que supostamente está acontecendo com o mundo, mas propõe, ao mesmo tempo e de forma sobreposta, novas maneiras de entender as relações entre os seres e o poder de constituição de mundos de tais relações, onde o humano e o próprio pensamento são frutos de processos simpoiéticos. Esta perspectiva impossibilita a adoção, mesmo que tácita e por hábito, da ideia de humano herdada do iluminismo e do liberalismo europeus como elemento definidor da condição que vivemos no Antropoceno, e desarticula o especismo embutido em tais perspectivas.

Outra dimensão fundamental associada ao conceito de Chthuluceno é sua rejeição das metafísicas totalizantes, onde ideias abstratas tem a pretensão de ser universais e, portanto, de não ter ancoragem contextual. Haraway sugere que precisamos alterar nossa perspectiva a respeito do que é importante, em direção ao que ela chama de materialismo sensível em contextos simpoiéticos: a capacidade de perceber as relações que constituem a vida, nos contextos locais, e de agir de forma responsável sobre tais relações. Toda forma de conhecimento é parcial, fragmentada, e tem marcas de nascimento. Quando o conhecimento se apresenta sem o reconhecimento explícito dessas coisas, uma de duas alternativas está em curso: os envolvidos reconhecem e aceitam essa incontornável contextualidade do saber e isso não é mais uma questão; ou o conhecimento segue parte das engrenagens do colonialismo.

A ideia de aterramento, apresentada no último livro de Latour[9], converge em grande medida com as posições de Haraway. Em termos de tradições filosóficas, na minha percepção de não-especialista parece-me que ambos se alinham com o pragmatismo norte-americano, ainda que raramente façam referência a isso.

2)  Frequentemente, quando se discutem os problemas ambientais mais críticos do presente, mas também outros temas urgentes da contemporaneidade, a falta de unanimidade e consenso é lamentada. O que seria, à luz de sua pesquisa e reflexão, uma resposta “adequada” às muitas questões difíceis colocadas pelo Antropoceno?

Vivemos em tempos complexos, e o desenvolvimento das ferramentas conceituais disponíveis para dar conta do que temos adiante de nós segue em ritmo acelerado, mas não exatamente na direção do que as ideologias de progresso científico do século 20 supunham natural. Não me parece que estamos chegando “mais perto” de algo que sejamos capazes de chamar de “solução”, ainda que filosófica. Não se trata mais disso. O que os autores inseridos nos debates sobre o Antropoceno estão sugerindo é que este ideário de progresso colapsou filosoficamente, ainda que siga sendo conveniente ao capitalismo. A maior parte da academia segue trabalhando dentro deste paradigma falido, de forma inercial ou porque efetivamente atua para fornecer recursos ao capitalismo.

O que ocorre é que as noções de que a mente tem acesso imediato à realidade e de que as ideias explicativas sobre o mundo buscam uma ordem subjacente universal, da qual as coisas e contextos são apenas reflexos imperfeitos – uma ordem platônica, portanto – vêm sendo atacadas desde pelo menos Nietzsche. Os autores mais importantes do debate do Antropoceno são herdeiros de uma corrente perspectivista do século 20 que tinha Nietzsche em posição central, mas que incluía também Whitehead e James, e que posteriormente esteve ligada principalmente a Deleuze e Foucault. Isso explica o fato de que é parte fundamental do debate sobre o Antropoceno a crítica às filosofias de transcendência e a atenção dada à questão das relações de imanência. É contribuição fundamental de Eduardo Viveiros de Castro mostrar ao mundo que o que Deleuze entendia como imanência tinha relações profundas com o pensamento indígena amazônico[10], e ele estava trabalhando nisso muito antes da questão do Antropoceno se impor na filosofia e nas ciências sociais. Quando o Antropoceno se tornou tema incontornável, a questão dos modos de vida indígenas ganhou saliência não apenas por se apresentar como forma real, empírica de se viver de modos relacionais, mas também pelo fato de que os povos indígenas têm pegada de carbono zero e promovem a biodiversidade. Este último item funciona como ponte entre os debates mais propriamente filosóficos e os ecológicos.

Isso tudo me parece importante para falarmos sobre o que são, e que expectativas existem em torno dos temas de unanimidade e consenso. O desejo da comunicação perfeita é irmão gêmeo do desejo da nomeação perfeita, citado na resposta anterior. Em ambos os casos, trata-se da manifestação de uma concepção de mente que flutua no vácuo, desconectada das bases materiais e processuais que a fazem existir. De certa forma, esta concepção subjaz aos debates sobre o dissenso sempre que este é entendido como problema epistemológico. Quando isso ocorre, a intersubjetividade entendida como necessária ao processo de construção de consenso é vista como ligada a conceitos e ideias, e os diagnósticos sobre a razão do dissenso rapidamente caem nas valas comuns da “falta de educação” ou de “formas míticas de pensamento”.

A despeito das diferenças entre os autores associados ao debate sobre o Antropoceno – Haraway, Latour, Viveiros de Castro, Stengers, dentre muitos outros -, uma das coisas que todos têm em comum é a rejeição de uma abordagem que reduz o problema a uma questão epistemológica, em favor de uma perspectiva que dá centralidade à dimensão mais propriamente ontológica. Em razão disso, intercâmbios muito frutíferos passaram a ocorrer entre a filosofia e a antropologia, como se pode ver na obra não apenas do Viveiros de Castro, mas também de Tim Ingold, Elizabeth Povinelli, Anna Tsing, e muitos outros.

A questão aqui é que, quando as questões ontológicas, dentro de filosofias relacionais e perspectivísticas, passam a ser tomadas em conta, a comunicação passa a ser outra coisa. O exemplo mais bem acabado de teorização sobre isso é a teoria do perspectivismo ameríndio[11], desenvolvida por Viveiros de Castro e por Tania Stolze Lima. Esta teoria postula que o que os seres percebem no mundo é definido pelo tipo de corpos que têm, dentro de relações interespecíficas perigosas (de predação, por exemplo), e frente a um pano de fundo cosmológico em que grande parte dos seres têm consciência e intencionalidade equivalentes às humanas. Para alguns povos, por exemplo, a onça vê o humano como porco do mato e sangue como cerveja de caium, enquanto o porco do mato vê o humano como onça. A questão crucial, aqui, é que nenhuma das visões é ontologicamente superior à outra. Isso quer dizer que percepção humana não é mais “correta” que a da onça; é simplesmente produzida por um corpo humano, enquanto a da onça é produzida por um corpo de onça. Não há perspectiva absoluta, porque não corpo absoluto.    

Como é que onça e humano se comunicam, então? A pergunta é interessante logo de saída, porque entre os ocidentais a onça é tida como irracional e destituída de linguagem, e a comunicação é entendida como impossível. Nos mundos indígenas, geralmente cabe ao xamã, através de tecnologias xamânicas – que na Amazônia costuma implicar o uso de substâncias das plantas da floresta -, sair de seu corpo de humano e entrar em contato com o espírito da onça, ou dos seres de alguma forma associados às onças. Mas essa é apenas parte da questão; a relação entre caçador e presa, mais ordinária do que o contexto xamânico, é frequentemente descrita como relação de sedução, como uma forma de coreografia entre os corpos.

Alguns autores do debate sobre o Antropoceno têm explorado as implicações filosóficas de uma nova fronteira da microbiologia que apresenta os seres e seus corpos através de outras lentes. Em seu último livro, Haraway discute o conceito de holobionte, um emaranhado de seres em relações simbióticas que permitem a ocorrência da vida dos envolvidos. A questão filosófica importante que advém dos holobiontes é que, ao invés de falarmos de seres que estão em simbiose, parece mais apropriado dizer que é a partir das relações que emergem os seres. A simbiose é anterior aos seres, por assim dizer. Isso pode parecer muito técnico, e fica mais claro se mencionarmos que o corpo humano é entendido como um holobionte. O corpo existe em relação de simbiose com um número imenso de bactérias e outros seres, como fungos e vírus, e está bem documentado que as bactérias que habitam o trato intestinal humano têm efeito sobre o funcionamento do sistema nervoso, induzindo a pessoa a certos estados de ânimo e vontades. Esticando o argumento no limite da provocação, seria possível dizer que o que chamamos de consciência não é produzido nas células que têm o “nosso” DNA, mas é um fenômeno emergente da associação simbiótica entre os sistemas do corpo humano e os demais seres que compõe o holobionte.

Se for este o caso, a comunicação não se dá entre mentes e sistemas semióticos imateriais, mas entre seres imbuídos de sua materialidade e da materialidade dos contextos em que vivem. Mais do que pensar de forma alinhada, a questão passa a ser encontrar formas de relação que, como diz Haraway, nos permita viver e morrer bem em simpoiese com os demais seres. Como coloquei em outro lugar[12], precisamos ser capazes de fazer alianças com quem não pensa como pensamos, com quem não pensa como humanos, e com que não pensa.

O problema é imensamente maior que o do consenso, e ao mesmo tempo mais realista, em termos das possibilidades de materialização de soluções. Duas formas de abordagem da questão foram desenvolvidas entre antropólogos que trabalham na Amazônia: Viveiros de Castro propôs a teoria do equívoco controlado[13], e Mauro Almeida a dos encontros pragmáticos[14]. Ambos os casos se referem à comunicação de seres que existem em mundos distintos, ou seja, suas existências são compostas de acordo com pressupostos distintos sobre o que existe e o que significa existir. É imediato pensar no contexto do contato entre povos indígenas e não indígenas, mas o esquema pode ser usado para pensar qualquer relação de diferença. A ideia de que a comunicação pressupõe necessariamente o alinhamento epistemológico, nesta perspectiva, implica processos de violência contra corpos, culturas e mundos.

Basta olharmos a nosso redor para perceber que a vida comum não pressupõe alinhamento epistemológico. Há alguns dias vi um grupo de formigas cooperando para carregar uma migalha de pão muito maior do que o corpo de cada uma delas, e estavam subindo uma parede vertical. Fiquei espantado com a capacidade de cooperação entre seres entre os quais não existe atividade epistemológica. Entre os seres que pensam, boa parte do que existe no mundo é fruto de desentendimentos produtivos – uma pessoa diz uma coisa, a outra entende algo diferente, e juntas transformam a sua realidade, sem serem capazes sequer de avaliar de forma idêntica o resultado de suas ações, mas ainda assim podendo ambas sentirem-se satisfeitas com o processo. É como se estivessem dançando: nunca se dança da mesma forma, ainda que os corpos estejam conectados, e tampouco se entende o que se está fazendo da mesma forma durante a performance da dança, e com tudo isso é perfeitamente possível que o efeito seja o sentimento de satisfação e a fruição estético-afetiva da situação.

