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>Metáfora religiosa ajuda a entender a ciência? Bóson de Higgs

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Em busca da “Partícula de Deus”

Redação do Site Inovação Tecnológica – 02/04/2007

Atlas era um dos titãs da mitologia grega, condenado para sempre a sustentar os céus sobre os ombros. Aqui, Atlas é um dos quatro gigantescos detectores que farão parte do maior acelerador de partículas do mundo, o LHC, que está em fase adiantada de testes e deverá entrar em operação nos próximos meses.

LHC é uma sigla para “Large Hadron Collider”, ou gigantesco colisor de prótons. Parece difícil exagerar as grandezas desse laboratório que está sendo construído a 100 metros de profundidade, na fronteira entre a França e a Suíça. A estrutura completa tem a forma de um anel, construída ao longo de um túnel com 27 quilômetros de circunferência.

As partículas são aceleradas por campos magnéticos ao longo dessa órbita de 27 Km, até atingir altíssimos níveis de energia. Mais especificamente, 7 trilhões de volts. Em quatro pontos do anel, sob temperaturas apenas levemente superiores ao zero absoluto, as partículas se chocam, produzindo uma chuva de outras partículas, recriando um ambiente muito parecido com as condições existentes instantes depois do Big Bang.

Nesses quatro pontos estão localizados quatro detectores. O Atlas, mostrado na foto nas suas etapas finais de montagem, é um deles. O Atlas, assim como o segundo detector, o CMS (“Compact Muon Detector”), é um detector genérico, capaz de detectar qualquer tipo de partícula, inclusive partículas ainda desconhecidas ou não previstas pela teoria. Já o LHCb e o ALICE são detectores “dedicados”, construídos para o estudo de fenômenos físicos específicos.

Bóson de Higgs

Quando os prótons se chocam no centro dos detectores as partículas geradas espalham-se em todas as direções. Para capturá-las, o Atlas e o CMS possuem inúmeras camadas de sensores superpostas, que deverão verificar as propriedades dessas partículas, medir suas energias e descobrir a rota que elas seguem.

O maior interesse dos cientistas é descobrir o Bóson de Higgs, a única peça que falta para montar o quebra-cabeças que explicaria a “materialidade” do nosso universo. Por muito tempo se acreditou que os átomos fossem a unidade indivisível da matéria. Depois, os cientistas descobriram que o próprio átomo era resultado da interação de partículas ainda mais fundamentais. E eles foram descobrindo essas partículas uma a uma. Entre quarks e léptons, férmions e bósons, são 16 partículas fundamentais: 12 partículas de matéria e 4 partículas portadoras de força.

A Partícula de Deus

O problema é que, quando consideradas individualmente, nenhuma dessas partículas tem massa. Ou seja, depois de todos os avanços científicos, ainda não sabemos o que dá “materialidade” ao nosso mundo. O Modelo Padrão, a teoria básica da Física que explica a interação de todas as partículas subatômicas, coloca todas as fichas no Bóson de Higgs, a partícula fundamental que explicaria como a massa se expressa nesse mar de energias. É por isso que os cientistas a chamam de “Partícula de Deus”.

O Modelo Padrão tem um enorme poder explicativo. Toda a nossa ciência e a nossa tecnologia foram criadas a partir dele. Mas os cientistas sabem de suas deficiências. Essa teoria cobre apenas o que chamamos de “matéria ordinária”, essa matéria da qual somos feitos e que pode ser detectada por nossos sentidos.

Mas, se essa teoria não explica porque temos massa, fica claro que o Modelo Padrão consegue dar boas respostas sobre como “a coisa funciona”, mas ainda se cala quando a pergunta é “o que é a coisa”. O Modelo Padrão também não explica a gravidade. E não pretende dar conta dos restantes 95% do nosso universo, presumivelmente preenchidos por outras duas “coisas” que não sabemos o que são: a energia escura e a matéria escura.

É por isso que se coloca tanta fé na Partícula de Deus. Ela poderia explicar a massa de todas as demais partículas. O próprio Bóson de Higgs seria algo como um campo de energia uniforme. Ao contrário da gravidade, que é mais forte onde há mais massa, esse campo energético de Higgs seria constante. Desta forma, ele poderia ser a fonte não apenas da massa da matéria ordinária, mas a fonte da própria energia escura.

