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Zizek: Podemos vencer as cidades pós-humanas (Outras Palavras)

Em Nova York, constrói-se, agora, uma distopia: não haverá contato social; as maiorias sobreviverão de trabalhos braçais e subalternos; corporações e Estado controlarão os inseridos. Alternativa: incorporar as novas tecnologias ao Comum

Outras Palavras Tecnologia em Disputa

Por Slavoj Žižek – publicado 21/05/2020 às 21:49 – Atualizado 21/05/2020 às 22:06

Por Slavoj Zizek | Tradução de Simone Paz

As funções básicas do Estado de Nova York, muito em breve, poderão ser “reimaginadas” graças à aliança do governador Andrew Cuomo com a Big Tech personificada. Seria este o campo de testes para um futuro distópico sem contato físico?

Parece que a escolha básica que nos resta para lidar com a pandemia se reduz a duas opções: uma é ao estilo de Trump (com uma volta à atividade econômica sob as condições de liberdade de mercado e lucratividade, mesmo que isso traga milhares de mortes a mais); a outra é a que nossa mídia chama de o “jeitinho chinês” (um controle estatal, total e digitalizado, dos indivíduos).

Entretanto, nos EUA, ainda existe uma terceira opção, que vem sendo divulgada pelo governador de Nova York, Andrew Cuomo, e pelo ex-CEO do Google, Eric Schmidt — em conjunto com Michael Bloomberg e Bill Gates e sua esposa Melinda, nos bastidores. Naomi Klein e o The Intercept chamam essa alternativa de Screen New Deal [alusão jocosa ao Green New Deal, que pressupõe uma Virada Sócioambiental. Screen New Deal seria algo como Virada para dentro das Telas] Ele vem com a promessa de manter o indivíduo a salvo das infecções, mantendo todas as liberdades pessoais que interessam aos liberais — mas será que tem chances de funcionar?

Em uma de suas reflexões sobre a morte, o comediante de stand-up Anthony Jeselnik fala sobre sua avó: “Nós achávamos que ela tinha morrido feliz, enquanto dormia. Mas a autópsia revelou uma verdade horrível: ela morreu durante a autópsia”. Esse é o problema da autópsia de Eric Schmidt sobre nossa situação: a autópsia e suas implicações tornam nossa situação muito mais catastrófica do que é para ser.

Cuomo e Schmidt anunciaram um projeto para “reimaginar a realidade pós-Covid do estado de Nova York, com ênfase na integração permanente da tecnologia em todos os aspectos da vida cívica”. Na visão de Klein, isso levará a um “futuro-sem-contato permanente, altamente lucrativo”, no qual não existirá o dinheiro vivo, nem a necessidade de sair de casa para gastá-lo. Todos os serviços e mercadorias possíveis poderão ser encomendados pela internet, entregues por drone, e “compartilhados numa tela, por meio de uma plataforma”. E, para fazer esse futuro funcionar, seria necessário explorar massivamente “trabalhadores anônimos aglomerados em armazéns, data centers, fábricas de moderação de conteúdo, galpões de manufatura de eletrônicos, minas de lítio, fazendas industriais, plantas de processamento de carne, e prisões”. Existem dois aspectos cruciais que chamam a atenção nesta descrição logo de cara.

O primeiro é o paradoxo de que os privilegiados que poderão usufruir de uma vida nos ambientes sem contato serão, também, os mais controlados: toda a vida deles estará nua à verdadeira sede do poder, à combinação do governo com a Big Tech. Está certo que as redes que são a alma de nossa existência estejam nas mãos de empresas privadas como Google, Amazon e Apple? Empresas que, fundidas com agências de segurança estatais, terão a capacidade de censurar e manipular os dados disponíveis para nós ou mesmo nos desconectar do espaço público? Lembre-se de que Schmidt e Cuomo recebem imensos investimentos públicos nessas empresas — então, não deveria o público ter também acesso a elas e poder controlá-las? Em resumo, como propõe Klein, eles não deveriam ser transformados em serviços públicos sem fins lucrativos? Sem um movimento semelhante, a democracia, em qualquer sentido significativo, será de fato abolida, já que o componente básico de nossos bens comuns — o espaço compartilhado de nossa comunicação e interação — estará sob controle privado

O segundo aspecto é que o Screen New Deal intervém na luta de classes num ponto bem específico e preciso. A crise do vírus nos conscientizou completamente do papel crucial daqueles que David Harvey chamou de “nova classe trabalhadora”: cuidadores de todos os tipos, desde enfermeiros até aqueles que entregam comida e outros pacotes, ou os que esvaziam nossas lixeiras, etc. Para nós, que conseguimos nos auto-isolar, esses trabalhadores se tornaram nosso principal contato com outro, em sua forma corpórea, uma fonte de ajuda, mas também de possível contágio. O Screen New Deal não passa de um plano para minimizar o papel visível dessa classe de cuidadores, que deve permanecer não-isolada, praticamente desprotegida, expondo-se ao perigo viral, para que nós, os privilegiados, possamos sobreviver em segurança — alguns até sonham com a possibilidade de que robôs passem a tomar conta dos idosos e lhes façam companhia… Mas esses cuidadores invisíveis podem se rebelar, exigindo maior proteção: na indústria de frigoríficos nos EUA, milhares de trabalhadores tiveram a covid, e dezenas morreram; e coisas semelhantes estão acontecendo na Alemanha. Agora, novas formas de luta de classes vão surgir