Haraway tem uma forma ainda mais provocadora de colocar a questão: devemos construir relações de parentesco com outros seres, animados e inanimados, se quisermos efetivamente caminhar no tratamento dos problemas ambientais.

No contexto dos conflitos associados ao Antropoceno, dois exemplos equivalentes de acordos pragmáticos são as manifestações conta a exploração de xisto betuminoso no Canadá, em 2013, e os protestos contra o oleoduto que cruzaria o território Sioux nos estados de Dakota do Sul e Dakota do Norte, nos Estados Unidos, em 2016. Em ambos os casos, viam-se pessoas indígenas marchando ao lado de estudantes universitários não-indígenas, ativistas e celebridades televisivas. Enquanto os manifestantes indígenas referiam-se à poluição do seu solo sagrado como motivação para o protesto, ativistas e celebridades gritavam o slogan de que não devemos continuar emitindo carbono. O fato de que um astro de Hollywood seja incapaz de entender o que é o solo sagrado Sioux não o impediu de marchar ao lado de anciãos Sioux que não têm nada parecido com a “molécula do carbono” em suas ontologias. Este é um exemplo pedagógico do tipo de acordo pragmático que precisamos no futuro.

Precisamos encontrar formas de “marchar” ao lado de processos do sistema terrestre que não entendemos, bem como de rochas, rios, plantas, animais, e outros seres humanos. É claro que isso não significa abdicar do uso da capacidade do uso da linguagem, mas apenas que devemos parar de atribuir poderes metafísicos transcendentes a ela – inclusive o de resolver todos os conflitos humanos -, e entender que a linguagem é tão material e relacional quantos as demais dimensões da existência.

3) Nas conversas sobre o Antropoceno e a crise ambiental planetária, as palavras e ações de resistência de comunidades indígenas de distintos lugares é frequentemente evocada. Qual é, na sua visão, a contribuição que estas experiências e intervenções, aparentemente tão distanciadas da face mais tecnológica, para não dizer tecnocrática, dos discursos oficiais sobre o Antropoceno, oferecem ao debate?

São inúmeras, e possivelmente as transformações em curso relacionadas ao papel e lugar dos intelectuais e líderes indígenas nas sociedades ocidentais ou ocidentalizadas fará com que sejamos capazes de perceber nuances dos modos de existência indígenas que hoje não são valorizadas. Refiro-me, no caso do Brasil, ao fato de que, no período de dois anos, Sonia Guajajara foi candidata à vice-presidência da república, Raoni foi indicado ao prêmio Nobel da Paz, Ailton Krenak foi agraciado com o prêmio Juca Pato de intelectual do ano e Davi Kopenawa ganhou o Right Livelihood Award e foi eleito para a Academia Brasileira de Ciência. E isso tudo nos dois anos mais obscuros e retrógrados da história política recente do país.

Uma parte da resposta já foi elaborada nas questões anteriores. O que se poderia agregar é o fato de que, como Latour desenvolve em seu último livro, não se pode ficar assistindo o desenrolar dos fatos na esperança de que, no fim, tudo dê certo em razão de alguma ordem transcendente misteriosa. O momento atual é de embate entre quem se alinha e vive de acordo com as agendas de exploração colonial do planeta, mesmo que não se perceba desta forma, e quem luta pela recomposição dos modos de existência em aliança com os ecossistemas e demais seres. O discurso oficial sobre o Antropoceno está em transformação, justamente em razão do ativismo das lideranças indígenas, como Davi Kopenawa[15] e Ailton Krenak[16], e dos pensadores que venho mencionando em minhas respostas, junto aos meios mais conservadores da ciência e da sociedade. E uso o termo ativismo de forma consciente aqui: não se trata de escrever livros e esperar que o mundo se transforme (ou não) como resultado. A disputa se dá palmo a palmo, reunião a reunião, e o final da história não está definido. Esta atitude se alinha mais com o modo como os indígenas entendem a realidade do que com o pensamento ocidental moderno.

Uma última coisa que vale a pena adicionar, aqui, diz respeito à questão da relação entre os modos de vida indígena e a sustentabilidade. É possível que toda a argumentação que eu apresentei aqui até agora tenha pouca aceitação e repercussão entre os cientistas que definem isso que a pergunta chama de “discursos oficiais”. Ocorre, no entanto, que pesquisas nas áreas de biodiversidade e ecologia têm mostrado que nos territórios indígenas em que as populações vivem de modos tradicionais, a eficácia na conservação da biodiversidade é igual, e algumas vezes maior, do que as medidas preservacionistas mais misantrópicas, como as chamadas áreas de proteção integral. Isto tem chamado a atenção dos biólogos e ecologistas, graças ao trabalho de antropólogos como a Manuela Carneiro da Cunha, o Mauro Almeida, o Eduardo Brondízio e outros[17]. Os povos indígenas, deste modo, são bons em conservação da natureza, mesmo que não tenham, em seus vocabulários, uma palavra para natureza. É de importância central, para os esforços ocidentais em conservação da biodiversidade, entender como isso se passa entre os povos indígenas e demais populações tradicionais. Escrevi sobre isso recentemente[18]: a chave para a compreensão deste fenômeno reside na relação entre o conceito de cuidado e a ontologia relacional habitadas pelos povos indígenas. Colocando isso de forma direta, em um contexto em que as coisas importantes do mundo são pessoas, isto é, possuem intenção e agência, independente do formato e da natureza dos seus corpos, as relações entre os seres passam a ser sociais e políticas e, portanto, perigosas e complicadas. A liberdade de ação é bem menor em um mundo em que árvores, rios e animais são gente com força de ação política. O resultado líquido disso é o que chamamos de proteção da biodiversidade.

Ou seja, índio não protege a natureza porque gosta ou vive dentro dela; índio protege a floresta justamente porque a natureza, da forma como o Iluminismo europeu plasmou o conceito, simplesmente não existe[19]. Disso tudo decorre que o cuidado para com a vida é um precipitado da arquitetura ontológica dos mundos indígenas, sem demandar voluntarismo nem culpa. Nos modos de vida ocidentais, cuidado é entendido como vontade, como obrigação moral[20], em um contexto em que as infraestruturas e o jogo político são capazes muito facilmente de desarticularem tal voluntarismo. Isso explica a desconexão entre o conhecimento e o cuidado nos modos de vida ocidentais modernos. Se tomarmos a Amazônia como exemplo, é muito fácil perceber que nunca se estudou tanto o bioma amazônico como nos últimos 20 anos; ao mesmo tempo, isso não deteve em nada a devastação da floresta. A mensagem relevante, aqui, e que é bastante contundente, é que ao invés de ficarmos culpando o mundo da política por impedir que o conhecimento científico se transforme em cuidado efetivo para com o meio ambiente, precisamos transformar as bases ontológicas sobre as quais conhecimento sobre o mundo e ação no mundo ocorrem, de modo que, à maneira dos mundos indígenas, conhecer seja, ao mesmo tempo e de forma imediata, cuidar.

4)  O seu trabalho toca frequentemente em questões associadas à interdisciplinaridade, um tema recorrente em muitas das iniciativas relacionadas ao Antropoceno e às mudanças climáticas. Como você resumiria sua experiência e posição a respeito disso?

Com minha colega Sophie Haines[21] desenvolvi uma análise das relações interdisciplinares na academia, com base nas coisas que mencionei em meu comentário acima sobre o consenso, a linguagem e a comunicação. O universo da cooperação interdisciplinar é permeado por conflitos de todas as naturezas, mas o mais proeminente é o resultado da ideia de que a colaboração só é possível com o alinhamento dos conceitos. A quantidade de tempo, fundos e amizades que se desperdiçam na tentativa vã de colonizar as mentes uns dos outros é imensa. Por essa razão as paredes simbólicas dos departamentos universitários são tão grossas.

Uma forma de pensar o problema, usando ainda o arcabouço conceitual da filosofia da ciência, é considerar que em termos epistemológicos, o mundo ao qual a atividade intelectual se refere pode ser dividido em três campos: o das variáveis, foco da atenção e do investimento da atividade científica, e que define os próprios contornos disciplinares; o dos axiomas, que são suposições a respeito da realidade que não estão ali para serem testadas, mas para instrumentalizar o trabalho com as variáveis; e o que Pierre Bourdieu[22] chamou de doxa, o fundo fenomênico da realidade que é tomado como não problemático (e portanto não tem o privilégio de se transformar em variável de pesquisa), e que algumas vezes sequer é reconhecido como existente. O problema nas relações interdisciplinares é que o que é variável para uma disciplina é parte da doxa para a outra, o que induz os acadêmicos a pensar que o que os colegas de disciplinas muito distintas fazem é inútil e perda de tempo. Vivi isso na pele, no início de minha pesquisa de campo de doutorado, quando disse a colegas meteorologistas que iria pesquisar a dimensão cultural do clima. Um deles me falou que parecia óbvio que as culturas reagissem aos climas, e isso portanto não justificaria uma pesquisa que pudesse ser chamada de científica.

Hoje, mais de duas décadas depois, as grandes agências financiadoras internacionais, como a National Science Foundation e o Belmont Forum, exigem a participação de cientistas sociais em pesquisas sobre questões ambientais. As coisas caminharam. Mas falta muito a ser feito ainda.

5)  Em algo que pode ser visto como um gesto “revisionista”, Bruno Latour recentemente afirmou que o declínio acentuado na confiança pública das ciências “duras” e nos cientistas pode estar de alguma forma relacionado com décadas de trabalhos críticos produzidos pelas ciências sociais. Devemos nós, pesquisadores das ciências sociais (e, de forma mais geral, intelectuais) recuarmos para uma forma de “essencialismo estratégico”? Ou, colocando de outra maneira, o que significa hoje um posicionamento crítico no debate sobre o Antropoceno?

Na minha percepção, a ideia de essencialismo estratégico é produto de formas essencialistas de pensar. Como se tivéssemos uma resposta rígida e correta que precisasse ser escondida. Em termos pragmáticos as coisas podem parecer assim, mas conceitualmente a questão é outra. A ideia de que estamos escondendo a resposta “correta” vai contra a compreensão da realidade como constituída de forma relacional. É como se na arena de embates a realidade não estivesse sendo plasmada ali mesmo, mas o conhecimento sobre a realidade fosse algo rígido que é apresentado na arena como arma para acabar com a conversa. Este é um argumento antigo de Latour; já estava em Jamais Fomos Modernos[23].

