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Brazil Is the World’s Most Dangerous Country to Be an Environmentalist (Bloomberg)

Businessweek

April 17, 2014

The Tijuca forest near Complexo do Alemao, a group of favelas on the outskirts of Rio de Janeiro, Brazil on April 24, 2013

Photograph by Dado Galdieri/Bloomberg. The Tijuca forest near Complexo do Alemao, a group of favelas on the outskirts of Rio de Janeiro, Brazil on April 24, 2013

Taking a stand to protect the environment in a developing country can be a matter of life and death. According to a new report by Global Witness, a London-based watchdog organization, at least 908 environmentalists were killed in action from 2002 to 2013.

The risks seem to be increasing. “Three times as many people were killed in 2012 than 10 years before,” the report notes. Those 147 deaths in 2012—the deadliest year for environmental activists to date—were “mostly assassinations of specific individuals or extrajudicial killings in the context of demonstration and protest actions.” The most significant sources of conflict were “opposition to land-grabbing and unfair land ownership, large-scale mining operations, deforestation, illegal logging, and hydroelectric projects.” Violence also arose during protests over water pollution, toxic waste disposal, and drainage of wetlands.

The most deadly country in which to be an environmentalist, in absolute numbers, was Brazil, according to a report. Over the course of a decade, at least 448 activists have been killed in Brazil. Many of them were involved in campaigns to defend local people’s land rights and to oppose illegal logging and mining activities.

Meanwhile, 109 environmental campaigners were killed in Honduras over the past 10 years, making it by far the deadliest country per capita. Sixty-seven were killed in the Philippines; 58 in Peru; and 52 in Columbia. “Competition for access to natural resources is intensifying,” the report notes. “At the same time, more and more ordinary people are finding themselves on the frontline of the battle to defend their environment.”

The number of journalists killed worldwide on assignment is also increasing. In 2013, 70 journalists were killed in the field, according to the Committee to Protect Journalists. The most deadly country in which to be a journalist was Syria, followed by Iraq and Egypt.

Sua flecha é a palavra (Boletim da UFMG)

Nº 1845 – Ano 40
18.11.2013

Bárbara Pansardi

“Pra quem não me conhece, sou Davi Kopenawa, filho da Amazônia, que vive no meio da floresta.” As palavras simples e fortes do líder indígena são certeiras como uma flecha que acerta direto no coração – é o que ele mesmo diz. O xamã yanomami acredita que sua arma é a palavra, com a qual protege a floresta amazônica e os povos autóctones.

“Nós, Yanomami, somos guerreiros para defender nossos direitos, nosso povo, nossas crianças, nossa terra própria. Nossos antepassados não sabiam se defender, não sabiam brigar por não compreender a língua portuguesa”, explica o xamã e intérprete da Funai, que utiliza o idioma como instrumento político. “Eu não posso viver isolado. Meu povo yanomami já foi isolado. Hoje não, nós conversamos com políticos sobre o problema da nossa terra, da saúde”, afirma.

Sua mensagem é firme, mesmo quando sua expressão parece hesitar, revelando a cadência de quem não tem o português como língua materna. “Minha fala é diferente; não é fala de cidade, não. Eu falo sobre natureza, sobre meio ambiente, terra, sobre o que é bom pra nós todos”, justifica Kopenawa.

A convite do Programa Cátedras do Instituto de Estudos Avançados Transdisciplinares (Ieat), Davi veio à UFMG ensinar o que os napë [homem branco, não índio] parecem não saber. “Será que o homem não tem pensamento, não pensa em seu futuro, nas gerações que vão sofrer? Consciência dos napë é diferente da consciência indígena. Terra é nossa vida, sustenta a barriga, é nossa alegria”, alega, tecendo dura crítica às atividades econômicas que se valem da exploração das riquezas naturais.

Para Kopenawa, o problema gerado pelo homem branco com a extração dos recursos é incontornável, não há reflorestamento que o resolva. “Reflorestar não vai trazer ar limpo, não vai chamar a chuva; só miséria, fome, sofrimento”, afirma, fazendo uma analogia com as cicatrizes que se formam quando ferimos a pele, sobre as quais não voltam a nascer pelos. “Na terra, depois que corta, não cresce de novo, não nasce urihi [cobertura florestal], porque não tem força, não tem água lá embaixo. Derrama sangue da terra e ela fica seca, a água vai embora.”

