Pressão por ‘ambição climática’ pauta COP-26: entenda em gráficos (O Globo)

Conheça o desafio de esfriar o planeta e saiba como o sucesso da conferência do clima pode ser medido

Rafael Garcia 31/10/2021 – 04:30 / Atualizado em 31/10/2021 – 09:10

Artigo original

Cientistas dão como certo que o planeta já vai estourar o "orçamento do carbono", mas é importante que não estoure muito, pois cada décimo de grau representa um clima mais prejudicial no futuro. Foto: Felipe Nadaes
Cientistas dão como certo que o planeta já vai estourar o “orçamento do carbono”, mas é importante que não estoure muito, pois cada décimo de grau representa um clima mais prejudicial no futuro. Foto: Felipe Nadaes

SÃO PAULO – A COP-26, a 26ª conferência das partes da Convenção do Clima da ONU (UNFCCC), será marcada por um ambiente de pressão acentuada para que os países aumentem suas promessas de corte de emissão de gases do efeito estufa. Na discussão sobre vários aspectos da implementação do Acordo de Paris contra o aquecimento global, um deles é central, resumido pela palavra “ambição”.

Este é o termo que diplomatas do clima usam para cobrar de seus pares a adesão a objetivos mais ambiciosos de redução das emissões. Cada país traduz a sua ambição (ou a falta dela) em sua contribuição nacionalmente determinada, ou NDC, documento onde suas metas são anunciadas.

A “ambição climática” atual de todos os países, somada, ainda é insuficiente para honrar os compromissos de Paris. O tratado clama para que se detenha um acréscimo de temperatura acima de 2°C no planeta, e que se faça o máximo de esforço possível para esse número não ir muito além do 1,5°C.

Segundo dados do Pnuma, o programa da ONU para o meio ambiente, as promessas atuais retiram o planeta da atual trajetória de acréscimo de 4°C e levam a um aumento de 2,7°C. Nesse cenário, a Terra ainda sofreria muito com eventos climáticos extremos, ondas de calor, elevação do nível do mar e outras consequências do aquecimento global.

Em outras palavras, a conta do Acordo de Paris não fecha, e a tentativa de adequar a ambição à realidade pouco avançou em relação às promessas de 2015, ano em que o tratado foi assinado.

Abaixo, explicamos em números o tamanho do desafio que o combate à mudança climática representa e mostramos como o sucesso da conferência poderá ser medido no futuro. Ativistas climáticos protestam antes da COP-26 para pressionar meta de reduzir em 1,5° C a temperatura global 1 de 12

Ativistas da Rebelião Oceânica se reúnem na frente do local da COP-26 em Glasgow, antes do início da cúpula do clima Foto: ANDY BUCHANAN / AFP - 29/10/2021
Ativistas da Rebelião Oceânica se reúnem na frente do local da COP-26 em Glasgow, antes do início da cúpula do clima Foto: ANDY BUCHANAN / AFP – 29/10/2021
Ativistas despejam óleo falso na frente do local onde a COP-26 será realizada em Glasgow para protestar contra as faltas de ações mais firmes para evitar uma catástrofe climática no mundo Foto: ANDY BUCHANAN / AFP
Ativistas despejam óleo falso na frente do local onde a COP-26 será realizada em Glasgow para protestar contra as faltas de ações mais firmes para evitar uma catástrofe climática no mundo Foto: ANDY BUCHANAN / AFP
Ativista da Rebelião Oceânica, Rob Higgs, protesta contra o arrasto de fundo durante uma manifestação antes da cúpula da COP26, em Glasgow, Escócia Foto: DYLAN MARTINEZ / REUTERS
Ativista da Rebelião Oceânica, Rob Higgs, protesta contra o arrasto de fundo durante uma manifestação antes da cúpula da COP26, em Glasgow, Escócia Foto: DYLAN MARTINEZ / REUTERS
Evento reunirá neste domingo, na Grã-Bretanha, mais de 120 líderes mundiais para discutir compromissos de combate ao aquecimento global Foto: ANDY BUCHANAN / AFP
Evento reunirá neste domingo, na Grã-Bretanha, mais de 120 líderes mundiais para discutir compromissos de combate ao aquecimento global Foto: ANDY BUCHANAN / AFP
Ativistas da Rebelião Oceânica protestam contra a pesca de arrasto de fundo perto do Scottish Event Centre, local da COP-26 Foto: ANDY BUCHANAN / AFP
Ativistas da Rebelião Oceânica protestam contra a pesca de arrasto de fundo perto do Scottish Event Centre, local da COP-26 Foto: ANDY BUCHANAN / AFP

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Ativistas protestam em Glasgow antes da COP-26, que começa hoje: Meta de 1,5° C segue distante Foto: RUSSELL CHEYNE / REUTERS
Ativistas protestam em Glasgow antes da COP-26, que começa hoje: Meta de 1,5° C segue distante Foto: RUSSELL CHEYNE / REUTERS
A ativista climática Greta Thunberg é escoltada ao chegar à Estação Central de Glasgow para participar da Conferência das Nações Unidas sobre Mudança Climática, a COP-26 Foto: DYLAN MARTINEZ / REUTERS
A ativista climática Greta Thunberg é escoltada ao chegar à Estação Central de Glasgow para participar da Conferência das Nações Unidas sobre Mudança Climática, a COP-26 Foto: DYLAN MARTINEZ / REUTERS
Conferência da ONU sobre o clima que começa neste domingo em Glasgow, na Escócia Foto: BEN STANSALL / AFP
Conferência da ONU sobre o clima que começa neste domingo em Glasgow, na Escócia Foto: BEN STANSALL / AFP
Ativistas protestam em Glasgow antes da COP-26 Foto: YVES HERMAN / REUTERS
Ativistas protestam em Glasgow antes da COP-26 Foto: YVES HERMAN / REUTERS
Artistas climáticos chegam para uma "Procissão de Peregrinos", uma cerimônia de abertura para uma série de ações em Glasgow Foto: DANIEL LEAL-OLIVAS / AFP
Artistas climáticos chegam para uma “Procissão de Peregrinos”, uma cerimônia de abertura para uma série de ações em Glasgow Foto: DANIEL LEAL-OLIVAS / AFP