Há uma outra questão importante a ser mencionada: Latour é nada mais do que vítima do seu próprio sucesso em ganhar um grau de atenção que se estende de forma inédita para fora da academia. Ele não foi o primeiro a revelar que os mecanismos de produção da ciência ocidental não condizem com a imagem que os discursos hegemônicos da ciência apresentam de si. Isso já estava em Wittgenstein. Paul Feyerabend desenvolveu toda a sua carreira sobre essa questão. O trabalho sobre os paradigmas e revoluções científicas de Thomas Kuhn[24] teve grande repercussão no mundo acadêmico, e é um dos golpes mais devastadores no positivismo. Lyotard[25] inaugura o que ficou conhecido como momento pós-moderno com um livro que ataca os ideais positivos da modernidade. Mais recentemente, a ideia de que se pode associar os problemas políticos com os científicos, de modo que ao resolver os últimos se resolvem os primeiros, foi novamente atacada pela teoria da sociedade do risco de Beck[26] e da ciência pós-normal de Funtowicz e Ravetz[27].

A diferença da atuação de Latour é que ele efetivamente buscou interlocução fora da academia. Ele escreveu obras teatrais, organizou diversas exposições, interagiu de forma criativa com artistas, fez experimentos sobre sua ideia de parlamento das coisas misturando intelectuais, ativistas e artistas, e recorrentemente faz uso de um estilo de escrita que busca ser inteligível entre audiências não acadêmicas. Ele começou sua carreira docente na França em uma escola de engenharia, e tem interagido de forma intensa com o meio da arquitetura e do design, especialmente no campo da computação. Ainda que para muita gente as ideias dele não são exatamente fáceis, não há dúvida de que todo o seu esforço deu frutos. E colocou ele na mira dos conservadores, naturalmente.

Ocorre que, ao se adotar uma abordagem ontológica relacional, composicionista, como ele mesmo chamou-a, não faz muito sentido pensar que os debates são vencidos em função do valor de verdade absoluta dos enunciados. Faz muito mais sentido colocar atenção nas estratégias e efeitos pragmáticos de cada debate do que defender uma ideia a ferro e fogo, independentemente de quem sejam os interlocutores. Se tudo é político, como nos mostram o feminismo, os estudos sociais da ciência e da tecnologia, a filosofia da ciência e tantos outros campos de pensamento, é politicamente irresponsável assumir uma atitude positivista sobre o mundo, ainda mais em um momento de transformação tão difícil.

Mas não é só isso. Existem arenas de debate em que o contexto e a lógica de organização semiótica da interação podem desfigurar, de antemão, uma ideia. Lyotard falou sobre essa questão em seu livro Le différend[28]; o grupo de antropólogos da linguagem e da semiótica vinculados aos trabalhos sobre metapragmática de Michael Silverstein[29] também trabalhou extensamente sobre o assunto. Em cada momento da luta política, os avanços se dão através de alianças e movimentos cuidadosamente construídos, em função do caminho que se está seguindo, e não de alguma lógica metafísica transcendente. É assim que se caminha, honrando as alianças e caminhando devagar, com a certeza de que o próprio caminhar transforma as perspectivas.

Vou dar um exemplo mais concreto: um bocado do que vai ocorrer no que diz respeito ao meio ambiente daqui a vinte anos está sendo definido nos assentos de cursos universitários no presente. Ocorre que as pessoas ocupando os assentos dos cursos de ecologia, biologia e afins têm menos poder neste processo de plasmar o futuro do que as que ocupam os assentos dos cursos de engenharia, direito, economia e agronomia. Se quisermos que o sistema de agricultura extensiva baseada em monocultura e agrotóxico deixe de existir, não basta este debate ocorrer nos cursos ligados à ecologia e às humanidades. Ele tem que ocorrer nos cursos de agronomia. O mesmo se dá com relação à mineração ou a questões energéticas e os cursos de engenharia, a questões ligadas aos direitos ambientais e das populações tradicionais e os cursos de direito, e a ideia de crescimento econômico e os cursos de economia. Dito isso, se eu chegar em um curso de engenharia com as ideias da Haraway sobre simpoiése e materialismo sensível, no mínimo não serei tomado a sério. É nisso que as alianças e movimentos têm que ser estratégicos. Não há nada mais importante, hoje, do que fazer este debate sobre o Antropoceno, da forma como os autores que eu mencionei aqui o entendem, nas faculdades de engenharia, economia, direito, agronomia e outras; mas para que eu possa fazer isso, preciso construir alianças dentro destas comunidades. E estas alianças, vistas de longe e sem a compreensão da dimensão estratégica do movimento, podem parecer retrocesso ou essencialismo estratégico. Uma diferença importante aqui é que, no caso de essencialismo estratégico, não existe a abertura para efetivamente escutar quem está do outro lado da interlocução. Em uma abordagem relacional de cunho composicionista, as alianças implicam, no mínimo, a escuta mútua, e isso tem o poder de transformar os membros da aliança. É essa abertura à vida e à transformação, característica das ontologias relacionais, que está ausente na ideia de essencialismo estratégico.

Voltando então ao Latour, o que me parece que ele está tentando fazer, em seus últimos dois livros, é reordenar a dimensão metapragmática dos debates internacionais, ou seja, reordenar os marcos de referência usados pelas pessoas para dar sentido aos problemas correntes. Um bocado de gente existe em uma situação de inércia com relação aos sistemas e infraestruturas dominantes – em como consomem ou votam, por exemplo – mas que estão potencialmente (cosmo)politicamente alinhados com o que ele chama de “terranos”. Seu objetivo é tirar estas pessoas de sua inércia perceptiva e afetiva, através do reordenamento simbólico dos elementos que organizam o debate. Ao mesmo tempo, Latour reconhece que não se trata apenas de ideias e regras de interação: instituições e infraestruturas são elementos fundamentais da composição dos mundos, e que precisam ser transformados. Daí a quantidade imensa de atividades extra-acadêmicas às quais Latour se dedica.

Talvez mais controvertido até do que esta questão do essencialismo estratégico é o movimento recente de insistir na necessidade de composição de um mundo comum. Essa defesa da composição do mundo comum é entendida por muitos como um retrocesso com relação às ideias de multiverso e multinaturalismo, de Viveiros de Castro. Talvez seja, uma vez mais, uma desaceleração e um desvio de percurso, no intuito de construir alianças importantes que demandam essas ações. Veremos. O debate está em curso.

6) Como você vê o futuro próximo dos estudos sobre o Antropoceno e, de maneira geral, das questões ecológicas no mundo lusoparlante e, em particular, no Brasil? Há novos projetos no horizonte que gostaria de mencionar? Que formas de intervenção são possíveis nos debates, não apenas dentro da academia mas também em níveis políticos mais amplos?

Há muita coisa acontecendo; não há dúvida que estamos em um momento de grandes transformações. Por essa razão, é muito difícil fazer previsões.

A condição do meio ambiente no Brasil, no governo Bolsonaro, é calamitosa, e não há qualquer sinal de que as coisas irão melhorar nos dois anos que ainda faltam para as próximas eleições. O país está à deriva. É impressionante, no entanto, que o país seja capaz de permanecer à deriva sem que tudo termine em anomia. Isso significa que existe alguma coisa além das estruturas de governo e do estado. É preciso seguir lutando, com todas as forças, para tirar o Bolsonaro do poder, e ao mesmo tempo é preciso abandonar o culto à figura do presidente que existe no Brasil. A situação atual do Brasil é paradoxal porque, ao mesmo tempo que aos sofrimentos trazidos pela pandemia se somam os sofrimentos trazidos por este governo, a vitalidade da sociedade civil, dos movimentos sociais e do ativismo ambiental é imensa.

Aqui acho que podemos fazer aqui um paralelo com uma das dimensões da questão do Antropoceno: ele pegou o mundo ocidental de surpresa, o que significa que há coisas bem à nossa frente que não somos capazes de perceber por muito tempo. Se assumirmos o início do Antropoceno com as detonações nucleares da década de 1940, vão-se aí mais de 70 anos e ainda não há reconhecimento científico institucionalizado sobre o fato. Não faz sentido dizer que já “se sabia” de sua existência porque Arrhenius tinha falado sobre isso em 1896. Uma voz perdida nos salões acadêmicos não pode ser tomada como percepção coletiva da realidade. E nem se pode reduzir o tempo que demorou para o reconhecimento do problema ao negacionismo, de forma anacrônica. O fato é que as ciências do sistema terrestre nos mostram que há inúmeros padrões de variação no funcionamento do planeta que não conhecemos, e que nos afetam diretamente. Até a década de 1920, a ciência não conhecia o fenômeno El Niño, que afeta o clima do planeta inteiro. Certamente há muitos El Niños que ainda não conhecemos, e alguns que nunca seremos capazes de conhecer com o aparato cognitivo que possuímos. O mesmo ocorre com fenômenos sociais. Há transformações e padrões no funcionamento das coletividades que não conhecemos, mas a que estamos sujeitos. Coisas imprevistas ocorrem o tempo todo no mundo social. No Brasil, por exemplo, ninguém anteviu as manifestações de 2013, e tampouco previu tamanho reconhecimento público e projeção das lideranças indígenas no país neste ano de 2020. Nem que este seria o ano em que, pela primeira vez na história brasileira, haveria mais candidatos pretos e pardos do que brancos nas eleições municipais. Eu sinceramente pensei que não veria isso acontecer nesta vida.  

Por isso acho improdutivo reduzir o contexto brasileiro atual ao Bolsonaro. Isso é seguir cultuando o estado, de certa forma, e reproduzir uma visão de mundo antropocêntrica. Há coisas importantes, inclusive nas dimensões tradicionalmente chamadas de sociais, que não acontecem na escala dos indivíduos nem na escala dos estados. Esta é exatamente uma das dimensões do Antropoceno. Reconhecer isso talvez diminua a amargura e a negatividade com que a intelectualidade progressista brasileira tem observado a realidade.