Se levarmos esse projeto à sua conclusão hiperbólica, ao final do Screen New Deal existe a ideia de um cérebro conectado, de nossos cérebros compartilhando diretamente experiências em uma Singularidade, uma espécie de autoconsciência coletiva divina. Elon Musk, outro gênio da tecnologia de nossos tempos, recentemente declarou que ele acredita que em questão de 10 anos a linguagem humana estará obsoleta e que, se alguém ainda a utilizar, será “por motivos sentimentais”. Como diretor da Neuralink, ele diz que planeja conectar um dispositivo ao cérebro humano dentro de 12 meses

Esse cenário, quando combinado com a extrapolação do futuro em casa de Naomi Klein, a partir das ambições dos simbiontes de Big Tech de Cuomo, não lembra a situação dos humanos no filme Matrix? Protegidos, fisicamente isolados e sem palavras em nossas bolhas de isolamento, estaremos mais unidos do que nunca, espiritualmente, enquanto os senhores da alta tecnologia lucram e uma multidão de milhões de humanos invisíveis faz o trabalho pesado — uma visão de pesadelo, se é que alguma vez existiu alguma

No Chile, durante os protestos que eclodiram em outubro de 2019, uma pichação num muro dizia: “Outro fim de mundo é possível”. Essa deveria ser nossa resposta para o Screen New Deal: sim, nosso mundo chegou ao fim, mas um futuro-sem-contato não é a única alternativa, outro fim de mundo é possível.

Meet Jibo, the cute social robot that knows the family (New Scientist)

14:00 16 July 2014 by Hal Hodson

It doesn’t just recognise you – it can field your phone calls and chat to you at dinner

IN SUITE 712 of the Eventi Hotel, high above the sticky June bustle of Midtown Manhattan, New York, one of the world’s most advanced consumer robots awaits command.

“Wake up, Jibo,” says Cynthia Breazeal, his creator. The robot’s round head shakes awake. He lets out a tinkling noise, then a yawn. Jibo’s two-part body twists and stretches and his face, with a single digital eye, switches on and turns to look at us. He looks like a Pixar character come to life.

Jibo is the first robot designed to be used by the whole family. He’s not a niche robot with a single purpose, like a Roomba, nor is he a toy. Available for $499 through an Indiegogo crowdfunding campaign that starts this week, Jibo is designed to tap into the social fabric of a household and help out. The first model, which will ship in 2015, will perform simple tasks like taking voice reminders, fielding phone calls and messages – connecting to the family’s phones through Wi-Fi. He will also act as the heart of the home connecting to iPads, TVs and games consoles. More complex skills include automatically identifying the faces in a room and taking pictures on request and reading a story to a child.

Breazeal chats casually to the robot: “How are you doing, Jibo?”

“I’m great, thanks for asking,” he says, cocking his head slightly as his digital eye curves into a grin. Jibo explains all the different things he can do, after a quick dance to Simon and Garfunkel’s 59th Street Bridge Song.

“I would say this is the first social, personal robot,” says Illah Nourbakhsh, a roboticist at Carnegie Mellon University in Pittsburgh. Jibo’s body language and expressions are designed to convey emotional states in the same way humans do, while his sensors and programming are tuned to our presence. Jibo knows when someone enters a room, and can identify who it is if he can see their face or hear their voice. The idea is that Jibo’s social skills help him to fit seamlessly into the household.

Jibo’s body and head movements are complex and smooth enough to convey convincing human-like body language but he cannot move around. For that, he relies on the humans in the household to pick him up – he weighs a mere 2.7 kilos – and move him from place to place. Jibo charges up via wireless pads plugged in around the house, or he can run on batteries for about 30 minutes away from a power source. When he joins the family at the dinner table, for instance.

Jibo turns to face whoever is talking, so an absent family member can use him to video chat as the rest of the family sit around the table. “With Jibo, you feel like you’re really part of the group dynamic,” says Breazeal.

“I think that’s enormous, I love it,” says Ken Goldberg, a roboticist from the University of California in Berkeley. Goldberg works on robots that can move around their environment and manipulate it, more in line with the traditional notion of the home robot. But such tasks are difficult to perfect: the dream of the robot butler is a long way off. “Right now, the most state-of-the-art robot still takes a good 20 minutes to fold a small towel,” Goldberg says.

Breazeal’s research at the MIT Media Lab, along with that of Bilge Mutlu at the University of Wisconsin-Madison, has shown how important it is for robot-human communication that robots can express emotion. “The ability to turn your head around and pay attention to something else has been taken for granted, but it’s huge,” says Mutlu.

Breazeal is also opening Jibo up to developers as a platform on which to build new kinds of apps, such as ones that let the robot place takeaway orders for “the usual” on request, or that control the lighting and heating in a home, or even keep an eye on activity patterns to make sure that senior household members are moving enough.

