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Presidente de Portugal quer fazer revisão do novo acordo ortográfico (Folha de S.Paulo)

Giuliana Miranda, 15/05/2016

Oficialmente, o último acordo ortográfico está em vigor em Portugal desde 2009, mas ainda enfrenta resistência em vários setores. Na semana passada, o time dos descontentes recebeu um apoio de peso: o novo presidente português se mostrou favorável à revisão das regras.

Em visita a Moçambique —país lusófono que, assim como Angola, não ratificou as mudanças—, Marcelo Rebelo de Sousa admitiu que a não adesão dos africanos pode permitir a Portugal também rever sua posição no acordo.

Mauro Vombe – 4.mai.2016/Xinhua
O presidente português, Marcelo Rebelo de Sousa, (esq.) saúda o colega moçambicano Filipe Nyusi
O presidente português, Marcelo Rebelo de Sousa, (esq.) saúda o colega moçambicano Filipe Nyusi

Na quarta-feira (11), a Associação Nacional de Professores de Português e vários membros da organização “Cidadãos contra o Acordo Ortográfico” recorreram à Justiça pedindo a anulação da norma que disseminou o uso da nova ortografia no país.

No cargo há dois meses, Rebelo de Sousa nunca escondeu sua contrariedade sobre o tema. Na década de 1990, ele assinou um manifesto que reuniu 400 personalidades portuguesas contrárias ao acordo ortográfico.

Embora as críticas públicas tenham se abrandado, o livro de imagens de sua campanha à Presidência, “Afectos”, não adota as mudanças ortográficas nem no título.

Em “O Acordo Ortográfico Não Está Em Vigor” (ed. Guerra & Paz), o embaixador e professor de direito internacional Carlos Fernandes diz que o acordo fere também princípios jurídicos e, por isso, não deveria ser adotado.

Segundo Fernandes, além de as regras anteriores não terem sido oficialmente revogadas, o governo português tampouco cumpriu trâmites legais obrigatórios para a entrada em vigor dos novos parâmetros da língua.

O debate sobre uma possível revisão do acordo —há quem defenda até um referendo— provocou uma “caça às bruxas” ortográfica. Vários políticos tiveram currículos, biografias e livros vasculhados em busca de indícios de que são contrários às mudanças na escrita.

CRÍTICAS AO BRASIL

Embora tenha sido assinado em 1990 pelos Estados de língua oficial portuguesa, o acordo precisa passar por ratificação interna em cada país para entrar em vigor. Brasil, Portugal, São Tome e Príncipe e Cabo Verde já promulgaram a decisão.

Já Angola e Moçambique —que concentram a maioria dos falantes do português depois do Brasil— ainda não têm data para ratificar.

O português é a quinta língua mais falada do mundo, com cerca de 280 milhões de falantes, dos quais 202 milhões estão no Brasil, 24,7 milhões em Angola, 24,6 milhões em Moçambique e 10,8 milhões em Portugal.

Entre os críticos portugueses e africanos, as alterações são encaradas como submissão aos desejos do Brasil. A língua oficial do país é várias vezes pejorativamente chamada de “brasileiro”.

Um dos motivos da discórdia é o fim das consoantes mudas presentes em várias palavras de Portugal. Com o acordo, prevaleceu a versão brasileira. Por exemplo: actor vira ator e óptimo, ótimo.

Segundo o Ministério da Educação brasileiro, as mudanças afetaram cerca de 0,8% dos vocábulos do Brasil e 1,3% dos de Portugal.

GOVERNO DEFENDE

O governo de Portugal segue o acordo ortográfico, e vários ministros saíram em defesa das regras.

Considerado o pai do acordo e um dos mais mais influentes linguistas lusitanos, Malaca Casteleiro também tem defendido sua aplicação.

O primeiro-secretário do Brasil em Lisboa, André Pinto Pacheco, afirmou que ” a embaixada acompanha com atenção o assunto, procurando esclarecer o Estado e a opinião pública de Portugal sobre a aplicação do Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa no Brasil”.

Diretor do setor de lexicografia e lexicologia da Academia Brasileira de Letras, Evanildo Bechara minimizou as críticas do presidente português e ressaltou o ritmo da implementação do acordo na comunidade lusófona. “É um processo irreversível.”

“Uma alteração ortográfica não é para a geração que a fez, mas para uma geração futura”, afirmou Bechara. O uso da nova ortografia é obrigatório no Brasil desde 1º de janeiro deste ano.