Em termos do que se vê no horizonte, o quadro é confuso, mas gosto de manter a minha atenção voltada aos fatos que sugerem que mudanças positivas estão ocorrendo. Vejamos: a ONU tem um secretário geral efetivamente comprometido com a agenda ambiental, e está sinalizando em direção à inclusão de indicadores ambientais nos índices usados para avaliar a situação dos países, como o IDH. O Papa Francisco é um ambientalista de esquerda. Trump perdeu as eleições nos EUA, e isso pode ter efeito cascata sobre a política no resto do mundo. A pandemia, a despeito da dimensão impensável de sofrimento que trouxe, forçou os mecanismos de governança planetários a se redesenharem e melhorarem seus processos. Mostrou ainda que a colaboração científica pode ocorrer sem ser induzida, e deformada, pela competição capitalista. A pandemia também deixou bastante evidente a necessidade da luta pelos comuns, inclusive entre grupos mais conservadores. As elites conservadoras abandonaram, por exemplo, a ideia de privatizar o sistema público de saúde brasileiro, o maior do mundo.

No Brasil, enquanto a ciência e a universidade são estranguladas pelo governo atual e resistem bravamente, os movimentos sociais, as periferias, a arte de rua e as iniciativas de solidariedade associadas à pandemia demonstram uma energia impressionante. O movimento da agroecologia tem ganhado muita força no país, também. Acho que, no curto prazo, haverá mais avanço vindo dessas áreas do que da academia. Mas coisas importantes estão ocorrendo no campo acadêmico, também. O que me está mais próximo é a experiência dos bacharelados interdisciplinares, nos quais efetivamente há um esforço de superação das barreiras disciplinares no tratamento de questões importantes. Sou professor em um bacharelado interdisciplinar em ciência e tecnologia do mar, onde os estudantes são preparados para lidar com as questões ambientais a partir de suas dimensões físicas, ecológicas, mas também filosóficas e sociológicas. Esta tem sido uma experiência muito positiva, e que me ajuda a ter esperança sobre o futuro.

Recebido em: 24/12/2020.
Aprovado em: 26/12/2020.
Publicado em: 26/12/2020.


[1] Professor de Antropologia da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). Orcid ID: https://orcid.org/0000-0002-9935-6183. E-mail: renzo.taddei@unifesp.br

[2] Professor no Departamento de Ciências Sociais Aplicadas da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade Nova de Lisboa (FCT-UNL). Orcid ID: https://orcid.org/0000-0003-1111-1286. E-mail: d.scarso@fct.unl.pt

[3] Pesquisador PNPD/CAPES e Professor-Colaborador no Programa de Pós-Graduação em Filosofia da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul – PUCRS. Orcid ID: https://orcid.org/0000-0003-3295-9454. E-mail: npcastanheira@gmail.com

[4] Haraway, Donna. “Anthropocene, capitalocene, plantationocene, chthulucene: Making kin.” Environmental humanities 6.1 (2015): 159-165.

[5] Morton, Timothy. Hyperobjects: Philosophy and Ecology after the End of the World. U of Minnesota Press, 2013.

[6] Danowski, Déborah, and Eduardo Viveiros de Castro. Há mundo por vir? Ensaio sobre os medos e os fins. Cultura e Barbárie Editora, 2014.

[7] Latour, Bruno, and Steve Woolgar. A vida de laboratório: a produção dos fatos científicos. Rio de Janeiro: Relume Dumará, 1997

[8] Haraway, D. 2016. Staying with the Trouble: Making Kin in the Chthulucene. Durham: Duke University Press.

[9] Latour, Bruno. Onde aterrar? Rio de Janeiro: Bazar do Tempo, 2020.

[10] Viveiros de Castro, Eduardo. Metafísicas canibais. São Paulo: Cosac Naify, 2015.

[11] Viveiros de Castro, Eduardo. “Perspectivismo e multi-naturalismo na América indígena.” In: A inconstância da alma selvagem e outros ensaios de antropologia. São Paulo: Cosac Naify, 2002: 345-399.

[12] Taddei, Renzo. “No que está por vir, seremos todos filósofos-engenheiros-dançarinos ou não seremos nada.” Moringa 10.2 (2019): 65-90.

[13] Viveiros de Castro, Eduardo. 2004. “Perspectival Anthropology and the Method of Controlled Equivocation.” Tipití: Journal of the Society for the Anthropology of Lowland South America 2 (1): 1.

[14] Almeida, Mauro William Barbosa. Caipora e outros conflitos ontológicos. Revista de Antropologia da UFSCar, v. 5, n. 1, p.7-28, 2013

[15] Kopenawa, Davi e Bruce Albert, A Queda do Céu: Palavras de um Xamã Yanomami. São Paulo: Companhia das Letras, 2015.

[16] Krenak, Ailton. Ideias para adiar o fim do mundo. Editora Companhia das Letras, 2019; Krenak, Ailton. O amanhã não está à venda. Companhia das Letras, 2020.

[17] IPBES. 2019. Summary for policymakers of the global assessment report on biodiversity and ecosystem services of the Intergovernmental Science-Policy Platform on Biodiversity and Ecosystem Services. Edited by S. Díaz, J. Settele, E. S. Brondízio E.S., et al. Bonn, Germany: IPBES secretariat.

[18] Taddei, Renzo. “Kopenawa and the Environmental Sciences in the Amazon.” In Philosophy on Fieldwork: Critical Introductions to Theory and Analysis in Anthropological Practice, edited by Nils Ole Bubandt and Thomas Schwarz Wentzer. London: Routledge, no prelo.

[19] Para uma análise surpreendente da importância filosófica do pensamento ameríndio, especialmente o de Davi Kopenawa, ver Valentin, M.A. Extramundanidade e Sobrenatureza. Florianópolis: Cultura e Barbárie, 2018.

[20] Puig de la Bellacasa, M. 2017. Matters of Care: Speculative Ethics in More Than Human Worlds. Minneapolis: University of Minnesota Press.

[21] Taddei, Renzo, and Sophie Haines. “Quando climatologistas encontram cientistas sociais: especulações etnográficas sobre equívocos interdisciplinares.” Sociologias 21.51 (2019).

[22] Bourdieu, Pierre. Esquisse d’une théorie de la pratique. Précédé de trois études d’ethnologie kabyle. Le Seuil, 2018.

[23] Latour, Bruno. Jamais fomos modernos. Editora 34, 1994.

[24] Kuhn, Thomas S. A estrutura das revoluções científicas. Editora Perspectiva, 2020.

[25] Lyotard, Jean-François. A condição pós-moderna. J. Olympio, 1998.

[26] Beck, Ulrich. Sociedade de risco: rumo a uma outra modernidade. Editora 34, 2011.

[27] Funtowicz, Silvio, and Jerry Ravetz. “Ciência pós-normal e comunidades ampliadas de pares face aos desafios ambientais.” História, ciências, saúde-Manguinhos 4.2 (1997): 219-230.

[28] Lyotard, Jean-François, Le différend, Paris, Éd. de Minuit, 1983.

[29] Silverstein, Michael. “Metapragmatic discourse and metapragmatic function” In Lucy, John ed. Reflexive language: Reported speech and metapragmatics. Cambridge University Press, 1993.

A Giant Bumptious Litter: Donna Haraway on Truth, Technology, and Resisting Extinction (Logic)

Issue 9 / Nature December 07, 2019

Donna Haraway at her desk, smiling.
Donna Haraway in her home in Santa Cruz. A still from Donna Haraway: Story Telling for Earthly Survival, a film by Fabrizio Terranova.

The history of philosophy is also a story about real estate.

Driving into Santa Cruz to visit Donna Haraway, we can’t help feeling that we were born too late. The metal sculpture of a donkey standing on Haraway’s front porch, the dogs that scramble to her front door barking when we ring the bell, and the big black rooster strutting in the coop out back — the entire setting evokes an era of freedom and creativity that postwar wealth made possible in Northern California.

Here was a counterculture whose language and sensibility the tech industry sometimes adopts, but whose practitioners it has mostly priced out. Haraway, who came to the University of Santa Cruz in 1980 to take up the first tenured professorship in feminist theory in the US, still conveys the sense of a wide‑open world.

Haraway was part of an influential cohort of feminist scholars who trained as scientists before turning to the philosophy of science in order to investigate how beliefs about gender shaped the production of knowledge about nature. Her most famous text remains “A Cyborg Manifesto,” published in 1985. It began with an assignment on feminist strategy for the Socialist Review after the election of Ronald Reagan and grew into an oracular meditation on how cybernetics and digitization had changed what it meant to be male or female — or, really, any kind of person. It gained such a cult following that Hari Kunzru, profiling her for Wired years later, wrote: “To boho twentysomethings, her name has the kind of cachet usually reserved for techno acts or new phenethylamines.”

The cyborg vision of gender as changing and changeable was radically new. Her map of how information technology linked people around the world into new chains of affiliation, exploitation, and solidarity feels prescient at a time when an Instagram influencer in Berlin can line the pockets of Silicon Valley executives by using a phone assembled in China that contains cobalt mined in Congo to access a platform moderated by Filipinas.

Haraway’s other most influential text may be an essay that appeared a few years later, on what she called “situated knowledges.” The idea, developed in conversation with feminist philosophers and activists such as Nancy Hartsock, concerns how truth is made. Concrete practices of particular people make truth, Haraway argued. The scientists in a laboratory don’t simply observe or conduct experiments on a cell, for instance, but co-create what a cell is by seeing, measuring, naming, and manipulating it. Ideas like these have a long history in American pragmatism. But they became politically explosive during the so-called Science Wars of the 1990s — a series of public debates among “scientific realists” and “postmodernists” with echoes in controversies about bias and objectivity in academia today.

Haraway’s more recent work has turned to human-animal relations and the climate crisis. She is a capacious yes, and thinker, the kind of leftist feminist who believes that the best thinking is done collectively. She is constantly citing other people, including graduate students, and giving credit to them. A recent documentary about her life and work by the Italian filmmaker Fabrizio Terranova, Story Telling for Earthly Survival, captures this sense of commitment, as well as her extraordinary intellectual agility and inventiveness.

At her home in Santa Cruz, we talked about her memories of the Science Wars and how they speak to our current “post-truth” moment, her views on contemporary climate activism and the Green New Deal, and why play is essential for politics.

Let’s begin at the beginning. Can you tell us a little bit about your childhood? 

I grew up in Denver, in the kind of white, middle-class neighborhood where people had gotten mortgages to build housing after the war. My father was a sportswriter. When I was eleven or twelve years old, I probably saw seventy baseball games a year. I learned to score as I learned to read.

My father never really wanted to do the editorials or the critical pieces exposing the industry’s financial corruption or what have you. He wanted to write game stories and he had a wonderful way with language. He was in no way a scholar — in fact he was in no way an intellectual — but he loved to tell stories and write them. I think I was interested in that as well — in words and the sensuality of words.