But socially aware robots raise new ethical questions. Would it be appropriate, for instance, for Jibo to announce that the senior family member he has been watching has fallen down and cannot get up? “We’re going to have a really interesting dilemma about when a robot can violate privacy to save a life,” Nourbakhsh says.

“The big deal with this is its optimisation for sociality,” says Nourbakhsh. “For the first time in history, we humans are going to have complex interactions with machines.”

This article appeared in print under the headline “The first family robot”

In This Papua New Guinea Village, People Use Cell Phones to Call the Dead (New Republic)

JUNE 17, 2014

By 

We often fret that we’re too attached to our smartphones or that we let them wield too much influence over our lives. But our reverence for technology is relative. In the remote Ambonwari society of Papua New Guinea, villagers believe that cell phones are extensions of their human owners and can be used to commune with the departed.

Borut Telban, an associate professor of anthropology at the Slovenian Academy of Sciences and Arts, and Daniela Vavrova, an anthropologist at James Cook University in Australia, spent a year embedded in the remote village of Ambonwari in Papua New Guinea, looking at how the locals incorporate new digital technology into their existing cosmologies. They published an early version of their findings online in the Australian Journal of Anthropology.

“For 60,000 years, they had no influence of Western philosophy, no influence of Eastern or Western religion,” says Telban, who has spent years living and working with the Ambonwari as well as other cultures of Papua New Guinea. “They developed their own philosophy of life.” In the 1950s, a Catholic bishop introduced them to Christianity; in 1994, Australian Charismatics brought their brand of Pentecostalism to the village. The Ambonwari adapted elements of each Christian tradition while maintaining many of their own rituals and social structures.

When the mobile phone network provider Digicel began introducing cell phones to the village in 2007, the Ambonwari enthusiastically embraced the new technology. Even though their service was, and remains, sporadicvillagers travel to the hills of nearby towns to try to get a connection, and can rarely scrape together enough credit for a real conversationthey have found other uses for their phones: as watches, torches, music players, and simply toys. “They love playing with the phones,” said Telban. “They’ll look at the screen endlessly.”

The Ambonwari have also incorporated the new technology into their existing systems of thought. They have long been confident in their ability to talk to the dead, believing they can communicate with the world of spirits in dreams, visions, and trances induced by special rituals. The introduction of mobile phones has opened up new possibilities: The Ambonwari believe they can use them to contact their dead relatives, whose numbers they obtain from healers. And once they reach them, they can ask for anything. “It is a general conviction,” write Telban and Vavrova, “that once people know the phone numbers of their deceased relatives they can ring and ask the spirits to put money in their bank accounts.” I asked Telban if the villagers are discouraged that they never get through to the spirit world; he assured me that they’re not. They might assume the spirits aren’t available. And they ring random numbers so often that occasionally they do reach someone, whose voice they attribute to a spirit.

When their calls don’t go through, they don’t blame shoddy service or wrong numbers; they believe the spirits of the dead can interfere with their connections. Telban recalled one instance when an Ambonwari man called Terence died in the nearby province of Madang. Over the course of the next few weeks, several men attempted to call Madang. When they had trouble getting through, they concluded that Terence’s spirit was getting in the way of the phone line.

Better cell phone service would allow villagers to stay in touch with family members who move to other towns, but the prospect of increased connectivity presents risks, too. Telban is concerned about what would happen if the villagers got Internet connection through their phones. “They have no clue about spam,” he said. “They would be tricked immediately into sending money.”

And mobile phonesa prized possessionhave already proved a source of conflict in this traditionally egalitarian society. “Those few who are in possession of a wireless or mobile phone are constantly watched and expected to provide others with both information and goods,” write Telban and Vavrova. And Digicel has unintentionally incited ill will between villages, which compete to host the cell phone towers.

They haven’t had time to develop telephone etiquette have, either. Back in Slovenia, Telban’s phone rings nonstop. “They really love just to ring me,” he said. He never knows who’s calling, since villagers share the phones, and as soon as he answers, the other person hangs up: They don’t have enough credit for an actual conversation. But Telban doesn’t mind. “They are my friends,” he said. “They’re just saying hello.”

Academic article: http://onlinelibrary.wiley.com/doi/10.1111/taja.12090/abstract

Sobre o exoesqueleto na abertura da Copa do Mundo

JC e-mail 4973, de 16 de junho de 2014

Ciência Hoje On-line: Lance polêmico

Aguardada demonstração de exoesqueleto criado por grupo do brasileiro Miguel Nicolelis recebe pouco destaque na abertura da Copa do Mundo, mas pode ser marco da ciência nacional

Centenas de milhões de telespectadores em todo o mundo. Muito rebuliço na imprensa pela demonstração que faria um brasileiro com deficiência andar com um exoesqueleto robótico. Olhares atentos de uma comunidade científica reticente. Por tudo isso, a demonstração de poucos segundos, realizada em meio a outras atrações da festa de abertura do mundial de futebol, na beira do campo e cortada pela transmissão oficial, merecia um tratamento melhor.