Especialistas criticam problemas no acordo ortográfico (Agência Brasil)

Assunto está em debate na Comissão de Educação do Senado

O professor Pasquale Cipro Neto defendeu nesta quarta-feira (22) revisão no Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa. “O texto do acordo é tão cheio de problema que foi preciso a Academia [Brasileira de Letras] publicar nota explicativa [sobre pontos do acordo]. Por que foi preciso isso? Porque há problemas”, ressaltou o professor, ao participar do segundo dia de debates sobre o assunto na Comissão de Educação do Senado.

Segundo Pasquale, o Brasil saiu na frente dos demais países signatários na implementação do acordo impedindo uma adoção simultânea da nova regra. Para ele, houve atropelo e falta de organização do país no processo. “Nós não podemos ir adiante com um texto que carece de polimento, soluções concretas”, disse.

As diversas situações do uso do hífen, considerado pelo professor uma das grandes fragilidades da norma, foi um dos pontos mais criticados. Para Pasquale Neto, no texto do acordo, “o hífen foi maltratado, mal resolvido”. A seu ver, a questão precisa ser solucionada. De acordo com ele, é inexplicável o fato da palavra “pé-de-meia” ser escrita com hífen e “pé de moleque”, não.

Para a professora Stella Maris Bortoni de Figueiredo Ricardo, integrante da Associação Brasileira de Linguística (Abralin), qualquer sugestão de mudança deve ser acordada com os países signatários. “A Abralin recomenda que se consolide o Acordo Ortográfico de 1990, sem que haja nenhuma alteração unilateral. Qualquer alteração que se queira fazer no acordo, que seja feito no âmbito da CPLP  [Comunidade dos Países de Língua Portuguesa] e do Iilp [Instituto Internacional da Língua Portuguesa]”, defendeu.

Para debater as sugestões visando a melhorar o acordo, a Comissão de Educação do Senado criou, em 2013, grupo técnico de trabalho formado pelos professores Ernani Pimentel e Pasquale Cipro Neto, que deverão apresentar uma síntese em março de 2015. Por interferência da comissão, a implantação definitiva foi adiada de janeiro de 2013 para janeiro de 2016 por decreto da presidenta Dilma Rousseff.

Na rodada de ontem (21) o presidente do Centro de Estudos Linguísticos da Língua Portuguesa, Ernani Pimentel, polemizou a discussão ao cobrar maior simplificação gramatical. Ele lidera movimento para adoção de critério fonético na ortografia, ou seja, a escrita das palavras orientada pela forma como se fala. Por esse critério, a palavra “chuva”, por exemplo, seria escrita com x (xuva), sem preocupação em considerar a origem. Para o professor, a simplificação evitaria que as novas gerações sejam submetidas a “regras ultrapassadas que exigem decoreba”.

A sugestão foi rechaçada pelo gramático Evanildo Bechara que considera que a simplificação fonética, “aparentemente ideal”, resultaria em mais problemas que soluções, pois extinguiria as palavras homófonas – aquelas que têm o mesmo som, mas com escrita e significados diferentes. Segundo ele, as palavras seção, sessão e cessão, ficariam reduzidas a uma só grafia – sesão –, o que prejudicaria a compreensão da mensagem. “Aparentemente teríamos resolvido um problema ortográfico, mas criaríamos um problema maior na função da língua, que é a comunicação entre as pessoas”, lembrou.

O gramático avalia que o acordo reúne qualidades e representa um avanço para o uso do idioma e para unificar regras entre os países lusófonos. Ele ressaltou que os países que assinaram o acordo poderão, depois da implementação das novas regras, aprovar modificações e ajustes, caso necessário.

Para o presidente da comissão, senador Cyro Miranda (PSDB-GO), a intenção dos debates não é alterar o acordo, uma vez que, segundo ele, o papel cabe ao Executivo, em entendimento com os demais países signatários. “Nossa obrigação é chamar as pessoas envolvidas para dar opinião. Mas quem toma a frente é o Ministério da Educação e o Ministério de Relações Exteriores. Estamos mostrando as dificuldades e se, for possível, vamos contribuir”, disse.

(Karine Melo / Agência Brasil)

http://agenciabrasil.ebc.com.br/educacao/noticia/2014-10/especialistas-criticam-problemas-no-acordo-ortografico