The other giant area of childhood storytelling was Catholicism. I was way too pious a little girl, completely inside of the colors and the rituals and the stories of saints and the rest of it. I ate and drank a sensual Catholicism that I think was rare in my generation. Very not Protestant. It was quirky then; it’s quirky now. And it shaped me. 

How so? 

One of the ways that it shaped me was through my love of biology as a materialist, sensual, fleshly being in the world as well as a knowledge-seeking apparatus. It shaped me in my sense that I saw biology simultaneously as a discourse and profoundly of the world. The Word and the flesh. 

Many of my colleagues in the History of Consciousness department, which comes much later in the story, were deeply engaged with Roland Barthes and with that kind of semiotics. I was very unconvinced and alienated from those thinkers because they were so profoundly Protestant in their secularized versions. They were so profoundly committed to the disjunction between the signifier and signified — so committed to a doctrine of the sign that is anti-Catholic, not just non-Catholic. The secularized sacramentalism that just drips from my work is against the doctrine of the sign that I felt was the orthodoxy in History of Consciousness. So Catholicism offered an alternative structure of affect. It was both profoundly theoretical and really intimate.

Did you start studying biology as an undergraduate? 

I got a scholarship that allowed me to go to Colorado College. It was a really good liberal arts school. I was there from 1962 to 1966 and I triple majored in philosophy and literature and zoology, which I regarded as branches of the same subject. They never cleanly separated. Then I got a Fulbright to go to Paris. Then I went to Yale to study cell, molecular, and developmental biology.

Did you get into politics at Yale? Or were you already political when you arrived? 

The politics came before that — probably from my Colorado College days, which were influenced by the civil rights movement. But it was at Yale that several things converged. I arrived in the fall of 1967, and a lot was happening.

New Haven in those years was full of very active politics. There was the antiwar movement. There was anti-chemical and anti-biological warfare activism among both the faculty and the graduate students in the science departments. There was Science for the People [a left-wing science organization] and the arrival of that wave of the women’s movement. My lover, Jaye Miller, who became my first husband, was gay, and gay liberation was just then emerging. There were ongoing anti-racist struggles: the Black Panther Party was very active in New Haven. 

Jaye and I were part of a commune where one of the members and her lover were Black Panthers. Gayle was a welfare rights activist and the mother of a young child, and her lover was named Sylvester. We had gotten the house for the commune from the university at a very low rent because we were officially an “experiment in Christian living.” It was a very interesting group of people! There was a five-year-old kid who lived in the commune, and he idolized Sylvester. He would clomp up the back stairs wearing these little combat boots yelling, “Power to the people! Power! Power!” It made our white downstairs neighbors nervous. They didn’t much like us anyway. It was very funny. 

Did this political climate influence your doctoral research at Yale?

I ended up writing on the ways that metaphors shape experimental practice in the laboratory. I was writing about the experience of the coming-into-being of organisms in the situated interactions of the laboratory. In a profound sense, such organisms are made but not made up. It’s not a relativist position at all; it’s a materialist position. It’s about what I later learned to call “situated knowledges.” It was in the doing of biology that this became more and more evident. 

How did these ideas go over with your labmates and colleagues?

It was never a friendly way of talking for my biology colleagues, who always felt that this verged way too far in the direction of relativism. 

It’s not that the words I was using were hard. It’s that the ideas were received with great suspicion. And I think that goes back to our discussion a few minutes ago about semiotics: I was trying to insist that the gapping of the signifier and the signified does not really determine what’s going on. 

But let’s face it: I was never very good in the lab! My lab work was appalling. Everything I ever touched died or got infected. I did not have good hands, and I didn’t have good passion. I was always more interested in the discourse, if you will. 

But you found a supervisor who was open to that? 

Yes, Evelyn Hutchinson. He was an ecologist and a man of letters and a man who had had a long history of making space for heterodox women. And I was only a tiny bit heterodox. Other women he had given space to were way more out there than me. Evelyn was also the one who got us our house for our “experiment in Christian living.” 

God bless. What happened after Yale?

Jaye got a job at the University of Hawaii teaching world history and I went as this funny thing called a “faculty wife.” I had an odd ontological status. I got a job there in the general science department. Jaye and I were also faculty advisers for something called New College, which was an experimental liberal-arts part of the university that lasted for several years. 

It was a good experience. Jaye and I got a divorce in that period but never really quite separated because we couldn’t figure out who got the camera and who got the sewing machine. That was the full extent of our property in those days. We were both part of a commune in Honolulu. 

Then one night, Jaye’s boss in the history department insisted that we go out drinking with him, at which point he attacked us both sexually and personally in a drunken, homophobic, and misogynist rant. And very shortly after that, Jaye was denied tenure. Both of us felt stunned and hurt. So I applied for a job in the History of Science department at Johns Hopkins, and Jaye applied for a job at the University of Texas in Houston. 

Baltimore and the Thickness of Worlding

How was Hopkins? 

History of Science was not a field I knew anything about, and the people who hired me knew that perfectly well. Therefore they assigned me to teach the incoming graduate seminar: Introduction to the History of Science. It was a good way to learn it! 

Hopkins was also where I met my current partner, Rusten. He was a graduate student in the History of Science department, where I was a baby assistant professor. (Today I would be fired and sued for sexual harassment — but that’s a whole other conversation.) 

Who were some of the other people who became important to you at Hopkins?

[The feminist philosopher] Nancy Hartsock and I shaped each other quite a bit in those years. We were part of the Marxist feminist scene in Baltimore. We played squash a lot — squash was a really intense part of our friendship. Her lover was a Marxist lover of Lenin; he gave lectures in town. 

In the mid-to-late 1970s, Nancy and I started the women’s studies program at Hopkins together. At the time, she was doing her article that became her book on feminist materialism, [Money, Sex, and Power: Toward a Feminist Historical Materialism]. It was very formative for me.

Those were also the years that Nancy and Sandra Harding and Patricia Hill Collins and Dorothy Smith were inventing feminist standpoint theory. I think all of us were already reaching toward those ideas, which we then consolidated as theoretical proposals to a larger community. The process was both individual and collective. We were putting these ideas together out of our struggles with our own work. You write in a closed room while tearing your hair out of your head — it was individual in that sense. But then it clicks, and the words come, and you consolidate theoretical proposals that you bring to your community. In that sense, it was a profoundly collective way of thinking with each other, and within the intensities of the social movements of the late 1960s and early 1970s. 

The ideas that you and other feminist philosophers were developing challenged many dominant assumptions about what truth is, where it comes from, and how it functions. More recently, in the era of Trump, we are often told we are living in a time of “post-truth” — and some critics have blamed philosophers like yourselves for creating the environment of “relativism” in which “post-truth” flourishes. How do you respond to that?

Our view was never that truth is just a question of which perspective you see it from. “Truth is perspectival” was never our position. We were against that. Feminist standpoint theory was always anti-perspectival. So was the Cyborg Manifesto, situated knowledges, [the philosopher] Bruno Latour’s notions of actor-network theory, and so on.

“Post-truth” gives up on materialism. It gives up on what I’ve called semiotic materialism: the idea that materialism is always situated meaning-making and never simply representation. These are not questions of perspective. They are questions of worlding and all of the thickness of that. Discourse is not just ideas and language. Discourse is bodily. It’s not embodied, as if it were stuck in a body. It’s bodily and it’s bodying, it’s worlding. This is the opposite of post-truth. This is about getting a grip on how strong knowledge claims are not just possible but necessary — worth living and dying for. 

When you, Latour, and others were criticized for “relativism,” particularly during the so-called Science Wars of the 1990s, was that how you responded? And could your critics understand your response?

Bruno and I were at a conference together in Brazil once. Which reminds me: If people want to criticize us, it ought to be for the amount of jet fuel involved in making and spreading these ideas! Not for leading the way to post-truth. We’re guilty on the carbon footprint issue, and Skyping doesn’t help, because I know what the carbon footprint of the cloud is. 

Anyhow. We were at this conference in Brazil. It was a bunch of primate field biologists, plus me and Bruno. And Stephen Glickman, a really cool biologist, a man we both love, who taught at UC Berkeley for years and studied hyenas, took us aside privately. He said, “Now, I don’t want to embarrass you. But do you believe in reality?” 

We were both kind of shocked by the question. First, we were shocked that it was a question of belief, which is a Protestant question. A confessional question. The idea that reality is a question of belief is a barely secularized legacy of the religious wars. In fact, reality is a matter of worlding and inhabiting. It is a matter of testing the holding-ness of things. Do things hold or not? 

Take evolution. The notion that you would or would not “believe” in evolution already gives away the game. If you say, “Of course I believe in evolution,” you have lost, because you have entered the semiotics of representationalism — and post-truth, frankly. You have entered an arena where these are all just matters of internal conviction and have nothing to do with the world. You have left the domain of worlding. 

The Science Warriors who attacked us during the Science Wars were determined to paint us as social constructionists — that all truth is purely socially constructed. And I think we walked into that. We invited those misreadings in a range of ways. We could have been more careful about listening and engaging more slowly. It was all too easy to read us in the way the Science Warriors did. Then the right wing took the Science Wars and ran with it, which eventually helped nourish the whole fake-news discourse.

Your opponents in the Science Wars championed “objectivity” over what they considered your “relativism.” Were you trying to stake out a position between those two terms? Or did you reject the idea that either of those terms even had a stable meaning?

Both terms inhabit the same ontological and epistemological frame — a frame that my colleagues and I have tried to make hard to inhabit. Sandra Harding insisted on “strong objectivity,” and my idiom was “situated knowledges.” We have tried to deauthorize the kind of possessive individualism that sees the world as units plus relations. You take the units, you mix them up with relations, you come up with results. Units plus relations equal the world. 

People like me say, “No thank you: it’s relationality all the way down.” You don’t have units plus relations. You just have relations. You have worlding. The whole story is about gerunds — worlding, bodying, everything-ing. The layers are inherited from other layers, temporalities, scales of time and space, which don’t nest neatly but have oddly configured geometries. Nothing starts from scratch. But the play — I think the concept of play is incredibly important in all of this — proposes something new, whether it’s the play of a couple of dogs or the play of scientists in the field. 

This is not about the opposition between objectivity and relativism. It’s about the thickness of worlding. It’s also about being of and for some worlds and not others; it’s about materialist commitment in many senses.

