>Profetas das chuvas preveem inverno rigoroso

>
Os três profetas populares que mais acertam em previsões de chuvas, prenunciam forte quadra invernosa

Diário do Nordeste, Caderno Regional – 08/01/2010

Quixadá. Cientistas populares de todo o Estado se reúnem neste município do Sertão Central, amanhã, para divulgar seus prognósticos sobre a quadra invernosa deste ano. O XIV Encontro dos Profetas da Chuva ocorre neste sábado no antigo Clube dos Agrônomos, no entorno do Açude do Cedro. Segundo o presidente do Instituto de Pesquisa de Violas e Poesia Cultural Popular do Sertão Central, João Soares, são esperados, no mínimo, 30 profetas e dezenas de convidados. Ontem, alguns deles anteciparam, com exclusividade, para o Diário do Nordeste, as suas previsões.

Responsáveis pelo maior número de acertos na última década, Chico Leiteiro, Paulo Costa e Antônio Lima tem praticamente as mesmas previsões para o inverno deste ano. Deve chover muito. No levantamento efetuado pela reportagem, o trio tem percentual de acerto, avaliado o quadro geral no Ceará, superior a 80%. No segundo sábado de janeiro de 2009, Francisco Quintino dos Santos, o Chico Leito, previu diante do público inundações no Estado. Fato que se confirmou em muitos municípios cearense no Interior.

Leiteiro observa as “carregações” do tempo, as plantas, abelhas para fazer seu prognóstico. Diz que, quando os inchuís ou colmeias de marimbondos, também conhecidos como capuxus ou vespas do papel, estão novinhos, no início do ano, é sinal de bom inverno. Associando essas observações ao movimento de outros isentos, do vento, das nuvens e dos astros, tira suas conclusões para o período invernoso a seguir. Ele começou a se familiarizar com esses sinais aos 11 anos de idade e, desde então, foi aumentando sua sensibilidade para os sinais da natureza.

Cantoria dos pássaros

Tendo no cupim seu principal parceiro na hora de prever a próxima estação chuvosa, Antônio Tavares da Silva – o Lima vem dos avós – também encontra na cantoria do sabiá, da cuã e da mãe-de-lua, motivo para animação. Para ele, as árvores também falam ou carregam suas ramagens de esperança para o lavrador. Afirma, categórico: “Se os homens são atingidos por inundações é porque não respeitam a natureza. Os pássaros tem como se proteger, ganharam asas para voar”.

Um pouco mais alto observa Paulo Costa, o único com formação acadêmica no grupo de profetas populares e um dos participantes dos encontros da categoria desde a primeira edição, em 1997. Associando o movimento dos astros a numerologia, complementando seus estudos com um ritual místico herdado do avô, denominado por ele “Arca de Noé”, em matéria de diagnóstico invernoso só perde para Chico Leiteiro. São apenas 3% a menos de percentual de acerto entre um e outro.

Aposentado, poeta popular por amor a arte dos versos, o profeta Erasmo Barreira tem como certa a chegada de inverno observando a árvore do juazeiro carregada e na casa do João-de-barro. Curiosamente, a natureza deu a esse pássaro o dom de construir seu ninho em forma de forno com a porta virada para o poente quando vem chuva, no nascente. No ano passado, ele expôs um ninho de João-de-barro ao público. Dessa vez pretende levar um bagaço de formigueiro, outra prova de chuvarada por vir. Aprendeu tudo com o pai, José Pergentino Barreira, que hoje completa 102 anos. No início, o poeta levava as previsões do pai para o Encontro. Chegou a receber o título de “Profeta de Procuração”. Para ele a cerimônia que reúne os sábios populares é um dos momentos mais importantes já experimentados em sua vida.

Homenagens especiais

Na cerimônia de apresentação dos “mestres da chuva” um deles, João Ferreira de Lima, receberá uma homenagem especial, póstuma. Ele morreu no início do ano. Completaria 81 anos em abril próximo. Nas suas experiências o profeta popular, conhecido por sua seriedade, se baseava principalmente na barra de Natal. João Ferreira nasceu em Choró, quando o município ainda pertencia a Quixadá.

Além dele, o presidente da Assembleia Legislativa, Domingos Filho, o diretor regional do Sebrae, Alci Porto, o secretário de Cultura do Estado, Auto Filho, o secretário de Desenvolvimento Econômico de Quixadá, Nascimento Marques, a presidenta da Fundação Cultural Rachel de Queiroz, Sandra Venâncio, o radialista Jonas Sousa e o cantor Raimundo Fagner serão homenageados.

Fagner não poderá comparecer ao Encontro. Ele faz show no Rio. A comenda será entregue a um representante. João Soares e Helder Cortez, idealizadores e organizadores do evento, explicam: Ele tem uma identificação peculiar com a simplicidade sertaneja, procura na natureza os sinais da esperança.