Davi explica o que em sua filosofia indígena designa por “coração da terra”. De acordo com ele, trata-se de um processo cíclico segundo o qual a água é conduzida por caminhos subterrâneos que a elevam para que em seguida se precipite novamente, em movimento continuamente circular, como na corrente sanguínea. “Nós estamos circulando juntos”, acrescenta, esclarecendo que o coração humano pulsa sob mesmo ritmo. Homem e natureza, portanto, estão ligados. Então, “destruímos a nós mesmos ao devastar a terra; nosso coração bate junto com a hutukara, terra-mãe”.

Diferentes, porém complementares

O xamã acredita na capacidade de mobilizar os outros como multiplicadores de uma consciência ambiental renovada, e se alegra porque vê seu conhecimento reconhecido na esfera acadêmica. “Sou analfabeto, mas tenho saber tradicional. Eles estão me escutando e achando bom. Estão interessados, gostando muito. Eu também estou gostando. Venho para me aproximar do homem branco que nunca conheceu de mim e para conhecê-lo como amigo. Não índio também está reconhecendo minha imagem, minha fala, a experiência que eu tenho e aprendi desde pequeno.”

Entre os xamãs yanomami, boa parte dos saberes advêm do campo onírico. Os sonhos – muitas vezes associados ao transe induzido pelo sopro do pó de yãkoana [alucinógeno] – funcionam como revelações esclarecedoras. Os xapiri [espíritos] são os responsáveis por alumbrar as ideias e desvelar a sapiência do líder. Davi conta que ele próprio “sonha terra, floresta, chuva, trovão, tudo o que tem no universo”. Por isso, irrita-se com os antropólogos que, “como formigas, andam procurando sabedoria” e valem-se do conhecimento alheio. “Eu não quero antropólogo falso, que só quer trair o meu povo, que só quer aprender, tirar e copiar conhecimento yanomami”, revolta-se, em alusão à experiência com o americano Napoleon Chagnon, que trata os yanomami como ferozes e violentos.

No livro La chute du ciel, escrito em conjunto com o antropólogo francês Bruce Albert, Kopenawa conta que pediu ao xori [amigo] que o ajudasse. Como discordava dos pesquisadores que frequentavam sua aldeia e imputavam juízos sobre o modo de vida indígena, resolveu manifestar-se. “Quem vai falar sobre meu povo yanomami sou eu. Eu não sou antropólogo, mas Bruce me ajudou a escrever como no meu sonho, um sonho conhecimento. Eu queria escrever para os antropólogos da cidade, para mostrar como o Yanomami pensou. Esse livro é um mensageiro para entrar na capital. Antropólogo que não conhece índio, não conhece aldeia, não conhece mato vai ler. Esse livro foi escrito para fazer antropólogo respeitar. Foi muito bom pra mostrar minha capacitação, a capacidade que eu tenho de quem conhece rio, terra, mato”, relata.

Quanto à sua participação nas palestras ao longo da semana, o xamã mostrou-se alegre e satisfeito por cumprir a tarefa que lhe foi confiada pelos anciões. “Estou com orgulho de mim. Sou um yanomami em paz. Estou dizendo boas coisas pra eles [homens brancos] entenderem, pensarem e depois fazer respeitar. Nós somos povo indígena, guardião da terra; estamos aqui para proteger”, assevera.

É um erro escolarizar o conhecimento tradicional, avalia pesquisadora da USP (Notícias da UFMG)

Foca Lisboa/UFMG
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Manuela Carneiro propôs projeto de valorização do conhecimento tradicional

Quinta-feira, 21 de novembro de 2013, às 5h50

As possibilidades de cooperação entre os cientistas acadêmicos e os chamados “conhecedores tradicionais” – em especial os indígenas – foram abordadas em conferência na UFMG da professora Maria Manuela Carneiro da Cunha, da Universidade de São Paulo (USP), no início deste mês. O evento integrou a programação doColóquio Davi Kopenawa e a Hutukara: um encontro com a cosmopolítica Yanomami.

Para a professora, é um contrassenso tentar escolarizar o conhecimento tradicional. “Ele não é só conteúdo; são também formas de existência e de transmissão desse conteúdo. Assim, em vez de se pensar em escolarização, devemos propor programas de pesquisa de conhecimentos tradicionais estabelecendo pontes entre o conhecimento prático e o que se aprende na escola”, defendeu.