To this day I know only one or two scientists who like talking this way. And there are good reasons why scientists remain very wary of this kind of language. I belong to the Defend Science movement and in most public circumstances I will speak softly about my own ontological and epistemological commitments. I will use representational language. I will defend less-than-strong objectivity because I think we have to, situationally. 

Is that bad faith? Not exactly. It’s related to [what the postcolonial theorist Gayatri Chakravorty Spivak has called] “strategic essentialism.” There is a strategic use to speaking the same idiom as the people that you are sharing the room with. You craft a good-enough idiom so you can work on something together. I won’t always insist on what I think might be a stronger apparatus. I go with what we can make happen in the room together. And then we go further tomorrow.

In the struggles around climate change, for example, you have to join with your allies to block the cynical, well-funded, exterminationist machine that is rampant on the earth. I think my colleagues and I are doing that. We have not shut up, or given up on the apparatus that we developed. But one can foreground and background what is most salient depending on the historical conjuncture.

Santa Cruz and Cyborgs

To return to your own biography, tell us a bit about how and why you left Hopkins for Santa Cruz. 

Nancy Hartsock and I applied for a feminist theory job in the History of Consciousness department at UC Santa Cruz together. We wanted to share it. Everybody assumed we were lovers, which we weren’t, ever. We were told by the search committee that they couldn’t consider a joint application because they had just gotten this job okayed and it was the first tenured position in feminist theory in the country. They didn’t want to do anything further to jeopardize it. Nancy ended up deciding that she wanted to stay in Baltimore anyway, so I applied solo and got the job. And I was fired from Hopkins and hired by Santa Cruz in the same week — and for exactly the same papers.

What were the papers?

The long one was called “Signs of Dominance.” It was from a Marxist feminist perspective, and it was regarded as too political. Even though it appeared in a major journal, the person in charge of my personnel case at Hopkins told me to white it out from my CV. 

The other one was a short piece on [the poet and novelist] Marge Piercy and [feminist theorist] Shulamith Firestone in Women: a Journal of Liberation. And I was told to white that out, too. Those two papers embarrassed my colleagues and they were quite explicit about it, which was kind of amazing. Fortunately, the people at History of Consciousness loved those same papers, and the set of commitments that went with them. 

You arrived in Santa Cruz in 1980, and it was there that you wrote the Cyborg Manifesto. Tell us a bit about its origins.

It had a very particular birth. There was a journal called the Socialist Review, which had formerly been called Socialist Revolution. Jeff Escoffier, one of the editors, asked five of us to write no more than five pages each on Marxist feminism, and what future we anticipated for it. 

This was just after the election of Ronald Reagan. The future we anticipated was a hard right turn. It was the definitive end of the 1960s. Around the same time, Jeff asked me if I would represent Socialist Review at a conference of New and Old Lefts in Cavtat in Yugoslavia [now Croatia]. I said yes, and I wrote a little paper on reproductive biotechnology. A bunch of us descended on Cavtat, and there were relatively few women. So we rather quickly found one another and formed alliances with the women staff who were doing all of the reproductive labor, taking care of us. We ended up setting aside our papers and pronouncing on various feminist topics. It was really fun and quite exciting. 

Out of that experience, I came back to Santa Cruz and wrote the Cyborg Manifesto. It turned out not to be five pages, but a whole coming to terms with what had happened to me in those years from 1980 to the time it came out in 1985.

The manifesto ended up focusing a lot on cybernetics and networking technologies. Did this reflect the influence of nearby Silicon Valley? Were you close with people working in those fields?

It’s part of the air you breathe here. But the real tech alliances in my life come from my partner Rusten and his friends and colleagues, because he worked as a freelance software designer. He did contract work for Hewlett Packard for years. He had a long history in that world: when he was only fourteen, he got a job programming on punch cards for companies in Seattle. 

The Cyborg Manifesto was the first paper I ever wrote on a computer screen. We had an old HP-86. And I printed it on one of those daisy-wheel printers. One I could never get rid of, and nobody ever wanted. It ended up in some dump, God help us all.

The Cyborg Manifesto had such a tremendous impact, and continues to. What did you make of its reception?

People read it as they do. Sometimes I find it interesting. But sometimes I just want to jump into a foxhole and pull the cover over me. 

In the manifesto, you distinguish yourself from two other socialist feminist positions. The first is the techno-optimist position that embraces aggressive technological interventions in order to modify human biology. This is often associated with Shulamith Firestone’s book The Dialectic of Sex (1970), and in particular her proposal for “artificial wombs” that could reproduce humans outside of a woman’s body.

Yes, although Firestone gets slotted into a quite narrow, blissed-out techno-bunny role, as if all her work was about reproduction without wombs. She is remembered for one technological proposal, but her critique of the historical materialist conditions of mothering and reproduction was very deep and broad.

You also make some criticisms of the ideas associated with Italian autonomist feminists and the Wages for Housework campaign. You suggest that they overextend the category of “labor.”

Wages for Housework was very important. And I’m always in favor of working by addition not subtraction. I’m always in favor of enlarging the litter. Let’s watch the attachments and detachments, the compositions and decompositions, as the litter proliferates. Labor is an important category with a strong history, and Wages for Housework enlarged it.

But in thinkers with Marxist roots, there’s also a tendency to make the category of labor do too much work. A great deal of what goes on needs to be thickly described with categories other than labor — or in interesting kinds of entanglement with labor. 

What other categories would you want to add?

Play is one. Labor is so tied to functionality, whereas play is a category of non-functionality. 

Play captures a lot of what goes on in the world. There is a kind of raw opportunism in biology and chemistry, where things work stochastically to form emergent systematicities. It’s not a matter of direct functionality. We need to develop practices for thinking about those forms of activity that are not caught by functionality, those which propose the possible-but-not-yet, or that which is not-yet but still open. 

It seems to me that our politics these days require us to give each other the heart to do just that. To figure out how, with each other, we can open up possibilities for what can still be. And we can’t do that in in a negative mood. We can’t do that if we do nothing but critique. We need critique; we absolutely need it. But it’s not going to open up the sense of what might yet be. It’s not going to open up the sense of that which is not yet possible but profoundly needed.

The established disorder of our present era is not necessary. It exists. But it’s not necessary. 

Playing Against Double Death

What might some of those practices for opening up new possibilities look like?

Through playful engagement with each other, we get a hint about what can still be and learn how to make it stronger. We see that in all occupations. Historically, the Greenham Common women were fabulous at this. [Eds.: The Greenham Common Women’s Peace Camp was a series of protests against nuclear weapons at a Royal Air Force base in England, beginning in 1981.] More recently, you saw it with the Dakota Access Pipeline occupation. 

The degree to which people in these occupations play is a crucial part of how they generate a new political imagination, which in turn points to the kind of work that needs to be done. They open up the imagination of something that is not what [the ethnographer] Deborah Bird Rose calls “double death” — extermination, extraction, genocide. 

Now, we are facing a world with all three of those things. We are facing the production of systemic homelessness. The way that flowers aren’t blooming at the right time, and so insects can’t feed their babies and can’t travel because the timing is all screwed up, is a kind of forced homelessness. It’s a kind of forced migration, in time and space. 

This is also happening in the human world in spades. In regions like the Middle East and Central America, we are seeing forced displacement, some of which is climate migration. The drought in the Northern Triangle countries of Central America — Honduras, Guatemala, El Salvador — is driving people off their land. 

So it’s not a humanist question. It’s a multi-kind and multi-species question.

In the Cyborg Manifesto, you use the ideas of “the homework economy” and the “integrated circuit” to explore the various ways that information technology was restructuring labor in the early 1980s to be more precarious, more global, and more feminized. Do climate change and the ecological catastrophes you’re describing change how you think about those forces? 

Yes and no. The theories that I developed in that period emerged from a particular historical conjuncture. If I were mapping the integrated circuit today, it would have different parameters than the map that I made in the early 1980s. And surely the questions of immigration, exterminism, and extractivism would have to be deeply engaged. The problem of rebuilding place-based lives would have to get more attention.

The Cyborg Manifesto was written within the context of the hard-right turn of the 1980s. But the hard-right turn was one thing; the hard-fascist turn of the late 2010s is another. It’s not the same as Reagan. The presidents of Colombia, Hungary, Brazil, Egypt, India, the United States — we are looking at a new fascist capitalism, which requires reworking the ideas of the early 1980s for them to make sense.

So there are continuities between now and the map I made then, a lot of continuities. But there are also some pretty serious inflection points, particularly when it comes to developments in digital technologies that are playing into the new fascism.

Could you say more about those developments?

If the public-private dichotomy was old-fashioned in 1980, by 2019 I don’t even know what to call it. We have to try to rebuild some sense of a public. But how can you rebuild a public in the face of nearly total surveillance? And this surveillance doesn’t even have a single center. There is no eye in the sky.

Then we have the ongoing enclosure of the commons. Capitalism produces new forms of value and then encloses those forms of value — the digital is an especially good example of that. This involves the monetization of practically everything we do. And it’s not like we are ignorant of this dynamic. We know what’s going on. We just don’t have a clue how to get a grip on it. 

One attempt to update the ideas of the Cyborg Manifesto has come from the “xenofeminists” of the international collective Laboria Cuboniks. I believe some of them have described themselves as your “disobedient daughters.”

Overstating things, that’s not my feminism.

Why not?

I’m not very interested in those discussions, frankly. It’s not what I’m doing. It’s not what makes me vital now. In a moment of ecological urgency, I’m more engaged in questions of multispecies environmental and reproductive justice. Those questions certainly involve issues of digital and robotic and machine cultures, but they aren’t at the center of my attention.

What is at the center of my attention are land and water sovereignty struggles, such as those over the Dakota Access Pipeline, over coal mining on the Black Mesa plateau, over extractionism everywhere. My attention is centered on the extermination and extinction crises happening at a worldwide level, on human and nonhuman displacement and homelessness. That’s where my energies are. My feminism is in these other places and corridors.

Do you still think the cyborg is still a useful figure?

I think so. The cyborg has turned out to be rather deathless. Cyborgs keep reappearing in my life as well as other people’s lives. 

The cyborg remains a wily trickster figure. And, you know, they’re also kind of old-fashioned. They’re hardly up-to-the‑minute. They’re rather klutzy, a bit like R2-D2 or a pacemaker. Maybe the embodied digitality of us now is not especially well captured by the cyborg. So I’m not sure. But, yeah, I think cyborgs are still in the litter. I just think we need a giant bumptious litter whelped by a whole lot of really badass bitches — some of whom are men!