Mesmo assim, a iniciativa liderada pelo brasileiro Miguel Nicolelis, da Universidade Duke, nos Estados Unidos, levou ciência a um dos maiores eventos esportivos do mundo e apontou possibilidades tecnológicas da medicina do futuro – apesar de não ter entregado exatamente o prometido e das críticas pela maneira pouco transparente como foi realizada.

A demonstração do projeto Andar de novo ocorreu pouco antes de a bola rolar na Arena Corinthians para a primeira partida do mundial. Em meio à festa, enquanto a transmissão se dividia entre a chegada da seleção brasileira ao estádio e as papagaiadas do espetáculo, o atleta Juliano Pinto utilizou a mente para comandar o equipamento robótico e chutar de leve a Brazuca, bola oficial do torneio. A proposta inicial era de que o exoesqueleto andasse cerca de 20 metros, o que não aconteceu – na verdade, ele não andou, nem dobrou o joelho ou deslocou seu centro de gravidade de maneira significativa, apenas moveu a perna.

Leia a matéria completa na CH On-line, que tem conteúdo exclusivo atualizado diariamente: http://cienciahoje.uol.com.br/noticias/2014/06/lance-polemico

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JC e-mail 4973, de 16 de junho de 2014

O show do exoesqueleto

Artigo de Roberto Lent publicado em O Globo de 14/6. A prévia publicação nas revistas especializadas é o selo de qualidade do produto científico, como o selo do Inmetro o é para os produtos industriais

Não deve ter sido por acaso que a Fifa reduziu para poucos segundos a exibição do exoesqueleto do cientista Miguel Nicolelis na abertura da Copa do Mundo. Talvez a prudência lhe tenha imposto essa medida.

Em torno desse polêmico episódio, há várias questões a considerar. Primeiro: não é possível aferir a originalidade e o impacto científico e prático da propalada tecnologia de comando cerebral do exoesqueleto sob feedback sensorial eletrônico. A razão é simples: Nicolelis ainda não a publicou em revistas especializadas. Sua produção científica e sua capacidade de trabalho permitem supor que o fará brevemente para a avaliação da comunidade científica da área. Ficaremos aguardando. Mas o fato é que até o momento pouco se pode comentar sobre o experimento da Copa que não sejam especulações.

Segundo: a exibição pública, para milhões de pessoas em todo o mundo, do chute à bola efetuado por um paraplégico vestindo o exoesqueleto é em si uma iniciativa importante para valorizar a ciência perante a sociedade. No entanto, do modo como foi feita, viola um princípio ético básico da divulgação científica – só se deve divulgar ao público leigo o que antes se publica nas revistas especializadas. Elitismo? Falta de espírito democrático? Não, responsabilidade social. A prévia publicação nas revistas especializadas é o selo de qualidade do produto científico, como o selo do Inmetro o é para os produtos industriais, a licença da Anvisa para os medicamentos, o carimbo do Ministério da Agricultura para os produtos agrícolas. Essas revistas, antes de publicar qualquer artigo, submetem-no a uma rigorosa revisão por especialistas. Além disso, os autores têm que apresentar todos os detalhes dos métodos que empregaram e dos resultados que obtiveram. Na abertura da Copa, o show do exoesqueleto representou uma ruptura com esse princípio. Talvez tenha sido isso que a Fifa percebeu a tempo.

Mas há outras questões em jogo: uma delas é o contraste entre o financiamento que o projeto Nicolelis obteve e o que conseguem obter os pesquisadores brasileiros de nossas universidades, com todo o crescimento dos recursos conseguido nos últimos anos. A Finep, agência de financiamento do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação, colocou R$ 33 milhões no exoesqueleto. Nada errado nisso: trata-se de uma agência de inovação, cuja missão é justamente investir em projetos ousados, assumindo os riscos, que de resto são inerentes a todos os projetos científicos. Mas é inevitável comparar: o edital recentemente lançado por outras agências do mesmo ministério para a criação de Institutos Nacionais de Ciência e Tecnologia anunciou que proverá no máximo R$ 10 milhões para cada um dos grupos que vencerem uma acirrada concorrência. Como esses R$ 10 milhões se destinam a grupos que associam vários pesquisadores independentes, cada pesquisador contará com algo em torno de R$ 1 milhão para o seu projeto.

Três a um foi a vitória da seleção brasileira; 33 a 1 foi a vitória de Nicolelis sobre a comunidade científica brasileira.

Roberto Lent é professor do Instituto de Ciências Biomédicas da Universidade Federal do Rio de Janeiro

(O Globo)
http://oglobo.globo.com/opiniao/o-show-do-exoesqueleto-12856030#ixzz34nrMrffx

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JC e-mail 4973, de 16 de junho de 2014

Baixaram a bola da Ciência Brasileira

Artigo de Marcelo Träsel publicado no Zero Hora

Uma das atrações mais esperadas na abertura da Copa do Mundo de 2014 era a apresentação do exoesqueleto desenvolvido pelo cientista brasileiro Miguel Nicolelis, que permitiria a um paraplégico dar o chute inicial do primeiro jogo. Ele de fato fez um paraplégico se levantar e dar um pontapé numa bola de futebol no Itaquerão. Mas quase ninguém viu esse marco da ciência _ pelo menos, não ao vivo, porque a Rede Globo o exibiu por apenas alguns segundos, em meia tela, para mostrar o ônibus da Seleção Brasileira chegando ao estádio no mesmo momento.