Na ocasião, Maria Manuela detalhou a proposta que submeteu ao Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação para a criação de programa focado na valorização do conhecimento tradicional e na criação de uma economia na Amazônia que seja compatível com o conceito de “floresta em pé”

“Fizemos a proposta ao Ministério, que parece ter gostado do projeto, e o incluiu no seu programa para o período de 2010-2014. A ideia é que o projeto resulte em editais anuais, e que fomente a distribuição equitativa de poder e de recursos”, explicou.

O Portal UFMG resumiu aspectos da conferência de Maria Manuela Carneiro da Cunha. Confira a seguir.

O contexto político
Formamos um conselho consultivo e propusemos ao MCTI um programa focado na importância da valorização dos conhecimentos tradicionais para o Brasil. O Ministério demonstrou interesse e pôs o programa na sua agenda para o período 2010-2014. Mas quiseram começar de uma forma mais prudente do que se poderia esperar. Encomendaram um estudo de três anos para avaliar a viabilidade e o formato de um programa permanente. É o que estamos fazendo atualmente. Mas sabemos que, quando mudam governo e secretário, mudam as políticas. E em 2014 teremos novas eleições. Portanto, não temos nenhuma segurança de que o programa vai se reverter em algo permanente. Mas estamos trabalhando para isso. Já foi um importante avanço tratar a questão no âmbito do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), em vez do Ministério da Educação (MEC).

Floresta em pé
O programa se chama Bases para um programa de pesquisas interculturais e fortalecimento do conhecimento tradicional e tem dois pilares principais. Um trata de fomentar a criação de um tipo de economia na Amazônia que seja compatível com a ideia de “floresta em pé”. Essa parte foi mais facilmente aceita. O segundo diz respeito à valorização dos conhecimentos tradicionais. Ou seja, de se reconhecê-lo e buscar o auxílio das populações tradicionais, que têm o know-how nesse tipo de manejo da floresta, para fomentar seu uso sustentável. Essa é uma ação que enfrenta mais resistência. Temos implantado projetos pilotos. São tentativas de demonstrar que é possível criar uma agricultura da “floresta em pé”, de que essa mudança de paradigma é interessante para todas as partes – populações tradicionais, cientistas das universidades e para a sociedade como um todo.

Contribuição do saber tradicional
Tenho trabalhado junto a especialistas solicitando levantamentos sobre as contribuições econômicas que os conhecimentos tradicionais podem oferecer. Mas temos de ter em mente que o mais importante não é mensurável. Não se pode medir o conhecimento tradicional pelo seu valor econômico; existem questões mais importantes. Um grande problema hoje é que, se o aspecto econômico não é mensurado, a contribuição oferecida pelo conhecimento tradicional não é apreciada, não é levada em conta, apesar de ser imprescindível para o trabalho. Pesquisadores fazem “descobertas” e não reconhecem o conhecimento tradicional embutido em seus trabalhos. Dizem: “não devo nada aos conhecimentos tradicionais”, quando, na verdade, devem muito.

Repartição equitativa
Até hoje não temos uma medida precisa para fazer essa avaliação. Mas estamos chegando a algum tipo de consenso de como deve ser feita a regulamentação desse reconhecimento. O Congresso Nacional está recebendo um projeto de lei que vai substituir medida provisória sobre o assunto. A ideia é estipular o pagamento equitativo, a recompensa, a “repartição equitativa de benefícios”; esse é o termo, porque essa recompensa pode até mesmo ser não monetária. Uma frente de trabalho tem sido a de colaborar para o estabelecimento de qual deve ser, do ponto de vista econômico, o aporte a ser feito em remuneração ao conhecimento tradicional embutido nos processos científicos. No entanto, cabe repetir: não se pode exigir uma justificativa estritamente econômica para preservar a diversidade de línguas, práticas e cantos. Reduzir tudo isso à questão do capital seria um absurdo.