Mourning Without Despair

You mentioned that your current work is more focused on environmental issues. How are you thinking about the role of technology in mitigating or adapting to climate change — or fighting extractivism and extermination?

There is no homogeneous socialist position on this question. I’m very pro-technology, but I belong to a crowd that is quite skeptical of the projects of what we might call the “techno-fix,” in part because of their profound immersion in technocapitalism and their disengagement from communities of practice. 

Those communities may need other kinds of technologies than those promised by the techno-fix: different kinds of mortgage instruments, say, or re-engineered water systems. I’m against the kind of techno-fixes that are abstracted from place and tied up with huge amounts of technocapital. This seems to include most geoengineering projects and imaginations. 

So when I see massive solar fields and wind farms I feel conflicted, because on the one hand they may be better than fracking in Monterey County — but only maybe. Because I also know where the rare earth minerals required for renewable energy technologies come from and under what conditions. We still aren’t doing the whole supply-chain analysis of our technologies. So I think we have a long way to go in socialist understanding of these matters. 

One tendency within socialist thought believes that socialists can simply seize capitalist technology and put it to different purposes — that you take the forces of production, build new relations around them, and you’re done. This approach is also associated with a Promethean, even utopian approach to technology. Socialist techno-utopianism has been around forever, but it has its own adherents today, such as those who advocate for “Fully Automated Luxury Communism.” I wonder how you see that particular lineage of socialist thinking about technology.

I think very few people are that simplistic, actually. In various moments we might make proclamations that come down that way. But for most people, our socialisms, and the approaches with which socialists can ally, are richer and more varied. 

When you talk to the Indigenous activists of the Black Mesa Water Coalition, for example, they have a complex sense around solar arrays and coal plants and water engineering and art practices and community movements. They have very rich articulated alliances and separations around all of this. 

Socialists aren’t the only ones who have been techno-utopian, of course. A far more prominent and more influential strand of techno-utopianism has come from the figures around the Bay Area counterculture associated with the Whole Earth Catalog, in particular Stewart Brand, who went on to play important intellectual and cultural roles in Silicon Valley.

They are not friends. They are not allies. I’m avoiding calling them enemies because I’m leaving open the possibility of their being able to learn or change, though I’m not optimistic. I think they occupy the position of the “god trick.” [Eds.: The “god trick” is an idea introduced by Haraway that refers to the traditional view of objectivity as a transcendent “gaze from nowhere.”] I think they are blissed out by their own privileged positions and have no idea what their own positionality in the world really is. And I think they cause a lot of harm, both ideologically and technically. 

How so?

They get a lot of publicity. They take up a lot of the air in the room. 

It’s not that I think they’re horrible people. There should be space for people pushing new technologies. But I don’t see nearly enough attention given to what kinds of technological innovation are really needed to produce viable local and regional energy systems that don’t depend on species-destroying solar farms and wind farms that require giant land grabs in the desert.

The kinds of conversations around technology that I think we need are those among folks who know how to write law and policy, folks who know how to do material science, folks who are interested in architecture and park design, and folks who are involved in land struggles and solidarity movements. I want to see us do much savvier scientific, technological, and political thinking with each other, and I want to see it get press. The Stewart Brand types are never going there. 

Do you see clear limitations in their worldviews and their politics?

They remain remarkably humanist in their orientation, in their cognitive apparatus, and in their vision of the world. They also have an almost Peter Pan quality. They never quite grew up. They say, “If it’s broken, fix it.” 

This comes from an incapacity to mourn and an incapacity to be finite. I mean that psychoanalytically: an incapacity to understand that there is no status quo ante, to understand that death and loss are real. Only within that understanding is it possible to open up to a kind of vitality that isn’t double death, that isn’t extermination, and which doesn’t yearn for transcendence, yearn for the fix.

There’s not much mourning with the Stewart Brand types. There’s not much felt loss of the already disappeared, the already dead — the disappeared of Argentina, the disappeared of the caravans, the disappeared of the species that will not come back. You can try to do as much resurrection biology as you want to. But any of the biologists who are actually involved in the work are very clear that there is no resurrection. 

You have also been critical of the Anthropocene, as a proposed new geological epoch defined by human influence on the earth. Do you see the idea of the Anthropocene as having similar limitations?

I think the Anthropocene framework has been a fertile container for quite a lot, actually. The Anthropocene has turned out to be a rather capacious territory for incorporating people in struggle. There are a lot of interesting collaborations with artists and scientists and activists going on.

The main thing that’s too bad about the term is that it perpetuates the misunderstanding that what has happened is a human species act, as if human beings as a species necessarily exterminate every planet we dare to live on. As if we can’t stop our productive and reproductive excesses. 

Extractivism and exterminationism are not human species acts. They come from a situated historical conjuncture of about five hundred years in duration that begins with the invention of the plantation and the subsequent modeling of industrial capitalism. It is a situated historical conjuncture that has had devastating effects even while it has created astonishing wealth. 

To define this as a human species act affects the way a lot of scientists think about the Anthropocene. My scientist colleagues and friends really do continue to think of it as something human beings can’t stop doing, even while they understand my historical critique and agree with a lot of it. 

It’s a little bit like the relativism versus objectivity problem. The old languages have a deep grip. The situated historical way of thinking is not instinctual for Western science, whose offspring are numerous. 

Are there alternatives that you think could work better than the Anthropocene?

There are plenty of other ways of thinking. Take climate change. Now, climate change is a necessary and essential category. But if you go to the circumpolar North as a Southern scientist wanting to collaborate with Indigenous people on climate change — on questions of changes in the sea ice, for example, or changes in the hunting and subsistence base — the limitations of that category will be profound. That’s because it fails to engage with the Indigenous categories that are actually active on the ground. 

There is an Inuktitut word, “sila.” In an Anglophone lexicon, “sila” will be translated as “weather.” But in fact, it’s much more complicated. In the circumpolar North, climate change is a concept that collects a lot of stuff that the Southern scientist won’t understand. So the Southern scientist who wants to collaborate on climate change finds it almost impossible to build a contact zone. 

Anyway, there are plenty of other ways of thinking about shared contemporary problems. But they require building contact zones between cognitive apparatuses, out of which neither will leave the same as they were before. These are the kinds of encounters that need to be happening more.

A final question. Have you been following the revival of socialism, and socialist feminism, over the past few years? 

Yes.

What do you make of it? I mean, socialist feminism is becoming so mainstream that even Harper’s Bazaar is running essays on “emotional labor.”

I’m really pleased! The old lady is happy. I like the resurgence of socialism. For all the horror of Trump, it has released us. A whole lot of things are now being seriously considered, including mass nonviolent social resistance. So I am not in a state of cynicism or despair.

An excerpted version of this interview originally appeared in The Guardian.

https://logicmag.io/nature/a-giant-bumptious-litter/

Ancient viral molecules essential for human development (Science Daily)

Date: November 23, 2015

Source: Stanford University Medical Center

Summary: Genetic material from ancient viral infections is critical to human development, according to researchers.


Rendering of a virus among blood cells. Credit: © ysfylmz / Fotolia

Genetic material from ancient viral infections is critical to human development, according to researchers at the Stanford University School of Medicine.

They’ve identified several noncoding RNA molecules of viral origins that are necessary for a fertilized human egg to acquire the ability in early development to become all the cells and tissues of the body. Blocking the production of this RNA molecule stops development in its tracks, they found.

The discovery comes on the heels of a Stanford study earlier this year showing that early human embryos are packed full of what appear to be viral particles arising from similar left-behind genetic material.

“We’re starting to accumulate evidence that these viral sequences, which originally may have threatened the survival of our species, were co-opted by our genomes for their own benefit,” said Vittorio Sebastiano, PhD, an assistant professor of obstetrics and gynecology. “In this manner, they may even have contributed species-specific characteristics and fundamental cell processes, even in humans.”

Sebastiano is a co-lead and co-senior author of the study, which will be published online Nov. 23 in Nature Genetics. Postdoctoral scholar Jens Durruthy-Durruthy, PhD, is the other lead author. The other senior author of the paper is Renee Reijo Pera, PhD, a former professor of obstetrics and gynecology at Stanford who is now on the faculty of Montana State University.

Sebastiano and his colleagues were interested in learning how cells become pluripotent, or able to become any tissue in the body. A human egg becomes pluripotent after fertilization, for example. And scientists have learned how to induce other, fully developed human cells to become pluripotent by exposing them to proteins known to be present in the very early human embryo. But the nitty-gritty molecular details of this transformative process are not well understood in either case.

An ancient infection

The researchers knew that a type of RNA molecules called long-intergenic noncoding, or lincRNAs, have been implicated in many important biological processes, including the acquisition of pluripotency. These molecules are made from DNA in the genome, but they don’t go on to make proteins. Instead they function as RNA molecules to affect the expression of other genes.

Sebastiano and Durruthy-Durruthy used recently developed RNA sequencing techniques to examine which lincRNAs are highly expressed in human embryonic stem cells. Previously, this type of analysis was stymied by the fact that many of the molecules contain highly similar, very repetitive regions that are difficult to sequence accurately.

They identified more than 2,000 previously unknown RNA sequences, and found that 146 are specifically expressed in embryonic stem cells. They homed in on the 23 most highly expressed sequences, which they termed HPAT1-23, for further study. Thirteen of these, they found, were made up almost entirely of genetic material left behind after an eons-ago infection by a virus called HERV-H.

HERV-H is what’s known as a retrovirus. These viruses spread by inserting their genetic material into the genome of an infected cell. In this way, the virus can use the cell’s protein-making machinery to generate viral proteins for assembly into a new viral particle. That particle then goes on to infect other cells. If the infected cell is a sperm or an egg, the retroviral sequence can also be passed to future generations.

HIV is one common retrovirus that currently causes disease in humans. But our genomes are also littered with sequences left behind from long-ago retroviral infections. Unlike HIV, which can go on to infect new cells, these retroviral sequences are thought to be relatively inert; millions of years of evolution and accumulated mutations mean that few maintain the capacity to give instructions for functional proteins.

After identifying HPAT1-23 in embryonic stem cells, Sebastiano and his colleagues studied their expression in human blastocysts — the hollow clump of cells that arises from the egg in the first days after fertilization. They found that HPAT2, HPAT3 and HPAT5 were expressed only in the inner cell mass of the blastocyst, which becomes the developing fetus. Blocking their expression in one cell of a two-celled embryo stopped the affected cell from contributing to the embryo’s inner cell mass. Further studies showed that the expression of the three genes is also required for efficient reprogramming of adult cells into induced pluripotent stem cells.