Nicolelis havia dado a impressão, em suas entrevistas, de que o tal chute ocorreria no início do jogo, não que seria apenas um acontecimento paralelo à beira do gramado enquanto J.Lo, Pitbull e Claudia Leitte erravam o playback do tema da Copa do Mundo. Existe a possibilidade de que ele tenha recebido promessas e estas tenham sido descumpridas. Também houve boatos de que a Fifa teria impedido o chute no centro do campo por medo de o peso do aparelho prejudicar o gramado.

De qualquer forma, a ausência de cerimônia com que esse enorme passo do engenho brasileiro foi tratado, primeiro, pela organização da festa de abertura e, depois, pela principal emissora do país, simboliza com perfeição o espaço que damos à ciência no imaginário nacional. Até 2012, o Brasil investia cerca de 1,3% do PIB em pesquisa e desenvolvimento de tecnologia, bastante menos do que a média dos países da OCDE, que era de 2,3%. Conforme estudo da ONG Battelle, em 2014 o país deve investir os mesmos 1,3% de 2012, bem mais do que os 0,6% da Argentina, mas ainda longe dos 3,6% da Coreia do Sul, ou dos 2% da China.

As cerimônias de abertura da Copa, das Olímpiadas e outros eventos do gênero servem não apenas para mostrar um país, mas também para projetar um ideal, o desejo de uma sociedade para o futuro. O Brasil, na Copa de 2014, poderia ter projetado se tornar também uma potência mundial em pesquisa e produção de tecnologia, mas preferiu continuar sendo apenas uma potência esportiva e cultural _ o país do futebol e do Carnaval.

Marcelo Träsel é pesquisador e professor de comunicação na PUCRS.

(Zero Hora)
http://wp.clicrbs.com.br/opiniaozh/2014/06/16/artigo-baixaram-a-bola-da-ciencia-brasileira/?topo=13,1,1,,,13

“Exoesqueleto é um grande ganho”, diz jovem do chute inaugural da Copa (Zero Hora)

JC e-mail 4974, de 17 de junho de 2014

Paraplégico rebate contestações ao projeto do neurocientista Miguel Nicolelis

Por três segundos na última quinta-feira, Juliano Alves Pinto, 29 anos, apresentou às câmeras um projeto de R$ 33 milhões: o exoesqueleto que permitiu o jovem paraplégico dar o pontapé inaugural da Copa do Mundo. Se ao projeto do neurocientista Miguel Nicolelis não faltaram críticas, o paciente não economiza elogios ao experimento.
– Aqueles que criticam são pessoas sem informação sobre o projeto – defendeu Juliano na manhã desta segunda-feira em entrevista a Zero Hora.

Questionamentos ao experimento científico se baseiam na dimensão da demonstração frente à grandeza da promessa, classificada quase como um milagre: munido de uma veste robótica, um paraplégico levantaria de uma cadeira de rodas, caminharia até o gramado do Itaquerão e chutaria uma bola acionando apenas a força do pensamento. Não foi o que ocorreu.
– O tempo foi muito curto para que isso acontecesse – constatou o jovem.

O uso do exoesqueleto representou mais um aprendizado na vida do morador de Gália – cidade de 7 mil habitantes a cerca de 400 quilômetros da capital paulista. Há 7 anos e meio, ele perdeu o movimento das pernas ao fraturar a coluna em um acidente de trânsito – no qual perdeu um irmão de 27 anos. Sob a nova condição em cima de uma cadeira de rodas, teve de readquirir as habilidades comprometidas:

– Minha vida mudou. Antes eu conseguia fazer as minhas coisas e, de repente, precisava das pessoas para me ajudar. Tive de reaprender a fazer tudo sozinho. Hoje, levo uma vida praticamente independente, dirijo, pratico esportes, me troco, tomo banho.

Passados os segundos de fama e a repercussão posterior à abertura do Mundial – na sua cidade, foi recebido com carreata -, Juliano retoma a rotina habitual. Ainda nesta semana, participa de um campeonato que representa uma das suas motivações: o atletismo. Para o futuro, ele busca ajuda para a compra de uma nova cadeira de corrida para participar de torneios e, quem sabe, acumular pontos para se tornar profissional. Paralimpíadas em mente?

– Sonho sim. Não perco as esperanças, nunca – diz o galiense.

Confira os principais trechos da entrevista que o jovem concedeu a Zero Hora, por telefone, nesta segunda-feira:

Como ocorreu a seleção para participar do projeto Andar de Novo e da abertura da Copa?
Sou paciente da AACD (Associação de Assistência à Criança Deficiente) de São Paulo, onde o projeto já estava acontecendo e onde estavam sendo selecionados alguns pacientes. Há uns seis meses, surgiu o convite para mim e eu aceitei. Ao todo, foram selecionados 10 pacientes, oito continuaram e três foram pré-selecionados para fazer a demonstração na Copa, mas todos os outros estavam preparados para usar o exoesqueleto. Depois veio a notícia, faltando uns quatro dias para o evento, que eu fui o escolhido.