Conhecimento em construção
Quando os cientistas apreciam o conhecimento tradicional, eles pensam o seguinte: “vamos fazer um levantamento e então guardar o recurso para futuras pesquisas”. O problema é que essa postura desconsidera que o conhecimento tradicional é fruto de um processo vivo, que está sempre em transformação. Ele depende da população que o gerou, depende dela para continuar se transformando, se aprimorando. Se você armazena cientificamente uma informação, ela não terá a mesma validade quando for retomada. Venho insistindo com o MCTI que não se deve pensar o conhecimento tradicional como algo pronto e consolidado, mas sim como conhecimento em constante construção, tal qual o conhecimento científico. Por incrível que pareça, isso é muito difícil de entrar na cabeça de biólogos, de cientistas acadêmicos.

O valor dos mateiros
Quando os cientistas vão adentrar a floresta, eles sempre precisam da orientação dos mateiros, oriundos da população local: são eles que conhecem a mata, os territórios, e que estão sempre descobrindo coisas novas, novos caminhos. Ainda assim eles são sempre depreciados nos institutos de pesquisa. Sempre são colocados como assistentes, sendo muito pouco valorizados no contexto da construção do conhecimento – e muito mal pagos. E a verdade é que os mateiros são os primeiros pesquisadores. Eles aprenderam no local e estão transmitindo esses conhecimentos para os pesquisadores científicos.

Desvalorização histórica
A história tradicional faz tudo para solapar o conhecimento tradicional. Por exemplo: a nossa escola, ao ser levada para essas comunidades, considera que o que a criança aprende em casa é algo sem valor. Faz com que esse conhecimento seja visto como de uma instância inferior. A escola atrapalha de várias maneiras: sua forma de elaborar seu calendário, seus horários… Por isso, as pessoas mais velhas dessas sociedades acabam se sentindo desvalorizadas quando em contato com a nossa. Em muitas dessas comunidades, eles são os responsáveis por passar certos conhecimentos de pai para filho. E a nossa escola canônica não entende ou aceita isso muito bem. A reação são as “escolas diferenciadas”, criadas pelas próprias comunidades indígenas – e que naturalmente vêm sofrendo muita resistência. São escolas que pensam seu calendário para que ele seja compatível com as atividades tradicionais da comunidade, que pensam a importância da língua, do conhecimento local, das tradições, das festas, da participação social. Aí está um aspecto muito importante a ser solucionado. É preciso que a escola se adapte à realidade dessas comunidades, no sentido de uma política de fortalecimento do conhecimento tradicional. Saber como fazer uma canoa, por exemplo, importa muito mais do que certos “conhecimentos” que as escolas acham importante disseminar.

Os riscos da ‘revolução verde’
Uma retomada histórica explica o desafio que se vive hoje na agricultura. Com o fim da Segunda Guerra Mundial, houve uma “revolução verde”: uma ambiciosa tentativa de aumentar a produção agrícola no mundo inteiro e resolver o problema da fome. Foi algo muito importante. Entre as mais de sete mil espécies de plantas alimentícias existentes no mundo, as trinta mais produtivas foram selecionadas para formarem a base da alimentação da maioria. Mas as demais espécies dessa enorme variedade foram de certa forma esquecidas. Apesar de sua importância na época, foi uma medida política muito arriscada. Quando a base de alimentação mundial é tão pequena, crescem os riscos de escassez caso algo aconteça com alguma dessas espécies. É uma medida em que não se considera que as variedades são adaptadas a cada lugar, ao tipo de solo, à quantidade de sol e chuva, às pragas. Então resolveram o problema da não adaptação das espécies às pragas e às demais dificuldades dos novos ambientes com o uso maciço de fertilizantes e de defensivos agrícolas. E hoje o Brasil é um “campeão” no uso dos dois. Resolveu-se o problema. Mas a que custo? Tornamo-nos reféns dos fertilizantes e dos defensivos agrícolas. Ao custo do sacrifício das variedades locais. E o risco disso é enorme.