Em dois ou três anos saberemos se a teoria está correta ou não. Ou, talvez, nos depararemos com um mundo todo novo, que exigirá novas teorias, novos equipamentos e novas descobertas.

>Rumo a uma pedagogia da incerteza: Keats e a "negative capability"

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Negative capability

From Wikipedia (15 mar 2010)

Negative capability is a theory of the poet John Keats describing the capacity for accepting uncertainty and the unresolved.

Theory

Keats’ theory of “negative capability” was expressed in his letter to his brother dated Sunday, 21 December 1817. He says [1]

I had not a dispute but a disquisition with Dilke, on various subjects; several things dovetailed in my mind, & at once it struck me, what quality went to form a Man of Achievement especially in literature & which Shakespeare possessed so enormously – I mean Negative Capability, that is when man is capable of being in uncertainties, Mysteries, doubts without any irritable reaching after fact & reason.

Keats believed that great people (especially poets) have the ability to accept that not everything can be resolved. Keats, as a Romantic, believed that the truths found in the imagination access holy authority. Such authority cannot otherwise be understood, and thus he writes of “uncertainties.” This “being in uncertaint[y]” is a place between the mundane, ready reality and the multiple potentials of a more fully understood existence. It relates to his metaphor of the Mansion of Many Apartments.

It could be argued that Keats explored this idea in several of his poems:
La Belle Dame sans Merci: A Ballad (1819)
Ode to a Nightingale (1819)
The Fall of Hyperion: A Dream (1819)
Ode on a Grecian Urn (1819)

Negative capability is a state of intentional open-mindedness paralleled in the literary and philosophic stances of other writers. In the 1930s, the American philosopher John Dewey cited Keatsian negative capability as having influenced his own philosophical pragmatism, and said of Keats’ letter that it “contains more of the psychology of productive thought than many treatises.” [2] [3] Nathan Scott, in his book Negative capability; studies in the new literature and the religious situation [4], notes that negative capability has been compared to Heidegger’s concept of Gelassenheit, “the spirit of disponibilité before What-Is which permits us simply to let things be in whatever may be their uncertainty and their mystery.” Walter Jackson Bate, Keats’s biographer, explored the approach in detail in his 1968 work Negative Capability: The Intuitive Approach in Keats.

Author Philip Pullman excerpts from Keats’s letter and prominently incorporates the concept in his fantasy novel The Subtle Knife.

Notes
1. Romanticism: an anthology, By Duncan Wu, Duncan Wu Edition: 3, illustrated Published by Blackwell, 2005 p.1351
2. Dewey, John. Art as Experience. New York: Penguin Perigree (2005):33-4.
3. Kestenbaum, Victor. The Grace and the Severity of the Ideal: John Dewey and the Transcendent. Chicago: University of Chicago Press (2002): 225.
4. Scott. Negative capability; studies in the new literature and the religious situation. Yale University Press (New Haven), 1969

>Marcelo Gleiser: Criação imperfeita (Folha Mais!)

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A noção de que a natureza pode ser decifrada pelo reducionismo precisa ser abolida.

14 março 2010

Desde tempos imemoriais, ao se deparar com a imensa complexidade da natureza, o homem buscou nela padrões repetitivos, algum tipo de ordem. Isso faz muito sentido. Afinal, ao olharmos para os céus, vemos que existem padrões organizados, movimentos periódicos que se repetem, definindo ciclos naturais aos quais estamos profundamente ligados: o nascer e o pôr do Sol, as fases da Lua, as estações do ano, as órbitas planetárias.

Com Pitágoras, 2.500 anos atrás, a busca por uma ordem natural das coisas foi transformada numa busca por uma ordem matemática: os padrões que vemos na natureza refletem a matemática da criação. Cabe ao filósofo desvendar esses padrões, revelando assim os segredos do mundo.

Ademais, como o mundo é obra de um arquiteto universal (não exatamente o Deus judaico-cristão, mas uma divindade criadora mesmo assim), desvendar os segredos do mundo equivale a desvendar a “mente de Deus”. Escrevi recentemente sobre como essa metáfora permanece viva ainda hoje e é usada por físicos como Stephen Hawking e muitos outros.