MAIS INFORMAÇÕES
XIV Encontro de Profetas da Chuva
Amanhã, às 9h – Clube do Agrônomo / Aç. do Cedro / Quixadá, V Encanta Quixadá, hoje, às 19h, (88) 9635.0828

O QUE ELES PENSAM

Sinais da natureza orientam prognóstico no CE

Com certeza teremos inverno grosso este ano novamente. Eu não queria prever coisa assim, mas será meio perigoso. Se a quadra da Lua Cheia não me enganar, vai acontecer isso mesmo. Até o mar cresce quando ela aparece. Esses estudiosos falam desse tal de “Ninho”, mas pelo jeito até os pássaros vão ter de procurar lugar mais seguro pra ficar, principalmente se construíram casa dentro de rio. O inverno deve ser grande a partir do fim de março.
Chico Leiteiro
Leiteiro

O nosso povo pode esperar muita chuva este ano. Nas minhas observações, o inverno se configura mesmo a partir de março, com chuvas pesadas. A tendência é ser, inclusive, superior ao do ano passado. Os ciclos se completam de fevereiro para março e de abril para julho, onde a expectativa é de aguaceiro. Os números dos meses provam isso. Os dias das semanas de fevereiro são os mesmos de março e os de abril são iguais aos de julho. As chuvas devem continuar até o mês de outubro.
Paulo Costa
Odontólogo

O inverno começa firme ainda no fim do mês de fevereiro para o início de março e se segura firme até maio. A chuvarada deve ser na mesma proporção do ano passado, mas em áreas isoladas do Interior do Estado. Além dos sinais dos bichos e dos insetos, os ventos do Aracati anunciam isso. Vem muita chuva por ai, com ventos fortes e muita trovoada. Formiga não é satélite, mas tem antena, e as delas tão alvoroçadas, indicando que vem muita água por ai no Estado.
Antônio Lima
Agricultor

V ENCANTA QUIXADÁ

Cantadores de viola abrem encontro

Noitada cultural ao som de violas e repentes marca a abertura, hoje, do encontro dos profetas das chuvas

Quixadá. Quem também rende tributo à tradição nordestina e aos observadores do tempo são os cantadores de viola. Seis duplas se apresentam na véspera do Encontro, na noitada cultural do V Encanta Quixadá, no Centro Cultural Rachel de Queiroz, hoje à noite. Geraldo Amâncio comanda a peleja de repente. Além dos repentistas, está programada a apresentação do espetáculo teatral “Profetas da Chuva”. Chico Mariano e Paroara contam para o público suas experiências. O curioso da encenação são os intérpretes. Os dois profetas de Quixadá são vividos por duas atrizes: Clara Colin e Paula Cavalcanti. Elas já apresentam a peça desde 2007 no Sul do País. Simples e narrativo o prólogo, intercalado com cantos de modas sertanejos, envolve o público à linguagem peculiar e observações dos protagonistas sobre a quadra invernosa no sertão. “Acontece muita prosa enquanto o céu se prepara para ficar bonito de chover”.

As duas atrações, o Encontro dos Profetas da Chuva e o Encanta Quixadá são abertas ao público. A entrada é franca. Parcerias com o Sebrae, Banco do Brasil e Caixa Econômica e mais de uma dezena de patrocinadores garantem o acesso gratuito e a realização dos dois eventos.

Quando o comerciário João Soares de Freitas e o agrônomo Hélder dos Santos Cortez resolveram reunir um grupo de observadores da natureza, a buscarem nela os sinais de probabilidade invernosa no Interior do Ceará, não imaginavam quão importante papel científico e cultural protagonizavam a partir de 1997. No pequeno auditório da Câmara de Dirigentes Lojistas (CDL) de Quixadá, reuniram Antão Mendes, Antônio Lima, Antônio Alexandre dos Santos, Antônio Anastácio da Silva (Paroara), Expedito Epifânio da Silva, Francisco Mariano e Joaquim Ferreira Santiago, o Joaquim Muqueca, Paulo Costa, Raimundo Mota Silva e Ribamar Lima.

João Soares recorda do I Encontro. O inverno daquele ano foi considerado bom. Observado o registro efetuado por ele e o parceiro idealizador, então gerente regional da Cagece, Hélder Cortez, houve divergências entre os prognósticos dos profetas da chuva.

Cinco deles estimaram inverno fraco. Outros cinco avaliaram como regular. Apenas as observações de Antônio Alexandre dos Santos se enquadram nas perspectivas. Ele foi curto e objetivo: bom inverno. Este ano não será diferente. Quem souber melhor interpretar a natureza, acerta mais.

ORIGEM

1997 foi o ano de início da promoção do Encontro de Profetas das Chuvas, evento idealizado pelo comerciário João Soares de Freitas e o engenheiro agrônomo Hélder dos Santos Cortez

ALEX PIMENTEL
Colaborador