Qual foi a sensação quando você recebeu a notícia?
Fiquei muito feliz não só por estar fazendo parte do projeto e representando todos eles, mas representando todos que também têm uma deficiência como eu e sonham, um dia, ter um bem-estar melhor para a sua vida. Creio que toda essa parte da ciência vem para nos ajudar, é um bem-estar a mais para a pessoa.

Como foi a preparação e o treinamento para o projeto?
Estávamos cercados de grandes profissionais não só na parte da ciência, mas também fisiatras, fisioterapeutas. Deu tudo certo. Eu saía de Gália de madrugada, chegava em São Paulo às 8h, ficava o dia todo em treinamento e voltava para a casa.

Por que você foi o escolhido?
Eu estava mais preparado para o dia da Copa. Não que os outros não estivessem, mas eu me enquadrava melhor no perfil que eles procuravam.

Qual foi a sensação ao vestir o exoesqueleto?
Posso dizer por mim e acho que pelos outros pacientes que também tiveram a oportunidade de andar no exoesqueleto que é muito bom. Você está em uma cadeira de rodas e, por mais que ela permita que você se locomova normalmente mesmo sem ter a mobilidade das pernas, você poder trocar alguns passos novamente, é um grande ganho. No meu caso, depois de sete anos e meio, o exoesqueleto trouxe isso de volta. É algo muito satisfatório, de muita alegria, você novamente poder fazer algo que perdeu lá atrás.

Foi como caminhar novamente?
A sensação, sim. Creio que isso depende, também, da gente começar a se adaptar mais… mas, poxa, é uma sensação bem real, mesmo.

Pelo sua sensação, será possível, no futuro, trocar a cadeira de rodas pelo exoesqueleto?
Creio que sim. Durante esse pouco tempo que acompanhei o doutor Nicolelis e sua equipe, percebi que eles têm um grande potencial para que isso venha a acontecer. Mesmo que haja críticas, que as pessoas não acreditem, estando ali e presenciando o projeto, creio que isso será possível, sim.

Inicialmente, a expectativa era que você levantaria da cadeira de rodas, caminharia até a bola e a chutaria. Não foi o que aconteceu. Como você avalia o resultado da experiência?
Como o próprio Miguel Nicolelis abordou, o tempo foi muito curto para que isso viesse a acontecer. A gente se enquadrou dentro de um roteiro da Fifa. Muita gente questionou por que fizemos o que fizemos na abertura também nos ensaios, mas foi porque o tempo era aquele. Para a gente fazer tudo isso(levantar, caminhar e chutar), teríamos que ter um tempo maior, não tinha como. É como o doutor Nicolelis falou, não existe na história uma demonstração da parte robótica dessa maneira em 29 segundos. Conseguimos fazer em 16 segundos, e menos apareceu na mídia. Então, a gente se enquadrou no padrão que nos passaram, fizemos aquilo para obedecer o tempo que chegou até nós. Não que a gente tenha fugido do que foi dito, mas nos adequamos dentro do tempo que tínhamos.

Então pode-se dizer que foi um sucesso?
Com certeza. Foi um marco, algo que entrou para a história.

Apesar da ampla divulgação do projeto, o chute ganhou apenas três segundos na televisão. Você ficou chateado com a pouca visibilidade dada no momento?
Eu não tinha conhecimento que havia sido transmitido em tão pouco tempo. Quando comecei a acompanhar vi que, realmente, foi pouco mesmo. Mas, depois, foi amplamente abordado, a mídia trouxe bastante o assunto, mas acho que poderia, sim, ter se dado um tempo maior para a apresentação, ter focado mais. Não sei se posso dizer que fiquei triste, mas posso dizer que gostaria que tivesse sido dado um tempo maior.

Críticos ao neurocientista Miguel Nicolelis disseram que o projeto foi um fracasso. O que você tem a dizer a eles?
Aqueles que criticam são pessoas sem informação sobre o projeto. Eles se baseiam no que pensam, mas eu creio que, se essas pessoas estivessem vivenciando o que os pacientes viveram durante todo esse tempo, tenho certeza que os pensamentos e argumentos seriam diferentes. Não tem como você falar de uma coisa que você não conhece, como dizer que o produto é bom se você não conheceu e não sabe detalhes. Então, eu creio que essas pessoas não têm informações corretas acerca do que está acontecendo.

O que mudou na sua rotina desde quinta-feira passada?
Estou procurando viver uma rotina normal. Agora, vou voltar a treinar e quero levar a minha rotina normal. O que mudou foi aparecer bastante na mídia, foi um assunto que ficou bastante visto, mas acho que isso não tem me atrapalhado. O que eu quero fazer é deixar as coisas bem claras, não me esconder, e estar disposto a esclarecer o projeto também.

Quais são seus planos?
O projeto continua, e estou buscando a minha classificação nos jogos de atletismo que participo. Tenho o sonho de conseguir um equipamento melhor, uma cadeira de corrida, para disputar e conseguir um índice para um nacional ou até um mundial. No Brasil não se acha, apenas com representantes, e o preço vai lá em cima porque é uma cadeira importada.