Essa busca por uma ordem matemática da natureza rendeu -e continua a render- muitos frutos. Nada mais justo do que buscar uma ordem oculta que explica a complexidade do mundo. Essa abordagem é o cerne do reducionismo, um método de estudo baseado na ideia de que a compreensão do todo pode ser alcançada através do estudo das suas várias partes.

Os resultados dessa ordem são expressos através de leis, que chamamos de leis da natureza. As leis são a expressão máxima da ordem natural. Na realidade, as coisas não são tão simples. Apesar da sua óbvia utilidade, o reducionismo tem suas limitações. Existem certas questões, ou melhor, certos sistemas, que não podem ser compreendidos a partir de suas partes. O clima é um deles; o funcionamento da mente humana é outro.

Os processos bioquímicos que definem os seres vivos não podem ser compreendidos a partir de leis simples, ou usando que moléculas são formadas de átomos. Essencialmente, em sistemas complexos, o todo não pode ser reduzido às suas partes.

Comportamentos imprevisíveis emergem das inúmeras interações entre os elementos do sistema. Por exemplo, a função de moléculas com muitos átomos, como as proteínas, depende de como elas se “dobram”, isto é, de sua configuração espacial. O funcionamento do cérebro não pode ser deduzido a partir do funcionamento de 100 bilhões de neurônios.

Sistemas complexos precisam de leis diferentes, que descrevem comportamentos resultantes da cooperação de muitas partes. A noção de que a natureza é perfeita e pode ser decifrada pela aplicação sistemática do método reducionista precisa ser abolida. Muito mais de acordo com as descobertas da ciência moderna é que devemos adotar uma abordagem múltipla, e que junto ao reducionismo precisamos utilizar outros métodos para lidar com sistemas mais complexos. Claro, tudo ainda dentro dos parâmetros das ciências naturais, mas aceitando que a natureza é imperfeita e que a ordem que tanto procuramos é, na verdade, uma expressão da ordem que buscamos em nós mesmos.

É bom lembrar que a ciência cria modelos que descrevem a realidade; esses modelos não são a realidade, só nossas representações dela. As “verdades” que tanto admiramos são aproximações do que de fato ocorre.

As simetrias jamais são exatas. O surpreendente na natureza não é a sua perfeição, mas o fato de a matéria, após bilhões de anos, ter evoluído a ponto de criar entidades capazes de se questionarem sobre a sua existência.

MARCELO GLEISER é professor de física teórica no Dartmouth College, em Hanover (EUA) e autor do livro “A Criação Imperfeita”

>Biocomunicação

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Da apresentação do livro Biocommunication and Natural Genome Editing, de Günther Witzany (Springer, 2010):

Biocommunication occurs on three levels (A) intraorganismic, i.e. intra- and intercellular, (B) interorganismic, between the same or related species and (C) transorganismic, between organisms which are not related. The biocommunicative approach demonstrates both that cells, tissues, organs and organisms coordinate and organize by communication processes and genetic nucleotide sequence order in cellular and non-cellular genomes is structured language-like, i.e. follow combinatorial (syntactic), context-sensitive (pragmatic) and content-specific (semantic) rules. Without sign-mediated interactions no vital functions within and between organisms can be coordinated. Exactly this feature is absent in non-living matter.

Additionally the biocommunicative approach investigates natural genome editing competences of viruses. Natural genome editing from a biocommunicative perspective is competent agent-driven generation and integration of meaningful nucleotide sequences into pre-existing genomic content arrangements and the ability to (re)combine and (re)regulate them according to context-dependent (i.e. adaptational) purposes of the host organism.

>Duelo de Titãs

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O que é rebelde à explicação não é próprio, como tal, para servir de explicação.”
Claude Lévi-Strauss, Totémisme
Mas se você diz: ‘Como posso saber o que ele quer dizer, se eu não vejo nada além dos sinais que ele fornece?’, então eu digo: ‘Como pode ele saber o que ele quer dizer, se ele não possui nada além dos sinais igualmente?
Wittgenstein, Philosophical Investigations, section 504