Cientistas identificam elementos da linguagem humana em chimpanzés (Um Só Planeta/Globo)

Os resultados também reforçam pesquisas semelhantes com outros primatas, como orangotangos e bonobos

Por Redação do Um Só Planeta – artigo original

12/05/2025 15h39  Atualizado há 17 horas

Um grupo de pesquisadores gravaram milhares de vocalizações feitas por chimpazés selvagens no Parque Nacional de Taï, em Ivory Coast
Um grupo de pesquisadores gravaram milhares de vocalizações feitas por chimpazés selvagens no Parque Nacional de Taï, em Ivory Coast — Foto: Liran Samuni/Taï Chimpanzee Project

Pesquisadores registraram milhares de vocalizações de chimpanzés selvagens no Parque Nacional de Taï, na Costa do Marfim, e encontraram dois elementos fundamentais da fala humana nesse comportamento animal: ritmo e combinação de sons.

Dois estudos recentes revelam que os chimpanzés usam estruturas rítmicas e combinam chamadas vocais para se comunicar — características consideradas pilares da linguagem falada. Para a cientista Catherine Crockford, diretora de pesquisa do Centro Nacional de Pesquisa Científica da França, essas descobertas são como “pegadas iniciais” de como a linguagem humana pode ter evoluído.

Os resultados também reforçam pesquisas semelhantes com outros primatas, como orangotangos e bonobos. No entanto, cientistas alertam que estudos com chimpanzés selvagens estão cada vez mais difíceis devido à caça, ao comércio de animais de estimação e à destruição de seus habitats.

Batidas com significado

Um dos estudos, publicado na revista Current Biology, analisou padrões de percussão feitos por chimpanzés nas florestas da África Ocidental e Oriental. Os animais usam as raízes salientes das árvores como superfícies para bater com os pés, enquanto seguram as raízes com as mãos — um tipo de “dança” que pode ser ouvida à distância.

Segundo a professora Cat Hobaiter, da Universidade de St. Andrews, os chimpanzés usam essas batidas para indicar direção de deslocamento ou para fazer um “check-in” social. Cada chimpanzé tem um “ritmo assinatura” próprio, reconhecível pelos outros, como se fosse um sotaque regional.

A análise de centenas de episódios de percussão confirmou que não só existe uma estrutura rítmica nas batidas, como populações diferentes usam ritmos distintos, o que sugere que esses padrões são aprendidos e controlados — aspectos essenciais da linguagem humana.

Hobaiter destaca que o ritmo é uma parte central do comportamento social humano: “Está presente nas conversas, no timing de um sotaque do interior ou na fala rápida da cidade.”

Combinação de sons com novos significados

Outro aspecto central da linguagem humana é a combinação de sons limitados para criar significados ilimitados. Para investigar isso entre os chimpanzés, Catherine Crockford e sua equipe acompanharam 53 indivíduos na Costa do Marfim, registrando todas as vocalizações e comportamentos ao longo do dia.

Com mais de 4.000 registros analisados, os pesquisadores identificaram uma dúzia de sons distintos, usados tanto isoladamente quanto em combinações. A análise se concentrou em pares de sons, ou “bigramas”, e mostrou que a combinação altera o significado original de cada som.

Por exemplo, o som “hoo” normalmente indica que o chimpanzé está descansando, enquanto “pant” costuma significar que está brincando. Mas, combinados, os dois sons sinalizam que o chimpanzé está construindo um ninho.

Estudos anteriores só haviam detectado esse tipo de combinação em situações de alarme, como a presença de predadores, mas o novo estudo sugere que esse comportamento tem usos cotidianos e sociais.

Embora os cientistas reconheçam que a comunicação dos chimpanzés é menos flexível e complexa que a linguagem humana, a motivação pode ser semelhante: a necessidade de navegar em um ambiente social. Crockford comenta que os chimpanzés, assim como os humanos, podem usar a comunicação para descobrir mudanças de status ou conflitos no grupo — algo bem parecido com o que chamamos de fofoca.

Ela conclui: “Provavelmente, essa habilidade de combinar sons não evoluiu apenas para alertar sobre predadores. Ela surgiu porque os chimpanzés, assim como nós, precisam entender e interagir com o mundo social ao redor.”