(Débora Ely / Zero Hora)
http://zh.clicrbs.com.br/rs/noticias/planeta-ciencia/noticia/2014/06/exoesqueleto-e-um-grande-ganho-diz-jovem-do-chute-inaugural-da-copa-4528138.html

Cientistas lançam robô que pode fazer cirurgias em fetos ainda no útero (O Globo)

JC e-mail 4964, de 02 de junho de 2014

Máquina seria capaz de prevenir doenças congênitas

Cientistas britânicos lançaram nesta semana um pequeno robô, capaz de operar fetos ainda no útero das mães. A máquina, que custou cerca de R$ 30 milhões, pode revolucionar o tratamento de más formações congênitas.

O minúsculo aparelho é capaz de fornecer imagens em 3D dos bebês imersos na placenta. Com a visão do “paciente”, o robô começa as intervenções médicas, controladas por uma equipe de especialistas que ficam nos bastidores. A invenção poderia, por exemplo, fazer cirurgias ou até implantar células-tronco em órgãos com deformações da criança.

O projeto é coordenado por engenheiros da University College London (UCL) e Universidade Católica da Lovaina, na Bélgica. De acordo com o líder da pesquisa, Sebastien Ourselin, o máquina evitará riscos tanto às mães quanto aos bebês.

– O objetivo é criar tecnologias cirúrgicas menos invasivas para tratar uma ampla gama de doenças no útero, com muito menos risco para ambos – disse Ourselin ao The Guardian.

O primeiro alvo em vista dos médicos é o tratamento de casos mais graves de espinha bífida, má formação da espinha dorsal que pode atinge um entre cada mil fetos. Ela ocorre quando a coluna não é plenamente desenvolvida, dando margem para que líquido amniótico penetre e leve consigo germes que poderiam atingir o cérebro e prejudicar o crescimento da criança. A intenção é que o novo robô possa fechar esses espaços na espinha, prevenindo a doença.

No entanto, cientistas alertam que operações deste tipo têm elevado risco cirúrgico, com fortes chances de sequelas nas mães. Intervenções médicas em fetos só podem ser realizadas após, pelo menos, 26 semanas de gestação. O procedimento é praticamente impossível atualmente.

O robô é composto por uma sonda muito fina e altamente flexível. A cabeça do equipamento teria um fio equipado com uma pequena câmera que iria usar pulsos de laser e ultra-som detecção – uma combinação conhecida como imagens foto-acústica – para gerar uma fotografia 3D no interior do útero. Estas imagens, então, seriam utilizadas pelos cirurgiões para orientar a sonda para a sua meta: a lacuna na coluna do feto.

(O Globo com Agências)
http://oglobo.globo.com/sociedade/saude/cientistas-lancam-robo-que-pode-fazer-cirurgias-em-fetos-ainda-no-utero-12674796#ixzz33UfgLb9W

Esqueleto-robô da Copa usará técnica já criticada por criador (Folha de S.Paulo)

JC e-mail 4923, de 31 de março de 2014

Cientista Miguel Nicolelis muda método para fazer criança paraplégica dar chute inicial na competição

Na abertura da Copa do Mundo do Brasil, uma criança com lesão medular usando um exoesqueleto dará o pontapé inicial da competição. A demonstração pública será o primeiro resultado do projeto “Andar de Novo”, liderado pelo neurocientista brasileiro Miguel Nicolelis. Mas uma recente mudança na maneira como serão captados os sinais cerebrais que controlarão o exoesqueleto traz dúvidas sobre os avanços do projeto no campo da neurociência.

Em sua carreira, Nicolelis sempre fez uma defesa intransigente do implante de eletrodos dentro do cérebro para captar a atividade simultânea de neurônios individuais. Era crítico de métodos não invasivos, como a eletroencefalografia (EEG) –técnica desenvolvida no começo do século passado que usa eletrodos colocados no couro cabeludo para obter tais registros.

Até pelo menos maio do ano passado, Nicolelis ainda dava declarações públicas sobre o desenvolvimento de eletrodos para serem implantados. Mas a partir de outubro de 2013, passou a dizer que usaria sinais obtidos por EEG. Críticas a essa técnica estão em seu livro, em artigos e já rendeu até embates públicos.

Em artigo publicado em 2008 na revista “Scientific American Brasil” e assinado com John Chapin, Nicolelis diz: “Os sinais de EEG, no entanto, não podem ser usados diretamente em próteses de membros, pois mostram a atividade elétrica média de populações amplas de neurônios. É difícil extrair desses sinais as pequeníssimas variações necessárias para codificar movimentos precisos dos braços ou das mãos.”

Em um debate da Associação Americana para o Avanço da Ciência de 2013, o brasileiro dirigiu provocações a Todd Coleman, da Universidade da Califórnia em San Diego, que pesquisa a EEG para controlar próteses. Na ocasião, Nicolelis disse que “haverá aplicações de implantes invasivos porque eles são muito melhores do que dispositivos de superfície”.