Cultivo on farm
Em algum momento, percebemos que o que se estava fazendo era uma política agrícola extremamente perigosa. Na Irlanda, por exemplo, aconteceu um desastre em função disso. Assim como na Bélgica, França, Alemanha, a base da alimentação no país era a batata, que havia sido domesticada pelos índios da América e levada para a Europa pelos espanhóis após a colonização. Os espanhóis levaram poucas espécies, as mais produtivas. Os irlandeses, em dado momento, estavam se alimentando só de duas espécies. Foi quando aconteceu uma praga que durou quatro anos e acabou com tudo. Um milhão de pessoas morreu de fome. Outro milhão migrou. É um exemplo de como é necessário guardar as variedades. Mas não basta fazer bancos de sementes como os da Embrapa, em que as sementes ficam em uma geladeira, mas não continuam se adaptando às mudanças do meio ambiente. O clima muda, o solo muda. Então, é preciso que as espécies continuem sendo cultivadas na roça, sendo cultivadas on farm, pois só se adaptam aquelas que continuam sendo cultivadas em campo. Isso é fundamental para a nossa segurança alimentar. E aí entra a questão dos conhecimentos tradicionais, dos índios, que tem o hábito de cultivar variedades.

Experiência no Rio Negro
Um desses projetos-pilotos de que falei está sendo desenvolvido às margens do Rio Negro, na Amazônia. Lá, a despeito das políticas governamentais que buscam consolidar a plantação apenas das poucas espécies mais produtivas, os índios estão plantando em seus roçados mais de cem variedades de mandioca, colaborando com a diversidade tão importante para a segurança de nosso sistema agrário. Hoje, 500 milhões de pessoas comem mandioca no mundo. É um alimento que tem enorme consumo na África, por exemplo. Se houvesse uma praga como a das batatas, teríamos hoje um problema enorme, a exemplo do que aconteceu na Irlanda. Esse caso da mandioca é um exemplo de como o conhecimento tradicional tem uma importância fundamental. Porque é o conhecimento tradicional dos índios que possibilita que lá, no Rio Negro, haja tanta variedade da espécie. Normalmente, a mandioca é plantada como “clone”; come-se a raiz e planta-se o caule. Mas a mandioca sabe dar flor, que tem semente. E, quando dá flor, é porque houve reprodução sexuada, de forma que essa semente não é um clone. A formiga gosta dessa semente, que é docinha. Então ela leva a semente para debaixo da terra. Essa é uma semente que só brota se houver fogo; só nasce na capoeira. Nesse sentido, ela tem brotado no Rio Negro em função do trabalho dos índios mais antigos, que gostam de cultivar as variedades e trabalham para que haja essa capoeira. As variedades também são fruto do trabalho das mulheres indígenas, que cultivam experimentalmente as sementes. Elas plantam em uma margem da roça algo que só vai dar a partir do segundo ou do terceiro ano. É um trabalho de colecionador. Essas mulheres de fato pesquisam para avaliar cada nova variedade e depois para cultivá-la. Há ainda a cultura de troca de sementes entre famílias e tribos, nas festas. Há um gosto pela coleção.

Virada política
Mesmo assim, ainda há hoje uma política do governo querendo disseminar o cultivo das espécies de mandioca entre as comunidades tradicionais, algo como “ensinar padre a rezar missa”. Insistem em focar nas espécies mais produtivas, ainda na lógica da revolução verde. E isso em um contexto em que o Brasil é signatário de um tratado que obriga o país a fomentar o cultivo de variedades na roça, de fomentar esse cultivo on farm, e não em bancos de sementes. O Brasil não está cumprindo esse tratado. Nesse sentido, nosso projeto-piloto visa transformar essas práticas tradicionais do Rio Negro em um sistema reconhecido como forma de conservação on farm valiosa e estratégica para o Brasil e para o mundo. É isso que a gente está construindo.

Leia também o perfil do líder yanomami David Kopenawa, publicado na edição 1845 do Boletim UFMG.

(Ewerton Martins Ribeiro)

Conheça todos os 12 vetos ao novo Código Florestal (EcoD)

29/5/2012 – 10h34

por Redação EcoD

51 Conheça todos os 12 vetos ao novo Código Florestal

Os ministros anunciaram vetos em 12 itens e 32 modificações no texto do Código Florestal, feitos pela presidenta Dilma Rousseff, na última semana. Foto: José Cruz/ABr

Impedir a anistia a quem desmatou e proibir a produção agropecuária em áreas de proteção permanente (APPs) foram alguns dos principais objetivos da presidenta Dilma Rousseff ao vetar parte do novo Código Florestal na sexta-feira, 25 de maio. Os vetos de 12 artigos resgatam o teor do acordo firmado entre os líderes partidários e o governo durante a tramitação da proposta no Senado.