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A COP acontece todos os anos, mas a edição de 2021 tem uma importância central. Países deverão revisar pela primeira vez as metas de redução das emissões de gases causadores de efeito estufa assumidas no Acordo de Paris Foto: ANDY BUCHANAN / AFP
A COP acontece todos os anos, mas a edição de 2021 tem uma importância central. Países deverão revisar pela primeira vez as metas de redução das emissões de gases causadores de efeito estufa assumidas no Acordo de Paris Foto: ANDY BUCHANAN / AFP
Ativistas da mudança climática pintam mensagens durante um protesto fora da sede da empresa de investimento BlackRock, antes da COP-26, em San Francisco, Califórnia, EUA Foto: CARLOS BARRIA / REUTERS
Ativistas da mudança climática pintam mensagens durante um protesto fora da sede da empresa de investimento BlackRock, antes da COP-26, em San Francisco, Califórnia, EUA Foto: CARLOS BARRIA / REUTERS

O labirinto do clima

Desde o início da Revolução Industrial, quando o planeta começou a usar petróleo e carvão em grandes proporções, os humanos emitiram 1,5 trilhão de toneladas de CO2 pela queima desses combustíveis fósseis, pelo desmatamento, pela agricultura e outras atividades.

O CO2 emitido desde então ainda está todo no ar, porque a capacidade do planeta de processar e reabsorver esse gás é limitada. Como isso provocou o efeito estufa, essas emissões já fizeram a temperatura média do planeta subir 1,1 °C.

Isso deixa os cientistas preocupados, porque mesmo esse pequeno aumento médio bagunça o sistema climático do planeta. Após se convencerem do problema, países assinaram em 2015 o Acordo de Paris, que busca tentar reduzir as emissões para que o planeta não ultrapasse um aquecimento de 1,5°C antes do final deste século.PUBLICIDADE

Para impedir que o aquecimento chegue a esse ponto até o fim do século, os cientistas fazem contas periódicas de quanto CO2 ainda resta para o mundo emitir. Se os humanos produziram até agora um total de 1,5 trilhão de toneladas de CO2, nos restam apenas 0,4 trilhão de toneladas de CO2 para emitir antes que nós cheguemos a esse patamar dos 1,5°C a mais. Este é o chamado “orçamento de carbono”, tal qual foi calculado pelo IPCC (painel de cientistas do clima da ONU).

Um total de 0,4 trilhão parece muito, mas o patamar atual de cerca de 55 bilhões de toneladas de CO2/ano consumiria esse orçamento em 7 anos, mesmo que emissões parem de subir e se estabilizem. Cientistas dão como certo que o planeta vai estourar o orçamento do 1,5°C, mas  é importante que não estoure muito, pois cada décimo de grau representa um clima mais prejudicial no futuro.

Um segundo horizonte no Acordo de Paris é deter um aumento de 2°C, o que abre um orçamento maior, de 1,15 trilhão de toneladas de CO2. Nesse caso, o orçamento se esgotaria em duas décadas num cenário de estabilização de emissões. Por isso, o tratado pede que países aumentem periodicamente suas NDCs (contribuições nacionalmente determinadas), o compromisso de quanto pretendem cortar do carbono.

Hoje, aquilo que está prometido ainda é insuficiente para frear os 2°C, e levaria o planeta 2,7°C. Por isso a Convenção do Clima da ONU (UNFCCC) pressiona os governos para que aumentem as suas ambições de corte de gases de efeito estufa para adequá-las aos 2°C ou, se possível, ao 1,5°C.PUBLICIDADE

Um ponto central da COP-26 é convencer países a adotarem NDCs mais “ambiciosas”, ou seja, cortes mais profundos de emissão. Segundo cientistas, é preciso ser rápido. O planeta precisa derrubar as emissões dos atuais quase 60 bilhões de toneladas de CO2/ano para 25 bilhões em dez anos. Mesmo nesse cenário otimista, o planeta ultrapassaria um pouco o 1,5° C, chegando a 1,7°C, depois recuaria de novo até o fim do século.

Impedir o aquecimento de 2°C, o segundo horizonte no Acordo de Paris, também requer um esforço tremendo, um corte de um terço nas emissões (para 41 bilhões de toneladas de CO2) até 2030. As promessas atuais dos países, porém, são suficientes apenas para frear o aumento de emissões nesta década, mas não para reduzi-las, projetando um planeta emissor de 52 bilhões de toneladas por ano em 2030.

O sucesso da COP-26 que começa em Glasgow neste domingo pode ser medido em quanto essa cifra vai ser reduzida caso países anunciem promessas mais ambiciosas. Se o termômetro do futuro ficar razoavelmente abaixo do aquecimento projetado de 2,7 °C, significa que o planeta está indo no rumo certo. Nenhum país, porém, tem ainda metas consonantes com a trajetória dos 2°C ou menos.