Segundo Márcio Dutra Moraes, neurocientista da UFMG, a mudança de metodologia é uma modificação “conceitual em como abordar a questão”. Ele aponta que isso ocorreu não porque a EEG é melhor, mas porque a proposta original era “estupidamente mais complexa” e o uso da EEG simplifica muito as coisas, ainda que não traga nenhum avanço substancial. Segundo Moraes, a mudança “certamente se deu pela impossibilidade de resolver de forma satisfatória e ética o projeto inicial dentro do limite de tempo imposto pela Copa”.

Segundo um cientista com experiência internacional que não quis se identificar, o projeto atual, como será apresentado na Copa, não justificaria os R$ 33 milhões investidos pelo governo.

Edward Tehovnik, pesquisador do Instituto do Cérebro da UFRN, chegou a trabalhar com Nicolelis, mas rompeu com o cientista, que o demitiu. Ele questiona quanto da demonstração de junho será controlada pelo exoesqueleto e quanto será controlada pelo cérebro da criança.

“Minha análise, baseada nos dados publicados, sugere que menos de 1% do sinal virá do cérebro da criança. Os outros 99% virão do robô”. E ele pergunta: “Será mesmo a criança paralisada que vai chutar a bola?”.

Sergio Neuenschwander, professor titular da UFRN, diz que a opção pelo EEG é uma mudança muito profunda no projeto original. Ele diz que é possível usar sinais de EEG para dar comandos ao robô, mas isso é diferente de obter o que seria o código neural de andar, sentar, chutar etc.

“O fato de ele ter optado por uma mudança de técnica mostra o tamanho do desafio pela frente.”

(Fernando Tadeu Moraes/Folha de S.Paulo)
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cienciasaude/158644-esqueleto-robo-da-copa-usara-tecnica-ja-criticada-por-criador.shtml

Cientistas criticam esqueleto-robô a ser exibido na Copa (Folha de S.Paulo)

JC e-mail 4896, de 17 de fevereiro de 2014

Interface não teria informação cerebral suficiente para fazer deficiente controlar estrutura que o permita andar

Pesquisadores que estudam a transmissão de informação do cérebro para os músculos estão questionando a promessa do neurocientista brasileiro Miguel Nicolelis, que anunciou que fará um jovem com lesão de medula espinhal dar o pontapé inicial da Copa do Mundo.

Em uma ilustração promocional do programa “Andar de Novo”, liderado por Nicolelis, uma mulher vestindo uma armadura robótica aparece levantando-se de uma cadeira de rodas, caminhando até a bola e chutando-a.

home_noticias_2013_05Um cientista que chegou a trabalhar com Nicolelis no IINN (Instituto Internacional de Neurociências de Natal), porém, diz que essa cena, caso se concretize, é mais bem descrita como um robô controlando os movimentos de uma pessoa do que o inverso.

“Essa demonstração é prematura e, na melhor das hipóteses, será só uma propaganda daquilo que ele espera que aconteça um dia”, diz Edward Tehovnik, americano que deixou o IINN após uma cisão interna em 2011.

Hoje professor na UFRN (Universidade Federal do Rio Grande do Norte), ele diz que Nicolelis ainda não publicou estudos suficientes para mostrar que sua técnica está pronta para reabilitar pessoas com problemas neuromotores. “Eu não digo que isso jamais acontecerá, mas a esta altura é prematuro”, diz.

BITS POR SEGUNDO
Segundo artigos publicados recentemente por Tehovnik, nenhum grupo de pesquisa consegue ainda extrair uma quantidade de informação no cérebro com velocidade suficiente para controlar movimentos complexos.

Segundo o pesquisador, com uma taxa menor de “bits” de informação por segundo, uma interface que conecte um cérebro a uma máquina já é capaz de tarefas simples, como ligar/desligar um aparelho, mas não conseguiria controlar uma perna eletromecânica com precisão.

“Não dá para obter nada que se pareça com um ser humano andando na rua”, diz Tehovnik. Segundo o cientista, o campo de pesquisa das interfaces cérebro-máquina foi “corrompido” pela oferta de dinheiro para os grupos de pesquisa, que hoje estariam mais preocupados em levantar verbas do que em solucionar problemas científicos que ainda se apresentam como barreiras à sua evolução.

Para ele, demonstrações públicas de uma tecnologia tão incipiente alimentam falsas expectativas em pessoas paralíticas. “Acho que isso deveria estar restrito ao laboratório nesse ponto”, diz. Tehovnik explica pormenores técnicos de sua argumentação em um artigo de opinião na revista “Mente&Cérebro”.

Outros cientistas que trabalham na linha de pesquisa de Tehovnik são menos contundentes na crítica a Nicolelis, mas também veem um excesso de entusiasmo.

Michael Graziano, da Universidade de Princeton, diz ver excesso de ênfase na engenharia dos projetos, em detrimento das questões de ciência básica. “Dizer que dentro de dez anos resolveremos esses problemas soa muito implausível para mim.”

(Rafael Garcia/Folha de S.Paulo)
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cienciasaude/152230-cientistas-criticam-esqueleto-robo-a-ser-exibido-na-copa.shtml