Artigo 1º, que foi modificado pelos deputados após aprovação da proposta no Senado, foi vetado. Na medida provisória (MP) publicada hoje (28) no Diário Oficial da União, o Palácio do Planalto devolve ao texto do Código Florestal os princípios que haviam sido incorporados no Senado e suprimidos, posteriormente, na segunda votação na Câmara. A MP foi o instrumento usado pelo governo para evitar lacunas no texto final.

Também foi vetado o Inciso 11 do Artigo 3º da lei, que trata das atividades eventuais ou de baixo impacto. O veto retirou do texto o chamado pousio: prática de interrupção temporária de atividade agrícolas, pecuárias ou silviculturais, para permitir a recuperação do solo.

61 Conheça todos os 12 vetos ao novo Código Florestal

Artigo 61 previa a continuidade das atividades agrossilvipastoris, de ecoturismo e turismo rural em áreas rurais consolidadas até 22 de julho de 2008 – o governo vetou. Foto: leoffreitas

Recebeu veto ainda o Parágrafo 3º do Artigo 4º que não considerava área de proteção permanente (APP) a várzea (terreno às margens de rios, inundadas em época de cheia) fora dos limites estabelecidos, exceto quanto houvesse ato do Poder Público. O dispositivo vetado ainda estendia essa regra aos salgados e apicuns – áreas destinadas à criação de mariscos e camarões.

Foram vetados também os parágrafos 7º e 8º. O primeiro estabelecia que, nas áreas urbanas, as faixas marginais de qualquer curso d’água natural que delimitem as áreas das faixas de passagem de inundação (áreas que alagam na ápoca de cheia) teriam sua largura determinada pelos respectivos planos diretores e pela Lei de Uso do Solo, ouvidos os conselhos estaduais e municipais do Meio Ambiente. Já o Parágrafo 8º previa que, no caso de áreas urbanas e regiões metropolitanas, seria observado o dispositivo nos respectivos planos diretores e leis municipais de uso do solo.

O Parágrafo 3º do Artigo 5º também foi vetado. O dispositivo previa que o Plano Ambiental de Conservação e Uso do Entorno de Reservatório Artificial poderia indicar áreas para implantação de parques aquícolas e polos turísticos e de lazer em torno do reservatório, de acordo com o que fosse definido nos termos do licenciamento ambiental, respeitadas as exigências previstas na lei.

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APP em Minas Gerais. Parágrafo 3º do Artigo 4º desconsiderava área de proteção permanente (APP) a várzea (terreno às margens de rios, inundadas em época de cheia) fora dos limites estabelecidos, exceto quanto houvesse ato do Poder Público. Foto: Paula FJ

Já no Artigo 26, que trata da supressão de vegetação nativa para uso alternativo do solo tanto de domínio público quanto privado, foram vetados o 1º e 2º parágrafos. Os dispositivos detalhavam os órgãos competentes para autorizar a supressão e incluía, entre eles, os municipais do Meio Ambiente.

A presidenta Dilma Rousseff também vetou integralmente o Artigo 43. Pelo dispositivo, as empresasconcessionárias de serviços de abastecimento de água e geração de energia elétrica, públicas ou privadas, deveriam investir na recuperação e na manutenção de vegetação nativa em áreas de proteção permanente existente na bacia hidrográfica em que ocorrer a exploração.

Um dos pontos que mais provocaram polêmica durante a tramitação do código no Congresso, o Artigo 61, foi vetado. O trecho autorizava, exclusivamente, a continuidade das atividades agrossilvipastoris, de ecoturismo e turismo rural em áreas rurais consolidadas até 22 de julho de 2008.

Também foram vetados integramente os artigos 76 e 77. O primeiro estabelecia prazo de três anos para que o Poder Executivo enviasse ao Congresso projeto de lei com a finalidade de estabelecer as especificidades da conservação, da proteção, da regeneração e da utilização dos biomas da Amazônia, do Cerrado, da Caatinga, do Pantanal e do Pampa. Já o Artigo 77 previa que na instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente seria exigida do empreendedor, público ou privado, a proposta de diretrizes de ocupação do imóvel.

A MP que complementa o projeto, publicada nesta segunda-feira (28), vale por 60 dias, podendo ser prorrogada por mais 60 dias – ela ainda será votada pelo Congresso.

* Publicado originalmente no site da EcoD.