Sequences found only in primates

“This is the first time that these virally derived RNA molecules have been shown to be directly involved with and necessary for vital steps of human development,” Sebastiano said. “What’s really interesting is that these sequences are found only in primates, raising the possibility that their function may have contributed to unique characteristics that distinguish humans from other animals.”

The researchers are continuing their studies of all the HPAT molecules. They’ve learned that HPAT-5 specifically affects pluripotency by interacting with and sequestering members of another family of RNAs involved in pluripotency called let-7.

“Previously retroviral elements were considered to be a class that all functioned in basically the same way,” said Durruthy-Durruthy. “Now we’re learning that they function as individual elements with very specific and important roles in our cells. It’s fascinating to imagine how, during the course of evolution, primates began to recycle these viral leftovers into something that’s beneficial and necessary to our development.”


Journal Reference:

  1. Jens Durruthy-Durruthy, Vittorio Sebastiano, Mark Wossidlo, Diana Cepeda, Jun Cui, Edward J Grow, Jonathan Davila, Moritz Mall, Wing H Wong, Joanna Wysocka, Kin Fai Au, Renee A Reijo Pera. The primate-specific noncoding RNA HPAT5 regulates pluripotency during human preimplantation development and nuclear reprogrammingNature Genetics, 2015; DOI: 10.1038/ng.3449

Antropoceno, Capitaloceno, Cthulhuceno: o que caracteriza uma nova época? (ClimaCom)

28/10/2014

A proposta de formalização de uma nova época da Terra levanta questões sobre utilidade, responsabilidade e formas alternativas de narrar a história do mundo em que vivemos

Por Daniela Klebis

Os impactos das ações humanas sobre o planeta nos últimos 200 anos têm sido tão profundos que podem justificar a definição de nova época para a Terra, o Antropoceno. No último dia 17 de outubro, a Comissão Internacional sobre Estratigrafia (ICS, na sigla inglês), reuniu-se em Berlim para dar continuidade às discussões sobre a formalização dessa nova época terrena, cuja decisão final será votada somente em 2016. A despeito dos processos burocráticos, o termo já foi informalmente assimilado por filósofos, arqueólogos, historiadores, ambientalistas e cientistas do clima e, nesse meio, o debate segue, para além da reunião de evidências físicas, no sentido de compreender sua utilidade: estamos prontos para assumir a época dos humanos?

A história da Terra se divide em escalas de tempo geológicas, que são definidas pela ICS, com sede em Paris, na França. Essas escalas de tempo começam com grandes espaços de tempos chamados éons, que se dividem em eras (como a Mezozóica), e então em períodos (Jurássico, Neogeno),  épocas e por fim, em idades. Quem acenou pela primeira vez a necessidade de definir uma nova época, baseada nos impactos indeléveis das ações humanas sobre a paisagem terrestre foi o químico atmosférico Paul J. Crutzen, prêmio Nobel de química em 1995. Cutzen sugeriu o termo Antropoceno durante o encontro  do Programa Internacional de Geofera e Biosfera (IGBP, na sigla em inglês), no México, em 2000. O evento tinha por objetivo discutir os problemas do Holoceno, a época em que nos encontramos há cerca de 11700 anos,desde o fim da era glacial.

A hipótese sustentada pelos defensores da nova denominação baseia-se nas observações sobre as mudanças iniciadas pelo homem sobre o ambiente desde 1800, cujas evidências geológicas  possuem impacto a  longo prazo na história da Terra.  E quais são as evidências que podem justificar a adoção do termo Antropoceno?  “O que nós humanos mais fizemos nesses dois séculos foi criar coisas que não existiram pelos 4,5 bilhões de anos da história da Terra”, denuncia o geólogo Jan Zalasiewicz, presidente do grupo de trabalho sobre o Antropoceno da ICS, em colóquio em Sidney, na Autrália, em março deste ano.

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Minerais sintéticos, fibras de carbono, plásticos, concreto, são alguns exemplos de novos elementos criados pelo homem. O concreto, um material produzido pela mistura de cimento, areia, pedra e água, vem se espalhando na superfície de nosso planeta a uma velocidade de 2 bilhões de quilômetros por ano, conforme aponta o geólogo.  Abaixo da superfície, escavações em busca de minérios e petróleo já abriram mais de 50 milhões de quilômetros em buracos subterrâneos.

Além das mudanças físicas, a emissão exagerada de dióxido de carbono e outros gases de efeito estufa, resultantes da ação humana, provocam mudanças químicas na atmosfera, como aquecimento global, descongelamento de calotas polares e acifidificação dos oceanos. A biosfera é também analisada, já que mudanças resultantes da perda de habitats, atividades predatórias e invasão de especies também provocam mudanças na composição química e física dos ambientes.

As evidências do impacto da ação humana,que vêm sendo consistentemente apontadas em estudos climáticos, foram reforçadas pelo 5º. Relatório do Painel Intercontinental de Mudanças Climáticas (IPCC), publicado no início do ano, com um consenso de 97% dos cientistas. Mais recentemente, no dia 30 de setembro, um relatório publicado no publicado pela WWF (World Wildlife Fund, em inglês), em parceria com a Sociedade Zoológica de Londres, apontou ainda que, nos últimos 40 anos, 52% da população de animais vertebrados na Terra desapareceu. Ao mesmo tempo, os seres humanos dobraram em quantidade. “Estamos empurrando a biosfera para a sua 6ª. extinção em massa”, alerta Hans-Otto Pörtner, do Instituto Alfred Wegener de Pesquisa Marinha e Polar, em Bremerhaven, Alemanha, e co-autor do capítulo sobre ecossistema do relatório do IPCC publicado nesse ano. Pörtner refere-se às cinco grandes extinções em massa registradas nos últimos 540 milhões de anos, caracterizadas por palentólogos como períodos em que mais de 75% das espécies foram extintas do planeta em um curto intervalo geológico.

“Há 200 anos, a coisas começaram a mudar o suficiente para visivelmente impactar o planeta: a população cresceu, assim como as emissões de CO2”, destaca Zalasiwicz. Segundo ele, o uso de energia cresceu 90 vezes entre 1800 e 2010, e já queimamos cerca de 200 milhões de anos de fósseis, entre carvão, óleo e gás. “Os humanos correspondem a 1/3 de todos os vertebrados da terra. Mas a dominação sem precedentes sobre todos os outros seres vivos, faz dessa a er a humana”, conclui.

Eileen Crist pesquisadora do Departamento de Ciências e Tecnologia na Sociedade, no Virginia Tech, no EUA, desafia a escolha do termo, defendendo que o discurso do Antropoceno deixa de questionar a soberania humana para propor, ao contrário, abordagens tecnológicas que poderiam tornar o domínio humano sustentável. “Ao afirmar a centralidade do homem – tanto como uma força causal quanto como objeto de preocupação – o Antropoceno encolhe o espaço discursivo para desafiar a dominação da biosfera, oferecendo, ao invés disso, um campo técnico-científico para a sua racionalização e um apelo pragmático para nos resignarmos à sua atualidade”, argumenta a pesquidadora em um artigo publicado em 2013.

O Antropoceno, dessa forma, entrelaça uma série de temas na formatação de seu discurso, como, por exemplo, o aumento acelerado da população que chegará a superar os 10 bilhões de habitantes; o crescimento econômico e a cultura de consumo enquanto modelo social dominante; a tecnologia como destino inescapável e, ao mesmo tempo, salvação da vida humana na Terra; e, ainda, o pressuposto de que o impacto humano é natural e contingente da nossa condição de seres providos de inteligência superior. Crist aponta que esse discurso mascara a opção de racionalizar o regime totalitátio do humano no planeta. “Como discurso coeso, ele bloqueia formas alternativas de vida humana na Terra”, indica.

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Relacionalidade

Donna Haraway, professora emérita da Universidade da Califórina em Santa Cruz, EUA, comentou, em participação no Colóquio Os Mil Nomes de Gaia, em setembro, que essa discussão é um dos “modos de buscar palavras que soam muito grandes, porém, não são grandes o suficiente para compreender a continuidade e a precariedade de viver e morrer nessa Terra”. Haraway é também umas das críticas do termo Antropoceno. Segundo ela, o Antropoceno implica um homem individual, que se desenvolve, e desenvolve uma nova paisagem de mundo, estranho a todas as outras formas de vida: uma percepção equivocada de um ser que seria capaz existir sem se relacionar com o resto do planeta. “Devemos compreender que para ser um, devemos ser muitos. Nos tornamos com outros seres”, comenta.

Para Haraway, épreciso, problematizar essa percepção, e endereçar a responsabilidade pelas mudanças, que está justamente no sistema capitalista que criamos. Este sim tem impulsionado a exploração, pelos homens, da Terra: “A história inteira poderia ser Capitaloceno, e não Antropoceno”, diz. Tal percepção, de acordo com a filósofa, pemite-nos resistir ao senso inescapabilidade presente nesse discurso, como Crist mencionou acima. “Estamos cercados pelo perigo de assumir que tudo está acabado, que nada pode acontecer”, diz.

Haraway aponta, entretanto, que é necessário evocar um senso de continuidade (ongoingness,em inglês),a partir de outras possibilidades narrativas e de pensamento.Uma delas, seria o Cthulhuceno, criado pela filósofa. A expressão vem de um conto de H.P.Lovecraft, O chamado de Cthulhu, que fala sobre humanos que têm suas mentes deterioradas quando, em rituais ao deus Cthulhu – uma mistura de homem, dragão e polvo que vive adormecido sob as águas do Pacífico Sul – conseguem vislumbrar uma realidade diferente da que conheciam.  No início da história, o autor norte-americano descreve o seguinte: “A coisa mais misericordiosa do mundo, acho eu, é a incapacidade da mente humana de correlacionar tudo que ela contém”.  A partir desse contexto, Donna Haraway explica que é necessário “desestabilizar mundos de pensamentos, com mundos de pensamentos”. O Cthulhuceno não é sobre adotar uma transcendência, uma ideia de vida ou morte: “trata-se de abraçar a continuidade sinuosa do mundo terreno, no seu passado​​, presente e futuro. Entretanto, tal continuidade implica em assumir que existe um problema muito grande e que ele precisa ser enfrentado. Devemos lamentar o que aconteceu, pois não deveria ter ocorrido. Mas não temos que continuar no mesmo caminho”, sugere.